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terça-feira, 25 de novembro de 2014

Três bandas bastam

Três bandas bastam para fazer um bom festival - talvez não para trazer bons lucros. Três bons shows me parece um limite para todas serem bem aproveitadas. Radiohead, Kraftwerk e Los Hermanos, em 2010, por exemplo. Juana Molina, Yann Tiersen e Mogwai, no Music Wins, em 2014. O festival trazia outras bandas, que serviram só para cansar. Sim, havia quem gostasse de Pond, Tame Impala ou Erlend Øye and the Rainbows, mas eram públicos muito distintos.
Cheguei à Costanera Norte quando Pond tocava. Não me agradou, mas circular pela área, reparar no público, foi intetessante. Notei que uma das modas indie em festival argentino, ao menos para las chicas, é galocha ou coturno - muito práticas em caso de chuva e lama. Também que elas mentem na altura, ao usar all-star plataforma, por exemplo. Notei ainda - mas isso foi durante o show da Juana Molina - que argentinos são baixos, e ter um metro e noventa de altura te torna um dos mais altos da platéia, visão livre para o palco. Ponto negativo: você estar na direção da câmera e identificar sem sombra de dúvidas sua careca - e isso (a careca) é algo que me incomoda muito. Enfim, de volta ao festival. Após Pond, achei que viria Juana Molina, mas veio o tal de Øye, chatíssimo - de legal, só que parecia o Bill Gates recém saído da faculdade tentando ser pop. Oquei, eu estava entretido vendo las muchas chicas guapas - em especial uma bochechudinha nariguda, sardenta de olhos verde acizentados (sou daltônico, antes que me perguntem como não soube identificar a cor dos olhos da garota), encantadoramente apaixonante. Mas mesmo esse entretenimento passa a ser cansativo quando a banda não ajuda (porque também não vou ficar olhando fixamente, que seria deselegante, para dizer o mínimo, apesar da vontade de não tirar os olhos da referida guria). A banda seguinte era tão chata quanto. Anunciou uma nova música e tocou mais um The Smiths piorado. Segui a indicação de dois vizinhos de sombra, que saíram às pressas assistir a D.I.E.T.R.I.C.H., no palco para bandas menores. Banda interessante, um eletrônico com batidas meio indígenas, presença de palco marcante, principalmente por estarem todos com os rostros cobertos. Ainda assim, começava a me arrepender do festival.
Foi quando vieram as três apresentações que me interessavam, para tirar qualquer pensamento que soasse um "será?". Molina entrou no lugar de Beirut, e ornou muito bem com as duas seguintes. Conhecia apenas um disco e algumas músicas dela (e gostava), e vê-la trabalhando o som, com loops e distorções - numa delas com inusitadas palmas do público a se repetir com sua voz - foi muito interessante. Seu show acontecendo com o cair da tarde também ornou muito bem - deu um toque que as luzes de palco não dariam. Yann Tiersen fez outro bom show, tocou uma música da trilha da Amelie Poulain, algumas do disco novo, Infinity, e poucas do anterior, Dust Lane, meu favorito. A conclusão a que cheguei foi que o francês sempre faz um prelúdio um tanto etéreo antes de começar a música de verdade. Da estética de palco, luzes de descarga fazendo a frente - muitas vezes como únicas luzes, uma para cada músico - davam um clima interessante. Duro era o moving light (é o que dá ler crônica de estudante de iluminação) passando pela cara do público o tempo todo, cegando-o. Era bonito o efeito, visto pelo telão, daquelas silhuetas vermelhas de cabeças - não era legal a luz no seu rosto (na verdade, esse é um problema de ser alto em shows argentinos, quando me abaixei à altura média, a luz não incomodava tanto).
Enfim, o grande show da noite, para mim: Mogwai. O quinteto de Glasgow, assim como o de Oxford, superam o quarteto de Liverpool, na minha opinião - desconfio que polêmica, mas a mais acertada. O que me chama a atenção é como parece que a banda surgiu pronta: eles tocam músicas do primeiro ao último disco, percebe-se algumas diferenças, mas as antigas não soam datadas (diferentemente de Radiohead, por exemplo, em que Pablo Honey é praticamente dispensável) nem repetitivas. A forma como eles trabalham tensões e sua resolução (ou fim brusco) também impressiona: a música parece ocupar todo o espaço, mesmo em pianíssimos como New Paths to helicon pt 1 ou Mogwai Fear Satan. Por sinal, emendar 2 rights make 1 wrong com Fear Satan dava para ser o fecho do show, se eles não fizessem questão de encerrar com tudo, com Batcat (a exemplo do show no Sónar, em 2012) - até eu fui pra frente (quero dizer, mais para frente), fazer parte da roda de aloprados e alopradas que pulavam ensandecidos. Uma coisa muito legal de assistir a show na Argentina é a tradição de canto das torcidas, e poder acompanhar Rano Pano fazendo ôôô-ôôô-ô-ô-ôô e por aí vai (show do Iron Maiden deve ser um orgasmo geral). Talvez por ser festival, sem muito tempo para montar o palco, talvez por ser na América Latina, talvez porque seja assim mesmo, careceu um trabalho um pouco melhor com as luzes - algo que o show pede. Contras, fumaça e estrobo, por mim, poderiam ser a base.
Do festival, positiva a localização: perto do centro, longe de residências. Os aviões que partiam do Aeroparque, bem ao lado, até poderiam compor bem o cenário, não fosse o barulho (Juana Molina ora comentou o estranhamento de tantos aviões - ninguém deve tê-la avisado). Achei interessante o esquema de só ser autorizada a venda e consumo de cerveja em espaços reservados - em tese para restringir o consumo entre menores, mas só em tese. O negativo para o evento (não para o público) é que vende menos cerveja - ou os argentinos são menos desesperados para encher a cara. Péssima foi a organização: não havia panfleto, cartaz, aviso nos telões, nada, sobre que banda se apresentaria qual horas - fui pra frente do Øye esperando Molina, por exemplo. Houve também atrasos nos shows de Yann Tiersen e Mogwai (apesar de ter sido divertido ver os dois contra-regras como que diaputando quem levantava mais o público com Black Sabbath). E das coisas mais chatas, a passagem de som de um palco atrapalhar o show do outro, a ponto do público ter que pedir silêncio. Preciso admitir, em organização, o Brasil está bem melhor. Mas nenhum desses poréns fez eu me perguntar se valeu a pena ir para a Argentina encarar um festival - depois de já ter me dito várias vezes nunca mais ir a um. 

Buenos Aires, 25 de novembro de 2014.