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quarta-feira, 9 de maio de 2018

"Vice-caução": sobre a função de Alencar e Temer nos governos petistas

É tendência no homem moderno olhar para o passado e reconstruir uma linha causal que não apenas explique como também torne quase que necessário o ponto onde se está. Talvez essa possibilidade passada de prever o que por fim ocorreu nos conforte de nossa angústia presente e nos faça imaginar que podemos, agora, predizer o futuro. Milan Kundera retrata bem esse comportamento em A insustentável leveza do ser, onde as personagens criam causalidades inefáveis, necessidades mágicas emaranhadas nas teias do destino desde quando a ingenuidade dos deuses criara o mundo (como dizia Guimarães Rosa) para justificar casualidades ordinárias.
Esse preâmbulo porque ao querer ver o golpe desferido em 2016 pronto desde 2002, desde que o PT ganhou as eleicões presidenciais, pode ser apenas um forçar causalidade onde há apenas eventos fortuitos. Não digo que em 2002 estava tudo planejado, as elites apenas esperando uma justificativa qualquer para encetar um processo de impeachment e uso abusivo da lei para perseguir adversários políticos convertidos em inimigos. Não estava planejado, porém estava nas possibilidades, e foi precondição para a vitória petista. A chave dessa interpretação está na figura do vice-candidato, seja José de Alencar, seja Michel Temer.
Em 2002, com o esgotamento do ciclo tucano-neoliberal, Lula via novamente grandes possibilidades de vencer a eleição presidencial - a exemplo de 1989. Era preciso, contudo, tornar o sapo barbudo palatável às elites. Daí a contratação de Duda Mendonça, a suavizada no visual com o Lulinha Paz e Amor, a generalidade no discurso "só você querer que amanhã assim será" e a Carta ao Povo Brasileiro. Não havia necessidade do cargo de vice ficar com José de Alencar, político de um partido pequeno - o PL, com 21 deputados -, para mostrar que Lula era paz e amor com o capital. Ainda que não um industrial, o partido possuía quadros capazes de passar a ideia dessa aliança, mesmo que menos enfaticamente - havia, por exemplo, Palocci, que na prefeitura de Ribeirão Preto já demonstrara ser amigão dos mercados, o "PT rosa". Que em 2002 fosse necessária essa mensagem,  ok, o PT ainda era um estranho no Palácio do Planalto, mas em 2006, já bem claro da conciliação lulista, poderia Alencar ter voltado ao senado e outro nome composto a chapa, inclusive um possível nome para sucedê-lo em 2010 - seria até mais "natural" do que a criação do poste-eleitoral que foi Dilma. O ponto de ter Alencar como vice é que o mineiro ficava como fiador do petista: se ele fugisse muito da linha que as elites traçaram como tolerável, bastava removê-lo e tudo voltaria à ordem, garantido por um dos seus. Foi também a função de Temer.
Oficialmente, Temer ser vice na chapa servia, principalmente, para ganho de tempo de propaganda eleitoral - entretanto, tempo por tempo, o PT poderia ter escolhido outro nome do PMDB, como do senador Roberto Requião, por exemplo, muito mais afinado com os ideais do partido. Entretanto, nem Requião, nem qualquer outro nome de esquerda, ou desenvolvimentista, foi alentado, do PMDB ou de qual partido fosse. O argumento de alguém com diálogo com os mercados, que passasse confiança ao capital, tampouco cabia: o coordenador da campanha de Dilma era Palocci, que já havia provado, sem deixar espaço para dúvida, sua total convicção neoliberal fanática. Era preciso alguém de vice do mercado para que este tivesse a faca sempre no pescoço da ex-presidenta.
Lula, conforme reportagem da época, preferia Henrique Meirelles como vice, de modo a ter um avalista menos sujo [http://bit.ly/2rrx9bD] (eu de início tinha escrito também "menos traiçoeiro", e ainda que seja verdade o "menos", o ex-tucano, rapidamente convertido a best friend petista e tão rápido quanto a grande estrela temerosa, mostra que suas convicções não possuem barreiras partidárias, e trairagem não é um desabono no seu léxico). Salvo ingênuos seguidores do pato, é sabido de longa data quem é Temer. Sua escolha não foi bem uma escolha, mas uma imposição - sob a ameaça de apoiar José Serra [http://bit.ly/2Il8j7T]. Tio Sam garantia ali um emissário seu no Planalto, mais cedo ou mais tarde - foi questão de surgir a oportunidade. Mais que isso: o vice-caução era do gosto da parte da elite alijada do poder central desde 2002: bastava a fabricação de um novo  escândalo como o do "Mensalão petista" e eles voltariam ao poder, sem precisar de aprovação popular - afinal, quem votou na Dilma votou também no Temer, como se a eleição fosse mera questão de escolha da cara, e não do programa.
Poderia ter sido diferente? Poderia o PT prescindir dessa aliança tão maléfica? Difícil dizer. Há muito dos bastidores que desconhecemos, que nos é escondido - por razões de Estado, por cálculo político ou por deficiência democrática, mesmo. Não dá para acreditar em Dilma quando diz que acreditava que ele era do "centrão democrático" [http://bit.ly/2I6C24U] - desde FHC, Temer sempre se moveu na base da chantagem rasa. 
Creio haver quatro fatores que nortearam essa aliança, que fez com que o PT aceitasse Temer (desde sempre caracterizado como o mordomo que irá cometer o crime, lembro de piadas do CQC nessa linha): 1) a leitura equivocada das elites brasileiras, predominante no partido, 2) a falta de experiência eleitoral de Dilma, 3) a desmobilização da militância petista e de movimentos populares, fruto dos anos Lula, 4) o poder intocado do oligopólio midiático, que já havia dado um golpe branco no PT, em 1989, e tentado outros quatro, em 1994, 1998, 2002, 2006 e tentaria de novo (como de fato tentou) em 2010; 5) a necessidade de manter uma saída rápida e ao agrado das elites, para que pudesse vencer as eleições, assumir e governar sem maiores dificuldades, desde que dentro do que as elites toleram. O PT, na "escolha" das alianças em 2010, começava a arcar com o alto custo de seus erros no governo - em especial na omissão de um enfrentamento aberto a determinados setores, mídia e oligarquias, em especial. Seria muito mais difícil construir a vitória eleitoral de Dilma sem Temer, mas até as tais jornadas de junho de 2013, a governabilidade do arranjo era satisfatória - o que legitimaria essa situação. Para 2014, houve um total equívoco de leitura do contexto nacional - coisa  primária, constrangedora -, que fez com que insistisse não só com Dilma para um segundo mandato, como com Temer, para "vice decorativo" e de permanente ameaça (ainda acho que parte da história é escondida por parte de Dilma e do PT, que culminou, inclusive, com a nomeação de Levy para .o ministério da economia). Diante de toda a instabilidade vivenciada desde 2013, um vice como Temer - mesmo desconhecendo seu pendor para Marcos Junio Brutus (ou para Pinochet, se quisermos uma referência mais atual) - era um preço excessivamente alto, praticamente impagável - de onde o PT ter de fato aceitado o impeachment sem usar todo seu potencial mobilizador.
Mas a questão que realmente importa agora é: em caso de eleições em outubro - e não sendo como as que elegiam Saddam Hussein no Iraque -, é possível um candidato progressista - Boulos, Manuela, Ciro, Lula - vencer as eleições e - fundamental - assumir e governar a partir de 2019? Ou será preciso aceitar um vice-caução, que irá assumir o poder se as elites se desgostarem do presidente? Se for preciso um vice fiador, qual o valor desse caução? Um Cunha? Um novo Temer? Um Meirelles? Um Skaf? Ou basta um nome mais light, um industrial da velha escola, daqueles que produzem algo e não apenas especulam no mercado imobiliário e financeiro? Mais importante: estão as elites (na verdade, algumas facções das elites) dispostas a uma nova conciliação com forças progressistas, e permitir um governo de esquerda, com ou sem vice-caução?

