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sexta-feira, 10 de agosto de 2018

Eleições 2018: percepções sobre o primeiro debate

Teria sido uma noite de quinta-feira divertida, não fosse assunto sério o debate na rede Band - uma das estimuladoras do golpe, a reboque da Globo. O debate entre os presidenciáveis-menos-o-favorito esteve muito além de boa parte do humor tupiniquim (porém aquém do Choque de Cultura), e mais que memes, pode fornecer vários personagens de humor - seriam muitos dos candidatos humoristas disfarçados de presidenciáveis?
Há uma mania, não entendo o porquê, de tentar achar um vencedor para debates, como se fosse uma luta e valesse algo vencer debate. Salvo em debates na antevéspera do dia da votação, com calmante na água e edição malandra no jornal do dia seguinte, não se pode falar exatamente em vencedor e perdedor de um debate - ainda mais sendo o primeiro, onde serve mais para ver por onde cada candidato tentará se vender, ao menos num primeiro momento. Pesquiso na internet e vejo que os apoiadores de Bolsonaro anunciam como o capitão, mesmo murcho (eu diria brochado), venceu o debate. Apoiadores do Boulos também cantam vitória - se eu fosse ver o que dizem os eleitores dos demais, seria a mesma história.  Mas se é preciso declarar um vencedor, foi Cabo Daciolo. De ilustre "ninguém sabia quem ele era muito menos que estava concorrendo" despontou como terceiro mais pesquisado na internet durante do debate, segundo o Google. Se não confundisse palanque com púlpito poderia provocar uma sangria grave em Bolsonaro; mesmo assim, sua verborragia indignada extremista e sem noção, saída diretamente do MBL e grupos de whatsapp, aliado à tentativa do capitão de parecer um político sério, normal, podem custar ao candidato do PSL os votos de protesto - esses que elegem Tiriricas ou vereadores semianalfabetos de cidades pequenas. Se conseguir segurar a pregação, corre o risco de ganhar os votos dos extremistas anticomunistas.
Álvaro Dias parecia o Coringa disfarçado de tia carola bêbada em almoço de família. Mal articulado tentou surfar na lava-jato e no antipetismo, tentando colar ao seu o nome do inquisidor Moro, numa estratégia que é de se perguntar se durará um dia mais, ou será desautorizado pelo próprio camicie nere de Curitiba [PS: foi autorizado, e isso traz uma novidade importante ao cenário]. Tentou traçar seu caminho na extrema-direita entre Alckmin e Bolsonaro.
Alckmin deve tentar mudar radicalmente de estratégia. Sua insistência nos cinco dedinhos pra explicar como vai diminuir de cinco impostos para um só faltou ser completada com um "pra você que é burro e não entende nada". É de se questionar se o tempo de propaganda irá salvá-lo de si próprio, ou vai chafurdar na própria insipidez - nos momentos mais enfáticos soou pastoso e sem viço. Ainda tem contra si o fator "Hillary Clinton" de ser muito establishment - fato explorado por seus adversários -, e foi ousado (e não muito esperto) ao expôr em linhas gerais suas ideias - menos estado, privatização, menos impostos empresariais. É o discurso hegemônico, repetido como solução pela Grande Mídia - resta saber quanto do eleitorado ainda compra essa bravata.
Marina Silva é outra que compete na insipidez, tentando algo do discurso de Lula - de alguém que sofreu mas venceu na vida. Busca votos como um Alckmin mais centrista, evitando desagradar quem for - e de agradar quem for também. Fora isso, tão insossa que não há o que dizer, nem quando podia assumir enfaticamente uma postura - de contrária ao aborto - fica em cima do muro e diz preferir um plebiscito.
Meirelles eu não conseguia ficar sem rir nas suas aparições, seja pela sua expressividade morta, aquela voz de Maluf insosso, seja pelo seu gestual descolado da fala, seja pelo gestual em si - parece ter feito um curso rápido à distância de libras e se esqueceu de tudo mas tenta usar assim mesmo. Achou um bom discurso, o de alguém dedicado à vida pública à despeito de seus interesses e além de qual governo for, tentou se vincular ao Lula, porém sem dizê-lo explicitamente. De qualquer modo, não parece haver discurso que o salve.
