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quarta-feira, 15 de março de 2017

Pannunzio e o nosso fascismo oculto

Escuto o áudio da "entrevista" do vereador do MBL-DEM Fernando Holiday Silva ao jornalista Fábio Pannunzio, da Rádio Bandeirantes. O breve trecho de três minutos (seria uma homenagem aos Engenheiros do Hawaii?) é um triste retrato do nosso acelerado caminhar para o fascismo.
Ao que dá para entender, Holiday não havia sido chamado ao programa, mas diante de terem dito que usara caixa 2 em sua campanha, liga para a rádio, para dar sua versão dos fatos. Justo, ainda que raro - a grande imprensa não oferece seu tempo assim tranquilamente ao Boulos, por exemplo. Talvez surpreendido por terem feito uma pergunta e cobrado uma resposta a ela, e não apenas a feito como desculpa para abrir o microfone para que falasse o que quisesse, o vereador se exalta e é tirado do ar, sem completar sua resposta (me pergunto se não foi para sorte dele e do grupo Bandeirantes).
O pequeno fascista começou com a desqualificação do site que noticiou seu suposto crime de caixa 2, o BuzzFeed Brasil. Realmente, o site não é algo que inspire grande confiança - até então, o tinha como site de listas bobinhas para perder tempo com inutilidades. Entrei na página do BuzzFeed e não consegui saber quem é o editor responsável - péssimo sinal. Entretanto, os jornalistas que deram o furo têm experiência, ainda que em veículos de baixa credibilidade: Tatiana Farah já trabalhou para O Globo e Severino Motta era da Veja - não sei da qualidade do seu trabalho nos respectivos veículos, pode ser que por serem profissionais éticos que tenham sido demitidos. Na reportagem, nada das frases usadas sempre pelo jornalismo da grande imprensa, nada de "fontes asseguram", "pessoas próximas confirmam" e afins: os repórteres dão nomes e caras aos bois, apresentam planilhas e áudios: uma reportagem muito bem feita, portanto. Se é falsificação - "fake news", como acusa Holiday, ele próprio integrante daquele que foi considerado por pesquisador da USP o maior divulgador de notícias falsas da internet brasileira -, Farah e Motta oferecem de bandeja suas cabeças para processos.
Impedido de falar do veículo e instado a falar do fato, Holiday tenta argumentar que dinheiro não contabilizado não é crime de caixa 2 - infelizmente não deixaram ele completar seu duplipensar, talvez ele dissesse que, não sendo petista ou de esquerda, não há crime. É nesse ponto, ao ser confrontado, que o vereador paulistano começa a gritar e é tirado do ar - medida bastante razoável.
A seguir vem o segundo momento fascista dos três minutos, o mais descarado, e que tem passado em branco - pelos comentários que li até agora. Diz Pannunzio, já sem possibilidade de réplica: "É isso aí, usou caixa 2. É o que aconteceu, e o resto é conversa fiada". Que autoridade tem Pannunzio para determinar a culpa de alguém de modo tão cabal? Ele sequer relativizou sua frase, algo como "para mim, usou caixa 2, ponto final". Fosse em particular, seria tosco, mas no seu direito, dar sentenças a torto e a direito, como se fosse o deus dono da verdade e da justiça, não foi o caso: o jornalista se utilizou de uma concessão pública para emitir um juízo de valor como se fosse fato (não que isso não aconteça o tempo todo na grande imprensa). A investigação das autoridades competentes, o contraditório, o direito à ampla defesa, e a sentença por alguém teoricamente habilitado e neutro, tudo isso é posto de lado: o veridicto está dado: Fernando Holiday Silva é culpado. É a mesma lógica utilizada contra Lula e Dilma, a mesma lógica utilizada contra o pai de Isabela Nardoni e sua mulher, a mesma lógica utilizada contra os donos da Escola Base. Estes conseguiram, vinte anos depois, provar sua inocência (pouco serviu, sua vida estava arruinada); Lula e Dilma tem a seu favor enorme capital simbólico e a completa falta de provas (mas há convicções); os do caso Nardoni, zé-ninguéns sem chance de contraditório, pagam por um crime que ninguém sabe a verdade. Holiday é outro zé-ninguém, apenas vive seus 15 minutos de fama, pode ter o mesmo fim de Nardoni e Jatobá, como nós - basta um suposto crime sensacionalista ou se indispor com o quarto poder, e não há outra justiça possível.
Nos indignamos (com razão) com o massacre sofrido por Dilma e Lula (e eu poria a morte de Marisa Letícia na conta de assassinato por parte do consórcio CIA-Moro-Globo); contudo, o episódio envolvendo Fernando Holiday Silva, até agora, mostra que estamos naturalizando esse tipo de atuação da grande imprensa. Logo estaremos apenas discutindo se os massacrados estavam do lado certo ou errado, do bem ou do mal.
Não se trata de defender Holiday. Ele tem dado reiteradas provas de não ter condições de ser vereador - seja pelos seus discursos de ódio, seja quando invadiu a reunião do PT, requerendo, ainda por cima, proteção da Guarda Civil -, e a cada dia se mostra menos apto para viver em sociedade. Contudo, não é justiçamento que vai dar conta do problema: ou reivindicamos o cumprimento das leis por parte das instâncias responsáveis (algo cada vez mais raro, com ministro do STF atuando como advogados nos casos que julgam ou juízes de província agindo como justiceiros), ou melhor defendermos logo a posse de armas, comprarmos nossa Uzi ou nossa AK-47, e sairmos para matar nossos iguais na praça de guerra.


na data da greve, 15 de março de 2017





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