quinta-feira, 20 de novembro de 2003

O esporte é o ópio do povo

Assistindo a um noticiário na globo, vejo a entrevista de um rapaz. Diz o repórter “em 93 fulano (não me lembro o nome do infeliz) podia andar de cabeça erguida, hoje...” e é o entrevistado quem completa “hoje está uma tristeza”. Falta apenas ele começar a chorar.

Mas o que houve para que esse rapaz tenha mudado tanto em nove anos? Será um desempregado, lembrando-se do tempo em que tinha um emprego? Será um empregado, lembrando-se do tempo em que tinha um salário que comprava mais que uma cesta básica? Nada disso, era um palmeirense que se envergonhava do time atual e recordava as glórias passadas.

Esta semana, ao caminhar pela faculdade, quatro de cada cinco conversas falavam do rebaixamento do time alviverde. Já quase não se lembravam de quem é o tal de Lula, e muito provavelmente não sabem das últimas (intermináveis) turbulências no Oriente Médio e na Venezuela.

Concordo com aqueles que dizem que não devemos nos restringir apenas a assuntos sérios, que precisamos de algumas distrações. Mas daí para o que vemos nos esportes – no caso brasileiro, mais especificamente, o futebol – a distância é grande.

Os esportes têm hoje cada vez menos a função de passatempo (se é que algumas vez tiveram), e são tomados como assunto sério. As discussões sobre futebol são para a “grande massa” da mesma importância e gravidade que as discussões acerca de política e economia são para a dita “elite”. Os estádios que (creio) poderiam ser uma forma de catarse para muitos, ao se reunirem a uma multidão para gritar e pular, não cumpre esse papel, pois o futebol não é uma simples diversão, que terminará quando acabar o jogo. O fato de haver jornais e revistas especializados mostra que o futebol é assunto sério, não apenas para os que deles vivem, como também para os torcedores. Nos grandes jornais do país, o espaço dado ao caderno esportes costuma ser, pelo menos, do mesmo tamanho que o dado às artes (uma outra forma de distração, muito mais construtiva que o esporte). Dificilmente vemos a foto principal da capa de um jornal dada a um escritor ou a um quadro, mas ao Palmeiras, ao Barrichello, à seleção, isso não é incomum.

O filósofo francês Robert Redeker, numa entrevista à revista Carta Capital (edição 153), disse que o esporte é pior do que a religião. Esta, bem ou mal, ao menos criou toda uma sociedade; e o primeiro, o que fez?

Não podemos ficar presos a assuntos sérios, mas também não podemos fugir deles. Transformar o que deveria ser diversão em assunto importante é como querer tratar política e economia como assuntos menores: é preciso haver uma certa distinção entre o que é sério e o que é divertimento, para não se fechar apenas em um assunto. Se o futebol é tratado como assunto sério, passa a servir tanto para bate-papo de botequim, como discussões sérias; e a política, que horas entra? E a discussão sobre os rumos do país? Sobre o valor da cesta básica ser igual a um salário mínimo?

Talvez Marx esteja errado: o esporte é o ópio do povo.

Campinas, 20 de novembro de 2002

quarta-feira, 19 de novembro de 2003

Um ano e meio

Fui hoje assistir a uma palestra sobre o governo Kirchner, com Atilio Borón, um dos principais sociólogos argentinos, professor da Universidad de Buenos Aires. Comentou vários fatos interessantes do presidente argentino, como a luta pelos direitos humanos, enfrentando para tal o exército e boa parte da elite argentina, e os caminhos neoliberais que o governo tem tomado apesar do acordo favorável, segundo a mídia, com o FMI (foi o maior superávit com o qual a Argentina já se comprometeu).
Mas uma coisa que me chamou a atenção foi a teoria que ele tem, baseado em Maquiavel, principalmente, de que um governante eleito sem o apoio da elite tem entre um ano e um ano e meio pra propor mudanças e tem que propô-las com convicção. Esse um ano e meio é quanto dura o mandato de um governante. Depois disso, resta-lhe administrar o Estado, sem qualquer chance de novas
mudanças. Como exemplo, ele citou Bill Clinton, que era a promessa de um Roosevelt do fim do século. Depois de eleito tentou reformar o sistema de saúde dos EUA, mas não se mostrou muito convicto, e depois de brigar um ano, se conformou com sua derrota e se tornou apenas mais um presidente estadunidense, sem nenhum brilho especial.
Moral da história: O governo Lula foi, até agora, um mero administrador da crise, sem sinalizar a menor mudança no modelo neoliberal, pelo contrário, tem aprofundado-o com uma nova leva de reformas neoliberais. Se Borón estiver certo na sua teoria de que um presidente tem de fato o primeiro ano e meio de mandato pra fazer as mudanças mais radicais que ditarão os rumos do governo, estamos perdidos.