Com esses candidatos, não é de se admirar o desespero do campo golpista/conservador/reacionário em cancelar ou postergar as eleições. Para um dos quatro nomes oficiais do sistema ganhar, só com fraude. Resta ainda Bolsonaro, patinho feio do campo, mas que deve ser ungido a principal muito em breve, se não houver reação de Alckmin ou de um dos azarões.
Bolsonaro têm um séquito de fieis que o vêem como O falo, a despeito da besteira que fale. É o que o mantém no patamar de votos há tanto tempo. Sua suavizada no discurso, tentando se apresentar como um político para ser levado a sério, com proposta "para o Brasil" (leia-se para os especuladores e donos do poder) é uma tentativa de ganhar simpatia dos donos do poder e os votos dos antipetistas que não chegaram ainda ao extremismo fora do tucanato. Ainda é uma ótima estratégia para se consolidar como o nome desse campo, porém Cabo Daciolo pode atrapalhar, ao falar com uma firmeza que o capitão não conseguiu demonstrar no debate - sua tibieza é outro possível ponto fraco para seus apoiadores: fora dos vídeos controlados e arroubos onde reage com pura testosterona, parece um aluno temeroso que gagueja a lição lembrada pela metade.
No campo progressista, Lula teria feito melhor presente que ausente, mas sua ausência se fez sentir e se for bem explorada pela campanha, pela militância, pode valer votos - o tal candidato antissistema não aventureiro.
Boulos escolheu bem o figurino: enquanto todos falam em mudança e contra todos os que estão aí, era não apenas o candidato virgem de eleição e de mandatos como aquele, dentre os homens, que não se apresentou de terno - preferiu uma camisa mais comum. No início da redemocratização o tal "igual a você" do Lula não deu certo - o eleitorado preferia alguém importante -; em 2018 quem sabe o significado não seja outro? Seu uso de ironias, contudo, pode ser encarado como esnobismo, não sendo bem visto por certo eleitorado. Como seu objetivo é marcar posição e não vencer, não fugiu de questões tidas por espinhosas, como o aborto. Talvez tenha errado ao começar atacando Bolsonaro, reforçando o capitão como candidato antiesquerda e perdendo oportunidade de se contrapôr no campo de propostas a Alckmin ou Meirelles, por exemplo.
A participação de Ciro mostra como o trabalho do PT para isolá-lo foi equivocado do ponto de vista de país e momento histórico, mas talvez acertado do ponto de vista eleitoral. Sem negar um posicionamento claro, nacional-desenvolvimentista, sacou uma proposta apelativa de limpar nomes no SPC/Serasa. Com o campo conservador sem qualquer nome que empolgue, tivesse tempo de tevê, correndo pela faixa do centro moderado mas firme, meio establishment, meio outsider, e poderia desbancar Bolsonaro na vaga para o segundo turno contra o PT - porque a impressão que deu foi que a disputa era quem confrontaria Lula ou Haddad no segundo turno. Ainda que no meio do debate tenha se posto contra não apenas Temer, mas contra o golpe, evitou falar explicitamente de Lula - como fez Boulos -, na ânsia de angariar um eleitorado antipetista; a estratégia me parece equivocada, e a perda pode ter sido maior que o ganho - uma sinalização de que Lula deveria estar participando do debate, por respeito à democracia e ao direito, teria sido mais inteligente.
No mais, o debate foi preparado para favorecer os "50 tons de Temer", afinal, quanto mais Boulos e Ciro forem expostos, mais fica evidente a fraqueza de todos os candidatos conservadores. Pela possibilidade de livre escolher quem responde, os dois pouco falaram. Na hora das perguntas dos jornalistas, era evidente a tentativa de catapultar os candidatos reacionários e complicar os progressistas: perguntar de segurança para Bolsonaro é levantar a bola para ele chutar, e de aborto para Boulos e Marina, é deixar evidente ao eleitorado conservador o perigo da esquerda ateia - Marina tão fraca que sequer conseguiu aproveitar essa bola levantada. Boechat foi a personificação lastimável do nível lastimável dos jornalistas da empresa, com destaque para seu jeito grosseiro e desrespeitoso com os candidatos da esquerda. Nada de novo nem de inesperado, portanto. 
Sem vencedores, mas com estratégias delimitadas e pontos fracos mais evidentes que pontos fortes de cada um. A ver o que nos espera nos debates seguintes. E a esperar se o judiciário vai mudar e passar a respeitar a lei ou seguir no casuísmo quanto à candidatura Lula.

