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domingo, 9 de outubro de 2016

Eleições municipais: uma visão menos catastrófica ao PT e às esquerdas.

Apesar de ainda estar em disputa a prefeitura de 55 cidades, é possível já fazer um esboço do que foram as eleições municipais de 2016.
Ao menos desde a ascensão do PT ao poder federal, analistas (sic) políticos da Grande Imprensa tentam dar às eleições municipais o caráter de prévia da presidencial dali dois anos - como se fossem a equivalente tupiniquim das eleições legislativas de meio de mandato nos EUA. Pela primeira vez acertaram: impossível não analisar os números destas eleições sem vincular ao que se passa na política nacional, por mais que fatores municipais não sejam irrelevantes.
A principal dificuldade para analisar os resultados de 2016 e o que eles significam para o futuro está em Brasília: vivemos sob um regime democrático ou não (por mais capenga que seja nossa democracia institucional)? Que não estamos mais sob um Estado de direito, isso nosso judiciário tem reiterado diariamente. Já sobre a democracia e eleições, há quem acredite que o "tropeço democrático" do impeachment da presidenta Dilma será restabelecido em 2018. Gostaria que assim fosse, mas não vejo motivos pra acreditar. Saber o que será é importante pra poder entender se vemos os números que temos até agora como radiografia de momento, vulneráveis aos ventos das ruas (por mais que sejam brisas), ou se se trata de uma tendência quase que imposta de cima para baixo, em que a população tem o dever de legitimar escolhas feitas pelos donos do poder - banca, judiciário, mídia, oligarcas.
Para a análise a seguir, dividido os partidos em três grupos: 1) esquerda/centro-esquerda (PT, PDT, Psol, PCdoB), 2) direita/extrema-direita (PSDB, DEM, PPS, PSC, SD), 3) fisiológicos-centro-direita (a grande geleca conservadora, mas que está com o governante do turno). Por precariedade das estatísticas fornecidas pelo TSE, centro no número de prefeituras ganhas.
A esquerda foi a grande perdedora em 2016, puxada pela queda do PT. Se alguém se surpreendeu com esse fato, precisa urgentemente ativar sua capacidade crítica, pois não dava para esperar nada que não isso. A questão que se põe: perdeu tudo aquilo que é alardeado na Grande Imprensa? Admito que eu imaginava uma queda maior, diante de todo o ataque que PT tem sofrido há anos - com respingos para o resto da esquerda -, em especial no período anterior ao pleito, com direito a Moro fazer o papel de diretor de figurino, cargo ocupado em 1989 pelo xerife Tuma, no seqüestro de Abílio Diniz e o espetáculo anti-PT feito em cima.
Se o PT e a esquerda caem, não é a direita e a extrema-direita quem mais ganham: ainda que tenham ganhado praticamente o dobro de prefeituras das esquerdas, esse grupo não conseguiu recuperar o número de prefeituras que obteve em 2008. Percentualmente, seus 24% estão longe dos 40% de executivos municipais conquistados em 2000, com a máquina federal tucana a todo o vapor - a esquerda ainda teve um aumento de 50% em relação a 2000, e mesmo o PT tem 27% a mais de prefeitos eleitos que então.
Quem mais cresceu em 2016 foram os partidos fisiológicos de centro-direita, que preferem sempre ceder anéis a ter que arriscar os dedos. E ainda que por si só esse fato não seja positivo, ele aponta perspectivas a serem exploradas pelas forças progressistas: o fato de desiludidos com o PT não aderirem à direita pura e raivosa - que cada vez mais embasa seu discurso no anti-petismo e na destruição do inimigo vermelho - pode significar que há uma grande faixa do eleitorado capaz de reconhecer - assim que baixe a poeira goebbelsiana da Grande Imprensa - os ganhos dos governos de esquerda. Se estivermos sob um regime democrático minimamente sério, o que se viu em 2016 pode ser revertido num curto espaço de tempo. Claro, para que isso ocorra realmente não convém esperar tomada de consciência espontânea de pessoas que nunca foram educadas politicamente: é preciso que as esquerdas (forças progressistas em geral) passem a fazer aquilo que abandonaram desde que o PT assumiu o poder federal: política, política quotidiana, micro-política. E um dos focos da conscientização política precisa estar em suprir falhas de nossa educação, que faz com que a maioria da população seja incapaz de interpretação de texto e de refletir criticamente sobre aquilo a que assiste, sendo ludibriada com uma facilidade espantosa por construções publicitárias pueris - como Doria Jr - ou manipulações grosseiras - como a criminalização do PT. Penso que é nessa política de conscientização para a política - muito mais que para a esquerda ou para certas bandeiras - que podemos reverter a ditadura em curso, e, quem sabe, remediar esse golpe sofrido em 2016. As eleições de 2016 mostraram que o discurso fascista ganha adeptos, sem conquistar (ainda) a maioria - Doria Jr, com descarado discurso de extrema-direita, só ganhou em São Paulo graças à construção do personagem populista a la Janio Quadros, e por ter conseguido fechar a disputa no primeiro turno.
Outra análise que tem sido comum: que o PT se tornou um partido decadente nas cidades e regiões ilustradas, que sobrevive nos grotões do país - teria se tornado algo como o novo PFL/DEM e PMDB. Há uma diferença substantiva entre vencer sendo o partido de coronéis e vencer sendo um partido de massa. O voto no PT em regiões pobres tende a ser um voto consciente, de quem sentiu na pele as melhorias nas condições de vida - 100 anos em 10 -, diferentemente do apadrinhamento político e troca de favores que costumam nortear oligarcas políticos em terras de ninguém. Achar que população carente e de cidade pequena é ignorante e mais facilmente manipulável é uma mentira repetida diariamente pela rede Globo e afins, engolida como se fosse caviar pela classe média, média-alta ignara-mas-diplomada, e comprada por muitas pessoas de esquerda. 
Pontuando sobre os partidos, rapidamente. PT caiu vertiginosamente: das 648 prefeituras em 2012 já possuía pouco mais de 500 este ano, e vai para 254 em 2016 - 50% de queda. Perderam também prefeituras, mas em número bem mais modestos (5 a 12%), o PSB em ressaca pós-Campos, e os definhantes de longa data PTB, PPS e DEM. PMDB ficou estacionado. O PSDB, com 793 prefeituras, volta ao padrão de 2008, porém está ainda muito longe das 991 prefeituras conquistadas em 2000. Os dois partidos que mais cresceram foram o PCdoB, com quase 50% (de 54 para 80 prefeituras), e o PRB, ligado à Igreja Universal, com 30% (79 para 103) - por essa faixa do eleitorado, o outro partido evangélico, mas com discurso de extrema-direita, o PSC, cresceu 4%, com 86 prefeituras. Cresceram também os partidos nanicos: 33%, com 265 prefeituras.
Depois de mais de dez anos tendo como norte políticas públicas progressistas, ainda que limitadas, que favoreceram a maioria da população, se não se consumar a ditadura judiciária-midiática no país, é de se esperar que os prefeitos eleitos não acompanhem as diretrizes de Brasília, e façam governos moderados, sem atacar diretamente boa parte das políticas tidas como "de esquerda" de seus antecessores. Por outro lado, se os políticos não tiverem mais como preocupação as próximas eleições (suas ou de seus padrinhos políticos), e sim em agradar os dono do poder - por ora simbolizado no espantalho-útil do golpista Michel Temer -, tempos temerários virão. É o fim de um ciclo, sem dúvida, porém em que magnitude se dará tal fechamento, depende tanto das mobilizações das ruas, da política cara-a-cara por tanto tempo esquecida, e da consumação ou não da ditadura. De qualquer modo: lutar politicamente é preciso.