Campinas, 19 de novembro de 2003

sexta-feira, 14 de novembro de 2003

Uma visão distorcida

Durante o governo FHC era comum abrir o jornal e deparar com o então ministro da educação, Paulo Renato de Souza, defendendo o financiamento do ensino superior por aluno e não por instituição. Era grande meu medo de que num eventual governo Serra, tal proposta fosse, finalmente posta em prática. Mas eis recebo a Folha e hoje e o que diz a primeira página? Que o ministro Palocci pretende cortar gastos com o ensino público. Votei no Lula, com a esperança de mudar, mas seu governo vem com o mesma idéia do
governo FHC, importada do Banco Mundial, e que dizia combater. Defender esse tipo de financiamento é típico de quem não conhece as especificidades da universidade pública brasileira, assentada no tripé ensino-pesquisa-extensão (e não somente ensino), e mais do que isso, ignora que o fato da universidade pública ser ocupada por alunos mais abastados é conseqüência da debilidade do ensino fundamental e médio ministrados pelo Estado.
O ensino superior de qualidade é pré-requisito básico para qualquer país que deseja ser uma grande nação, e a melhor forma de corrigir as distorções sociais do sistema brasileiro é um investimento maciço em educação fundamental e média, de forma a permitir ao aluno do ensino público, além de um formação cidadã, competir em pé de igualdade com o do ensino privado pela vaga na universidade pública.
Felizmente Cristóvão Buarque conhece nosso país e se opõe ao projeto da fazenda.

Campinas, 14 de novembro de 2003

terça-feira, 11 de novembro de 2003

O caleidoscópio da vida

Não sei se esse desencontro com o mundo que muitos reclamam é privilégio apenas daqueles que tentam seguir um caminho alternativo. Muita gente que soube se adequar ao Sistema também reclama estar sem rumo.

Esperamos que o mundo seja um quadro de Monet, mas ele é um caleidoscópio: os elementos são sempre os mesmos, mas o arranjo muda a cada momento. E tentamos fazer o caleidoscópio parar de girar, mas é inútil: a vida é movimento. Não conseguindo freá-lo, tentamos acompanhar o ritmo do girar, mas tampouco conseguimos: poucos são os que foram treinados o suficiente para compreender os meandros que o fazem girar.

Parece restar-nos duas alternativas: ou se entregar passivamente aos giros do caleidoscópio, ou fugir dele. Entregar-se é besteira: tentar aceitar que o mundo é assim mesmo e que nem da nossa vida temos controle poderá, no máximo, transferir nosso desalento com o mundo, com a vida, para outro ponto, mas não saná-lo.

Besteira também é virar as costas para o mundo: não conseguimos, vivemos nele, impossível fugir. Por isso essa alternativa nada alivia (além de que a única forma efetiva de conseguir o completo distanciamento do mundo e da vida é o suicídio, algo que não recomendo, mas tampouco recrimino).

O que eu sugiro, então, é aproveitar a beleza do caleidoscópio, sem querer pará-lo; não tentar integrar-se totalmente a ele, nem afastar-se demais. Enfim, tentar construir a própria vida, o próprio caminho, num meio termo entre o que se quer, e o que o mundo permite (o que já dá um trabalho danado, difícil de se alcançar, dependendo do que se quer – que o diga Policarpo Quaresma); comemorar cada vitória (presente e passada) ao invés de lamentar os fracassos. E estar sempre preparado e bem disposto para o futuro, mesmo quando este parece sombrio: até mesmo o amargo da vida é doce.


