segunda-feira, 6 de outubro de 2014

Brincou, caiu, machucou?


Saio do metrô nostálgico, e logo na primeira banca me deparo com uma máscara de plástico do Homem-Aranha, dois furos para os olhos. Lembro da minha de Changeman, mil novecentos e batatinhas: se não me falha a memória, a minha era vermelha, e a do meu irmão, azul (será por isso minha mania em usar vermelho, a ponto de uma amiga, quando sugeriu que eu usasse roupas coloridas, emendou a seguir: "vermelho não vale como cor pra você, é praticamente um intermediário entre o branco e o preto"?). E vestido com a máscara, lá ia eu salvar o mundo com minha espada do Thundercats, seguido pelo meu irmão, com sua máscara e sua espada, em nossas aventuras a la Don Quixote pelo quintal da casa - só não me recordo se algum dia ele conseguiu ser rei de uma ilha, bem possível que tenha sido e eu não prestei a devida atenção. Me questiono agora: por que a viseira tinha vários furos, ao invés de só dois? E por que não uma viseira de plástico transparente, por que aqueles furos todos? Com furos ou com viseira, azul, vermelha ou de outra cor, nenhuma dessas aventuras me deixou trauma.
Contrariamente à uma outra, cujo cartaz no metrô, alguns minutos antes, me fez rememorar. Esperava o trem e observava as propagandas. Numa delas, um anti-séptico, versão spray e versão "antiga". Só de ver o aplicador senti a dor de quase trinta anos atrás: estava eu na casa do meu amigo, o vizinho logo ao lado, e após (mais) uma briga, saio enfezado e tropeço num buraco que havia na calçada. Muito religioso, é bem capaz de ele ter dito que foi deus quem fez isso, para eu aprender, mas isso é suposição de agora, a partir de outras lembranças. Nessa ocasião específica, lembro de abrir um berredo e ser socorrido pela mãe dele, que ligou para a minha (ela estava no trabalho), e vir, então, a fatídica aplicação daquele desgraçado anti-séptico. (Antes de começar a escrever esta crônica, analisei meus joelhos, tentando adivinhar qual das cicatrizes seria desse tombo. Não sei). Lembro de ter tentado fugir, em vão. E se eu já chorava, com certeza depois dessa aplicação o negócio potencializou trocentas vezes: aquele remédio fazia a ferida latejar de ardência, ardia até a alma, arde até hoje! Parecia um castigo: brincou, caiu, machucou, chorou? Hora de passar o anti-séptico pra ver o que é dor de verdade. 
A propaganda no metrô avisa: não arde. Tenho a impressão de já ter ouvido isso antes.

São Paulo, 06 de outubro de 2014.

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