09 de outubro de 2016.


2000 2004 2008 2012 2016*
PT 200 411 557 638 254
PDT 289 307 352 307 332
PcdoB 2 10 41 54 80
PSOL X X 0 2 2
Total esquerdas 491 728 950 1001 668
PMDB 1260 1059 1202 1021 1028
PSD X X X 498 539
PP 619 551 551 476 493
PSB 135 175 310 440 413
PR X X 385 275 295
PTB 399 421 413 298 260
PRB X X 54 79 103
PV 13 57 75 100 101
REDE X X X X 5
PL 235 382 X X X
Outros 213 189 143 199 265
Total fisiológicos 2874 2834 3133 3386 3502
PSDB 991 870 791 695 793
DEM/PFL 1027 789 496 278 265
PPS 168 308 129 125 118
PSC 34 26 57 82 86
SD X X X X 62
PRONA 0 7 X X X
Total direitas 2220 1993 1473 1180 1324
*1o turno




segunda-feira, 3 de outubro de 2016

Meio fascismo, meio populismo: a vitória de Doria Jr em São Paulo

Ao ver o resultado das eleições em São Paulo, com vitória de Doria Jr. no primeiro turno, a sensação que se tem é de terra arrasada e triunfo do fascismo - campos de concentração bandeirantes, aqui vamos nós! Respiro e tento analisar a situação um pouco mais objetivamente: chego à conclusão de que vivemos tempos realmente preocupantes, mas não se pode vaticinar nada para um futuro breve - é possível reverter o quadro, ainda que o mais provável seja o aprofundamento de um Estado de Exceção aos moldes nazi-fascista, tal qual já acontece. A vontade é achar culpados por termos chegado aonde chegamos, porém penso que vale uma análise mais pontual, visando um próximo passo - a tal auto-reflexão que muitos da esquerda cobram de seus representantes é necessária e urgente, mas precisa ser feita junto com o embate político: não há possibilidade de fazer uma pausa para discutir e depois voltar a agir.
Sem mais delongas, à eleição paulistana.
As regras do jogo
Primeiro, é importante salientar que as regras do jogo têm influência direta no seu resultado. Um amigo tratou de levantar logo: "Gilmar Mendes é o presidente do TSE". Prefiro não acreditar em manipulação nesse nível no resultado das urnas, entretanto Coronel Mendes é o Coronel Mendes, tudo dele pode se esperar. Deixo de lado essa hipótese. Ao meu ver, o principal fator destas eleições foi a diminuição do tempo de campanha: a exemplo de Russomano, Doria Jr. também era um candidato-sabonete, e não suportaria nenhum embate direto: assim que fosse instigado a fazer propostas um pouco mais palpáveis, desidrataria. Entretanto, para achar esse flanco e explorá-lo, faz muita diferença se se tem 90 ou 45 dias de campanha - a regra favoreceu, portanto, candidatos oportunistas e antipolíticos, a exemplo do futuro prefeito paulistano.
Segundo ponto: o poder da mídia, cujo monopólio não foi atacado diretamente pelos governos petistas. Desde 1982 a Globo tenta diuturnamente, e em todas as eleições, dar golpes brancos. Conseguiu de 1989 a 1998, e vinha falhando fragorosamente desde 2002, a ponto de apelar para o golpe direto em 2016. Voltou ao modus operandi nestas eleições: eu estava numa cantina no sábado, o televisor ligado sem som, e pude ver no Jornal Nacional uma notícia em que se vinculava PT e algum crime eleitoral - só o PT. Entretanto seu maior triunfo, assim como dos golpistas, não foi a derrota do PT, foi a desmobilização da população: o desalento representado em votos brancos, nulos e nos que se abstiveram de votar - retorno a este ponto mais adiante, é aqui que vejo a possibilidade de reverter o ritmo acelerado para o fascismo.
Sobre os candidatos, em agosto eu comentava que a eleição seria uma verdadeira disputa pela sobrevivência política [http://bit.ly/cG160822], com Doria Jr. como o único apto a perder sem sofrer maiores danos com isso - no fim, o azarão venceu.
Luíza Erundida e o Psol-Raiz
O Psol, com Erundina, cresceu em relação a 2012. Ainda assim, esteve aquém do que se imaginava no início da campanha. Parte dessa queda se deve ao pouco tempo de exposição na mídia - ou seja às regras do jogo. É provável que outra parte seja por conta de voto útil no Haddad. Uma das falhas de sua campanha que me chamou a atenção foi seu colega de chapa: num momento em que se pede algo "novo" em política, uma chapa formada por um casal de velhinhos passa a imagem de antigo (estou aqui analisando em termos de marketing e imagem, independente de propostas e trajetórias políticas), um vice jovem passaria essa idéia - Erundina poderia mesmo inovar, tendo como vice uma mulher. Pessoalmente, não demonstrou querer usar esta eleição para outros vôos políticos - era mesmo uma questão do partido. Se no Rio Freixo dá novo alento à esquerda e ao Psol, em São Paulo, a esquerda ainda tem o PT como seu principal representante. Sem dúvida a participação de Erundina no pleito foi extremamente importante - união de esquerda não deve significar candidatura única (como eu disse alhures: é necessária a desunião sincrônica das esquerdas).
Celso Russomano
Russomano deve dar adeus a pleitos majoritários - talvez ainda tente senado em 2018 (caso haja eleições em 2018). Sem qualquer estofo político, e sem a mesma equipe de marketing e complacência da mídia que tem Doria Jr., não deu conta de manter sua vantagem. De positivo, sua campanha não se baseou em discurso de ódio ao PT e à esquerda, ficou ainda no esquema "catch-all party" - o discurso cata-tudo -, com tendência à direita. Propostas fracas, postura tímida e uma enxurrada de podres da sua vida pregressa minaram seu sonho de ser um novo Jânio Quadros.
Marta Suplicy
Como eu havia anunciado em agosto, Marta Suplicy era quem mais arriscava. Ao fim da eleição, definitivamente é quem mais perdeu: favorita se fosse ao segundo turno (onde ganharia os votos dos anti-petistas caso disputasse com Haddad ou da esquerda, caso enfrentasse a direita puro-sangue), esqueceu de combinar com os russos. Terminar em quarto lugar é um tremendo golpe em sua carreira política - e em seu enorme ego. Seus 10% mostram qual seu capital político real, provavelmente fruto da sua gestão à frente da prefeitura: sua adesão ao golpismo não deve ter lhe rendido um voto sequer. Mediu errado seu passo político e ao tentar se desvencilhar do PT indo para a direita, perdeu o discurso sem perder a pecha de petista - tentar voltar à esquerda me soa impossível, depois de ter votado pelo impeachment-golpe. É possível que perca ainda mais esse resto de simpatizantes daqui para a frente, e sobraria tentar se manter na política com base no fisiologismo de cúpula e currais eleitorais. Se tentar o senado em 2018 (caso haja eleições em 2018), pode perder novamente; suas chances maiores parecem ser na disputa do governo do Estado, ou costurando um amplo apoio dos partidos fisiológicos e de direita (aí precisa conversar com o Doria Jr), ou na expectativa de ir para o segundo turno e vencer com o voto "anti".
Eduardo Suplicy
Eduardo Suplicy não disputou a prefeitura, contudo, na disputa pela vereança, seus quase 6% dos votos mostram sua força. É nome forte para voltar ao senado em 2018 (caso haja eleições em 2018), se assim desejar, ou à Câmara dos Deputados, caso seja mais interessante ao partido garantir a maior bancada possível, para ter maior tempo de tevê e quetais.
Fernando Haddad e o PT
