terça-feira, 13 de junho de 2017

Lava Jato em dois tempos: há listras e estrelas - e há as nossas elites ineptas.

Fernando Horta sugere que sigamos devagar com o andor em apontar o dedo para o Tio Sam na orquestração do golpe e do colapso político (e econômico) brasileiro [http://bit.ly/2rWS8EJ]. Ainda que não ache que os Estados Unidos sejam os grande protagonistas do que vivemos atualmente, não consigo não vê-los em papel de destaque; e se nos faltam provas da participação estadunidense - afinal, ainda não foram disponibilizados os documentos dos EUA sobre este passado tão recente -, há uma série de elementos que reforçam a hipótese de influência externa.
Influência não quer dizer determinismo: sem nossas elites interessadas na defesa de seus privilégios e ávidas em reafirmar seu poderio frente os trabalhadores e os descamisados, não haveria golpe algum, participasse os EUA ou não. Como Horta comenta, os EUA não são exatamente um primor de eficiência quando buscam garantir seus interesses pelo globo - e cita o exemplo da Baía dos Porcos e do Afeganistão. Contudo, os EUA ainda são eficientes em desestabilizar o mundo, como no caso do próprio Afeganistão ou nos diversos conflitos que eclodiram após a chamada primavera árabe. Horta também fala de empresas e interesses capazes de ações internacionais por cima do governo - a questão é o quanto é possível fazer uma distinção drástica entre os interesses desses atores e do governo estadunidense, sempre em parcerias muito próximas, por mais que não possam ser tratados como uma coisa só.
Dado o papel principal às nossas elites, questiono a extensão da participação dos EUA. A Lava Jato possui claramente duas fases, dois momentos bem distintos. No primeiro deles (2014-2015), ações precisas, com provas e não convicções, acertam em cheio os pontos estruturantes do relativo protagonismo que o Brasil vinha ganhando com os governos petistas: empreiteiras, segurança nacional, com o submarino atômico, e, principalmente, petróleo. Dos grampos telefônicos da NSA à presidenta Dilma, além de uma série de outros grampos que é de se imaginar que correram solto no país, passando pelo treinamento de Moro e outros nos EUA, tudo leva a crer que se sabia onde estavam os pontos que poderiam ser "descobertos" e provados rapidamente. A novidade no uso das prisões preventivas como forma de tortura evitou questionamentos mais enfáticos à legalidade do método das "delações premiadas", assim como acusações de seletividade política eram caladas na medida em que o recorte era preciso em determinadas ilegalidades - sem, até então, a predominância do discurso messiânico-religioso de salvar o país da corrupção (atéia e comunista?) do pato Dallagnol. Pode-se definir essa fase como uma "operação asséptica", uma blietzkrieg econômica-geopolítica. E precisava ser rápida, porque seu fôlego era curto e logo seria tripudiada em seus métodos. Os resultados favoráveis aos EUA não demoraram para aparecer, não só com o enfraquecimento da Petrobrás, assim como na abertura do pré-sal às petroleiras internacionais, ainda no governo Dilma [http://bit.ly/2sk5sn9].
Ainda mais quando comparado ao segundo momento da Lava Jato, fica a forte impressão de que Moro e a república de Curitiba foram inicialmente atores de uma peça escrita alhures, e cumpriram bem seu papel. No segundo momento, os atores resolveram assumir a condição de autores e descambamos para o estado de exceção ao melhor estilo do III Reich. Prisões arbitrárias infinitas (ou até uma delação premiada falando em PT e Lula), delações sem provas, violação explícita da constituição, power points toscos, convicções como condição de prova de crime. A esbórnia tomou conta de Curitiba e da nação a partir de 2015. É quando, ao que tudo indica, nossa elite tomou as rédeas da situação. A perseguição política de Moro e pato Dallagnol ao PT e a Lula passaram a ser evidentes, e a falta de qualquer decoro do judiciário foi além de Coronel Mendes e seu pupilo D.T. e se tornou carne de vaca - não me refiro aqui à Operação Carne Fraca ou à delação da JBS. Em São Paulo, a PM foi usada como milícia tucana [http://bit.ly/2rrQ3gs], um oficial do exército agiu à revelia da Comandante em Chefe, espionando movimentos sociais por mais de um ano até forjar um ridículo flagrante contra adolescentes [http://bit.ly/2sYkwF5], e em Brasília, bem, em Brasília todos os piores estereótipos sobre políticos subiram o Planalto com Temer e sua camarilha, para melhor destruir a Constituição, os direitos sociais e qualquer possibilidade de vida minimamente digna a milhões de brasileiros.
Ainda que tenha participado de golpes similares anteriormente, em Honduras e no Paraguai - vale lembrar o nome da embaixatriz Liliana Ayalde -, não me parece que esse segundo momento fosse do interesse dos EUA, não só por permitir a eventual ascensão de um político progressista (Lula, no caso) ou destemperado (ninguém aqui, por enquanto), como por não ser nada positivo aos seus interesses geopolíticos ter a grande potência regional à deriva, sem poder contribuir para garantir a estabilidade na região.
Em resumo: sem nossas elites, não teria Lava Jato, não teria golpe, não teria o colapso político e caos econômico que vivenciamos. Concordo com Horta que buscar um inimigo interno é fugir das próprias responsabilidades e, mais, é deixar passar o principal - a conclusão de sua análise é precisa. Porém, até pelo primarismo de nossas elites, é difícil não acreditar na colaboração efetiva dos EUA - se governo, CIA, Departamento de Estado, think tanks, empresas, universidades ou o que for, não importa - como fator fundamental do sucesso inicial da Lava Jato - mentores e capitães da operação de desmonte do parco protagonismo brasileiro - e do caos que nos impusemos a seguir.