fevereiro-maio de 2018

terça-feira, 20 de fevereiro de 2018

A relação da Mídia com o Exército no pós-intervenção do RJ

Ainda estamos tentando entender quais objetivos reais por trás da intervenção federal no Rio de Janeiro, que ganha contornos militares. Interpretações são muitas, de aviso prévio à população para a possibilidade de qualquer revolta popular com a prisão de Lula a um preparo para um golpe militar efetivo. De qualquer forma, não há como não concordar com Nassif, quando fala do crescimento do poder do exército, com Etchegoyen [http://bit.ly/2olkF3E]. A questão é até onde iremos (e coloco o verbo na primeira pessoa do plural porque a população não é parte passiva no processo), até onde os donos do poder estão dispostos a ceder o poder ao militares e até onde os militares estão dispostos a assumir esse abacaxi, digo, esta república bananeira. Também há o elemento imponderável, como em tudo na história.
Se os neoliberais dizem que não existe almoço grátis, nestes Tristes Trópicos podemos dizer que a Grande Imprensa não dá notícia gratuitamente - se não vende a capa por dinheiro vivo, loteia notícias por interesses outros, nunca explicitados. Que faça jogadas erradas é uma coisa, mas a censura e cooptação dos jornalistas é pesada e nada que ganha direito a figurar em suas páginas ou transmissões é isento de avaliação prévia - das delações da JBS às críticas a Pablo Vittar. Notícias sobre a ditadura e a intervenção militar, então, não são por acaso.
Tivemos a intervenção federal no Rio, com ameaça de uso do exército como força policial, legitimado pelo legislativo e aguardando o ok da justiça (sic), com as buscas e apreensões coletivas - como disse Luis Felipe Miguel, isso é um reforço a mais no fim do Estado de Direito nesta terra "sem fé, sem lei, sem rei": "pedidos coletivos de busca e apreensão indicam a percepção de que a lei, ao estabelecer direitos, impede o combate ao crime". Mais impressionante é ver os próprios operadores do direito, aprovarem o fim do império da lei. Certamente essa decisão não foi tomada numa noite. De onde podemos presumir que não foi sem querer que dois dias antes da intervenção, a procuradora geral da república, Raquel Dodge, tenha pedido ao STF para reabrir a discussão sobre a lei de anistia, por se tratar de crimes lesa humanidade os praticados por militares durante a ditadura civil-militar de 1964-85 [http://bit.ly/2oj4mUY]. Nunca é demais que atualmente Globo e MPF praticamente se confundem, com este assumindo o poder de milícia jurídica (sem controle externo) dos interesses vocalizados pela Globo.
Ontem, a notícia de que Villas Bôas, comandante do exército e uma das vozes mais lúcidas da corporação (dentro da limitação luminosa que o exército brasileiro pode ter), pediu maiores garantias de impunidade, para evitar uma nova comissão da verdade do que vierem a fazer (e ocultar) durante a intervenção militar no Rio de Janeiro e alhures [https://glo.bo/2BEihxf]. O general acha pouco a lei de 2017 que põe o exército oficialmente na esbórnia corporativista estatal, onde juízes julgam juízes, políticos julgam políticos, ladrões julgam ladrões (digo do PCC, organização que ficou com a terceirização no combate ao crime e execução da justiça aos reles mortais, ao menos no Tucanistão) e, agora, militares julgam militares - apenas a população e a democracia seguem julgada por outros, com critérios alheios e arbitrários.
Hoje, o Globo noticia a identificação da ossada de Dimas Antônio Casemiro, assassinado e desaparecido pela ditadura [https://glo.bo/2EG4tFt]. No mesmo dia, notícias de como os militares vão ajudar a salvar o Rio de Janeiro da criminalidade, com o próprio general interventor tendo sua narrativa do herói (justiceiro), com o assassinato do irmão pela criminalidade [https://glo.bo/2EVPaYu]), muito mais espetacular para forjar um herói popular (diferentemente do camicie nere Moro); e editorial aplaudindo o efeito saneador dessa intervenção, em revival de 1964: "Intervenção é oportunidade para sanear instituições" [https://glo.bo/2C9Y6bC].