Ainda que tenha perdido a prefeitura, o segundo lugar do atual prefeito mostra uma força de resistência sua e do PT que não pode ser desprezada. Anunciado desde o início da campanha pelas pesquisas eleitorais como candidato sem quaisquer chances, com seu partido sofrendo feroz perseguição política da justiça, da polícia, e da imprensa nas datas próximas ao pleito, seus 16% são significativos - o PT não acabou, como alguns arautos da direita (e da extrema-esquerda) anunciavam em agosto. Se somarmos aos votos de Erundina e Marta, a esquerda (acredito que Marta teve seus votos ainda pela sua trajetória no PT) teve 31%, ou seja, mantém sua base de 1/3 do eleitorado - era o piso antigamente, hoje é o teto. Sem negar o quanto a esquerda foi golpeada, ainda mais o PT - que em 2012 se tornara a segunda força municipal e ganhara a principal cidade do país -, um terço do eleitorado da principal cidade do Brasil é um índice alto para um país cujo lema do governo central é "tirar o país do vermelho" (em outra demonstração nazi-fascista do presidente-golpista Michel Temer). No plano nacional, a queda do PT foi grande, mas chama a atenção não ter sido acompanhada do crescimento dos seus antípodas, da "direita-cheirosa" (PSDB+DEM+PPS), que cresceu menos de 10%, sem sequer recuperar o que perdera de 2008 para 2012 (1416, 1084, 1174 prefeituras, respectivamente). A grande tarefa das esquerdas é conseguir, a partir de agora e o quanto antes, formar a frente ampla, sem ir a reboque de um partido.
De volta a Haddad. Seu grande erro não é só de campanha, é de governo: não ter investido o suficiente em publicidade oficial. Infelizmente, é da regra do jogo: aparecer para ganhar: à mulher de César não basta ser honesta... A gestão Haddad priorizou o marketing de internet, mais barato, e deixou de lado grandes campanhas de publicidade. Começou a campanha com a fama de prefeito que não fez nada, e passou o período eleitoral enunciando tudo o que fizera - do bilhete único temporal a hospitais e creches nas periferias. Os 45 dias de campanha foram determinantes para que não conseguisse divulgar o suficiente sua gestão. Se por problema de comunicação ou realmente por ter não dado a devida prioridade, o mapa da eleição mostra que Haddad foi muito mal nos extremos da cidade, reduto habitual do PT - tendo melhor desempenho nas regiões central, oeste e sul-1.
Talvez o que tenha sido determinante para a derrota de Haddad foi o elevado índice de abstenções, brancos e nulos. Costuma-se dizer que cada um colhe o que planta. A Grande Mídia tem plantado intensivamente o desalento com a política, encontrando solo fértil naqueles que viam na política ideais mais nobres - como combate à pobreza e melhoria das condições de vida de todos -, e conseguiram desmobilizá-los o suficiente para garantir a vitória ao seu candidato, ao que tudo indica. A lógica é fácil de ser compreendida: por mais que ache Haddad melhor que os outros, ou que tenha feito um governo razoável, de que adiantaria votar nele se são todos "políticos", ou seja, são todos corruptos, são todos "bandidos"? Quase 40% dos paulistanos se absteve de votar ou não se sentiu representado por nenhum dos onze candidatos - isso num país cujo voto é obrigatório! Dos que foram às urnas, os votos válidos na capital caíram de 87% para 83% do eleitorado. Se esses 4% a mais que se abstiveram tivessem votado em algum dos candidatos derrotados, seria o suficiente para forçar o segundo turno. Eis nesse ponto onde ainda vejo esperança: construir uma contra-narrativa que dê conta de reabilitar a política e as esquerdas (poderia ser também a direita, mas uma direita de verdade, não esse atraso político que no Brasil assume a bandeira), de modo a trazer para política parte da população que sucumbiu ao canto da desolação. Isso, claro, implica em trabalho de base e diário, e não apenas em época eleitoral.
João Doria Jr.
Há diversos fatores a se levar em conta na vitória de Doria Jr. Um deles, que levantei acima, a desilusão com a política, que repercutiu no aumento no número de eleitores que não participaram do pleito ou não fizeram voto útil em algum candidato. Outro é que Doria Jr soube explorar quatro discursos diferentes: um discurso de direita, dois de extrema-direita e um populista de direita. Em tese, portanto, Doria Jr teve quatro tipos de eleitores: 1) os de direita, que votaram nele por acharem que um estado mais enxuto e concentrado em áreas prioritárias da administração é a melhor forma de se alcançar o bem-estar comum (proposta política apresentada de maneira muito tosca, mas ainda assim uma proposta política); 2) os anti-petistas radicais, que embarcaram no seu discurso de ódio de clara inspiração nazi-fascista: o candidato não se punha como crítico da administração Haddad, ele propunha a eliminação do PT e do prefeito - suas políticas seriam somente a conseqüência do PT ser a encarnação do Mal -; 3) os desiludidos com a política, que votaram no seu discurso de anti-político, também de inspiração nazi-fascista; e 4) os que compraram o sabonete Doria Jr-trabalhador.
Acreditar nesses quatro perfis de eleitores do Doria Jr que me dá alento de que não necessariamente começaremos o ano letivo de 2017 queimando em praça pública livros de autores degenerados.
Os eleitores de direita dificilmente formaram sua base: pelo racha dentro do próprio PSDB, pela ausência de uma opção razoável de direita e pela gestão econômica de Haddad, é de se acreditar que quem está nesse espectro político e é razoável (racional, diriam os economistas) votou no atual prefeito. A base cativa de Doria Jr - e do PSDB todo, cada vez mais - são os eleitores de extrema-direita, ou em um termo um pouco mais cru: o PSDB caminha a passos largos para se tornar um partido neofascista, se é que já não se tornou (uma das particularidades da extrema-direita século XXI tupiniquim, é que o "movimento" não funda um partido, conforme a análise do fascismo feita por Robert Paxton, e ainda hoje observável na França e na Alemanha, por exemplo, e sim é adotado por um partido já consolidado, como forma de sobreviver à sua iminente derrocada política e eleitoral). O discurso de extrema-direita do tucano teve duas frentes: de um lado, o discurso de ódio e contra o inimigo portador de todo o Mal; do outro, a exploração da desilusão com a política, causada pelos escândalos ocorridos também nos governos petistas - que antes de assumirem o governo federal eram os arautos da moralidade política no país -, mas principalmente pela forma como tais escândalos são explorados pelo "quarto poder" (que parou de se referir a si próprio assim desde que começou a ficar evidente que era de fato um poder para-estatal e que não estava sob qualquer controle legal). Mario Vargas Llosa (saliento: um autor descaradamente conservador, porém liberal), em La civilización del espectáculo, livro de 2011, comenta sobre a desvalorização da política: "Em muitos países e em muitas épocas, a atividade cívica alcançou um prestígio merecido porque atraía gente valiosa e porque seus aspectos negativos não pareciam prevalecer sobre o idealismo, a honradez e a responsabilidade da maioria da classe política. Em nossa época, aqueles aspectos negativos da vida política têm sido magnificados freqüentemente de uma maneira exageradamente irresponsável por um jornalismo amarelo com o resultado de que a opinião pública chegou ao convencimento de que a política é um fazer de pessoas amorais, ineficientes e propensas à corrupção" (p. 133-134). Berlusconi, na Itália, ascendeu pela porteira aberta por esse jornalismo nefasto; Doria Jr também - muito antes deles, em processo muito similar, na Alemanha dos anos 1930, Adolf Hitler. Ainda que muitas pessoas se sintam intimidadas e acabem emulando o comportamento raivoso dos neofascistas tupiniquins, não penso que só o discurso explícito de ódio dê voto suficiente - pode fazer muito barulho, é sua função fazer muito barulho, para parecer maior. Aí entra o discurso velado de ódio, contra a classe política e o fazer político; Doria Jr explorou isso não apenas se apresentando como o "novo", como reafirmando sempre e uma vez mais que não era político - deixando subentendido, até pelo seu "tenho todo respeito aos políticos, mas...", seu desprezo pelos seus colegas de profissão. Se apresentou, portanto como anti-candidato, apesar de fazer parte de um partido tradicional.
