quarta-feira, 23 de abril de 2014

What are they doing in heaven today? [Memórias feitas de saudades]

Porra, Misson! Tanta falta sinto de você. Nunca havia pensado que sentiria tamanha falta quando estávamos juntos, e não me arrependo: tínhamos a vida pra viver, nossa companhia pra dividir, a morte era algo para um futuro distante e não fazia sentido deixá-la tomar conta da vida. Agora que é passado, tampouco faz sentido, eu sei. What are they doing in heaven today?, escuto agora. E então, muito ocupada para mandar uma carta? Quando recebi a ligação às três e cinqüenta e oito da manhã, sabia que você seria um enorme vazio. Mas o enorme é vasto demais pra gente ter idéia antes de vivê-lo. Assim como o vazio. Assim como sua ausência - ainda tão presente, como suas lembranças. Comentei hoje em terapia - infelizmente não pude contar da minha nova terapeuta para você, que teria muitas piadas para fazer -, dos silêncios que tenho vivenciado nos últimos tempos. Silêncios agradáveis em companhia de outras pessoas. Lembrei dos silêncios contigo, tantos e tão leves: não tínhamos a obrigação de lançar o tempo todo palavras umas atrás das outras para saber que o outro estava próximo. O espaço-tempo ao nosso redor não era um vazio rarefeito que precisava ser preenchido: havia nos interstícios nossos afetos, nossos pensamentos - e seu cigarro com café no sofá e meu chimarrão na cadeira. Nos compreendíamos tão bem. E se não nos compreendíamos, tínhamos a sintonia para entender qual era o ponto da questão que atormentava o outro e então problematizávamos em cima dele. Mas não é do que falávamos que sinto falta hoje, é do que não precisávamos falar. Dos olhares que já diziam a piada. Dos gestos que se seguiam às palavras. Eu te ensinando a desapegar; você me ensinando a me encorpar (imagine hoje, se soubesse que estou fazendo dança). Eu aprendendo a te pedir um abraço, aprendendo a te abraçar. Nós dois usando as costas das mãos como lenço das lágrimas alheias, sem pedir nada em troca no futuro. E eu não tinha dúvidas da pertinência de te pedir companhia. Assim como você sabia que era pertinente me escrever ou tocar a campainha de madrugada, se fosse preciso - seja porque estava mal, seja porque a balada acabara e estava satisfeita com a noitada. Silêncios. Tenho escutado você neles por estes últimos tempos. Tem horas que te vejo dizer: "é isso, Dalmoro! Vai lá", antes de outra tragada carregada de alegria. 

São Paulo, 23 de abril de 2014. 

 Para Patrícia Misson, de quem sinto falta também dos silêncios.

1 comentário:

Daisy Serena disse...

Dj me disse: "sei que estás no trabalho, mas se precisar chorar, vá ao banheiro e coloque tudo para fora. Vai te fazer bem. E tu não podes ficar mais carregando, guardando este tipo de sentimento, sensação"

Ontem a noite eu tinha chorado muito, hoje eu estava segurando, dando nó de marinheiro no que já estava aqui preso na garganta frouxa. Estava...