O movimento da mídia com os militares, de morde e assopra, pode ser uma antecipação da estratégia usada com Moro e demais justiceiros da república de Curitiba, que tão logo cumpriram sua função moralizante da nação, condenando Lula, foram desmascarados em uma série de imoralismos e ilegalidades pela mídia que um dia antes os tratava como heróis paladinos da ética. Afinal, exército tem forte senso de hierarquia e as armas à mão, não precisa delegar a tarefa de tiro a ninguém, com o risco de não ser respeitado (como foi a decisão judicial de condução coercitiva de Lula, em 2016), melhor não deixar que eles cresçam demais. O ponto é que isso pode ser jogar gasolina em certos setores da corporação, podendo levar a um fechamento breve e duro do sistema. Interrompem as manifestações a tiro, e calam a mídia na base da censura - com esta podendo posar de vítima daquilo que estimularam e desejam. A internet, essa é fácil de conter, já vimos os ensaios no período de desestabilização do governo petista: basta um juiz de província qualquer ordenar o bloqueio de Facebook, Whatsapp ou outros sites e programas, com base em qualquer argumento - como o combate ao crime organizado (por sinal, se bem notei, depois do golpe, nunca mais a justiça bloqueou o Whatsapp e afins).
A grande incógnita a um reles cidadão como este escriba, sem contatos quentes nas estruturas do poder, é saber a quantas andam as divisões dentro das forças armadas. Há ao menos três correntes identificáveis: os nacional-desenvolvimentistas, talvez ressentidos pela forma como foram tratados pelos aliados no fim da ditadura (Jessé Souza identifica o PND II, em 1974, como ponto de inflexão no apoio da mídia e dos seus patrocinados aos militares), e certamente insatisfeitos com os rumos do golpe atual; os caça-comunistas, em que importante é manter seu status quo frente o grosso da população, ao custo de qualquer aspiração de nação ou projeto de desenvolvimento; e os legalistas, que defendem um papel constitucional e de ação restrita das forças armadas. A disputa interna existe, e ainda que não seja aberta, é visível e não aparenta ser pequena - e nessa briga, a hierarquia fica um tanto esfumada. Convém relembrar que o hoje major Willian Pina Botelho, responsável por forjar um patético flagrante de jovens que protestavam contra o golpe, em 2016 [https://glo.bo/2GwAwEi], estava infiltrado em movimentos sociais há mais de um ano e agiu à revelia da então comandante em chefe das forças armadas do país, Dilma Rousseff - mas certamente não agiu sozinho.
Villas Bôas sempre sinalizou ser do terceiro grupo. As recentes mudanças no discurso, mais que uma mudança de mentalidade do general, apontam uma mudança na correlação de forças dentro da corporação. Diante da inefabilidade (ou da grande probabilidade) de um recrudescimento do regime de exceção e da presença ostensiva do exército, o general trata de tentar dar um verniz legal e civil às arbitrariedades de um futuro regime militar ou semi-militar.
Para o exército (pensando aqui enquanto corporação, alheio às disputas da facções internas e dos interesses do país), o ideal é que o melhor cenário se concretize: a intervenção no Rio se encerre antecipadamente, sem maiores crimes e escândalo; que as eleições aconteçam e não sejam uma farsa, nem incorram em fraude, e que ganhe o mais votado - por ora, Lula. Se assim for, o exército sai de cena sem maiores custos da sua imagem frente a população porém, em compensação, seu poder político cresce enormemente, podendo se transformar em uma espécie de "guarda revolucionária" tupiniquim - ou, para ser mais preciso, guarda antirevolucionária. Se até hoje o preço a se pagar por um enfrentamento dos seus interesses eram altos - mesmo com a modernização da força aérea e a aceleração do navio nuclear, a Comissão da Verdade não foi engolida -, a partir desse cenário serão exorbitantes. A maior possibilidade, entretanto, é de um cenário negativo, com exército envolto em uma série de escândalos, por conta de sua ação policial, e consequente arranhões à sua imagem. Se se começar esse processo de corrosão da sua moral, o golpe pode ser a solução mais rápida para estancar a sangria (com Supremo, com tudo?). E, claro, nessa discussão toda dos círculos de poder, a população que sofra, o país que acabe, a nação que se desmantele.