Só o discurso de extrema-direita talvez o pusesse na disputa pelo segundo turno (quero acreditar que não), certamente não foi o que o elegeu. Entretanto, será utilizado ao extremo pelos golpistas (Temer, PSDB, judiciário, Grande Mídia): as urnas da maior cidade do país legitimaram que a política seja substituída por gestores e tecnocratas totalitários - ordem e progresso.
Contudo, o grande lance da equipe publicitária do publicitário-patrão foi o produto "Doria Jr-trabalhador", construção populista digna de Jânio Quadros, apesar da incompetência de Doria Jr para aparentar popular - que o diga suas fotos provando pastel e café, que logo sumiram, visto que a Grande Imprensa acatou as regras dos publicitários do candidato. Eu realmente não acreditava que um populismo tão tacanho ainda tivesse vez na política - pelo visto, nem seus adversários. Prova do quanto nossa educação é falha e sofrível - e olha que ainda nem implementaram o "escola sem partido" ou a MP do governo golpista - e o quanto a esquerda e os movimentos de massa descuidaram da formação política: milhões de pessoas caíram no conto do vigário em pleno século XXI! Quando falo da responsabilidade da esquerda em permitir que esse tipo de candidatura encontre eco na população, claro que não tem como não atribuir a maior responsabilidade ao PT, por ter sido pólo das esquerdas até aqui e por ter ocupado o governo federal por 14 anos: a inclusão social via consumo e não via cidadania política foi o tapete vermelho para que o discurso do self-made man cativasse o recém-formado pelo Prouni, o tercerizado que conseguiu comprar seu carro em 60 prestações (e agora nem pode andar como se fosse o dono da rua, porque o limite de velocidade é 50 Km/h), a dona-de-casa aflita com o desemprego do filho. À diferença de Russomano, que no início se pôs como uma pessoa do povo, como qualquer eleitor; Doria Jr afirmava que já fora do povo, mas que agora era um vencedor - tudo conseguido com o suor de seu rosto, trabalhador que começou do nada e venceu por mérito próprio -, e que faria de todo paulistano disposto a trabalhar um clone do líder. Ainda que esse engodo publicitário que bebe no populismo aparente maior dificuldade em ser rebatido - num estado que já elegeu Janio Quadros, Adhemar de Barros e Paulo Maluf -, não penso que seja tarefa árdua em ser desmontado, pelo mesmo motivo que Russomano caiu: por mais que se diga anti-político e abuse do discurso de ódio, estamos numa situação política em que ainda, para a maior parte da população, o candidato precisa apresentar propostas para a cidade - propostas políticas, portanto -, as quais necessariamente surgem (ou mostram que não existem) quando o candidato é confrontado (Doria Jr precisa agradecer Marta pelo último debate). Em um eventual eventual segundo turno Doria Jr precisaria inventar um quinto discurso para não perder para Haddad. Levantar esse "se houvesse" é importante para sublinhar que a "vitória acachapante" de Doria Jr foi acima de tudo fruto de saber usar as regras do jogo, e não de necessariamente da adesão ao neofascismo por 3 milhões de paulistanos. Outra coisa: Doria Jr tem respaldo popular menor que teve Haddad. Deixemos de lado votos úteis e pensemos no total de eleitores: os 53% de votos úteis de Doria Jr, pouco mais de 3 milhões de votos, significam pouco mais de um terço do total de eleitores; ao ser eleito, em 2012, Haddad teve o voto de quase 40% dos eleitores (300 mil votos a mais que o tucano, em um universo de 250 mil eleitores a menos).
Administração Doria Jr e as esquerdas e forças progressistas
No atual quadro de crise político-institucional, qualquer tentativa de palpite para os próximos quatro anos é muito arriscada: nem se sabe se teremos eleições em 2018. De qualquer modo, se Doria Jr puser em prática sua retórica anti-PT radical, de acabar com tudo o que cheire a esquerda, é capaz de voltar até com os Palacetes Prates. Não acredito em ataque tão radical, por uma questão de, caso haja eleições, é bom não se queimar totalmente com os eleitores - Doria Jr é acima de tudo político, sua atividade empresarial é fachada para contratos com o Estado. A escolha das ciclovias e da velocidade das marginais mostra que o tucano vai marcar seu anti-petismo em questões menores, no sentido de que envolvem menor conflito com interesses poderosos - ao menos assim aparentam. Não é por não ser radical que não deverá ser temerária sua gestão: a depender da proposta que o PSDB tem há tempos apresentado à nação, privatização dos espaços públicos, sucateamento dos serviços públicos, repressão aos opositores por parte da PM transformada em política política estadual, nortearão a administração pública, e só não avançaram a trote rápido se houver oposição na câmara e nas ruas.
Às forças progressistas e democráticas, não apenas de esquerda, urge se unirem, não apenas politicamente, mas em ações coordenadas para recuperar o terreno perdido pela Blietzkrieg midiática e golpista. Lideranças políticas, intelectuais comprometidos com valores como direitos humanos e democracia, movimentos sociais e pessoas avulsas, precisam criar uma contra-narrativa que dê conta de não haver mais golpes (de Estado ou eleitorais) comprados com tanta facilidade - a exemplo do pós-impeachment-golpe, o pós-eleição foi impressionante morno no centro de São Paulo, muitos poucos comentários -, e que torne a política novamente um valor positivo. Importante nessa tarefa: ativismo de internet serve para sabermos que não estamos sozinhos, mas tem pouco influência fora do círculo dos convertidos: é preciso, sim sair da zona de conforto do Fakebook e ir para o embate, para o diálogo, para o desgaste do cara-a-cara com pessoas que não pensam como nós (mas que pensam).
Uma faixa da população, os 2% de Major Olímpio, da SS, digo SD, e parte do eleitorado de João Doria Jr, parece estar condenada à vidiotia pelos próximos anos, completamente zumbizados pela narrativa de Globo, Veja, Folha e congêneres, e sobre ela, pouco há o que fazer, que não impedir seu crescimento; outra parcela, os que não votaram ou anularam, e muitos dos que votaram em Doria Jr, mostra que gostaria de acreditar na política como transformadora (para melhor) da sociedade, mas sucumbiu ao bombardeio midiático: trazer essas para a política, não apenas a eleitoral, mas a quotidiana: que a cidade (e o país) se faz no dia-a-dia por todos e não a cada quatro anos, ao delegar poderes a representantes que não as representam. Vale lembrar que a esquerda - no Brasil e alhures - se forja na resistência, nas disputas nas ruas pela inclusão dos excluídos. É preciso despertar o fazer político que a década de sonolência petista nos desacostumou - reabilitar o "nós" coletivo que Haddad e Erundina puseram na campanha.

