sexta-feira, 14 de novembro de 2003

Uma visão distorcida

Durante o governo FHC era comum abrir o jornal e deparar com o então ministro da educação, Paulo Renato de Souza, defendendo o financiamento do ensino superior por aluno e não por instituição. Era grande meu medo de que num eventual governo Serra, tal proposta fosse, finalmente posta em prática. Mas eis recebo a Folha e hoje e o que diz a primeira página? Que o ministro Palocci pretende cortar gastos com o ensino público. Votei no Lula, com a esperança de mudar, mas seu governo vem com o mesma idéia do
governo FHC, importada do Banco Mundial, e que dizia combater. Defender esse tipo de financiamento é típico de quem não conhece as especificidades da universidade pública brasileira, assentada no tripé ensino-pesquisa-extensão (e não somente ensino), e mais do que isso, ignora que o fato da universidade pública ser ocupada por alunos mais abastados é conseqüência da debilidade do ensino fundamental e médio ministrados pelo Estado.
O ensino superior de qualidade é pré-requisito básico para qualquer país que deseja ser uma grande nação, e a melhor forma de corrigir as distorções sociais do sistema brasileiro é um investimento maciço em educação fundamental e média, de forma a permitir ao aluno do ensino público, além de um formação cidadã, competir em pé de igualdade com o do ensino privado pela vaga na universidade pública.
Felizmente Cristóvão Buarque conhece nosso país e se opõe ao projeto da fazenda.

Campinas, 14 de novembro de 2003

terça-feira, 11 de novembro de 2003

O caleidoscópio da vida

Não sei se esse desencontro com o mundo que muitos reclamam é privilégio apenas daqueles que tentam seguir um caminho alternativo. Muita gente que soube se adequar ao Sistema também reclama estar sem rumo.

Esperamos que o mundo seja um quadro de Monet, mas ele é um caleidoscópio: os elementos são sempre os mesmos, mas o arranjo muda a cada momento. E tentamos fazer o caleidoscópio parar de girar, mas é inútil: a vida é movimento. Não conseguindo freá-lo, tentamos acompanhar o ritmo do girar, mas tampouco conseguimos: poucos são os que foram treinados o suficiente para compreender os meandros que o fazem girar.

Parece restar-nos duas alternativas: ou se entregar passivamente aos giros do caleidoscópio, ou fugir dele. Entregar-se é besteira: tentar aceitar que o mundo é assim mesmo e que nem da nossa vida temos controle poderá, no máximo, transferir nosso desalento com o mundo, com a vida, para outro ponto, mas não saná-lo.

Besteira também é virar as costas para o mundo: não conseguimos, vivemos nele, impossível fugir. Por isso essa alternativa nada alivia (além de que a única forma efetiva de conseguir o completo distanciamento do mundo e da vida é o suicídio, algo que não recomendo, mas tampouco recrimino).

O que eu sugiro, então, é aproveitar a beleza do caleidoscópio, sem querer pará-lo; não tentar integrar-se totalmente a ele, nem afastar-se demais. Enfim, tentar construir a própria vida, o próprio caminho, num meio termo entre o que se quer, e o que o mundo permite (o que já dá um trabalho danado, difícil de se alcançar, dependendo do que se quer – que o diga Policarpo Quaresma); comemorar cada vitória (presente e passada) ao invés de lamentar os fracassos. E estar sempre preparado e bem disposto para o futuro, mesmo quando este parece sombrio: até mesmo o amargo da vida é doce.


Campinas, 11 de novembro de 2002