segunda-feira, 12 de março de 2018

Boulos, o próximo impedido?

O PT tem reiteradamente falado que não possui plano B para caso Lula não possa disputar as (previstas) eleições - o que deve deveras ocorrer (ele não disputar; as eleições, isso ainda há sérias dúvidas). Certamente o partido faz seus cálculos. Contudo, há indícios, pela movimentação observável (não tenho contatos para saber o que se passa nos bastidores), da possibilidade do PT não disputar a presidência da república nas (eventuais) eleições de outubro. Fosse dois anos atrás, qualquer análise que falasse em PT não encabeçar uma chapa poderia ser descartada como estapafúrdia; os tempos sinistros em que vivemos, entretanto, tornam não somente factível não ser cabeça de chapa como sequer ficar com a vaga de vice.
Seria um ato simbólico importante para evidenciar o estado em que se encontra o Brasil: o maior partido do país, aquele que ainda é o partido mais forte do país, um dos maiores partidos de esquerda do mundo, não disputará a eleição presidencial, não por não ter um nome viável, e sim por não confiar no processo judiciário-eleitoral.
Além de não se estar ventilando nenhum nome do partido, o vídeo de apoio de Lula à candidatura Boulos, pelo PSOL, é uma sinalização nesse sentido. O líder do MTST, além de formação nas lutas sociais, tem também formação acadêmica - acusação feita contra Lula por dez entre dez ignorantes com diploma na parede -, e se é atingido pela rebarba da criminalização da esquerda, foge do foco principal da mídia, que é o PT - pode, inclusive, se utilizar desse discurso, caso posto contra a parede, de que o partido surgiu em resposta às falhas petistas. Pode ser o nome ultrapolítico contra o candidato antipolítico que deve correr pela direita - Bolsonaro, Huck ou algum outro -, e se conseguir decolar nas pesquisas, pode até mesmo trazer o debate um pouco mais para a esquerda (que ficaria pelo centro, dado a direitização atual), com boa distância das armadilhas moralistas - o que seria um avanço civilizatório.
Antes dos ataques da direita, a primeira tarefa será com os do próprio PSOL. Desde sua fundação tenho dito que o PSOL é um partido sem base social (além de responsável pelo retorno de Collor ao senado, em 2006), o que é um equívoco: sua base social é uma de meia dúzia de acadêmicos, que figuram entre os 3% mais rico da população. Ainda que parte da crítica do outro pré-candidato do partido, Plínio de Arruda Sampaio Jr, seja pertinente, seu esperneio me faz lembrar dos meus tempos de editor do Trezenhum. Humor sem graça., em que havia o "Prêmio Peter Pan de Resistência", dado o alienação social que a esquerda da Unicamp vive e a briga para recusar toda realidade em favor dos seus ideais. Plínio é professor da Unicamp, e à sua visão do Brasil como Terra do Nunca, soma-se um ego de enorme tamanho, bem ao gosto dos acadêmicos brasileiros. Longe de pensar no partido ou no país, pensa em seu desejo de ser candidato a presidência da república, como fora seu pai - ainda que renovar os nomes e manter os sobrenomes seja prática consagrada da direita brasileira. Resta saber o quanto vai aceitar ser instrumentalizado pela direita para prejudicar Boulos. 
Pela direita, o jogo promete ser duro, caso Boulos cresça nas pesquisas - por ser tomado como candidato do Lula, por exemplo. As acusações de incentivar a desordem e o crime serão de hora em hora. Reportagens e mais reportagens mostrarão exemplos isolados de contraventores penais ("bandidos") que compõem o MTST; ou boatos (hoje chamados de fake news, prática consagrada pela Globo e afins) de que, assim como ocupam prédios abandonados, com a vitória, Boulos obrigará as pessoas a dividirem suas casas com sem-tetos, ou outras pataquadas requentadas de 1989. Contudo, os tempos são outros, e se não bastar um calmante na água do debate e uma edição tendenciosa, Boulos tem tudo para ser preso, sob acusação qualquer - provavelmente terrorismo. Já falei em outra análise que Bolsonaro é boi de piranha das elites para a eleição prevista para outubro. Seu impedimento - possibilidade que ainda paira - seria uma tentativa de dar lustro de imparcialidade à justiça e permitir que ela cace todo candidato de esquerda ou progressista, cuja plataforma seja estancar e reverter o golpe. Sem Lula, talvez sem PT na disputa, Boulos é forte candidato não apenas ao segundo turno, como a uma nova arbitrariedade dos golpistas vestidos de toga e armados de concessões de tevê.

12 de março de 2018.

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