10 de agosto de 2018

terça-feira, 14 de outubro de 2014

Picotes eleitorais (II) [Eleições 2014]

Assisto a um dia da propaganda eleitoral dos postulantes ao Planalto. O PT se centra na comparação entre seus mandatos e os do PSDB, aposta na polarização "governo para os pobres x governo para os ricos". Em um discurso que parece mais interessado em consolidar votos do que angariar mais, deixa o raciocínio pela metade, esquecendo de explicitar o porquê da melhora das condições de vida da base da pirâmide social trazer ganhos para o conjunto da sociedade - fator de diminuição de violência, pressão por melhorias nos serviços públicos, aumento nos salários. Já o PSDB recebeu não só o apoio de Marina Silva e do PSB, como teve seu discurso moralizante a la UDN repetido pela representante da nova política. Aécio, ao menos nesse programa, deixou passar a oportunidade de se apresentar como o candidato da uniâo contra o partido da divisão social. Além disso se focou em certo discurso da emoção - por conta do apoio da viúva de Campos -, próximo daquele usado por Marina durante o primeiro turno, uma tentativa, talvez, de ganhar o eleitorado pernambucano, ou de inflar a presumida onda que embala sua candidatura - Marina Silva foi uma mostra de que discurso da emoção não se sustenta por muito tempo. O mais deprimente foi vê-lo repetir discurso dos formadores de opinião da direita brasileira - essa que diz que o Brasil passou por uma "ditabranda" -, de que o país vive sob a hégide de um partido anti-democrático, uma quase ditadura (bolivariana): essa fala desligitima não só o processo de escolha como todo o sistema democrático! Que tenha sido um lapso, não um chamado ao "restabelecimento da ordem" (com Deus pela família?).
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Eduardo Campos tem sido alçado a político com legado para o Brasil - absurdo exagero. Tratava-se de um político hábil e com futuro, mas sem legado que garanta um lugar no panteão de políticos como Cipriano Barata, Rui Barbosa, Getúlio Vargas, Juscelino Kubitschek, Leonel Brizola - para ficar nos falecidos. Se não for esquecido tão logo se encerre a disputa eleitoral, seu presumido legado o tornará um grotesco espantalho para uso de ocasião pela Grande Mídia.
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Dois gigantescos desserviços dos eleitores ao Brasil: a substituição de Eduardo Suplicy por José Serra, como senador por São Paulo, e a de Pedro Simon por Lasier Martins, no Rio Grande do Sul.
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Jair Bolsonaro, Geraldo Alckmin, Álvaro Dias, Pastor Feliciano, José Serra, André Sanchez (até agora não vi cartola que não seja uma decepção: ou um fracasso ou um Eurico Miranda com sutis diferenças), Lasier Martins, Paulinho da Força, Pedro Taques, Fernando Collor, Renan Filho, Raimundo Colombo, Celso Russomano. Parece que ao se olhar pro lado, o nível dos eleitos é sempre horrível. Para a Assembléia Legislativa do Paraná, graças à votação de Ratinho Jr (começamos bem), o PSC (Partido Nacional-Socialista Cristão, do Pastor Everaldo, Pastor Feliciano e tantos outros Intolerantes Cristãos) será o maior partido da Assembléia Legislativa. Daria para ser pior?
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Xico Sá sofreu censura prévia da Folha de São Paulo - expediente que dizem há tempos ser aplicado também a um dos polemistas do jornal (que acata obediente, enquanto anuncia o PT como partido ditatorial). Motivo: a Folha repudiaria proselitismo político em suas páginas. Em um jornal que tem Reinaldo Azevedo, proselitismo político significa ser favorável ao PT, porque qualquer coisa contra o Partido dos Trabalhadores e a favor dos tucanos, desde que se vista com uma tosca roupagem de informação, é autorizado. Xico Sá (de quem este escriba é fã de longa data e o assume como uma de suas influências) soube se dar o devido valor, e dignamente pediu demissão.
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Nada contra o voto em Aécio Neves, quando se trata de uma escolha racional, como comentou Antônio Prata ou Gregório Duvivier. Problema é o voto de cabresto - ignaro, para não dizer preconceituoso - que quer tirar o PT do poder federal por ser O partido corrupto. Não se trata de defendé-lo dizendo que todos roubam, mas convém ressaltar que nenhum outro partido até agora, em qual nível for, deu tanto apoio e tanta liberdade às investigações sobre malversação de dinheiro público. Não é a corrupção que cresceu, foi seu combate: os crimes foram muito semelhantes, mas José Dirceu está preso e Fernando Henrique Cardoso ou Eduardo Azeredo, não.
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Muito se tem comentado sobre os impressionantes erros dos institutos de pesquisa. Falei sobre isso após as eleições de 2010, na qual o índice de acerto das três principais empresas de medição de pretensão de voto teve acerto de 0% (isso mesmo, zero porcento). Está em http://j.mp/cG151010e. Este escriba insiste na sua tese de que as pesquisas de opinião divulgadas pela Grande Imprensa são uma forma discreta de tentar influenciar o voto: há quem vote no candidato favorito para "não perder o voto", por exemplo, ou então um candidato chega ao segundo turno em uma "empolgante crescente", pronto para desbancar a murcha presidente candidata à reeleição.


