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sexta-feira, 25 de março de 2016

Breve pausa para novo ataque golpista [O Brasil em tempo de cólera e golpe]

O refluxo golpista desta semana, antes de comemoração inspira atenção. Não que seja uma retirada planejada - parece antes que foram realmente surpreendidos e tiveram que recuar momentaneamente -, mas certamente algo planejam, pois a aposta que fizeram foi alta demais e é difícil - se não impossível - voltar atrás.
Insisto na minha tese de que a entrada de Lula no governo, ainda que passado o momento ideal, foi um contra-golpe genial num golpe que já era considerado como certo por tucanos e marinhos [http://j.mp/cG160316]. Noto pela cobertura da imprensa internacional: até a entrada de Lula no governo, a narrativa estrangeira seguia muito próxima da linha da Grande Imprensa brasileira, tratando a crise brasileira como uma conjunção de crise econômica com crise política causada por um escândalo de corrupção. Desde a semana passada a imprensa internacional vem se descolando da narrativa golpista e buscado entender melhor o que se passa. Ainda falam da crise financeira e da Petrobrás - elas existem, a despeito de qual seja a causa -, porém não tardam a notar que há um quarto poder extra-legal e extra-constitucional no Brasil, que derrotado na vitória tida como certa em 2014, decidiu fazer valer sua vontade, democraticamente apresentada ao país em horário nobre. A desfaçatez é grande demais, a ponto de muitas vezes virar piada: na linha sucessória de uma presidenta chamada de corrupta apesar de não ter nenhuma acusação contra si, notórios corruptos; na oposição, o partido que criou as práticas perpetuadas pelo PT e seus satélites extremistas e limpos como a água do rio Tietê depois de vinte anos e mais de um bilhão de dólares em despoluição. Em tom de sarcasmo ou de denúncia, ficou difícil justificar o golpe ao mundo "civilizado", ou mesmo aos nossos vizinhos argentinos. No plano interno, o PMDB segue discutindo o novo governo, como forma de abastecer o noticiário de fofocas, e tucanos já até prepararam uma festa de inauguração do Novo Governo em Portugal, num pretenso congresso de direito. As ameaças de Temer e Cunha já não causam o mesmo frisson de quinze dias atrás - Lula articula com os principais caciques da sigla, e o silêncio destes tem sido suficiente para não permitir sorrisos largos de Bonner e congêneres na cobertura da crise política. Dilma, por seu turno, saiu finalmente para o combate, e denuncia dia sim, outro também, o golpe em curso, tentando acuar os golpistas. Entretanto, o principal trunfo no plano interno do contra-golpe foi a força demonstrada nas manifestações contra o golpe e pela democracia organizada pelo PT, dia 18: ali ficou claro aos golpistas que haveria enfrentamento sério, e por mais que eles queiram dizer que mobilizaram mais pessoas no domingo, sentiram no moral o desmoronar da crença global de que eram praticamente unânimes.
O alerta de que vêm mais golpe baixo por me despertou uma mensagem no Fakebook de Eduardo Kawamura, que desconheço quem é e o que faz:
"Spoiler: O novo governo já está planejado. Ele até será defendido em Portugal no final de março (aliás, com o nosso dinheiro). Há quem tenha ficado feliz com os editoriais dos grandes jornais afirmando o caráter 'perigoso' da atuação do Moro para o estado democrático de direito. É apenas a terraplanagem do golpe. O governo Dilma cai, a Lava Jato será duramente questionada pela imprensa, a Lava Jato acaba... Ninguém contava, porém, que alguém iria divulgar a lista da Odebrecht que inclui TODO o 'Novo governo'. A imprensa terá muito trabalho para fazer a lista desaparecer da memória dos brasileiros (ou não)."
Realmente faz muito sentido: as manifestações de domingo, dia 13, seriam a comprovação da vontade popular de fim do ciclo petista - e praticamente do PT - e a volta dos homens direitos e probos e da meritocracia (ganha mais quem pode mais). O juiz/justiceiro/jagunço Moro já havia alcançado seu objetivo e era hora de fingir distanciamento e denunciar exageros pouco antes do golpe, para quando consumado, dar um fim a qualquer perigo a quem não fosse petista, e atestar que não era de ocasião a crítica à Lava Jato. As ruas dia 18 contradisseram os donos da voz, Odebrecht denunciou mais do que a Lava Jato queria saber (ainda não se sabe se as doações são legais ou ilegais, vale ressaltar), o vazamento seletivo vazou errado, Janot deu uma prensa em seus subordinados e Teori Zavascki decidiu pôr um freio ao coronel Gilmar Mendes (eu ainda me pergunto o que falta para tirar esse criminoso do STF e julgá-lo como ele merece) e seu pupilo paranaense. O pior para os golpistas não é isso: como disse, a aposta na queda de Dilma foi alta, e está difícil dar o passo atrás: a manutenção da ordem democrática pode significar não o fim do PT, mas o fim do PSDB (com possível crescimento de uma extrema-direita puro sangue, como o PSC); o corte de vez de verba federal para a imprensa que tentou derrubar Dilma (a tentativa da presidenta, ao assumir, de fazer as pazes com essa imprensa através de publicidade oficial merecia ser destacado ao fim desse imbróglio todo), além do acirramento de cobranças pela cassação da concessão pública da rede Globo.
PSDB, coronel Mendes, Rede Globo e demais patrocinadores do golpe têm muito a perder com a manutenção da democracia e não vão, portanto, se entregar tão fácil. Não consigo imaginar os próximos passos, gostaria de estar errado, mas penso que logo vem mais chumbo grosso contra o PT, a esquerda e a democracia.