03 de outubro de 2016.

Ainda não acredito que esse cara conseguiu se vender como trabalhador, que já foi do povo.

terça-feira, 23 de agosto de 2016

Debate em SP: os presentes ganharam, a democracia perdeu

O primeiro debate entre os candidatos à prefeitura de São Paulo, realizado pelo grupo Bandeirantes (um dos cinco Berlusconis do Brasil, não esqueçamos) na segunda, dia 22, não trouxe grandes surpresas nem grandes embates: os cinco presentes estavam ali para marcar posição, tentar garantir os eleitores que já tendem a neles votar. Analiso o desempenho de cada um a seguir.

Erundina, PSOL
Não esteve presente no debate, por conta da cláusula de partido (no mínimo 9 deputados federais ou então aprovação de 2/3 dos demais debatedores) que, se excluiu Erundina, também não deu voz a Ley Fidelix (aquele que em 2014 nos ensinou que sistema excretor produz partidos e candidatos). Não há como negar que perderam todos, eleitores, candidatos e nossa democracia-na-UTI. Curiosamente, quem parece ter se dado melhor com sua ausência foi justo Haddad, que defendeu sua participação.

Major Olimpio, SD
Tanto quanto a ausência de Erundina, deve ser sentida a presença de Major Olimpio, do SD (seria SD ou SS?), partido do notório Paulinho da Farsa Sindical. A presença dele não somente no debate, mas no pleito, é uma grave sinal da qualidade da nossa democracia e da nossa sociedade: Major Olimpio tem um discurso de ódio de clara inspiração nazi-fascista, apenas atualiza os termos: de "ratos" para "câncer" e "metástase"; sua proposta é militarizar e hierarquizar a sociedade, enquanto extingue qualquer contestação - fez questão de associar movimentos sociais ao tráfico de drogas e a população carente e da periferia ao PCC (mas ignora que o ministro da justiça (sic) do governo golpista foi advogado do "partido"). Termina sua fala falando em "força e honra", dois termos bastante afins aos regimes totalitários do século XX, além de várias vezes dizer que a cidade é terra sem lei e que vai "impôr" a lei - "tolerância zero". Tem como propostas repressão ampla e extinção do PT (provavelmente porque falar em extinguir a democracia não cairia bem). 

Doria Junior, PSDB
Em fevereiro, quando PSDB hesitava entre Doria e Matarazzo, eu dizia que "João Doria Junior seria a assunção do papel de legenda proto-fascista" e que o PSDB deixaria, definitivamente, de ser uma opção democrática. Faço uma correção: substituto o "proto" por "neo". O PSDB de São Paulo é um partido neofascista. Doria Junior claramente desdenha da política, dando novo alento à tarefa que o PSDB se põe há tempos, de esvaziar a esfera pública de toda e qualquer política. Doria Junior chegou a soltar o velho conhecido "nada contra, mas...": "não desrespeito os políticos, mas...", mas é isso que fica claro na posição atual do PSDB: sai o gerente, entra o patrão, e a política é varrida para longe de qualquer horizonte - temerosos tempos nos aguardam. Um partido que nega a política é um partido que bebe do fascismo - ainda que o PSDB tenha suas idiossincrasias, como ser anti-nacionalista. Doria Junior, a exemplo do candidato do SD (SS?), buscou marcar presença como candidato de extrema-direita e anti-PT: em todos os blocos o candidato tucano atacou o PT, no primeiro bloco os dois chegaram a rivalizar no discurso de ódio, a seguir Doria Junior diminuiu um pouco o tom, deixando ao PT a responsabilidade por ter "destruído o Brasil"; encerrou suas considerações finais não com uma mensagem positiva, como publicitários geralmente defendem, mas com mais ataques e ódio ao PT - outra figura lastimável que São Paulo apresenta ao Brasil.

Russomano, PRB
Russomano era quem mais tinha a perder com o debate, por ser líder e por ser fraco - já provou em 2012 e já deu mostras em 2016. Faltar, como havia ameaçado, o tornaria alvo fácil dos adversários - fez bem em comparecer. Apagado, falou pouco, e conseguiu, ao que tudo indica, se safar. Por ser o adversário ideal no segundo turno, foi também poupado por todos. Com entonação muito próxima a dos pastores televisivos, evitou se apresentar como candidato anti-PT, ao mesmo tempo que assumiu discurso de direita, falando em gestão, redução de impostos, liberdade de mercado (para a construção civil). Em suas considerações finais, fez um discurso de candidato próximo do povo e dos seus problemas, por ser apresentador de tevê e brigar pelos seus direitos de cidadão (sic), foi o único a marcar tal proximidade (ao menos a conseguir, Doria Junior foi risível ao dizer que vai fazer uma gestão na rua). Por fim, se apresentou como "zelador de São Paulo": um papel condizente com sua presença apagada, o que pode ser bastante perigoso (para o candidato): um homem como eu e você tem condições de ser prefeito? Lula tem má-recordação de discurso desse tipo. Além do mais, zelador é uma figura um tanto subalterna, que cumpre ordens e faz pequenos consertos, mas não tem autonomia para realizar grandes mudanças. A ver se esse seu discurso não lhe custa votos - se correr o risco de ficar fora do segundo turno, passa a ser alvo preferencial dos adversários.

Marta, PMDB
Confesso ter me surpreendido com a Marta, imaginava que ela seria mais crítica a Haddad e ao PT, apelando para a baixaria. Não foi. No debate tentou se apresentar como a velha Marta de 2004, a Marta petista - talvez tenha notado que tentar disputar os votos do anti-petismo com a extrema-direita seria tarefa inglória -, apenas se corrigindo em criar taxas e impostos. Seu anti-petismo ficou na discreta consideração final, em que se disse capaz de "acolher todos os cidadãos", o que faz coro com o discurso da grande mídia e da extrema-direita, de que o PT dividiu o Brasil e governa só para alguns - ao que tudo indica, vai guardar o anti-petismo para quando falar diretamente com anti-petistas, como os leitores do Estadão. Acenou com a direita em pouco pontos, como na defesa da repressão na região central de São Paulo como política anti-drogas; preferiu marcar sua experiência e fazer um discurso para a periferia. O que mais chamou a atenção durante o debate, contudo, foi a quantidade de vezes que usou "eu": sua forma ultra-personalista de fazer política é bem aceita na tradição política do país, e sua força nestas eleições vem justo daí (Doria e Olimpio foram pelo mesmo caminho, mas sem toda ênfase no "eu" porque tinham que atacar o PT).

Haddad, PT
Haddad era quem mais tinha a ganhar com o debate: por ser o governante de turno tem mais que promessas a fazer, mas como é boicotado pela grande imprensa, pouco espaço teve para notícias positivas durante seu mandato - seu marketing também parece ter sido falho, ao não se centrar em propaganda intensiva nos veículos tradicionais durante os quatro anos (tenho cá minhas dúvidas se não foi decisão tática). Soube usar o debate para elencar suas ações nos três anos e meio à frente da prefeitura: citando obras e localidades e bairros, ao invés de falar genericamente em "periferia" ou zona leste, oeste, norte, sul, seu discurso foi direcionado para as periferias citadas, com o objetivo de marcar para seus moradores o que são ações de seu governo. A tentativa desesperada da extrema-direita de colá-lo ao PT (e o PT à corrupção) demonstra minha tese de que ele conseguiu construir sua imagem acima da do partido. Foi o único candidato a falar "nós" e não "eu", ou seja, o único que assumiu a política como construção coletiva (seja de um equipe, de um partido ou da população) e não como desejo voluntarioso de um governante benfeitor - uma sutileza política talvez pouco notada, mas que parece ser um dos responsáveis pela sua (alardeada) baixa aprovação. Destaque para quando resolveu não responder Major Olimpio e sim desmascará-lo no que chamou de "provocação": não apenas por dizer que todos os partidos e corporações têm corruptos (Major Olimpio babou de raiva quando Haddad falou que havia PMs corruptos) e devem ser punidos, mas por recusar entrar nos termos postos pelo major da SS, digo SD.