Campinas, 11 de novembro de 2002

sexta-feira, 7 de novembro de 2003

De quatro Brasil!

Na era do tucanato, o Simão costumava vir com a seguinte piada, depois do Brasil apelar ao FMI: diz que o Malan tinha ido aos EUA, acertar o acordo com o FMI, mas no dia da reunião chovia, e para não chegar com a calça suja, o ex-ministro levantou a barra. No elevador, o ascensorista notou que o ministro esquecera a barra levantada e falou: 'senhor Malan, o senhor não
vai baixar as calças?', a resposta do Malan foi 'calma, deixa eu tentar conversar antes'.
Na era do PT, essa piada não funciona, afinal, um governo que aumenta por livre e espontânea vontade o superávit primário pra 4,25% do PIB, os juros para 26% mostra que não está disposto a dialogar: já chega pro FMI de calça abaixada. Então, nada de surpreendente o novo acordo com o FMI, mesmo sem que o Brasil necessitasse. O governo Lula mostrou que não vai pro FMI só de caixa abaixada, mas também já na posição adequada (e quem toma o ferro somos nós).
O que indigna é o PT mostrar que tudo o que ele disse quando oposição era bravata. Na eleição de 98 o partido atacou FHC por não dizer na sua campanha que costurava um acordo com o fundo. Em 2002 o PT também não disse nada à respeito de um novo acordo. Mas o caso do PT é pior, afinal o PT sempre atacou as idas ao FMI, e quem votou nele na última eleição imaginava que assim seria no governo. Afinal, o PT até bem pouco tempo atrás era a favor de uma auditoria e da renegociação da dívida externa. A Folha de São Paulo trouxe quatro frases de petistas sobre o FMI, um bom
exemplo de como o PT é um partido tão ético quanto o PFL ou o PMDB: "Todo país que vai ao Fundo é um país que se mete em enrascada". A frase é do ministro do planejamento, Guido Mantega, e pode não parecer, mas foi dita quando ele já era ministro. Se ele está correto, o Brasil acaba de se enfiar numa bela encrenca, e o pior, sem necessidade.
"O PT não pode se acomodar e achar que é possível o país se desenvolver e crescer dentro dos parâmetros da política econômica que existe hoje. A Argentina está mostrando o desastre para o qual as orientações equivocadas do FMI podem levar". Frase do ministro da casa civil, José Dirceu, em dezembro de 2001. Assim sendo, o espetáculo do crescimento fica, na melhor das hipóteses para 2005. E bem lembrou o ministro do caso da Argentina: De La Rúa caiu porque seguiu as políticas desastradas do governo anterior. "O FMI não existe para ajudar o país ou ajudar o povo. Existe para ajudar os credores". Algum comentário sobre pra quem Lula governa?
E por fim: "O Malan não sabe o que é o desemprego. O presidente FHC e o Armínio Fraga também não sabem. Se soubessem, certamente o Brasil não estaria subordinado à especulação financeira e ao FMI". Pelo jeito o presidente esqueceu o que é desemprego (se é que alguma vez ele realmente soube). Ou então crê que esse é um problema secundário: o importante, antes de mais nada é agradar os mercados, afinal são os mercados que investirão em saneamento básico no Brasil, não é presidente? Pode-se argumentar que o acordo, como o Brasil não estava desesperado, não foi tão ruim, afinal, diminui o superávit, permite investis 2,9 bilhões de reais em saneamento básico e discute-se deixar de contar parte dos investimentos das estatais como gastos.
Algumas observações: 1) enquanto aqui nós apertamos o cinto pra ter um superávit de 4,10%, na União Européia os governos não podem ter um DÉFICIT maior que 2,5% do PIB, e olha que na Europa as necessidades são bem menores que no Brasil; 2) os 2,9 bilhões de reais correspondem a 1,63% do necessário para universalizar o abastecimento de água e esgoto no país; e 3) um governo que se dispõe por conta própria a aumentar o superávit, e pra isso corta gastos sociais, em segurança pública (o governo liberou 4,98% das verbas previstas para o Fundo Nacional de Segurança Pública), na saúde, você acha que vai gastar 2,9 bilhões abrindo buracos sem nenhuma visibilidade eleitoral?
Nessas horas que eu digo: Kirchner para presidente!