20 de fevereiro de 2018.

quarta-feira, 13 de dezembro de 2017

O gado que aplaude o chicote

Durante a ditadura civil-militar adotou-se a cenoura ideológica do "Brasil, país do futuro". Para o grosso da população, o Brasil vivia do futuro (e não para o futuro): o interregno ditatorial logo daria lugar a uma democracia das pessoas de bem, o bolo cresceria para logo ser dividido (Delfim Netto afirma nunca ter dito isso, o que parece ser verdade: ao que tudo indica, nunca passou pela sua cabeça a necessidade de dividir o bolo com a rafuagem, vide suas defesas das ações do governo golpista atual), em breve o Brasil se tornaria uma potência mundial; um amanhã radiante, para compensar o hoje funesto e mórbido ou, como (não) cantava Raul Seixas em "Como vovó já dizia" (censurada): "Quem não tem presente se conforma com o futuro.
Com a produção da memória (e do esquecimento) nas mãos do status quo (do espetáculo, diria Debord), foi preciso apenas uma geração para que a ditadura civil-militar não fosse mais que uma historieta distante, sem maiores implicações na vida, e o campo estivesse pronto para a semeadura de uma nova ditadura (desta feita, ao que tudo indica, encabeçada por juízes e procuradores, não mais por militares), a avançar brandamente como um zepelim sob o céu azul (seria Lula nossa Geni?).
Novamente tolhidos do presente, nos conformamos com o futuro. Contudo, ao contrário de 1970, a solidariedade social foi dinamitada por um individualismo cego e suicida, e o futuro que se sonha a partir dos escombros que habitamos é um futuro individual - a coletividade pode servir de alicerce para a "vitória" do indivíduo, não pode crescer junto (como atestam o ódio ao PT e aos programas sociais de minoração da miséria e aos de capacitação precária da mão-de-obra). 
Durante o almoço, ao meu lado, dois advogados conversam, ambos na faixa dos trinta anos. O rapaz conta do seu crescimento e do seu mais novo contrato. Não diz explicitamente, mas fica evidente que se considera um predestinado dos grandes fornecedores. Conta primeiro que conseguiu abrir seu escritório graças a uma indenização ganha contra o Carrefour, por ter incluído seu nome no CPC/Serasa após ter quitado sua dívida. Admito que não sou entendedor dessas questões, se a decisão de mandar o inadimplente (ou suposto) para a lista suja é automatizado ou depende uma pessoa, porém me chamou a atenção que seu nome ficou sujo por duas pendências: uma de cinqüenta e outra de trinta centavos. Graças a essa cobrança de oitenta centavos, o Carrefour teve que pagar três mil reais (na época, que não sei quando foi). Parece um erro grotesco de programação, ao mesmo tempo soa bastante plausível como ação deliberada de um funcionário insatisfeito com a empresa.
A mais recente proeza do rapaz é um contrato recém assinado, para ser advogado das Casas Bahia. "Na verdade - ele se corrige -, não foi a Casas Bahia quem me contratou; sou terceirizado". Tenho a clara impressão de que falou com orgulho que era um trabalhador precário - talvez fosse orgulho por estar trabalhando para uma grande rede. Ele prossegue e conta, admirado, do escritório que o contratou: "mudaram pra Alameda Santos. Ficaram com uma estrutura super enxuta. São os dois sócios, mais dois advogados e uma estagiária", mas tem cento e cinqüenta advogados trabalhando para eles. "Estão certos: não tem que ficar administrando pessoal, gastando com férias, décimo terceiro, essas coisas". Sua interlocutora concorda entusiasmada, cita um caso de um escritório que está seguindo "a nova tendência do mercado".
Reparo nos dois. O homem é negro, a mulher, branca. Não tem a menor pinta de que estudaram na USP, ou mesmo na PUC. Provavelmente conseguiram seus anéis de bacharéis graças ao Prouni do Lula. São peões sonhando ser patrões. E em nome do que acreditam que um dia virão a ser, batem palmas à própria exploração, comemoram a perda dos seus direitos, planejam fazer o mesmo e um pouco mais quando estiverem do outro lado do balcão, quando de gado se tornarem quem dá o preço no leilão. Se se tornarem. 
Se... 
A cenoura ideológica atual diz que é só você querer, que amanhã assim será, basta um pouco de esforço e abnegação. Propositalmente não diz que esse paraíso terrestre tem vagas limitadas e fila preferencial - e certamente os dois deslumbrados ao meu lado, um deles que acha que tirou a sorte por ter conseguido três mil reais de indenização, estão longe de entrar nessa fila, se não tiverem sorte ou um jeitinho heterodoxo de resolver a vida. Negar a própria realidade em favor do que ingenuamente acreditam que um dia se tornarão: negar que são oprimidos, embalados no sonho de logo se tornarem opressores. Paulo Freire, desenterrado pela extrema-direita (e terraplanistas em geral) como educador-ideólogo a serviço do PT, esquecido de fato pela esquerda, se mostra atual, como nunca deixou de ser. 
Nosso trabalho de base se mostrou falho - e não só por comodismo com o PT no poder federal e adequação ao seu discurso despolitizante. Parte da esquerda - a com maior capital simbólico e cultural - nunca quis sujar os pés, sair de suas cômodas salas de aula da academia e tentar dialogar com a massa da população - dialogar e não civilizar, ensinar, conduzir: entrar em contato e ouvir medos e aspirações daqueles que tratamos por objeto (de estudo, mas não por isso menos objeto). Nosso diálogo é entre pares, em revistas que contam pontos que rendem uns trocados a mais, não com o diferente, com quem não teve a oportunidade de estudar em universidade de ponta. Daí que a universidade pública pode ser atacada de toda forma e poucos se indignam. Ou que a nova direita tenha encontrado solo fértil para impôr sua forma de encarar o mundo - fake news, ódio e gregarismo proto-fascista. Daí o discurso consolidado que condena os vagabundos (pobres) e louva o "vagabundo ostentação". Por isso não surpreende o gado que louva o chicote, e que a reforma trabalhista tenha sido aprovada sem maiores resistências. 
Sou otimista, e creio que há possibilidades de reverter esse quadro, até mesmo no curto prazo: apesar de todos seus títulos, os doutores golpistas são grosseiros e petulantes o suficiente para deixar pronta uma contra-narrativa que escancara a realidade sem a cenoura ideológica (diante de Moro, Mendes e caterva, até os linha-dura de 64 seriam "da Sorbone"). A questão é a esquerda e as forças progressistas saberem se aproveitar do momento para desvelar as mentiras, sem querer pôr uma verdade no lugar - deixar a cada um e cada uma descobrir sua verdade por suas próprias pernas. Sair da internet e das universidade e ir para a rua é parte fundamental nesse processo.

