sexta-feira, 29 de julho de 2005

A alfândega falha, a polícia não

Meu irmão acha que estou muito animado com teorias conspiratórias, mas continuo com a mesma opinião desde quando fiquei sabendo do assassinato do brasileiro pela política britânica - inclusive os fatos que vão sendo revelados aos poucos corroboram minha tese: a polícia britânica não se equivocou, sabia quem era e qual a situação de Jean, e sua tarefa foi cumprida com louvor. Aos fatos.
A inteligência da polícia britânica, ao contrário da brasileira, não é burra. Cometer tal equívoco seria uma gigantesca desmoralização, digna de críticas e não de elogios por parte dos governantes. Ainda mais depois de "não conseguir prever" os atentados de 7 de julho, mesmo quando todos sabiam que a Inglaterra era alvo preferencial de terroristas.
Segundo escreveu o filósofo francês Guy Debord, em Comentários sobre a sociedade do espetáculo (encontrado em copyleft na internet), em 1988, no início do século XX a máfia (e o crime organizado em geral) estava fada a se extinguir, devido à racionalização crescente do estado de direito. Entretanto, devido à necessidade de extirpar certos problemas sociais os governos notaram a utilidade do crime organizado para a realização das tarefas "sujas". Se viermos para o fim do mesmo século XX não é preciso sequer mencionar quem armou, treinou e financiou os dois maiores sanguinários da atualidade, segundo a imprensa chapa branca internacional.
Acontece que os terroristas (o terrorismo não deixa de ser uma corrente do crime ornganizado) fugiram do controle, aparentemente. Falo aparentemente porque, se repararmos bem, os EUA foram enormemente favorecidos pelo 11 de setembro de 2001. Tiveram um pretexto ótimo - muito melhor do que a guerra contra as drogas - para fincarem suas botas onde tinham interesses. A Inglaterra, ou melhor, os donos do poder inglês, com os ataques em seu território, também ganharam: o IRA, Exército Republicano Irlandês, acusado de terrorismo (apesar de não merecer a mesma denominação que a Al Qaeda, conforme já discorri em crônica de 1 de março de 2004), vendo que poderia ser utilizado como bode expiatório nos recente ataques, anunciou a deposição das armas. O outro ganho é a justificativa par o "atirar na cabeça", ou seja, atirar para matar. Debord, no texto citado, também fal dessa grande vantagem do terrorismo: ele autoriza os governos a tudo (menos a conversar com os terroristas, como a polêmica suscitada na Espanha no início de 2004). Aqui entra o assassinato do brasileiro: a guerra ao terror justifica equívocos como esse. E sob tal argumento põe-se todos os imigrantes ilegais em um estado de estresse contínuo. Se a alfândega não está funcionando direito, a polícia está. Os imigrantes ilegais, diga-se de passagem e não sem propósito, são freqüentemente alçados pela direita européia à condição de causadores do desemprego, do aumento da violência, da piora da qualidade de vida. Imagine o medo permanente das milhares de pessoas que vivem na Inglaterra ilegalmente: se a polícia "confunde" um latino-americano cristão com um terrorista árabe muçulmano e ainda assim é elogiada, o que não fará com africanos e árabes de qualquer religião ou muçulmanos de qualquer região? O recado foi dado: quem correr da polícia (expediente comum entre imigrantes ilegais) morre, quem ficar é extraditado.
Bush, Blair podem muito bem utilizar como filosofia de vida o título do filme do Kubrick: como parei de temer a bomba e passe a adorá-la.

Campinas, 29 de julho de 2005

quarta-feira, 20 de julho de 2005

Beleza, pode pôr sem título esta bagaça.

...e lá estava o recado no meu Orkut. “A Paula pede para avisar que ela está organizando mais um Zine2 e conta com vossa modesta colaboração.” Minha colaboração?! Tarefa árdua... Um zine é algo duradouro, não comporta uma crônica política ou algo do gênero, falando da corrupção ou da elevação da DRU - que retira recursos da saúde, educação e segurança para pagamento da dívida e dos juros -, que estaria superada em uma semana. Um texto aqui deve almejar a eternidade! Sem dúvida, uma enorme responsabilidade. Mas é difícil recusar um pedido desses, feito da forma que foi feito (via Vannucci). Aceito, portanto, o convite para participar do famigerado Zine2! Sed quid scribus ad Paulae zineam?

Fui dar uma olhada nas edições anteriores que eu tinha comigo, tentando sentir o “clima” do zine quando... ‘Pera lá! Por que Zine2? Eis a dúvida que se me abateu. E ninguém para me explicar. 2, por que 2 e não 1, 3, 21? Dizem que o segundo é o primeiro dos últimos. Será por isso? Ora, se é assim, é melhor ficar mais pra trás, que a cobrança é menor.