25 de março de 2016.


segunda-feira, 21 de março de 2016

Esperando o primeiro cadáver [O Brasil em tempo de cólera e golpe]

Eu bem gostaria de dizer que os próceres do golpe encenam uma peça de teatro do absurdo, mas seu irrealismo ganha realidade no moderno aparato espetacular: a realidade material é secundária diante de interpretações fantasiosas, esquizofrênicas, paranóicas que a Grande Imprensa - rede Globo à frente - oferece para o consumo acrítico de parte da população. Praticando com esmero os ensinamentos de Goebbels, a mentira repetida um milhão de vezes ao dia se tornar verdade a uma parcela significativa da população, que se perdeu da realidade em teorias universitárias e jornalismo-novela; seu consumo, contudo, não é passivo: tem gerado reações extremistas em pessoas que vêem um futuro de herói nacional ao agirem com mais realismo que o rei.
O PSDB assumiu a dianteira do golpe, mesmo depois de serem escorraçados do ato que promoveram - acreditam, com base em si próprios, que o que aconteceu com Carlos Lacerda não acontecerá com eles, e tanto o judiciário quanto o povo (que não os elegeu) os carregarão nos braços, no dia da redenção golpista, no dia da rendição da democracia.
Em almoço José Serra e Gilmar Mendes parecem ter decidido os próximos passos do golpe - indiferentes ao que se passa nas ruas das cidades do país. Não encenam teatro do absurdo: brincam de jogo de estratégia em tempo real, algo como Warcraft, sem se importar que as forças que mobilizam são pessoas de carne e osso e não exércitos impalpáveis. Com a justiça preocupada em dar verniz legal ao golpe e não em agir como poder o mais próximo da neutralidade, logo menos deve aparecer o primeiro cadáver do discurso de ódio da rede Globo e seus asseclas - e nada garante que será o único. Não que seja novidade: o discurso de ódio contra minoria há tempo produz vítimas, só não era tão democrático como agora, a englobar qualquer pessoa que use vermelho, mesmo que seja camisa da Coca-Cola.
A decisão de Gilmar Mendes de devolver o processo para o justiceiro de província, Sérgio Moro, deixa o Brasil na beira de um conflito civil. As manifestações de sexta-feira, dia 18, na avenida Paulista e em diversas cidades brasileiras foram uma mostra de que haverá resistência popular ao golpe. Os neofascistas da "morolidade global" até então se sentiam legitimados em apedrejar qualquer Maria em nome de Jesus, quem sabe agora passem a apedrejar eventuais viventes que decidam imitar o filho de deus - agora que sabem que são a maioria, como o eram desde as eleições, a despeito do discurso da Grande Mídia e dos golpistas - e pedir um mínimo de bom senso. Acontece que nenhum é Jesus e é provável reações da turma da democracia.