13 de junho de 2017

terça-feira, 6 de junho de 2017

Cena banal - 06 de junho

Três da tarde. Em um dos calçadões do centro de São Paulo, sob um céu plúmbeo escondido pela marquise de uma loja fechada pela crise, enrolado em um cobertor cinza, dorme uma pessoa. Perto dela está parado um homem, moreno, negro - tenho dificuldade com nossa sutil paleta de cores humanas, útil para disfarçar nosso preconceito racial. Ao desviar a vista deles e olhar para meu caminho, me assusto ao me deparar com três militares vindo em minha direção. Rapidamente noto meu engano. Ao notar os três PMs se aproximando, o homem se vira e põe as mãos na parede - o outro seguirá dormindo até o momento que acompanho a cena. Não sei o que se passa dentro dele, mas a cena é um conformismo pavloviano: o cão que sempre apanhava depois do sino, passado um tempo começa a chorar só de ouvir o sino; passado outro tempo, não chora mais nem quando apanha. Um dos PMs já tirou a arma do coldre, carrega-a na mão. A subserviência daquela pessoa de nada serve: os policiais militares são rudes (afinal, olha a cor, olha a roupa, olha os modos): as mãos são cabeça, não na parede. Fica evidente que não há ali respeito à lei: o homem não teme um processo, a prisão, a pena por algum crime; o que teme é a arma na mão daquele que se diz garantidor da lei e da ordem: ele sabe, por ser preto pobre periférico, que se não baixar a cabeça e se mostrar temeroso e servil pode apanhar (como o aluno na escola pública de Alagoas [http://bit.ly/2rIEJhU]), ser preso por desacato (quem sabe por tráfico, se for muito arrogante [http://bit.ly/2sPcEEP]), ou morrer num auto de resistência, mesmo que nunca tenha encostado em uma arma de fogo e em um baseado. A exemplo de tantas abordagens dos militares a pessoas negras, humildes e periféricas que tenho presenciado ultimamente, provavelmente nada encontrarão com aquela pessoa, que será dispensada depois de toda a humilhação, mas a abordagem contará pontos no índice de produtividade dos PMs, no seu duro combate ao crime. Pouco adiante, vejo outra cena corriqueira: um homem corre atrás de outro gritando "pega ladrão". Não pegaram: a PM estava ocupada combatendo os pobres.