Enfim, pode-se dizer que todos os candidatos presentes ganharam com o debate, em que pouco, quase nada, se debateu, o que talvez explique seu "bom" nível. A ausência de Erundina e a presença de Major Olimpio e Doria Junior, entretanto, podem ser encarados como uma grande derrota da democracia e da população da cidade. Há ainda cinco debates pela frente, e é de se esperar que o nível caia muito - resta-nos torcer pra que nossa democracia-na-UTI resista.

23 de agosto de 2016

Erundina, apesar de sua relevância política, foi barrada do debate por Marta, Doria e Olimpio

segunda-feira, 22 de agosto de 2016

Eleição paulistana: disputa pela sobrevivência

Desde a ascensão do PT ao executivo federal os analistas políticos da grande imprensa (que entendem tanto de política quanto Miriam Leitão de economia e eu de modelagem teórica em monocamadas anfifílicas) tentam ligar as eleições municipais a uma prévia da presidencial de dali dois anos, como se fosse um equivalente às eleições legislativas de meio de mandato no Estados Unidos. Erram sempre, claro, porque o objetivo é criar uma narrativa de início de decadência do PT, que se consumaria na próxima eleição federal. Nas eleições de 2016, por conta da polarização política conseguida pela extrema-direita (bem ao gosto do fascismo e nazismo do século XX), consagrada com o golpe de estado encabeçado por Temer e Serra, e com o desenho institucional de uma "ditadura pós-moderna de linhas neofascistas", ao menos nas grandes cidades, talvez a política federal tenha  - finalmente! - alguma relevância na decisão do eleitor. Entretanto, na principal cidade do país, São Paulo, o que chama a atenção é o enredo de reality show que a eleição deve ganhar. Não se trata apenas de vencer a disputa, mas de sobrevivência política. Com um adendo a mais: não se sabe se e em que condições o vencedor concluirá o mandato, ainda mais se for Erundina ou Haddad.
Em fevereiro, quando Datena desistia da disputa e Erundina ainda não era cotada, Haddad podia ser considerado favorito [http://j.mp/cG160201]. Com o grau de perseguição e ódio ao PT que superou as expectativas dos mais entusiastas goebbelsianos e a entrada de Erundina, a situação se complicou ao atual prefeito, que está longe de ser carta fora do baralho, ao contrário do que apregoa a grande imprensa. Convém lembrar que os institutos de pesquisa tem índice de acerto de 0% nas suas pesquisas de boca-de-urna (como bolão, Ibope, DataFolha e afins chegam perto dos 50%, mas pesquisa estatística e bolão são significativamente diferentes [http://j.mp/cG10410]). Não por acaso, pesquisas internas de partidos e candidatos são feitas por outros institutos, que numa estratégia de mercado optaram por não divulgar resultados na imprensa, e garantir seu ganha pão com índices de acertos relevantes (ouvi isso de um professor de estatística, dono de um desses institutos menores mas mais bem conceituados). Mesmo assim admito; é difícil pensar que tudo o que se vê na grande imprensa sobre as pesquisas de intenção de voto seja mentira - mas ouso dizer que se não é tudo é quase tudo: o The Intercept mostrou como Folha de São Paulo não tem nenhum pudor em manipular e distorcer dados (Globo, Veja e quetais menos ainda) [http://bit.ly/2bcjdbG]. Enfim, faço uma breve análise dos principais candidatos do pleito:
João Doria Junior, PSDB: o azarão
Dos principais candidatos, apenas Doria Junior pode perder: o PSDB não possuía nome para a disputa (graças a seus caciques personalistas, que não permitiram a emergência de outras lideranças), e Doria Junior foi ungido para ser escada do Milosevic bandeirante, Alckmin, no seu plano de alcançar a presidência de nossa república bananeira. Disputa a prefeitura para ganhar visibilidade com vistas à eleição estadual em 2018 (se houver eleições em 2018). Tem pequena chance como voto útil contra as esquerdas, caso Russomano abra a boca e desidrate, como em 2012, e Marta não consiga anular o fato de ser ex-petista. Seu veto a Erundina participar dos debates televisivos mostra que sua preocupação maior é combater as esquerdas e não vencer as eleições.
Luiza Erundina, Psol: para provar que é alternativa
Mais que Erundina, quem testa sua sobrevivência nas eleições de 2016 é o Psol. Vencer a disputa na capital paulista seria sua consagração como alternativa de esquerda ao PT. Ainda que uma derrota não seja desastrosa para a legenda nem para a candidata, dificultará a construção de um discurso para 2018 (se houver eleições em 2018). O problema da candidatura de Erundina é se resolver centrar fogo em Haddad, como alguns de seus apoiadores têm feito: além de ajudar a enfraquecer a esquerda como um todo, num cenário de criminalização goebbelsiana das esquerdas, seu passado tem deslizes que contradizem abertamente seu discurso atual. Seu ponto forte é que deve ter a militância mais aguerrida da disputa, o que pode fazer diferença num eleitor de esquerda hesitante entre ela e Haddad e a força de cada um no segundo turno.
Celso Russomano, PRB: o candidato sabonete não pode falar
Em 2016 Russomano precisa provar que é capaz de disputar de verdade uma eleição majoritária: se fizer o papel de cavalo paraguaio novamente deverá se consolar com eleições legislativas, apenas. Em 2012, tão logo abriu a boca para fazer uma proposta política, perdeu votos e ficou fora do segundo turno. Promete não fazer muito diferente em 2016, de modo que ameaça não participar dos debates no primeiro turno - sua sorte também é o menor tempo de campanha. Tem ido em busca dos viúvos do Datena, assumindo discurso militarizado e de repressão. Uma de suas promessas é de revista geral para garantir que só os "cidadãos de bem" circulem pelo centro da cidade: proposta capaz de desagradar parte de seu eleitorado - pretos pobres periférico - sempre vistos como suspeitos, que ganhariam uma revista bônus da polícia e da GCM, sempre que resolvessem sair de casa. Também pesa contra o político ser do partido da Igreja Universal do Reino de Deus - para sua sorte o pastor-estuprador Marcos Feliciano apenas declarou apoio, não havia chegado a gravar um vídeo. Ainda assim, tem grandes chances de ir para o segundo turno, se ficar quietinho. Ganhar a eleição, dificilmente. Se não cair nas pesquisas, deve ser poupado de ataques no primeiro turno: Marta, Haddad e Erundina sabem da fragilidade do adversário, e que quem for disputar com ele tem boas chances.
Marta Suplicy, PMDB: tudo ou nada
Numa disputa onde todos tem muito a perder, quem está com a pele mais em risco é Marta: derrota em 2016 pode significar o fim da sua carreira política (pressupondo a continuidade de certa democracia). A disputa à prefeitura serve para pôr à prova se seu capital político é mesmo dela, ou é do PT. A sexóloga homofóbica (basta lembrar a campanha contra o Kassab, em 2008) abandonou o PT ressentida e assumiu o discurso mais tacanho da grande imprensa: defendeu a moralidade e o fim da corrupção ao lado de Temer e Eduardo Cunha, se aliou a Serra na entrega do pré-sal, foi voz ativa dos golpistas na farsa do impeachment, e até se disse vítima de "racismo reverso", por ser loira de olhos azuis. Resta saber se isso será suficiente para que ela perca a pecha de petista para o paulistano classe-média típico - até que prove o contrário, Marta é o mais petista dos candidatos. Seu ponto forte está na periferia, ainda em conseqüência de sua gestão à frente da prefeitura, em governo bastante personalista. Ganha votos também graças ao discurso de destruição do PT, e ao erros de publicidade da gestão Haddad. Entretanto, por estar aliada ao que há de mais nefasto na política nacional, pode perder parte do seu capital político numa periferia que não tem vocação para massa de manobra. Deve fazer uma campanha das mais vis, de fazer Regina Duarte mirim no seu discurso do "eu tenho medo", centrando ataque contra Haddad e Erundina.
Fernando Haddad, PT: a negação da tese, novamente?
Em 2012 Haddad já foi a negação da tese da grande imprensa, judiciário e grande capital (o triunvirato da ditadura pós-moderna em que vivemos): mesmo com julgamento do chamado mensalão do PT nas manchetes de todos os jornais, o petista conseguiu ganhar a prefeitura paulistana, derrotando ninguém menos que o cacique tucano José Serra. Mas o discurso de 2012 era primário perto do que foi feito desde então, em especial desde a eleição de 2014: o objetivo não é mais derrotar o PT, mas destruí-lo, aniquilá-lo (ao gosto nazi-fascista de Coronel Mendes, irmãos Marinho, PSDB paulista e asseclas menores). Vencer a eleição de 2016 seria a prova de força do PT, mais que do candidato, apesar de tudo o que tem se passado. A seu favor, Haddad conseguiu construir uma imagem desvinculada do partido, a exemplo de Eduardo Suplicy, vencendo barreiras, inclusive, nos cinturões endinheirados da capital. Sua fraqueza estaria justo onde o PT costuma ser mais forte: nas periferias - ainda mais depois de Erundina ter entrado na disputa. Também é ponto fraco o pouco conhecimento da população acerca das ações de seu governo - ações que não são visíveis, mas são sentidas e foram fácil e rapidamente incorporadas ao dia-a-dia do paulistano, como o bilhete único mensal -, e o tempo reduzido de campanha, aprovado pela mini-reforma eleitoral Cunha-Dilma. Esse desconhecimento, contudo, pode ser o seu trunfo: se conseguir reverter os índices de rejeição que os institutos de pesquisa lhe atribuem e ter um crescimento significativo, é capaz de se tornar uma onda difícil de ser parada - para isso, é importante a militância não aceitar o discurso da grande imprensa de candidato derrotado. Por ora tem centrado ataques em Marta, Dória e Russomano, como forma de não deixar dúvidas como candidato de esquerda.

