sexta-feira, 31 de janeiro de 2003

Lula do Brasil

Bem fala minha mãe: se o Lula não fizer nada, pelo menos uma coisa ele já fez: mostrou ter orgulho de ser brasileiro.

Nada de discursos em inglês, francês, javanês, Lula, no Fórum Econômico Mundial falou em bom português, mesmo.

Entre os cortes de gastos do novo governo, Lula cortou a cozinheira que preparava os “sofisticados pratos” de FHC; quem sabe agora, voltamos a comer, com orgulho, o bom arroz com feijão, e deixamos de lado o Big Mac.

Durante as eleições, muitos – professores da Unicamp, inclusive –, se alarmavam com a vitória de Lula: como é que ficaria a imagem do Brasil no exterior? Nessa primeira viagem à Europa feita pelo novo presidente (que tem, diga-se de passagem, um sabor de velho governo), não li uma linha que comentasse o fato do terno do presidente, não sendo Armani, tivesse o prejudicado em algo; nem mesmo ao seu discurso em português no FEM ouvi qualquer censura. Além disso, se o Lula fosse sinônimo de irrelevância do Brasil no cenário internacional, porque toda essa cobrança (sadia, por sinal) por uma posição quanto à guerra dos EUA contra o Iraque?

Por falar em guerra, já está na hora do Lula deixar um pouco o estilo FHC (belos discursos e posições sempre em cima do muro), e dizer qual a sua posição. Espero (e creio não ser o único), que ele não se preste ao sórdido papel de companheiro dos EUA nessa guerra imperialista, calcada unicamente em interesses econômicos.


31 de janeiro de 2003

segunda-feira, 27 de janeiro de 2003

O importante é competir

É bastante conhecido um texto que compara o frescobol ao jogo de tênis: o primeiro cooperativo, o segundo competitivo; o primeiro com dois vencedores, o segundo com um perdedor.

Caminhando pela praia, este final de semana, esse texto me veio à mente: hoje joga-se frescobol com certas variações que não existiam na última vez que eu tinha ido para praia, cinco anos atrás.

Os limites da “quadra” riscados na areia, redes improvisadas, contagem de pontos. O frescobol se assemelha cada vez mais ao tênis. Bem que eu torci para que isso fosse reflexo do sucesso do Guga (afinal, eu estava em Santa Catarina), mas não me parece que argentinos e paraguaios dividam do mesmo entusiasmo pelo Guga, nem que tenham um nome de tamanho brilho para servirem de inspiração (fossem chilenos, quem sabe...). Além do mais, essas quadras improvisadas eram utilizadas principalmente por jovens de até 16 anos, mais ou menos. Algumas poucas pessoas que já haviam passado dos 30 e que vi jogando frescobol, jogavam a versão tradicional, em que o importante é não deixar a bolinha cair.

Uma década de reformas liberais e de individualismo exacerbado, a geração que não joga frescobol foi educada e formada sob esse signo. A cooperação é algo sem graça, a emoção está na competição, na possibilidade da vitória, em ser melhor que o outro, subjugá-lo. A igualdade é medíocre.

O texto que comparava o frescobol ao tênis parece estar sendo superado. O frescobol, subvertido. A cooperação, fora de moda. Para a geração atual o importante é competir, cooperar só se for para vencer o time adversário.

Me interrogo qual seria o mote dessa geração: que vença o melhor, ou salve-se quem puder?


Pato Branco, 27 de janeiro de 2003

segunda-feira, 20 de janeiro de 2003

O nariz de palhaço e a orelha de burro

Hoje fui visitar um médico. Não que se trate de uma visita que me agrada, mas de vez em quando é preciso. Como belo espécime da classe-média, disponho de plano de saúde privado, o que permite milagres, como o de marcar consultas para o dia seguinte.

Tinha eu agendado consulta para as quatro e meia da tarde. Adepto ao “me-faça-de-pato-que-eu-gosto”, cheguei às quatro e vinte e cinco. Como – já disse – sou usuário de plano de saúde, e não particular que paga em dinheiro, tenho direito a um brinde, na maioria das vezes que vou a um médico: um nariz de palhaço.

Como cheguei ao consultório trinta e cinco minutos adiantado, tive que achar um jeito de passar o tempo. Assim ganhei mais um brinde: um par de orelhas de burro! A tv estava ligada, prendendo a atenção de quase todos os que estavam na sala de espera. Na tela um filme da “sessão da tarde”: A Lagoa Azul: duas crianças que não sabem que se engravida, mas conhecem anatomia. Diante de tamanha idiotice (também, o que eu poderia esperar de um televisor?) fui em busca de uma revista. Revirando entre Caras e Contigos encontrei uma Veja, o que não melhorou muito. Na verdade melhorou muito pouco. Ainda mais que, se bobear, a Veja mais nova que você encontra em salas de espera é a que anuncia a URV. Surpreendentemente aquela era de novembro de 2002.

Folheei um pouco aquilo, até que me detive nos colunistas. Primeiro o ultra-conservador, mas que escreve várias coisas boas, Roberto Pompeu de Toledo. Falava da importância da instituição da ex-presidência, cujo ocupante serviria de ponto de referência da nação. Creio que ele só falava isso porque o ex-presidente em questão era o FHC, fosse o Lula o assunto seria abordado de outra forma. Falava também da importância do Lula escolher o Palácio da Alvorada e não a Granja do Torto como morada oficial: nós precisamos da nossa Casa Branca.