2. 2 não tem nenhum significado especial. Claro, melhor Zine2 do que Zine13, Zine 25, Zine45, Zine56... Mas ainda assim, 2? 2 é um número sem quê nem porquê. Que falta de tato numerológico! Por que não escolheram um número com mais presença? ‘Tá, é certo que 1 é uma baita pretensão. Quem se proclama o número 1 geralmente é um fracassado que um dia acreditaram que tinha chances de realmente ser o primeiro. Mas 2 é admitir o fracasso. Que tal 3 ou 7? São números bacanas: tem um quê cabalístico, que sempre cai bem nas publicações que pretendem ir além do comum, do vulgar.

Começa que 3 e 7 são primos. E eles estão presentes na nossa vida de maneira assustadora, desde a antigüidade. Deus é três. Nas olimpíadas, as medalhas são para os três primeiros. Os dias da semana são sete. Sete são os pecados. Os princípios do movimento para Aristóteles são três. Se somarmos esses princípios ao número de causas (quatro), temos sete. As listas dos melhores são sempre os 10+ (3+7). Os mandamentos também são dez.

E o dois? A primeira vez a gente nunca esquece, já a segunda... alguém se lembra? Poderia ser usado para defender o 2 do Zine2, o argumento de que os textos aqui publicados são obra de profunda reflexão e não uma mera primeira versão, ainda tosca. Pero no creo. Digamos que isto não parece ter muito respaldo na realidade. Também não creio que a maioria que contribui com esta ou qualquer outra edição (tirando a segunda) o faça pela segunda vez. Eu, por exemplo, é a primeira vez (pelo jeito, é também a última que me chamam pra contribuir). Se eu contar participações em revistas da faculdade, cartas em jornais, esta deve ser a sétima vez que publico algo. 7, vê só? É um número cabalístico, sempre presente!

Alguns, como a dona-idealizadora-diretora-redatora-diagramadora-contribuidora do zine, por exemplo, mais afinada com a leitura de mão do que com a numerologia, podem não gostar de um nome em que está evidente o intuito cabalístico. Conheço bem as armadilhas da língua, inclusive conheço um japonês assim chamado, e ressalto de antemão que o uso que farei desta palavra encontra-se no sentido tradicional do português, ou seja, de sugestão. Pois bem, sugiro que o nome poderia ser Zine37 ou Zine73, evitando assim uma disputa por qual dos dois números (epa, um dois!) cabalísticos escolher, agradando a gregos e troianos, botafoguenses e comercialinos, sendo que 37 e 73 são, inclusive, primos.

Antes que achem que todo este meu blábláblá é inútil e despropositado, deixo claro que o que fiz aqui foi uma pequena e singela crítica dialética, ao melhor modo da dialética hegeliana, transformando o dado (no caso, o Zine2) em um produzido, utilizando também dos imprescindíveis recursos da cabala, da numerologia e da astrologia; tentando, destarte, adequar as nobres pretensões que sei servirem de norte a este zine - histórico já desde seu primeiro número -, a um nome condizente com uma publicação digna do panteão de Apolo e da Brazilian Letters Academy.

Entretanto, feito a crítica ao zine, falta a crítica à crítica, momento crucial para notarmos as falhas da crítica, e mais ainda, para achar um nome pro texto. Haja vista a frase em latim, a citação em espanhol, a menção a Hegel, Aristóteles, Deus, pecado, Botafogo e Comercial, Orkut, Paula e Vannucci, Apolo, cabala, a vontade que dá é de chamá-lo de “Crítica Romana ao Zine2”. Entretanto devo reconhecer que, não tendo citado Maquiavel, Voltaire, Diderot, Roussseau, Espinosa, Descartes, Malebranche, Montaigne, Leibniz, Vico, Montesquieu, d’Alembert, Pascal, Marx, Weber, nem outra meia dúzia de filósofos, este texto não é digno do digníssimo filósofo Beto Romano, que em um texto de igual tamanho comportaria ao menos 21 filósofos, citações em francês, italiano e latim. Mas ainda sou estudante, estou aprendendo. Sei que se muito me esforçar aos 59 estarei quase tão pomposo quanto o supracitado, ganhando aplausos pela minha verborragia incompreensível.

Pois bem, finda a crítica à crítica, como manda os bons princípios da filosofia crítica, resta-nos agora fazer a crítica da crítica à crítica. Repare que, se não fizermos esta crítica da crítica à crítica estaremos incorrendo no tradicional erro de achar que chegamos ao princípio (ou seria ao fim?), quando na verdade estamos no meio do caminho. Por isso, faz-se imprescindível perceber que, se comentamos da obra de Hegel, Aristóteles e Romano, precisamos fazer uso dos autores clássicos da modernidade, como Kant, por exemplo. Já que falamos em princípio e fim, este ponto é assaz pertinente para começarmos uma crítica crítica da crítica à crítica...


Pato Branco, 20 de julho de 2005 - texto pro Zine2