Com a situação dada, é difícil arriscar um favorito. A grande imprensa fará seu papel: desinformação, boatos, mentiras, acusações e reportagens e entrevistas tendenciosas, com o principal objetivo de tirar os dois candidatos de esquerda do segundo turno. As campanhas oficiais louvarão os pontos positivos de seus candidatos, e na internet, padrão-Veja de ataques e boatos deve ser a norma. Esta é, contudo, uma eleição extremamente peculiar, seja pelo contexto nacional, seja pelo contexto dos candidatos - poderia fomentar um rico debate político, mas tudo o que os donos do poder querem agora é política nos debates. A esperar se e como Haddad e Erundina contornam essa interdição, e são capazes de ventilar um mínimo de inteligência num ambiente marcadamente neofascista.

22 de agosto de 2016



quinta-feira, 14 de julho de 2016

Pela desunião sincrônica das esquerdas!

Por conta da eleição para a Câmara dos Deputados, vejo uma série de análises, antes da votação, pedindo uma união das esquerdas, a seguir, criticando sua desunião. Conforme tais análises, a perda da presidência da casa seria apenas o prenúncio do que aguardaria as esquerdas nas eleições de outubro, se não conseguirem se unir - a exemplo de São Paulo e Rio de Janeiro. Mais calma no catastrofismo. São duas eleições absolutamente diferentes, ainda que atendam à mesma democracia farsesca. 
A presidência da câmara era uma eleição indireta em que se sabia que as forças progressistas não tinham chances: somando os votos dos candidatos dos partidos tidos como de esquerda (PSOL, Rede, PCdoB, sem entrar no mérito se são mesmo de esquerda ou progressistas) e a bancada do PT, não conseguiriam chegar ao segundo turno (seriam 102 votos, Rosso teve 106). A eleição da Câmara, portanto, servia para esses partidos marcarem presença para o público externo, de olho nas eleições municipais, enquanto o PT buscava um mínimo de governabilidade, para o caso de voltar ao executivo federal. Um detalhe: desde a ascensão do PT ao executivo federal se fala de uma regra de ouro, um pacto de honra do legislativo brasileiro, de que a maior bancada faz o presidente da casa; romper com essa "tradição" não é de todo insignificante.
Saindo da Terra do Nunca chamada Brasília e indo para as eleições municipais, a união das esquerdas pode ser boa, recomendada, mas não é imperativa, mesmo para a possibilidade de vitória: convém notar que a direita também está dividida. 
A primeira dificuldade para a união de forças progressistas está no fato de que a esquerda deixou de ter um pólo claro e inconteste, o PT - como era desde o assassinato político de Brizola pela Globo, em 1992 -, sem que isso implique em uma força de esquerda que o supere. Como ceder se ainda é o mais forte?, o questionamento petista é justo, ainda que falho. Sem contar que PSOL, apesar dos novos bons ares que tem agitado o partido nesta segunda década, ainda não consegue se apresentar como uma alternativa quanto ao fazer política significativamente diferente da petista - não estar envolvido em casos de corrupção é fácil quando não se está com o poder nas mãos, ainda que a corrente do PSOL que fincou raízes na Unicamp demonstre acreditar, assim como alguns petistas, que há uma corrupção do mal e uma do bem (a deles, claro. http://bit.ly/29RuYZZ) -, nem possui as bases que davam a força ao PT de alguns anos atrás. No caso paulistano, há ainda uma segunda dificuldade: Haddad disputa a reeleição: se alinhar a ele implica não em concordar com teses ou potenciais projetos, mas referendar práticas concretas, muitas das quais plenamente questionáveis pelos padrões progressistas, como a higienização do centro ou a segregação de público nos equipamentos da prefeitura, reforçando a lógica (muito afim às classes média e alta brasileira) que vê a alteridade como negativa.
O que as forças progressistas precisam estar atentas é para não entrarem em brigas fratricidas por votos de modo a reforçar candidatos de direita - imperativo é haver pactos de não-agressão assim como pactos de ataques a inimigos comuns. Certa esquerda terá que abandonar devaneios rousseaunianos de sinceridade pura, e calar críticas muitas vezes necessárias, mas desaconselhadas pelo momento político, de avanço da direita reacionária: por mais pertinente que seja, a crítica feita no primeiro turno pode ser utilizada pelos reacionários no segundo turno. E se já está difícil avançar um passo, arriscar retroceder dois não é uma alternativa sensata (penso no exemplo da GCM: se sob Haddad a guarda está longe de ser uma flor, ao menos ela tem atuado em colaboração com a assistência social; sob Russomano ou Dória ela voltará aos seus velhos tempos de truculência desmedida, atuando em sintonia fina com a milícia estadual do senhor Alckmin, o Milosevic bandeirante).
Em um contexto de golpe de Estado, governo ilegítimo, imposição anti-democrática de políticas de Estado, alienação da casta política das questões da população que os elegeu e ataques reiterados à política, inclusive por parte de políticos (Alckmin, por exemplo), as eleições de 2016 podem ser a chance das esquerdas demonstrarem que a democracia enquanto um valor que, se aprofundado, merece ser defendido. Ao invés de atacarem entre si, mostrarem a convivência saudável de idéias díspares, e usarem a carga para denunciarem pseudo-democratas, esses que defendem que a democracia acaba tão logo se fecham as urnas. Mais importante: as eleições de 2016 devem ser utilizadas para restituir à política seu caráter positivo, que a extrema-direita brasileira, com apoio da imprensa e de togados, tem conseguido com sucesso minar.

