Não escondo minha simpatia - guardadas muitas ressalvas - pelo atual governador do Paraná, o senhor Roberto Requião (PMDB). Não acompanho em detalhes sua administração, assim como a de nenhum outro governador do país, mas pelas notícias que leio (majoritariamente oriundas da grande imprensa), mostram um governador mais voltado para as questões sociais e problemas das pessoas do que para estatísticas, planilhas de gastos e politicagem rasteira. Não que ele não esteja imune à imundice inerente à política atual tupiniquim (e não falo em corrupção, falo em disputa de poder), mas ele não deixou de manter uma linha coerente entre o que dizia na campanha e o que fez no governo, inclusive fazendo uso das apocalípticas "quebras de contrato" com as empresas (porque quebra de contrato com eleitor não é problema).

Com relação ao MST, por exemplo. Tem sua posição clara e não faz jogo duplo. Se não dá todo o apoio que militantes e simpatizantes do movimento julgam necessário, em momento algum ameaça criminalizar o movimento ou seus líderes. Pelo contrário, "criminaliza" as milícias armadas dos proprietários rurais que ameaçam os integrantes do MST. O argumento para a existência dessas milícias é que elas surgiram justamente por causa da leniência do governo para com o movimento, falácia completa, primeiro porque dialogar não é ser leniente, e segundo porque tais milícias existem inclusive nos estados onde o movimento é criminalizado.

Outra prova de que Requião enxerga além de tabelas de dados se deu esta semana, com a demissão do comandante da PM de Londrina, major Manuel da Cruz Neto. Enquanto o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB) é acusado por entidades ligadas aos direitos humanos de permitir a execução da Operação Cachoeirinha, que resultou no assassinato de 30 pessoas pela PM, no que seria uma farsa montada justamente para a execução dessas pessoas; enquanto o governo de Goiás, do senhor Perillo (PSDB) considera um sucesso matar duas pessoas na desocupação de um terreno em Goiânia (Perillo agora está sendo crucificado pelo partido por ajudar o MST na sua marcha a Brasília); enquanto José Serra tem agido contra resoluções da ONU pelo direito à moradia, tirando a "casa" de famílias que não tem para onde ir, sem dar qualquer auxílio a elas, em nome da revitalização do centro da cidade; Requião demitiu o major por ter dito que o assassinato por espancamento de um jovem de vinte anos pela polícia foi um "acidente de trabalho". Os dois PMs que participaram da "operação", além de outros 30, também foram afastados (o jovem foi morto por se recusar a baixar o som de casa).

Sem dúvida é pouco. Não digo nem que seria o ideal, mas o mais elementar seria que a polícia protegesse a vida acima de tudo, fosse de quem fosse; e que um assassinato por parte da PM fosse um absurdo impensável, digno de fazer cair até o governador. Mas como o Brasil é Brasil, já é um grande avanço que policiais estejam sendo presos por contrabando de arma e formação de milícias contra MST, ou que sejam presos e afastados por assassinarem cidadãos ou simplesmente por não acharem isso abjeto. Essa mesma polícia, no governo anterior, do senhor Jaime Lerner (ex-PFL, hoje PSB), assassinava trabalhadores sem-terra e isso era tido como "acidente de trabalho".

Campinas, 17 de maio de 2005