Mas a situação pode piorar para além de brigas de rua entre proto-gangues neofascistas e anti-fascistas: Geraldo Alckmin deixou explicitado que usará a Polícia Militar de São Paulo como milícia pró-golpe a serviço do projeto de poder do PSDB-Globo-judiciário: já havia sido constrangedor o tratamento diferenciado dado aos seguidores do Pato da Fiesp, que bloqueiam por 40 horas a avenida Paulista sem serem incomodados (em compensação, se é adolescente reivindicando educação, dez minutos de interrupção de via pública é motivo para espancamento geral da gurizada, sob aplausos da mesma classe-média que apóia o golpe); a forma como a polícia militar interveio na PUC-SP nesta segunda, em que apenas observava o protesto dos alunos quando era pró-golpe, e mudou drasticamente de atitude quando esses foram calados pelos pró-democracia, com direito a balas de borracha, bombas de efeito moral e tratamento de choque para proteger neofascistas, mostra que Alckmin não tem qualquer compromisso com a ordem pública ou com a segurança dos cidadãos (o que não é novidade para um governador que estimula assassinatos extra-judiciais por parte de seus comandados), pelo contrário: são as ações de sua polícia que na grande maioria das vezes instigam a desordem e a violência - palavras de ódio e incitação à violência, tudo bem, reivindicar direitos ou exigir respeito à democracia, aí vira baderna, tudo homologado por Datenas, Bonners e afins.
Já desde ano passado comento que o exército está com muita vontade de entrar no palco e resolver a situação. Entretanto, contrariamente ao que pedem golpistas e porta-vozes da Grande Imprensa, as forças armadas não vão derrubar presidente nenhum: se entrarem em ação será para reprimir golpistas: mais de um ano da casa pegando fogo, com pedidos de intervenção militar, com acusações mil de comunismo ao PT e as forças armadas caladas, nenhum pio sequer dos seus generais de pijama. Foi só semana passada que um oficial se manifestou, para dizer que o exército respeita a constituição, ou seja, se subordina à comandante suprema das forças armadas do Brasil, isto é, Dilma Rousseff (amigo meu disse que o exército chegou a entrar em cena ano passado, para liberar pontos principaia de estradas do país durante o locaute dos caminhoneiros). A vontade das forças armadas entrarem em cena é simples: cobrar a fatura com o respeito à ordem democrática e constitucional agora com o enterramento definitivo de todo questionamento sobre a ditadura civil-militar de 1964-85. Na atual situação, se preciso for, penso ser um preço amargo, mas válido.
A prisão de Lula pode ser o estopim para revoltas populares e sua repressão pela milícia oficial (que atende pelo nome de polícia militar) paulista e pelas milícias paralelas. Do lado da reação, além dos defensores da democracia é possível que detone uma bomba de revolta e ressentimento contra o sistema repressor do Estado (principalmente em São Paulo), e esses não irão para as ruas protestar com gritos. Gilmar Mendes, Serra, os irmãos Marinho, Sérgio Moro e outros, protegidos em suas mansões, apostam que o governo não resistirá a um derramamento de sangue. A responsabilidade (ou irresponsabilidade) dos golpistas é preocupante para nós, pessoas comuns, sem direito a foro especial e guarda-costas pagos pelos cidadãos.

21 de março de 2016.

