terça-feira, 10 de janeiro de 2012

A garotinha do metrô


A garotinha não era feia – ou não deveria ser. Pelos dentes nascendo, devia ter seus sete anos, apesar do falar um tanto embebezado para sua idade, me pareceu. Entrou no metrô com a mãe e outra mulher, e se sentou bem defronte a mim, de forma que o breve trajeto que percorremos juntos pus-me a observá-la – até porque me chamava a atenção.
Não era feia – já disse –, talvez até pudesse ser uma criança bonita: olhos grandes, azuis, loira, gordinha (sem exageros) do estilo redondinha. Mas usava lápis de olho, batom que marcava bem (ou simulava) o contorno da boca, e devia usar mais alguns apetrechos de maquilagem que não constam no meu escasso repertório do gênero. Tudo isso dava a ela um ar de personagem de filme de terror, algo como Chucky, o boneco assassino. E não adiantava ela sorrir com as palhaçadas da amiga da mãe, tudo aquilo de maquilagem – que quem sabe na mãe não desse um ar sexy – a ela emprestavam um quê de sádico e alheio.
Me lembrei das pinturas medievais, nas quais se representavam crianças como mini-adultos, ou mesmo nas de Paula Rego, em que crianças mini-adultos dava um ar de horror a cenas que aparentemente tendiam para festas. Ocorre que a garota nascera no século XXI, mais próxima de Paula Rego do que de Fra Angelico, e sua mini-adultice era horrorificante.
Ao sair do vagão, reparei que a mãe – loira como a filha – tinha as raízes escuras. Apesar da curiosidade, preferi não reparar de novo no cabelo da garotinha.

São Paulo, 10 de janeiro de 2012.