13 de dezembro de 2017

quinta-feira, 17 de agosto de 2017

Youtubers: a ponta de lança da resistência progressista?

Faz um tempo desativei o rastreamento do Google, de modo a ser bisbilhotado apenas sem meu consentimento; como resultado, o Youtube tem apresentado sugestões de vídeos muito aleatórios para meus gostos já razoavelmente aleatórios (as propagandas seguem certeiras nas buscas que fiz). Hoje entrei para ver o novo vídeo do Porta dos Fundos. Serviu para dirimir minha suspeita de auto-censura por parte do grupo - a nova dona da marca, Viacom, poderia, talvez, estar pedindo para moderarem nas críticas religiosas, para não perder esse importante mercado consumidor que são os evangélicos (e católicos) conservadores-reacionários. Parece que o grupo não está se censurando, e sim aprofundado a crítica no ponto exato: o uso do nome de deus, e não o próprio.
Findo a esquete em que um deputado tenta convencer seus interrogadores da justiça que apenas praticava corrupção, e não qualquer ato sexual com outro homem - pois era pastor e não podia ficar mal com seu rebanho, caso fosse visto como gay -, me distraio e o Youtube engata um vídeo na sequência. Dois youtubers que nunca vi na frente respondem a um terceiro - ilustre desconhecido meu, como todos os youtubers, pelo visto. Por procrastinação crônica, fico a assistir.
A discussão que eles traziam era sobre o grande debate atual do Brasil, na falta de questões mais urgentes: se Hitler e o nazismo seriam de esquerda - ou mesmo comunistas. Uma questão quase pueril diante de quem defende que a Terra é plana. Só não inocente porque não estamos falando de algo enterrado no passado - a possibilidade de um segundo turno em 2018 (se tivermos eleições) entre Bolsonaro e Doria Jr que o diga.
A dupla que fez a tréplica prima pelo rigor e pelo respeito à inteligência daqueles que os assistem - mas numa linguagem que caminha para a do líder do MBL, K.K. (K?) (ao menos nos dois vídeos que vi desse pequeno apedeuta levado às páginas da Folha de São Paulo para falar sobre Power Rangers e atestar a qualidade e índole do "maior jornal do Brasil"), apenas um pouco menos cínica e dona da verdade - talvez seja minha ignorância da linguagem usada pelos youtubers do mundo. O boçal a quem respondiam tem a fala pausada dos velhos sábios donos da sacro-santa verdade - um O. C. ou L. F. P. metaleiro. Como os mestres, abusa de má-fé e usa de mil referências bibliográficas e citações descontextualizadas para justificar seu preconceito para um público desejoso de uma mentira envernizada (ou nem tanto) que encubra sua ignorância e justifique seu ódio (uma forma de fuga de suas vidas existencialmente miseráveis?).
Após os vinte minutos de vídeo, o Youtube me manda para uma outra tréplica contra o mesmo nazi-metaleiro. A questão agora é religiosa. E o youtuber da vez tem uma estética despreocupada, para aparentar que o vídeo foi gravado de sopetão, sem maior preparo, com ele exprimindo sua opinião como se não tivesse elaborado o discurso - ao menos ele realmente exprime uma opinião e não um veridicto divino.
Por conta própria, resolvo encarar o youtuber raiz desses vídeos que acabei por assistir - fui logo no primeiro sugerido, em que ele fala de religião. Diz que não é Jesus nem pretende sê-lo - mas age como se fosse o irmão mais novo dele, com a sensível diferença de ser um vida boa e que optou por fugir dos pregos e das cruzes e encruzilhadas da vida (linha reta é sempre mais rápido. Acelera!). Retira uma meia dúzia de passagens bíblicas para justificar homofobia e defender que Jesus pregava o ódio e a intolerância - ah, a Bíblia, esse livro maravilhoso que serve a qualquer propósito e ninguém se anima a seguir à risca faz um par de anos, pouco mais de dois mil. O nazi-metaleiro não tem trinta anos, mas fala como se tivesse a sabedora de um velho mandarim da China antiga. Seu público, pelo que dá para deduzir, deve ser como muitos dos meus tios e primos (em tempo: não posso escolher meus parentes, no máximo, como fiz, romper com eles): carente de um grande pai (dono de um grande falo) que diga o que é certo e o que é errado, se ajoelha para o primeiro que assumir o papel farsesco e repete o que ele fala como se pensasse. E aos homens-gado e mulheres-gado o ódio é sempre mais fácil de internalizar e entender - talvez por dinâmica interna.