Pato Branco, 14 de outubro de 2014.

terça-feira, 2 de setembro de 2014

Picotes eleitorais


Ao que tudo indica, Marina Silva "russomanizou" mais cedo do que era de se esperar: tão logo saiu das generalidades abstratas para propostas concretas, tropeçou nas próprias pernas (e alheias, postas por seus aliados), e para quem já era vidraça, abrir a guarda pode ser mortal - pedras é o que não falta. Ao obedecer a ordem do pastor Malafaia, e voltar atrás na sua política sobre homossexuais, Marina viu sua credibilidade escorrer entre pessoas mais à esquerda, desiludidos com o petismo e críticos à imiscuição entre Estado e religião. Pior: para quem tenta vencer eleição para o executivo sem base legislativa, é importante o culto à personalidade (quer dizer, isso no Brasil é importante com ou sem base) e a demonstração de força, para garantir a aura salvacionista (Collor em 1989, Heloísa Helena em 2006 e Marina Silva em 2010). A hesitação da candidata do Rede vai refletir na confiança dos eleitores que ainda hesitavam se votariam mesmo nela. Não está perdida, mas terá trabalho para recuperar a imagem.
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Na segunda-feira, em sua coluna no Valor Econômico, o filósofo Renato Janine Ribeiro, entusiasta de Marina Silva, apresentava contradições do programa de governo da candidata, como quando esta falava em ampliar a participação popular na política e, na hora de indicar ações concretas, propôr unificação de todas as eleições, com mandatos de cinco anos: tamanho intervalo, comenta o filósofo, só ajuda a desmobilizar ainda mais a discussão política. Concordo com ele e desde muito defendo que as eleições deveriam seguir a cada dois anos, porém unificando eleições executivas em uma das datas e eleições legislativas na outra.
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A Grande Imprensa, por seu turno, age como biruta de aeroporto que tenta mudar a direção do vento. Primeiro dizendo do medo petista com vitória de Aécio no segundo turno, enquanto todas as pesquisas indicavam vitória da presidente no primeiro turno. Agora o PT teme Marina que, pelas últimas pesquisas ganharia no segundo turno (o detalhe é que as mesmas pesquisas indicam que três quartos dos votos de Marina ainda são influenciados pela comoção com a morte de Eduardo Campos). Raymundo Costa, precaríssimo colunista do jornal Valor Econômico (dos grupos Folha e Globo), fala que Aécio Neves e o PSDB cogitam renunciar à disputa para apoiar Marina Silva. Talvez ele tenha alguma informação privilegiada. E essa informação é algo como a decisão de acabar com o PSDB: não faz sentido renunciar à campanha para se juntar a uma ex-petista, simplesmente para derrotar o PT. O PSDB perderia credibilidade e boa parte do seu eleitorado fiel, e Aécio viraria, na melhor das hipóteses, um morto-vivo político.
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Brizola, que não deve ter um descanso muito tranqüilo na tumba, diante do que foi feito dos partidos nos quais fez história - o PTB de Vargas e seu PDT pós-golpe -, revolve-se ainda mais em tempos de eleição. Na propaganda do rádio ouço um candidato a deputado pelo PDT, coronel qualquer coisa, criticar o estado frouxo, a parcimônia com a criminalidade - justo no partido de quem foi acusado pela elite carioca de desrespeitar os desrespeitos aos direitos humanos pela polícia militar nas favelas do estado. Na rádio Estadão, em entrevista antes do debate do SBT, Brizola é citado pelo Pastor Everaldo. Definitivamente, a um dos personagens mais importantes - se não o mais importante - da política brasileira da segunda metade do século passado, nosso Cipriano Barata do século XX, ser citado por pastores, ver seu partido dar guarida a policiais raivosos e a representantes da rede Globo (Lasier Martins, no Rio Grande do Sul), não faz jus à sua luta.

