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quinta-feira, 23 de setembro de 2021

Prévias do PSDB: incapaz de se atualizar e sem projeto, o partido tenta sobreviver ao que ele próprio criou.

A elite financeira do país busca desesperadamente uma tal "terceira via", algum candidato que rompa com a pretensa polarização entre Lula (ou qualquer nome do PT) e Bolsonaro e garanta não somente seus lucros - que isso o PT fez -, mas o abismo social que impede qualquer questionamento ao status quo

Tirando Ciro Gomes - um coronel esclarecido que parece ter decidido seguir os rumos de José Serra e quer ser presidente a qualquer custo -, são nomes pífios, artificiais, sem nenhum apelo fora das bolhas endinheiradas e de seus asseclas iludidos da classe média. 

O PSDB seria o partido mais consagrado para fazer esse papel - desde que foi deslocado do polo antipetista, que ocupava desde 1994, pelo candidato da terceira via em 2018, Bolsonaro. Contudo, se os anos no poder não ensinaram muita coisa ao partido, os anos na oposição, menos ainda. No máximo - segundo alguns analistas - poderia ter aprendido algo nos anos como coadjuvante ou linha auxiliar em governos militarizados (Temer e Bolsonaro): se acaso o general Santos Cruz, ex-ministro de Bolsonaro, aparecesse como viável eleitoralmente para a terceira via, seria de bom tom estar em um partido consolidado (de uma "massa limpinha e cheirosa", como disse certa feita uma publicitária do partido, digo, uma jornalista de um jornal tradicional) para dar o verniz democrático necessário para apresentá-lo ao mundo globalizado. Parece que nem isso o PSDB aprendeu.

Dos nomes que se apresentaram como pré-candidatos, Arthur Virgílio e Tasso Jereissati entraram para marcar posição e tentar evitar que aconteça a nível federal o racha fratricida que houve em São Paulo. 

Eduardo Leite, que enquanto governador do Rio Grande do Sul pratica um neoliberalismo duro, de cartilha, antissocial e incapaz de pensar a curto, médio ou longo prazo, no lançamento de sua pré candidatura ficou entre clichês motivacionais e a incrível tese da grande mídia (que Maria Inês Nassif, há mais de uma década avisava que havia se transformado no verdadeiro partido de oposição) de que foi o PT, principalmente Lula, quem elegeu Bolsonaro - ou seja, está preparando o discurso da derrota. Talvez o mais interessante posto por ele foi uma postura menos personalista - algo que Haddad mostrou ser complicado na tradição política brasileira, mesmo em um partido com uma militância ativa e aguerrida [https://bit.ly/3EPYysv].

Doria Jr., por ser governador do principal estado do país, seria o nome mais natural. Contudo, sua aprovação como "gestor" do estado já mostra suas credenciais. Além disso, vale frisar que suas vitórias nas eleições de 2016 e 2018 se deram muito mais por uma confluência de fatores - bem aproveitados por seus publicitários -, que sincronizavam com seu discurso de ódio há anos exercitado (falei, quando Doria Jr. foi escolhido para ser candidato a prefeito, que isso desabilitava o PSDB do campo democrático [bit.ly/cG160201], e se ainda insistimos no partido como aliado da democracia é porque os padrões de comparação se rebaixaram excessivamente). Por mais que sua equipe de publicidade tenha tentado repaginar seu perfil de fascista que joga golfe para democrata que dialoga e defende a ciência - chegando a enganar alguns incautos muito predispostos a acreditar em qualquer coisa -, o tucano mostra que é o que sempre foi: um bom representante da elite de rapina nacional. Até aí, nenhuma novidade: esperar algo de uma classe que hesitou só de faz-de-conta na hora de apoiar um fascista com ligações com milícias, só para garantir o saque do estado e dos trabalhadores do país mostra qual o caráter dessa classe. Mais: ao fazer um discurso centrado no antipetismo (que é a encarnação de qualquer coisa que cheire a direitos sociais para o povo), sem alusão ao atual mandatário do país, Doria Jr. mostra que o fascismo nunca foi um problema e é, sim, uma opção válida para se atingir o poder.

Fora do discurso antipetista, Doria Jr. não foi além de platitudes de baixa intensidade que ele e seu partido sequer são capazes de seguir - não que isso seja problema eleitoral: a grande mídia vai fazer seu trabalho para que nada disso apareça. Inclusive, não deixa de ser irônico ele falar em pôr uma mulher como vice, quando foi quem articulou para que fosse Ricardo Nunes e não uma mulher, a vice na chapa de Bruno Covas, em 2020 [https://bit.ly/2ZyMBrn].

Do que foi apresentado pelo PSDB, notamos que o partido tenta se viabilizar eleitoralmente, mas não tem mais qualquer projeto de país, mesmo que em linhas gerais - quando muito segue a cartilha neoliberal dos anos 1990 que fracassou em toda a América Latina. 

Desde que Alckmin, em 2006, ao se ver obrigado a apresentar propostas concretas e perder votos do primeiro para o segundo turno com isso, o partido teve que assumir que seu projeto neoliberal não tinha chances de vencer as eleições - e o PT havia achado um flanco por onde vencer sempre -; ao mesmo tempo, seu caráter classista impediu que o partido revisse suas propostas econômicas, mesmo que em detalhes. Se falar de economia era derrota certa, Serra achou a solução em 2010: sua plataforma foi baseada em antipetismo e pautas morais reacionárias. Com isso começou a dinamitar qualquer veleidade do PSDB seguir como um partido sério e, pior, começou a esgarçar a própria democracia liberal do país (análises da Alemanha sob Merkel tem me interessado por permitir ver paralelos com o governo Lula e a forma como o status quo reagiu em cada país), esgarçamento concretizado por Aécio Neves, em 2014 (o que veio depois foi só consequência de uma democracia desacreditada, praticamente de fachada, pois não era respeitada pela oposição nem no básico de reconhecer o resultado eleitoral). 

O partido até largou das pautas morais, mas não consegue ir além do antipetismo e do neoliberalismo - todas essas três pautas apropriadas por Bolsonaro, a última de maneira velada no seu discurso ao grande público. Agora, com Doria Jr. e Leite, mostra que deve tentar se reinventar nas pautas morais, porém sem mexer no essencial da economia política e da exclusão social. Pior, mostra que vai seguir com o processo de fuga da discussão política, com o trato do adversário como inimigo - hesitei em chamar de "satanização do inimigo", mais afim aos tempos necroteopolíticos atuais -, e uso de um bode expiatório que só convence os convertidos - mas prepara terreno para a aceitação de um futuro golpe que termine de enterrar nossa moribunda democracia.


23 de setembro de 2021