Se Pompeu não estava inspirado, o mesmo não posso dizer do Diogo Mainardi. Mais surpreendente que encontrar aquela Veja, foi ler uma coluna do Diogo Mainardi boa! Comentava da presunção italiana com os islâmicos, que vai da Divina Comédia, de afrescos de igrejas às declarações do Silvio Berlusconi e “pensadores” italianos; e do risco dos extremistas realizarem um ataque terrorista ao país em que ele residia.

Talvez eu só esteja querendo me defender, já que não são poucos os que dizem que meu jeito de escrever é semelhante ao do Mainardi. Mas essa crônica dele foi a primeira razoável que vi! Claro que ele não podia perder a dele: além de pitadas de preconceito contra a cultura islâmica; do início ao fim da crônica, o maior desastre de um ataque terrorista na Itália que ele encontrou foi o de ele ir pelos ares.

Moral da história: da próxima vez que eu for num médico, levo meu Cony em baixo do braço, ao menos aproveito o tempo com alguma coisa útil.


Pato Branco, 20 de janeiro de 2003

sábado, 18 de janeiro de 2003

Perguntas que sempre voltam

Tem certas perguntas que sempre me faço, por mais que já tenha encontrado respostas satisfatórias, quando abro os jornais.

Por que a oposição na Venezuela é branca, dentes bonitos e roupas de marca?

Por que greve no Brasil é inconstitucional e locaute na Venezuela é popular?

Por que o Chavez é ditador e o Duhalde é presidente?

Por que chamam os Estados Unidos de democracia?

Por que dizem que no Brasil há democracia?

Por que Cuba é um perigo para os Estados Unidos?

Por que o Iraque é um perigo para os Estados Unidos?

Por que o Iraque se tornou um perigo só depois da saída do Bustani da Opaq?

Por que o projeto atômico da Coréia do Norte não representa perigo aos Estados Unidos?

Por que só os “países civilizados” podem ter bomba atômica?

Por que o Eixo-do-mal nunca passa pela França, Itália, Alemanha, Rússia, Inglaterra, Israel?

Por que os Estados Unidos se interessam tanto pela Colômbia?

Por que não capturaram o Bin Laden?

Por que os terroristas são sempre os mais fracos?

Para onde foi o dinheiro das privatizações dos anos FHC?
Por que os preços controlados pelo governo aumentaram muito acima da inflação durante os anos FHC?

Por que se avalia um presidente pelo currículo e não pelo que fez quando no cargo?

Por que FHC defendeu tanto o foro privilegiado?

Por que o Palocci agrada os “mercados”?

Por que o Lula ainda não falou da base de Alcântara?

Quando vai acabar a tortura no Brasil?
Por que o S no BNDES?

Por que a Globo puxa tanto o saco do Lula?

Por que justo o Miro Teixeira no ministério das comunicações?
Por que existe prisão especial pra aqueles que tiveram mais oportunidade na vida?

Por que o vê-comunista-em-cada-esquina Denis Rosenfeld tem tanto espaço na Folha de SP?

Por que “elevador de serviço” não é preconceito?

Por que todo mundo só prevê as tragédias passadas?

Por que não se faz mais médicos como Che Guevara, Oswaldo Cruz e Guimarães Rosa?
Por que o MST é criminoso e a UDR não?

Por que o culpado pelo aumento da violência é sempre o traficante, nunca o usuário de drogas?

Por que todo mundo se diz de esquerda?


Pato Branco, 18 de janeiro de 2003

terça-feira, 7 de janeiro de 2003

A caravana


Saudades do tempo em que se dizia na política que o poder era como violino, pega-se com a esquerda e toca-se com a direita... na era da internet, do big brother, do viagra o poder agarra-se com a direta e toca-se com a direita.
Lula ganhou as eleições. Foi vendido como se vende pasta de dentes, se tornou um ícone pop (ele e o Enéas foram os dois mais pop das eleições), ganhou com um discurso vazio e sempre tentando agradar aos especuladores. O povo? Algumas propostas de impacto, midiáticas. As atitudes concretas sempre se direcionaram ao capital.
Agora Lula faz a caravana da miséria com seus ministros. Para variar, mais um evento midiático. A intenção até é boa, mostrar a verdadeira cara do Brasil para aqueles que decidirão o seu rumo. Só que esqueceram de chamar quem manda no Brasil: até onde sei, nenhum representante do FMI integra o grupo de tal caravana. Já os ministros, é estranho que não conheçam a face do país, que é mostrada em doses homeopáticas a cada esquina das grandes cidades brasileiras. Deve ser porque agora haverá equipes de televisão acompanhando a caravana que eles atentarão para o fato de no Brasil existir quem passe fome.
Enquanto Lula e a maioria de seus ministros aparecem bastante e fazem pouco, tem ministro já mostrando para o que veio. O ministro do trabalho, Jaques Wagner, disse que é contra a multa de 40% sobre o FGTS para demissões sem justa causa (não entendo muito de economia, vai ver que desonerar as demissões aumenta a oferta de empregos).
O governo é novo, mas as emissoras de tv são as mesmas. E para agradar a esses "mesmos" Lula segue a linha de seu antecessor, não apenas na questão trabalhista, como na televisiva: ambos fazem a alegria dos telejornais, um com seus belos discursos, outro com suas caravanas e abraços. Estou sendo um pouco precipitado - mas como dizem que a primeira impressão é a que fica -, parece que trocamos um sociólogo de gabinete, intelectual-de-orelha-de-livro por um astro pop.

Pato Branco, 07 de janeiro de 2003