Para relembrar:

São Paulo, 02 de setembro de 2014.

quarta-feira, 13 de agosto de 2014

Sem Campos, como pode ficar a disputa presidencial? [Eleições 2014]

Para além da tragédia familiar e dos amigos próximo com o acidente aéreo que vitimou Eduardo Campos, a morte do candidato do PSB tem potencial para provocar grandes mudanças na corrida presidencial deste ano. Pela primeira vez vislumbro possibilidade real de segundo turno na campanha, se for Marina a substituir Campos (convém ressaltar que todas as pesquisas divulgadas até agora apontam vitória de Dilma no primeiro turno, sendo o tal segundo turno antes distorção dos números por parte de institutos de pesquisa (sic) e jornalistas (sic) da Grande Imprensa).
Eduardo Campos parecia ter alcançado algo próximo do seu teto de votos, sem possibilidades de grandes avanços nesta eleição - e seu projeto era para 2018. Marina, por sua vez, tem o nome consolidado nacionalmente: é de se imaginar que mantenha boa parte dos vinte milhões de votos da eleição passada (quase vinte por cento dos votos válidos), e ganhe alguns mais, por conta da comoção pela morte de Campos. Ademais, seu discurso se propõe o de uma via alternativa à forma de fazer política tradicional - a idéia de rede e não de pirâmide hierárquica -, e dada a saturação da polaridade PT-PSDB pode granjear o voto dos semi-descontentes com esses partidos ou dos muito descontentes com o sistema representativo nacional. E ainda que não seja "candidata evangélica", tal qual o Pastor Everaldo, por ser evangélica, já tem uma barreira a menos para vencer diante do eleitorado mais conservador - nem precisa defender abertamente redução da maioridade penal, manutenção da criminalização do aborto e temas afins daqueles que "são a favor da vida" (sic).
Se Marina Silva assumir a cabeça da chapa, trará preocupações para o bunker petista assim como tucano: Aécio Neves, por ter sido preterido na eleição passada, ainda não tem nome forte nacionalmente - diferentemente das suas adversárias -, e será obrigado a radicalizar sua apresentação como anti-governo - quando para boa parte da população não se trata de desfazer as conquistas petistas, mas aprofundá-las, mudá-las sutilmente de rumo. Dilma Rousseff, por seu turno, terá uma oposição moderada mais forte que a de Campos, e pode se ver obrigada a uma defesa incondicional do seu governo - sem mea-culpas para pequenas melhoras. Sem contar que Marina pode roubar votos tanto de Aécio quanto de Dilma e ainda animar eleitores indecisos ou que votariam nulo - a disputa pela segunda vaga no segundo turno seria acirrada entre os oposicionistas, e creio que a acreana seria favorita.
Há, entretando, um porém anterior às conseqüências da entrada de Marina: a aceitação do seu nome pelo PSB. O partido vem numa curva ascendente e cresceu muito na eleição passada, assumindo certo protagonismo nacional, a ponto de lançar um candidato ao planalto com intenção de votos expressiva - e longe de ser um oportunista-aventureiro, como Collor-1989 ou, em menor medida, Marina-2010, sem suporte no legislativo para conduzir o governo. Marina Silva e seu grupo entraram no PSB somente para esta eleição - após o pleito, terminariam de recolher as assinaturas e criariam o Rede. Os caciques do PSB estão nessa aporia: ou dão a cabeça da chapa para Marina, vislumbram ganhar a eleição, mas perder o poder logo em seguida - correndo o risco de ver o PSB diminuir e sem candidato "natural" para 2018 -; ou põem um nome menos conhecido, insistindo com Marina como vice, com vistas a ter maiores chances de disputa em 2018. O problema desta segunda alternativa: quem?
Pela legislação, o PSB tem dez dias para uma nova convenção. Até lá, várias alternativas serão avaliadas, prós e contras pesados, e a decisão menos onerosa tomada. Enquanto não se anuncia o novo cabeça de chapa socialista, Dilma e Aécio tentarão preencher possíveis espaços que Marina poderia ocupar - um centro moderado com críticas leves ao governo Dilma.

São Paulo, 13 de agosto de 2014.