sexta-feira, 23 de março de 2012

Um mar de rosas?


Andar na contra-mão, dançar conforme a música, buscar seu próprio bailado, disputar pra ser o primeiro. “La vie en rose???”, espetáculo da Companhia de Danças de Diadema, consegue apresentar uma interessante resposta à pergunta que se põe – se a vida é um mar de rosas.

Trata-se de uma apresentação alegre – otimista em alguma medida, portanto –, mas que não compartilha da idéia de uma alegria permanente e idílica. A trilha sonora é composta de várias músicas que se sobrepõem, de Bizet a hip hop, passando por Chico Buarque e Edith Piaf. Quem dá o tom, contudo, é Satié e suas Gnossiennes. Não faz muito, uma amiga disse que achava tristes as Gnossiennes e Gymnopedies. Eu as sinto de uma melancolia doce. Em “La vie em rose???” elas preenchem parte da coreografia com a sensação de falta, de ausência, e talvez seja essa uma das alternativas propostas pelo grupo para encarar o mar da vida: o estar com o outro – diferentemente de como começa a dança para uma das bailarinas.

A coreografia, contudo, não é linear, um caminhar para o encontro, para a alegria, para o mar de rosas. Ela tem o oscilar do oceano – esse que exige que navegar seja preciso, enquanto a vida dispensa dessas precisões, mais ou menos como cantam Pessoa em uma das músicas tocadas. Ora em harmonia, ora em disputa, ora em briga – se o paraíso talvez esteja nos outros, o inferno, já comentava Sartre, também está. A dificuldade em achar alguém que “dê uma mãozinha”, e a hesitação de se oferecer essa ajuda – que chega quando não mais necessária –, mostram os desencontros, as falhas de comunicação, os medos, os egoísmos.

A frase O que vocês estão fazendo?, repetida por uma das bailarinas três vezes, dá um outro ponto da resposta que o grupo tenta construir: parece que ter um pouco de consciência do que se está fazendo leva a um refazê-lo em outros termos – e não se trata de parar para pensar, às vezes é agir para pensar. Não por acaso a parte que me pareceu mais bela da coreografia vem depois dessa frase, dita após os cinco bailarinos dançarem belicosamente – com uma imagem urbana ao fundo, o que me pareceu uma ligação direta infeliz entre cidade e violência. O que vocês estão fazendo? Não havia resposta, e a conseqüência foi um maravilhoso flutuar da dançarina, bailando como o vôo de um pássaro – livre mas ciente das alturas que consegue alcançar, por mais que supere suas limitações –, com a ajuda dos cinco homens.

No final, após novamente a pergunta O que vocês estão fazendo?, cada dançarino em sua própria dança, gerando uma coreografia harmoniosa e bonita. Seria um grand finalle, a tão sonhada solução. Seria bonito, porém irreal, demais Poliana. A dança díspar de todos vai se homogeneizando, até todos estarem dançando igual – o que não é ruim por princípio, o problema é quando vira imposição. A saída para essa uniformidade, de todos juntos, mas isolados? Havia uma janela ao fundo, entreaberta, que mostrava luz do outro lado – uma janela, não uma solução.

São Paulo, 23 de março de 2012.