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sábado, 2 de fevereiro de 2013

Conquistas, encontros e solidões

Um espetáculo solo numa coreografia que pretende tratar do encontro amoroso, da relação com o Outro. Soa curioso, mas a escolha de Sílvia Geraldi em Todas as tardes está longe de qualquer absurdo: podemos até ser uma inexperiência crônica na arte da conquista (como este que escreve), porém estamos longe de sermos virginais no encontro com o Outro: seríamos antes síntese dessa infinidade de encontros que foram nos formando, conformando, transformando no correr da vida, desde (via de regra) o encontro com o Outro-mãe.

Encontrar o outro é perder-se um pouco de si. Contudo, perdido de si é possível encontrar o Outro? Essa perda que parece tão sintomática da atualidade. Que encontros nos permitem as receitas dos manuais de sedução, que “dão dicas” (porque “ensinar” seria chamar claramente o leitor de ignorante) de flerte, de postura corporal, de frases-chave, de olhares cronometrados?

Não há muitos elementos de palco em Todas as tardes: um gravador portátil e três molduras de tamanhos variados, com rodinhas – com as quais Sílvia interage em alguns momentos. Numa dessas interações, com a moldura um pouco mais larga e alta do que ela, põe-se a correr com o acessório, deixa se levar por ele, apóia-se nele como se apoiasse no ombro de alguém – e a moldura escapa, evitando a entrega completa. Ao fim, dançarina e Outro-moldura acabam frente a frente, como em um espelho: encarar o Outro talvez seja encarar o reflexo de si mesmo. E Sílvia hesita se deve atravessar esse espelho: seria que isso seria a superação de si em direção ao Outro? Ou seria o consumo de si pela própria imagem? Seria o enquadrar-se? Ou seria a descoberta que para além não há nada – ao invés de um país maravilhoso, o deserto do real? Sílvia atravessa para logo retornar, desencontrada.

Táticas de guerrilhas, gestos ensaiados, ordens de não planeje como conduzir a conversa a abordagem: a exigência de confiança e firmeza, e a realidade de hesitações e insegurança. O fato da intérprete não ser uma jovem reforça a sensação de que não há fórmula pronta, de que cada encontro é um ato solitário de atirar-se até o Outro – ou pode ser um estar sozinho a dois, como diante da imagem fria no espelho.

São Paulo, 02 de fevereiro de 2013.