Ao fim de uma hora de vídeos, os últimos vinte minutos do mais puro dejeto intelectual, a recusa soberba e orgulhosa do pensar - louvada como "coragem de falar o que pensa" nos comentários -, me pus a perguntar porque tenho perdido tanto meu tempo com porcarias (minha relação com a internet até merecia uma crônica).
De uma porcaria a outra, vou ao Fakebook, minha bolha política virtual. Lá, um professor universitário (da área de humanas e de esquerda) avisa que não há erro maior que responder à acusação de que o nazismo era de esquerda: isso seria dar verniz de assunto sério a um descalabro sem tamanho. A torre de marfim tupiniquim não me desaponta! E entendo que ter perdido meu tempo com os youtubers não foi em vão.
A ignorância de mundo do professor doutor e pós-doutor me fez entender a importância dos youtubers: são jovens dispostos a dar a cara e discutir no mesmo terreno (um dos) que a extrema-direita avança com sua ignorância planejada. Poucos são os professores universitários que se arriscam a "se rebaixar" e encarar a mídia de massa - ou mesmo um público amplo sem "formação superior" nem endinheirado -, levar alguma luz (e no atual contexto não é descabido esse tom salvacionista) a uma massa que tem como ídolos Neymar, Rodrigo Hilbert e Ana Hickman; que tem como formadores de opinião Bonner, Galvão Bueno, Datena e Luciano Huck. Esses poucos que se arriscam, tem dificuldade em achar uma linguagem que impacte muito além dos que tendem a concordar com suas posições - Karnal talvez fosse o grande nome desses iluministas-midiáticos, mas foi ele próprio seduzido pelo cio da cadela do nazismo (como ele mesmo dizia). Safatle, que vejo como sucessor da Chauí na empreitada midiática, é um dos poucos que se expõem, mas os dois filósofos recusaram maior jogo de cintura e preferiram afirmar desde cara uma posição - o que tem seus pontos positivos e negativos. Mesmo pela rede, a maioria dos professores universitários que sigo prefere discussões herméticas, nos seus melhores momentos, quando não destilam puro ressentimento contra o PT ou se auto-iludem de que ensinar teoria marxista para os filhos da elite é fazer a revolução - Luis Felipe Miguel, professor da UnB e uma das mais lúcidas vozes da atualidade, é uma exceção obrigatória de ser acompanhada! Os professores não-universitários, esses, quando podem falar em sala de aula sem risco de perderem o emprego ou serem intimidados pelos vigilantes do "Escola Sem Partido", devem ficar contentes - e a academia retira deles qualquer legitimidade para pleitear voz como especialistas na sociedade.
Ao fim destas duas horas de procrastinação depressiva pela internet, em grosseiras linhas gerais, ouso dizer que, enquanto a extrema-direita se organiza e ataca por várias frentes e em várias linguagens, se aproveitando de seu poderio econômico, sua hegemonia na grande imprensa e de um sistema educacional falido de alto a baixo, da pré-escola à pós-graduação - USP ou Unicamp serem as melhores universidades da América Latina beira a insignificância social, uma vez que o que é produzido ali dentro parece não extrapolar seus muros (ainda que o professor da Faculdade de Medicina da Unicamp, Paulo Palma, me faça temer que, sim, o pensamento acadêmico tem contaminado o país, e é por isso que discutimos se Hitler é de esquerda, e logo estaremos acompanhando uma discussão sobre se as balas utilizadas pela PM para execução de negros e periféricos deve ser paga pelas famílias que perderam seus entes queridos) -, a esquerda oscila entre brigas ressentidas entre partidos (quando não em movimentos oportunistas de políticos de expressão, como Luciana Genro), movimentos sociais que tentam acordar e se reestruturar depois da letargia otimista dos anos Lula (MTST é o grande ponto fora da curva), sindicatos transformados em impotentes grupos de lobby, e acadêmicos que dão mais valor às discussões herméticas sobre a epistemologia marxiana do que às condições objetivas da sociedade atual - a alienação da universidade pública frente a realidade que está inserida é tamanha que não percebe nem quando está sendo atacada: mesmo com o anúncio de seu desmonte, ainda antes de Temer assumir, e depois com a emenda constitucional que congelou os gastos com saúde, educação e segurança por 20 anos, nada, absolutamente nada fez, que não xingar um pouco no twitter. Nesse contexto, parece que a ponta de lança de alguma possibilidade de reação e mudança vem da juventude, com os secundaristas na ação direta, e com os youtubers, na frente de comunicação, formação e contra-informação. A despeito das boas intenções, é muito pouco para fazer frente.