Eles fingem que estão jogando War

quarta-feira, 16 de março de 2016

Lula na Casa Civil: a confissão do golpe

Aqueles que entoam o "não vai ter golpe" não podem estar mais enganados: a ida de Lula para a Casa Civil é a admissão velada de que há um golpe de Estado em estágio avançado.
Lula pode não ter feito faculdade - diferentemente da maioria dos cabeças do golpe em curso e dos seus apoiadores apedeutas dos bairros nobres da nação -, mas é inteligente e demonstrou isso com tudo o que aprendeu ao longo de sua vida pública. Depois de afirmar que seria candidato em 2018 (eu ainda acho que ele não queimaria seu capital político com um terceiro mandato, antes tentaria a presidência da ONU, não fosse todo o trabalho dos seus inimigos de pô-lo fora da disputa da presidência do país), assumir um cargo no governo Dilma como o fez, às pressas e sem outras mudanças de imediato, seria um suicídio eleitoral - estivéssemos nós em condições democráticas normais. Não estamos, e assumir a Casa Civil foi a forma que o ex-presidente achou para tentar garantir eleições livres em 2018 - seja para ele ou para quem for do PT (e da esquerda?) participar.
(Parênteses para meia teoria conspiratória: a impressão que se tem é que sua prisão (na Guantanamo brasileira, conforme alcunha corrente da carceragem da PF em Curitiba) era para breve, ao que se seguiria o processo de impeachment de Dilma e sua destituição do cargo, um governo tampão "de união nacional" (vulgo PMDB, PSDB e os donos da voz) até 2018, quando novas eleições correriam "normalmente", sem perigo de vitória petista - tudo feito sob a supervisão do judiciário brasileiro e da nossa Grande Imprensa, ambos de notória imparcialidade).
A nomeação de Lula para a Casa Civil foi um belo contra-golpe político: no plano interno, dá ao governo petista um alívio - pequeno e por si só insuficiente - nas negociações com o legislativo, retardando o impeachment num primeiro momento, com possibilidade de freá-lo tão logo consiga se estabelecer (Paulo Henrique Amorim fala que Lula já estaria fechado com a maioria do PMDB, e a governabilidade, garantida); no plano internacional é que seu lance é grandioso: ao entrar no governo, uma destituição da presidenta deixaria escancarado ao mundo nossas instituições de república bananeira (em pé de igualdade com nossos hermanos paraguaios, de má-lembrança), o que traria sanções ao país, além de ferir nosso orgulho nacional tão pós-moderno e ao mesmo tempo tão século XIX - visível nas manifestações de domingo ou em manifestações de tucanos ou nas manifestações tanto dos políticos do Partido Conservador quanto do Partido Liberal -, de sermos quase primeiro mundo, não fosse a maioria da população desta terra, esse populacho feio e ignorante feito de gente mestiça e pobre.
O acerto do lance de Lula ficou evidente no destempero dos principais articulistas do golpe, Moro pelo judiciário e Globo pela Grande Imprensa e partidos de oposição de direita, ao divulgar conversas da presidenta da República - um crime contra a segurança nacional. Foi a comprovação de que o golpe estava em curso e que o contra-golpe também - "Nietzche", Marx e Hegel foi a primeira tentativa destrambelhada de barrar o contra-golpe. Se a espionagem da presidenta por parte da NSA (sigilosa, não fosse o WikiLeaks) mereceu congelamento das relações brasileiras com o todo-poderoso Estados Unidos, a espionagem e divulgação de conversas privadas da Presidente da República, com claro intuito de perturbar a ordem pública - o próprio Juiz admite de que não há indícios nas conversas -, merece respostas à altura, contra o juiz, contra o Grupo Globo de comunicação (e suas concessões públicas), e demais envolvidos nessa lastimável página de nossa história. 
Como já disse em outra análise: o Brasil hoje não se divide entre petistas e anti-petistas, coxinhas e petralhas, como a Grande Imprensa tenta fazer crer (e muitos acreditam); mas entre os defensores da democracia (falha, capenga, mas ainda assim sob o manto do direito e com possibilidades de aprimoramentos) e de uma ditadura com fortes traços fascistas.


PS: na CBN ouço da manifestação em Brasília, acompanhada pela PM e pelo exército. Desde a tentativa de locaute dos caminhoneiros, ano passado, tenho achado que o que o Exército mais quer é ter que entrar no jogo, garantindo a normalidade institucional ao obedecer as ordens das presidenta, e poder cobrar a fatura com o fim de Comissão da Verdade qualquer coisa relacionada ao período em que eles encabeçaram a ditadura nestes Tristes Trópicos - aplaudidos, diga-se de passagem, pelos mesmos que hoje aplaudem Gilmar Mendes, Sérgio Moro e seu jagunços.

PS2: é hora de Lula rever o documentário da BBC "Além do Cidadão Kane" (Beyond Citizen Kane), de Simon Hargo, em que um então político de esquerda homônimo ao ministro da Casa Civil falava do imperativo em se romper com o monopólio da comunicação do país, sob o risco de nossa democracia nunca poder triunfar por completo [http://j.mp/1XwkfRC].

16 de março de 2016.