06 de junho de 2017


domingo, 4 de junho de 2017

Entre a platitude e o preconceito: sobre Diásporas, da Companhia Elevador de Teatro Panorâmico

Fazer uma obra sobre algo que não se vivencia nem vivenciou pessoalmente é complicado, mas não impossível - há quem argumente a questão do "local da fala", legítimo, mas se a arte se restringisse ao que foi experienciado em primeira pessoa, já teria há muito sido substituída por completo pelo divã. Esse escrever sobre o estranho - e sobre o outro -, entretanto, exige certos esforços - e mesmo sensibilidades - para não resultar em um fruto descartável. Tomar conhecimento pela produção "racional" do assunto, como teses acadêmicas, artigos e reportagens diversas, é um bom começo. Pesquisar outras formas de discurso sobre o tema, como o literário, fílmico, das artes visuais, instalações, etc, é outro bom instrumento. Ajuda também entrar, de alguma forma, em contato direto com o outro que sofre ou sofreu aquilo sobre o que se pretende debruçar. Mas esse entrar em contato exige certa porosidade do artista e um olhar mais atento a sutilezas, que vai do radicalizar o estranhamento ao tentar se irmanar dessa experiência - se for para buscar o outro para que esse aprove o discurso que o artista já tem elaborado de antemão, melhor buscar logo uma tese acadêmica, poupa o tempo de todos. Certamente há mais formas de ganhar repertório, mas não nos alonguemos neste preâmbulo.
Cássio Pires parece ter feito ficado com preguiça de levar a sério essa fase de estudos e preparação (tempo ele teve, foi um ano de montagem) ao escrever o texto para Diásporas, da Companhia Elevador de Teatro Panorâmico, dirigida por Marcelo Lazzaratto - que parece não ter conseguido perceber que a pretensa universidade do gestual ocidental é bem específica da cultural do ocidente judaico-cristão moderno, e não diz respeito a todos os povos, todas as culturas, todos os tempos.
Diásporas conta a história de três povos fictícios: um do mar, um do deserto e um das montanhas, obrigados a migrar em épocas diferentes por culpa de imperialismos clichês - EUA, Inglaterra e França -, e que terminam por se encontrar numa mina de carvão abstrata. É dividia em dois atos, mas possui três partes, que Lazzaratto chamou de movimentos. No primeiro movimento, sem fala, esboça-se o que seriam os costumes de cada um dos povos em seus ambientes - danças, festas, brincadeiras, rituais. Claramente introdutória, deixa a expectativa de que a partir dali se construirá cada uma das histórias - porque em si é uma parte fraca, pobre. Expectativa frustrada. No segundo movimento, agora com fala, temos pinceladas de conflitos internos e das causas da migração de cada povo. É quando a peça começa a desandar. O preconceito dos autores é evidente e posto toscamente: na construção precária e lacunar das frases - beirando o "mim Tarzan, você Jane" - e na estereotipia exagerada dos movimentos, notamos que não são apenas povos "primitivos", e sim que beiram o animalesco - tirando o povo das montanhas, ao que tudo indica morador de algum sertão da Europa (a se entender pelo interesse francês em abrir lá um hotel em 1899), que são capazes, aí sim, de construir frases na sua plenitude, tem até crendices primitivas e tem-se muito claro que são pessoas e não meio humanos, meio cabras