14 de julho de 2016.


terça-feira, 10 de maio de 2016

A extrema-direita brasileira em busca de um Trump pra chamar de seu

A extrema-direita brasileira ainda se bate atrás de um nome viável de assumir o executivo federal - mas também os estaduais e municipais. Seu movimento legislativo é clarividente e tem dado resultados: via bancada BBB (boi-bala-bíblia) deixou de ser uma força capaz de barrar propostas contrárias às suas bandeiras e hoje é capaz de impôr sua pauta - cujo ápice, por enquanto, vem desde que assumiu a presidência do Congresso Federal, com Eduardo "Capone" Cunha. Para o executivo, contudo, os nomes alentados não têm força para ganhar uma majoritária no curto prazo - conforme comentei em crônica passada [http://j.mp/cG160430]. Esse desfilar de nomes de alto impacto e pouco resultado, entretanto, tem servido para desviar a atenção de uma extrema-direita que cresce, se organiza e que se não ganhar o poder agora, via impeachment-golpe, deve ganhar em breve via golpe branco em parceria com a sempre presente Globo e demais veículos da Grande Imprensa, e com setores do judiciário que fazem justiçamento e não justiça - quando não fazem simplesmente gangsterismo, como é o caso de notório ministro do STF. 2022 é o mais provável, porém pode acontecer já em 2018. A forma como reverteram as chamadas "jornadas de Junho de 2013", de um movimento contestatório de esquerda para uma marcha reacionária de direita, mostra seu poder de organização: eles precisam apenas de um rosto que encarne um Führer tropical e pós-moderno.
Enquanto o PSC de Feliciano e Bolsomico se apresenta já sem quase nenhum disfarce como o partido neofascista do Brasil - mas tem seu teto baixo para o curto prazo, até por questões culturais [http://j.mp/cG160506] -, outra corrente neofascista se arma em um partido mais bem estruturado e com discurso mais palatável à cordialidade brasileira. Trata-se do PSDB, em especial da corrente paulista ligada ao atual governador Geraldo Alckmin.
Alckmin é o bom moço de fala firme mas sem extremismo (aparente), que vai à igreja (católica), defende a meritocracia (que seleciona sempre os mesmos e seus filhos, por coincidência), sem mácula de corrupção (como nos bons tempos do militares) e tem o dedo sempre no gatilho para matar quem reagir (e quem é da periferia sabe que se entregar é reação punível com execução sumária). Tudo bem ao gosto das viúvas de 64 mais recatadas, e dos incautos que viram na educação um meio e não um fim, e hoje desfilam com o mesmo orgulho sua ignorância diplomada, suas viagens para roteiros turísticos kitsch e seus carros importados blindados.
A Alckmin, entretanto, falta presença midiática: se seu banho publicitário fez com que superasse seu carisma de picolé de chuchu, ele se mostra pouco viável para discursos inflamados, como os seguidores do grande pato fascistas sinalizam buscar. Aécio Neves sonhou ocupar esse espaço e até ensaio vôos mais altos: com ajuda da Grande Imprensa, desde a eleição têm levantado uma cortina de fumaça para disfarçar seu passado, fez um "recall" no seu visual, em 2015, surgindo mais modernex, ao estilo playboy collorido, e radicalizou o discurso moralista-salvacionista, apesar das eleições terem terminado há tempos e ele ter sido derrotado. Sua tática tem virado pó: passou a disputar o mesmo nicho que Bolsomico, e é evidente que vai sendo sugado pelo neofascista puro-sangue. O outro nome do partido, José Serra, é outro político muito tradicional e pouco midiático, mas não convém subestimá-lo, pois para atingir seu objetivo pessoal de se tornar presidente do Brasil, não teria problemas em adotar o modelito nazi-fascista, stalinista, verde e até mesmo democrático, conforme o que melhor couber para a ocasião - é capaz de implodir o PSDB, se isso for necessário, para ser candidato à presidência.
Em suma, tirando o nome-hecatombe tucana de José Serra, o nome-chave do futuro do PSDB é Geraldo Alckmin. Como havia comentando em outra análise, a eleição paulistana deste ano "pode ser uma verdadeira refundação do partido, ou selar o seu fim enquanto opção política democrática para o país (João Doria seria a assunção do papel de legenda proto-fascista, a espera de Luciano Huck para presidente) [http://j.mp/cG160201]. Doria Jr, apadrinhado de Alckmin, levou, e é o nome a ser observado com muita atenção nestas eleições: é o primeiro ensaio de um Trump tupiniquim. Como seu colega estadunidense, para além de empresário de sucesso, já buscou a fama na indústria cultural - na versão brasileira do programa que consagrou Trump. Seu discurso é um equilíbrio publicitário entre Alckmin e Bolsonaro, a fala firme, mas sem extremismos do primeiro, e o discurso de ódio do segundo. Mais up-to-date que Bolsomico, Doria Junior não perde tempo em lamentar o fim da ditadura civil-militar e do Comando de Caça aos Comunistas, mas seu programa modernizador consegue, em certa medida, andar ainda mais para trás, sem por isso deixar de ser atual: reafirma o mito do vencedor brasileiro, identificado, primeiramente, com o automóvel próprio; a seguir, reafirmar esse brasileiro vencedor através do desdém com a urbe e tudo o que é público: o tal "Estado mínimo" por ele defendido não é outra coisa que redução de tudo que o que é público - inclusive o espaço público, a convivência pública, o debate público - ao seu mínimo, na impossibilidade de reduzi-lo a zero. Mais do que eventual cabo-eleitoral para Alckmin em 2018, Doria Junior é um teste de candidato-midiático por um partido estruturado e sem limitações de credo religioso - como o caso de eventuais candidatos por PSC ou PRB.
Alckmin é o nome-chave desse neofascismo com sede no PSDB do Tucanistão (outrora São Paulo, a locomotiva do Brasil, que hoje parece buscar novamente essa alcunha, restando apenas achar um Auschwitz paulista), também por o que tem demonstrado em seu governo: uma política militarizada até o limite que a ordem democrática suporta (ou já não suporta), tratando movimento sociais e reivindicatórios como criminosos, populações periféricas como culpadas (e passíveis de serem executadas legitimamente por seus comandados) - a ponto de seu secretário de segurança, Alexandre de Moraes, um nome à altura de Fleury (o delegado ou o governador), ser cotado para a pasta da justiça e direitos humanos de um eventual e temeroso governo Temer  -, e com ampla conivência da Grande Imprensa - é de se imaginar como não será a anti-cobertura de um eventual governo de um empresário, ou então de um egresso da própria Grande Mídia.
Bolsonaro e o PSC não devem ser tratados como irrelevantes ou folclóricos, mas estão longe de ser o principal perigo a todos aqueles que defendem a efetivação da democracia e os direitos humanos nestes Tristes Trópicos. O conluio entre forças reacionárias, Fiesp, grande capital internacional, Grande Imprensa e PSDB de Alckmin promete muita instabilidade política e social para os próximos anos - percam ou ganhem as próximas eleições. A mobilização da sociedade civil e dos movimentos sociais precisa ser de grande intensidade e permanente, sob o risco de retrocessos perigosos nos pequenos avanços conquistados desde o fim da ditadura civil-militar.

10 de maio de 2016