17 de agosto de 2017

PS1: Não falei da direita não extrema; essa, infelizmente, desapareceu do Brasil, com a adesão do PSDB ao nazi-fascismo tupiniquim desde Serra 2010, engolido de vez por Bolsonaro e Doria Jr, fina flor do hitlerismo tropical do século XXI (e para registrar: este comentário pode me custar o emprego).
PS2: visualizações dos vídeos citados (até 12h do dia 18): Coisa de Nerd: 345 mil; Izzy Nobre: 456 mil; nazi-metaleiro: 464 mil. A título de comparação. Os últimos 3 vídeos do PSOL tem, respectivamente, 22, 442 e 2,3 mil visualizações; os do PT, quando muito, chegam a uma centena.


quarta-feira, 14 de dezembro de 2016

A PEC da desestabilização

Com o Estado tomado pelas finanças, há uma busca agressiva por parte dos donos do poder pelo esvaziamento da política na sociedade, de forma a garantir a platitude necessária à maximização de seus lucros. A Política, a exigência dos "de fora" em serem incluídos no pretenso bem-estar geral da nação, desestabiliza, ou melhor, torna evidente a falta de qualquer estabilidade na sociedade contemporânea, é capaz de mudar rumos - os tais "contratos" que governos progressistas precisam respeitar quando assumem o executivo -, por isso deve ser combatida, por isso deve ser tratada como sinônimo de "palavrão" (quantas vezes Alckmin não desqualificou greves e movimentos reivindicatórios por serem "políticos", para não falar no seu pupilo, o lobbysta que não faz política mas disputa eleição e ainda não saiu do palanque). Uma das funções de Lula no executivo federal, enquanto grande conciliador nacional, foi dar um pouco de sossego a uma turba que se politizava via lutas e reivindicações sociais, e ameaçava questionar privilégios, reivindicar direitos. Houve quem anunciasse ali o fim da política. Exagero: Lula, inteligente e experiente, sabe que política é imanente à sociedade humana, o que o ex-presidente fez foi manter a política em intensidade muito baixa - talvez seu grande erro: conseguiu considerável apoio e tranqüilidade durante seu mandato, mas deu as condições ideias para a gestação da serpente que vem engolindo o PT, as esquerdas e a incipiente democracia brasileira.
O grupo que assumiu o poder com o golpe de Estado de 2016 aparenta mais esperto que o PT, mas tenho cá sérias dúvidas: parecem crentes demais para conseguir perceber o que se passa ao seu redor. A PEC 241/55 pode ser vista como a tentativa de institucionalizar o fim da política sem precisar recorrer a uma ditadura de linhas totalitárias (o golpe de 64, convém lembrar, manteve alguma política acontecendo). O golpe, contudo, pode sair pela culatra: soa absurda a idéia de uma sociedade que prescinda da política - e qual não é o principal instrumento de disputa política no Estado moderno que não o orçamento, desde a cobrança de impostos até a alocação dos recursos? Tentar sufocar a política é dar fermento para que ela ressurja com muito mais força e vigor - o que pode gerar reações igualmente vigorosas e violentas do lado oposto, da anti-política (de inspiração nazi-fascista). 
Ainda antes de possível revolta popular nas ruas, há sinais de que a PEC surge capenga, e quem o diz é um dos porta-vozes oficiais do golpe. O Datafolha não possui credibilidade, mas é reconhecido por ser falho e adulterar dados para favorecer suas posições - vale lembrar a notícia, a partir de dados forjados, deturpados e mal apresentados, que diziam que 50% da população queria a permanência de Temer, pouco antes do desfecho do golpe contra Dilma [http://bit.ly/2hPtcHp]. Pois é esse instituto quem anuncia que 60% da população é contra a PEC 241/55 [http://bit.ly/2hy0749], isso mesmo com toda propaganda feita pelo jornalismo da chamada Grande Imprensa, de que a tal emenda evitaria a quebra do país e permitiria a retomada do investimento e do crescimento. A lógica é simples: com dinheiro garantido para os juros da dívida, os "investidores" (termo genérico para especulador) voltariam a aplicar no país, por dar estabilidade ao seu investimento.
O dado do Datafolha deixa claro que, apesar da emenda constitucional, não deve haver estabilidade nos próximos anos, a não ser que se recorra a uma ditadura aberta e se implemente a tão sonhada paz de cemitério (com trabalhadores zumbis) que o mercado elogia. Se se mantiver o mínimo do lustro de democracia formal, a oposição à PEC deve ser bandeira forte em 2018, no mais tardar em 2022, quando seus efeitos serão sentidos (ainda que economia não seja ciência exata, há certos direcionamentos cuja direção é evidente e permite antever muito do que espera). Alckmin, nome forte da extrema-direita tupiniquim, já deu entrevista criticando a proposta [http://bit.ly/2gMX9Kj] - a esquerda, desnecessário falar. A tendência, portanto, é de permanente crise entre os poderes - com agudização da crise de representatividade dos políticos eleitos para o legislativo -, ou uma nova ementa à constituição que desfaça a PEC dos golpistas. De qualquer modo, contrariamente ao que dizem os analistas da Grande Imprensa, a PEC 241/55 deve afastar qualquer estabilidade jurídica e econômica, condição para atrair investimentos ou mesmo especuladores. Por mais um caminho, o golpe deve deixar como maior legado a instabilidade - e há aqueles que saberão ganhar muito com isso.

