quinta-feira, 21 de março de 2013

De um restaurante em um cruzamento vejo o movimento da rua

Depois de assistir ao ensaio da Osesp com o maestro Osmo Vänskä (uma experiência assaz interessante essa, de ver um ensaio que não o do Fellini), vou a um restaurante vegetariano, no cruzamento da Brigadeiro Tobias com a Senador Queirós. O restaurante é muito bom, e o preço relativamente barato para São Paulo – pouco mais de R$ 30 por quilo. Me sento do lado da janela, para a Brigadeiro, para assistir ao movimento da cidade. Pessoas passam, carros também, nada além do esperado (e assim será até o fim desta crônica, já aviso). (Bebida? Não, obrigado). Na vaga para idoso pára um carro com dois velhinhos. É um carro bom, novo, nem top nem “pop”, que evito dizer o nome para não fazer propaganda. O velhinho veste fato completo, a velhinha está um pouco mais leve na indumentária – quase leve demais para a temperatura do dia. (Professor ganhava nove reais a hora-aula, nove reais, sabe o que é isso?). Ficam um tempo ali, conversando, eu me distraio com o movimento que segue indiferente aos dois. Passam orientais, que me fazem lembrar de minha namorada, rolo, “caso afetivo significante”, como prefiro chamar, que foi quem me indicou este restaurante, e hoje começa vida nova na Bahia. Passa uma moreninha com camisa de medicina veterinária que eu vira próximo à estação da Luz, linda! Está com uma amiga, parecem perdidas, pedem informação a um homem parado em frente ao restaurante do outro lado da rua. Não, é aqui o restaurante bom!, grito em pensamento. O homem dá a informação, com os gestos percebe-se que não é na próxima, e na outra rua. Elas agradecem, correm para atravessar a rua, e somem de meu campo de vista, para minha tristeza. O casal de velhinhos – volto a reparar neles – seguem no carro. O movimento prossegue. De repente do senhor abre um pouco a porta do carro e despeja um líquido de uma espécie de caneco grande de plástico na rua. (Sabe do que não gosto daqui?). Será? Me parece estar esvaziando o papagaio. Será? Não deve ser. Pouco depois o carro parte. Passam homens carecas, orientais, moradores de rua, engravatados, morenas bonitas (mas não tanto quanto a veterinária, e me vêm à mente a música do Iggy Pop). Aparece, então, o casal de velhinhos, desta feita caminhando. Ele se agarra no braço da mulher com uma mão, com a outra leva uma bengala. Seu caminhar é lento e arrastado, não consegue levantar os pés do chão. (A bonita oriental que me fez lembrar de meu caso afetivo significante acaba de sair do restaurante em frente). Caminhar pela calçada irregular, inclinada e cheia de buracos, é rali para o senhor, que chega a me deixar cansado por ele. Um homem espera com paciência o casal passar, para então seguir com seu trabalho de carregar tábuas. Na esquina, param, a senhora põe a banqueta que carregava no chão, e o velhinho se senta. O homem retoma seu trabalho, pessoas passam, carros passam, ela espera, em pé, ao seu lado. A mancha no asfalto com o líquido segue forte e visível. Será? (Roubaram a moto do Arnaldo). Eles se levantam e seguem. Eu tomo nota. São duas e dois da tarde, preciso ir.

São Paulo, 21 de março de 2013.

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