Sem maiores esperanças para o segundo ato (e terceiro movimento), esperei para ver se Pires e Lazzaratto conseguiriam salvar a peça - e como. Tentam aliviar o preconceito no discurso dos fuzileiros navais, discutindo entre si a palestra de um professor acadêmico sobre os povos primitivos. Além de ser uma tempestade de clichês rasos e senso comum, não salva o preconceito do primeiro ato: nele vimos não a visão dos colonizadores, mas a apresentação dos povos na sua animalidade. O que vem a seguir segue essa toada: preconceitos na caracterização dos povos migrantes, discursos rasos dos civilizados, seja no papel da religião ou do exotismo, e um final que tenta problematizar o "oprimido-opressor" do imigrante-outro para acabar no clichê mais clichê.
(Parênteses técnico: para ajudar a piorar a peça, mal iluminada do início ao fim, com cabeças no escuro e um metro de palco de cada lado na penumbra - e ainda assim utilizada pelos atores. Não sei se foi só problema de afinação, ou foi de desenho também, tímido em usar todo o equipamento que o Sesc possui. Como pontos positivos: a trilha sonora, feita ao vivo - realmente muito boa! -, e a produção gráfica do programa. Por sinal, parece ser uma característica recente do Sesc: diante da sua (ao que tudo indica) enorme bonança financeira, ao invés de investir em outro espetáculo, talvez mais modesto (mas de boa qualidade), dissipa-se na produção de primeira qualidade do programa, algo que será jogado fora logo a seguir, muitas vezes sem ser lido - um verdadeiro potlatch de verbas para a cultura. Fim do parênteses.)
São quase três horas de uma montagem enfadonha que transita entre o senso comum e a platitude - isso nos seus melhores momentos. Ao que tudo indica, o dramaturgo estava ciente disso, a ponto de avisar no programa que "talvez (...) esta não seja uma peça sobre o 'outro' (...). Se Diásporas é alguma coisa, talvez seja isso: uma ficção sobre nós que, quando não somos de fato migrantes em algum nível, ao menos guardamos em nós as marcas ancestrais da experiência da migração". Clichê e vazio como a peça: não somos palestinos, haitianos, curdos, sírios, senegaleses, bolivianos - sequer nordestinos ou nortistas fugidos da seca ou da (quase) total falta de perspectivas -, e o fato de todos termos umbigos não nos habilita para acharmos que temos qualquer universalidade na nossa experiência de migração (da Vila Madalena para Lapa para Santa Cecília para outro bairro da moda?). Achar que há marcas ancestrais em toda pessoa é de um romantismo adolescente de quem nunca teve um encontro verdadeiro com um migrante ou imigrante (e falo isso por já ter compartilhado de visão semelhante, até ter deitado por terra qualquer ingenuidade do tipo com meus anos de colaboração com o Serviço Pastoral dos Migrantes (ainda correndo) e um namoro com uma imigrante taiwanesa). Ler de Cássio que "creio que não há nada de particularmente novo a se dizer sobre a experiência migratória" me ofende: é de uma pretensão infantil de quem não acompanha sequer as notícias diárias mais espalhafatosas sobre o assunto, de quem não tem qualquer interesse pelo drama particular de cada migrante e imigrante, e parece crer, com base em tudo o que não sabe, que será capaz de criar qualquer coisa que valha só com o pouco que traz na cachola.
Tanto pelo que apresentou no palco como pelo que disse programa, mais conveniente que Diásporas se chamasse Reflexos narcísicos de uma alma acomodada, O outro - eu mesmo (para ironizar Kertész), Eu, eu mesmo e Irene, ou algo assim, e não tentasse enganar o público que, levado pelo título e pela sinopse, imaginava algo sobre migrações, alteridade, o outro...