14 de dezembro de 2016


segunda-feira, 5 de setembro de 2016

"Fora Temer": O Cavalo de Tróia que os golpistas precisam [O Brasil para amadores]

Com 10% de aprovação, segundo o Ibope, apesar de toda a blindagem da grande mídia, o presidente golpista Michel Temer precisa de um milagre para não ser o próximo ex-presidente da República Bananeira do Brasil já em 2017. Ele é só o espantalho útil pro momento, e os donos do poder não terão nenhum remorço em ejetá-lo do Planalto dia 2 de janeiro de 2017, e promover uma eleição indireta para presidente. A grande preocupação do neoditadores que se escondem atrás de Temer é segurá-lo até 2017.
A equação é simples: Temer, impopular, vai apelar mais e mais para a repressão para se segurar no poder, enquanto as barbaridades são encobertas pela grande imprensa. Quando dezembro chegar, será hora de mostrar toda a revolta das ruas, pedindo "Fora Temer", em janeiro, os nobres deputados e nobres senadores ouvirão as vozes das ruas e farão o impeachment do golpista. A narrativa oficiosa será de que o parlamento (atenção para o uso intensivo desse termo, ao invés de legislativo) democraticamente eleito novamente ouviu a população e fez a vontade do povo. Botarão no Palácio do Planalto um nome com algum respaldo popular, de modo que os protestos arrefecerão, podendo diminuir o nível de repressão e partindo para ataques mais pontuais, a supostos "terroristas", conforme a nova Lei de Segurança Nacional.
Contratempos nesse caminho: quatro são os principais empecilhos dos golpistas para a consolidação do golpe: 1) a pressão das ruas ser tão grande, apesar da escalada da violência do Estado, que Temer caia antes de 2017; 2) a mudança do slogan-chave das manifestações de "Fora Temer" para "Diretas Já", desarticulando o discurso golpista de 2017, e podendo fazer o novo presidente perder respaldo popular que o "Fora Temer" garante quase que automaticamente; 3) os custos políticos da repressão policial serem altos demais e os governadores começarem a dar para trás (Alckmin, por exemplo, já tem um saldo negativo de 10% entre os que acham seu governo bom e os que acham ruim), e Temer apelar para o exército, que pode rachar (há ao menos duas alas bem delimitadas dentro do exército) ao ir para as ruas novamente - ainda que não admitam, 1964-85 tem sido bastante custoso à imagem das forças armadas -; 4) a pressão internacional crescer, partindo também de países importantes da Europa.
Tão importante quanto Temer sair, é a eleição do próximo presidente da república por sufrágio popular direto (idealmente, do legislativo também, mas sejamos realistas, e por ora conseguir só para o executivo já é um grande avanço).
DIRETAS JÁ!
CONSTITUINTE EXCLUSIVA PARA REFORMA POLÍTICA!

 05 de setembro de 2016