quinta-feira, 11 de outubro de 2001

Santo?

Não sei de onde vem esse costume, mas sei que ele existe. Salvo os ladrões de galinha, condenados ao fogo do inferno, todo mundo depois que morre vira santo. Com Roberto Campos, falecido dia 9 não seria diferente.
Abro hoje (11 de outubro) o jornal e me deparo com a notícia de sua morte e, é claro, depoimentos e colunas esparramando elogios ao defunto. A impressão que fica era de alguém beirando a perfeição. E me parece perigoso tal tratamento a um homem público.
Esse economista tido como coerente era, ao meu ver, um covarde: poderia, quando ministro da economia, fazer as reformas liberais que defendia, mas não fez – talvez porque soubesse das conseqüências do modelo e que isso acabaria por minar a "Revolução de 64".
Esse imortal tido como inteligente, apenas hábil fraseador, que baixava qualquer discussão para um nível "hepático" e tinha como argumento principal para defender suas posições "Nos EUA é assim e se lá funciona aqui também funcionará" – falo isso com base nos seis meses que em 99 eu me dediquei à insalubre tarefa de ler a coluna do destacado intelectual na Veja – como se EUA, que mandam no mundo, e Brasil, que não manda nem em si, tivessem realidades muito semelhantes.
Esse o homem que a imprensa canoniza, que todos só vêem virtudes. Se é assim com Roberto Campos, já até imagino um discurso no estilo "era um homem de palavra, honesto e ilibado, que dedicou sua vida aos mais pobres" quando na vez de Paulo Maluf.
Não estou dizendo que Roberto Campos seja todo ruim. Ele tem, como todos, virtudes e defeitos; uma dessas virtudes, não há como negar era a de que suas frases eram muito boas. E é com uma delas que termino: "A burrice, no Brasil, tem um passado glorioso e um futuro promissor", mas que a burrice vai sentir a ausência de um de seus maiores expoentes, isso vai.
PS: Agora, sem eufemismos. Roberto Campos morreu. Morreu tarde. Melhor que tivesse sido abortado. Mas já que durou até 2001, que agonizasse até 2010. Ao menos me conforta saber que ele pode presenciar a queda do WTC. Será que ele não morreu de desgosto?

Ribeirão Preto, 11 de outubro de 2001

Sem comentários: