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quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

Das pequenas esperanças

Se há um lugar de onde não espero notícia boa é da região da Palestina (e falo aqui em toda a conflituosa área do chamado Oriente Médio, e não apenas às partes que cabem ou caberiam aos árabes). Tem momentos que me parece que a única solução possível para o conflito entre judeus e muçulmanos que disputam o espaço seja esvaziar a área e usá-la para acabar com o armamento atômico do mundo, inutilizando aquelas históricas e sagradas areias por uns cinco milênios. Por exemplo: quando leio a notícia de que Isaac Herzog, líder do Partido Trabalhista israelense, em tese menos de direita que o fascista Likud, do atual premiê Benjamin Netanyahu, defende políticas dignas da África do Sul do apartheid, sacramentando muçulmanos como sub-cidadãos (e mesmo sub-humanos), estimulando a segregação e o ódio, com propostas em pé de igualdade com os vergonhosos bantustões sul-africanos. Isso para não falar nas notícias quotidianas - que resisto a considerá-las banais - de assassinatos de pessoas muçulmanos pelo exército de Israel.
Mas leio no Al Jazeera do dia 12 de fevereiro uma notícia que dá um pequeno sopro de esperança. Não chega sequer a ser uma boa notícia, mas mostra que, apesar de minoria, há judeus que acreditam que a convivência com muçulmanos não só é possível como necessária, e vice-versa. Em tempo: sou da opinião que a paz, lá ou onde for, só pode ser alcançada a partir da igualdade de direitos e oportunidades (o que pode implicar, sem problemas, em tratamento desigual para os desiguais) e da convivência entre os diferentes.
Em Israel há quatro tipos de escolas: uma para judeus ortodoxos, uma para judeus não-ortodoxos, uma para cristãos e outra para muçulmanos. Não é preciso ser muito esperto para saber que o nível de cada tipo de escola decai, conforme vai das para ortodoxos até as para muçulmanos. Pior: seguem a lógica que aqui no Brasil pensadores tem denominado de "lógica do condomínio", em que a segregação entre os diferentes permite que o Outro, desconhecido, possa ser pintado como monstro pelos líderes políticos, sem que haja possibilidade de contrapôr essa visão com a realidade. A convivência gera atritos e busca de entendimentos, a segregação, ódio e a violência.
A reportagem toma como exemplo uma escola pré-escolar de Jaffa, com 140 alunos. Ao todo são doze escolas do tipo em todo o território israelense, administradas pela organização Hand in Hand. Nela não há segregação entre judeus, católicos e islâmicos: Isaac e Mohamed podem até brigar - afinal, crianças brigam -, mas logo a seguir voltam a ser amigas, A expectativa é que no futuro, já adultos, por mais que Isaac e Mohamed não concordem, isso não tenha como conseqüência o ódio e o desejo de aniquilação do outro, mas sim a discordância dentro de limites aceitáveis e saudáveis
Na entrevista, uma das fundadoras da Hand in Hand, Nadia Kinani, reclama que os pais precisam enfrentar o aparto estatal para poderem educar seus filhos fora dos padrões impostos pelo governo - isso porque a escola segue o calendário de festas judaicas e não foi autorizada a liberar seus alunos muçulmanos para o feriado do Dia do Sacrifício (Eid al-Adha). Illan Grosman, cujo filho estuda na escola, reclama: "queremos uma escola igualitária, com direitos iguais para todos - judeus e árabes -, não uma escola judaica em que palestino não se sentem confortáveis".
Como disse, é o exemplo de uma escola de jardim-da-infância, com 140 alunos, que deve ter influência direta sobre 500 pessoas, entre pais, irmãos, tios, professores - em uma população de 55 mil almas. Uma visão mais fria e realista vai dizer que uma iniciativa como essa - ainda mais com toda a resistência por parte da maioria da população e do poder estatal - não permite ter esperança. Mas tantas vezes a história viu a realidade sucumbir a idealismos postos em prática, que prefiro acreditar que num futuro - não tão distante, espero -, os cidadãos saídos de escolas como as da Hand in Hand consigam construir um país e não um território em guerra total.

17 de fevereiro de 2016

Reportagem: http://j.mp/1OgtsHm