04 de junho de 2017

PS: Acho chato falar mal do trabalho alheio, afinal, é evidente que não foi algo feito de qualquer jeito. Entretanto, fazer arte é estar sujeito a erros e a críticas.

quinta-feira, 1 de junho de 2017

O fascismo se enfia pelas frestas

Costumo dizer que o fascismo se enfia pelas frestas, como um gás inodoro que toma o ambiente sem que percebamos. Sutilmente altera a forma como percebemos o mundo, o outro, a nós mesmos; naturaliza a barbárie e nos anestesia para o horror. Se casos mais visíveis ainda nos chocam - como as ações de Doria Jr à frente da prefeitura de São Paulo, a cobertura da grande imprensa das notícias políticas do país, as falas de ódio de Bolsonaros, Gentilis e Malafaias da vida; ou as ações de milicianos pagos pelo PSDB e DEM -, é pela rudeza dos seus atores: quando o fascismo ocupa os espaços sem dizer seu nome, no máximo causa um sopro de indignação - como o caso do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, autorizar publicamente julgamento e extermínio extra-judicial dos seus subordinados, ao defender ações indefensáveis da PM com seu "quem não reagiu está vivo", sendo que há imagens e mais imagens (para não falar nas testemunhas e laudos periciais) a mostrar policiais atirando em gente indefesa. Uma das característica do que estou chamando aqui de fascismo (na falta de termo melhor) é a reificação da pessoa, seu rebaixamento do status de "ser humano", tratado como número (estatístico ou capital-mercantil), ou como algo descartável, disponível para qualquer arbitrariedade de quem detém o poder.
Guy Debord, em 1967, definia o fascismo como o "arcaísmo tecnicamente equipado" (tese 109 d'A Sociedade do Espetáculo), e a sociedade em que vivemos - a espetacular - como aquela em que o mais moderno e o mais arcaico se encontram unificadas (tese 23). Da democracia liberal para o fascismo totalitário, basta um breve cochilo. A universidade, como principal centro produtor de conhecimento técnico da sociedade, não podia deixar de dar sua contribuição para o fascismo - afinal, sem seu otimismo e contribuição para com o progresso científico, o século XX teria sido muito diferente. Não quero com isso desqualificar a academia, apenas alertar para o fato de que se ela não se puser em constante autocrítica, logo estará fornecendo quadros para novos Auschwitz, em troca de pessoas sub-humanas, de baixo valor social (como mídia e poder público hoje tentam vender os crackeiros) para experimentos em prol da evolução da ciência e da humanidade.
Fiz esse preâmbulo com ênfase na universidade porque foi com uma dose de choque que li, em meados de maio, a notícia sobre o falecimento de um professor da Faculdade de Medicina da USP, no portal da universidade.
Além de falar de onde estava sendo o velório e seria o enterro, a notícia trazia algumas outras informações sobre o professor. Dizia a área em que atuava, onde havia se formado e feito seus estudos de pós-graduação. Até aí, normal: apesar de uma série de mudanças estruturais, ainda vivemos em uma sociedade do trabalho, uma sociedade em que a ocupação laboral é vista como marca da personalidade da pessoa (ou do seu descaminho, vide o qualificativo de "vagabundo" para qualquer um que questione ou fuja à ordem), e a universidade pública, via de regra, é reforçadora da ordem social.
Talvez por ter lido por alguns anos o obituário de um jornalecão, admito que esperava ler algo também sobre a pessoa que havia perdido a vida: se tinha filhos, esposa ou marido, se era estimado por alunos e colegas, se jogava futebol ou gostava de dançar tango. Nada. Pensei que poderia ser a pedido da família, que preferiu evitar qualquer exposição - e por isso, inclusive, evito citar seu nome. Vamos, então, crer que nada pessoal foi publicado a pedido da família. Justo. A notícia poderia (deveria?) acabar ali: onde se formou, onde será enterrado, ponto. Não. O jornal da USP quis falar mais sobre o professor e dedicou a ele seis parágrafos, onde apresentou o horror fascista em dose homeopática.
A crer pelo que li, o que se perdeu ali não foi a vida de uma pessoa, mas um produtor de estatísticas acadêmicas. Alguém que poderia se chamar Maria ou se chamar João, que não seria rima, nem solução e não faria falta alguma, se não produzisse centenas de artigos e referências e, consequentemente, aumentasse o status da universidade no índice internacional de citações científicas. Parece que o que a universidade perdeu foi um computador de produzir referências.
Não consegui saber se o professor era casado, mas soube que seu h-index variava entre 11 e 20! O que é um h-index?, nem idéia. Teve quase 150 coautorias em trabalho, mais de 70 artigos e quase 80 participações em congresso. Seu livro tem mais de mil citações acadêmicas. Cito todos os números que usaram para descrevê-lo: 2, 2, 70, 79, 1000, 48, 500, 11, 52, 500, 11, 20, 5, 7, 4, 144. Seria um algoritmo? Uma versão mais moderna do HAL 9000? Para além dos números, sobre o que ele falava, escreveu, o que pesquisava e ensinava? Nenhuma palavra. A USP o tratou como uma máquina de produzir estatística em forma de artigos - e cometeu até uma falha grave na tarefa a que se propôs: não informou se era professor MS-4, MS-5 ou MS-6.
Parece que o jornal da USP não percebeu: morria ali uma pessoa. E não vi ninguém se indignar com esse lapso na notícia.

01 de junho de 2017