Campinas, 07 de novembro de 2003

quinta-feira, 6 de novembro de 2003

O autoritarismo não acabou

Estava eu hoje com minha namorada na cantina do Núcleo de Estudos de População (NEPO) da Unicamp, conversávamos, ela sentada em meus joelhos, mas nada que fosse ofensivo ou considerado atentado ao pudor. Mas eis que passa um senhor e, como se estivéssemos em pleno coito, agressivamente se dirige a nós, pergunta de onde somos, e exige com que ela saia do meu colo,
pois "isto é uma instituição de pesquisa séria", argumento - se é que pode ser chamado de argumento - totalmente furado, afinal aquilo era um espaço público e não fazíamos nada de mais. Mas ele, claro, não se contentou com esse "argumento", e logo usou um que pode ser chamado de argumento de autoridade: "sou diretor deste núcleo". Uma clara demonstração de autoridade, em um assunto que não lhe cabia respeito. Não pudemos fazer nada além de aceitar a ordem, pois minha namorada trabalha lá, mas ficou na boca uma boa porção de revolta. Exemplos parecidos têm às pencas nas escolas e universidades - eu mesmo já tive alguns problemas ao questionar essa "autoridade" - e, creio eu, em qualquer emprego. Enfim, qualquer lugar em que haja uma hierarquia,
subordinados.
Parênteses: não que eu ache ruim autoridade, mas há uma grande diferença entre autoridade e autoritarismo: o primeiro se conquista, o segundo se impõe.
Mas enfim, estou reclamando de barriga cheia. Picuinha de pequeno-burguês, coisa pra revoltinha de uma crônica e fim. Entretanto, se é assim numa universidade pública, onde está boa parte da elite nacional, imagine como não é com os menos favorecidos.
Uma música do grupo O Rappa dá uma boa mostra disso: "A viatura foi chegando devagar, e de repente, de repente, resolveu me parar. Um dos guardas saiu de lá de dentro já dizendo 'aí cumpadi, 'ce se perdeu, se eu tiver que procurar 'ce tá fudido, acho melhor 'ce ir deixando este flagrante comigo'. No início eram três, depois vieram mais quatro, agora eram sete os samurais da extorsão, vasculhando meu carro, metendo a mão no meu bolso, cheirando a minha mão. De geração em geração todos no bairro já
conhecem essa lição. E eu ainda tentando argumentar mas tapa na cara pra me desmoralizar, tapa na cara pra mostrar quem é que manda".
Por que estou falando tudo isso? Já ocorreram em São Paulo, segundo li, quase 30 ações contra policiais. Sem dúvida, obra do crime organizado com o intuito de amedrontar o Estado. As classes abastadas se apavoram com isso, acham uma calamidade, mas muito provavelmente o pessoal de Capão Redondo, Diadema, devem estar se sentindo, de certa forma, justiçadas. Estão errados? De jeito nenhum. Quantos não comemorariam caso o general Médici fosse assassinado?
Autoritarismo só gera ódio e revolta, e a culpa (não tenho receio em apontar um culpado) é de quem é autoritário.

Campinas, 06 de novembro de 2003

domingo, 2 de novembro de 2003

Falta espelho

Falei ontem do provérbio chinês que dizia que devemos dar três voltas ao redor de nossa casa antes de sairmos para consertar o mundo. Queria falar do Lula, mas acabei saindo do caminho. Não tem problema, falo hoje. Não sei se o Lula conhecesse esse provérbio, creio que não. Se conhecesse talvez não falasse tanta besteira como é de seu costume. Poderíamos mudar o provérbio, no caso de Lula, para "Lula, dê três voltas ao redor de sua casa antes de falar qualquer coisa."
O bate boca entre Lula e FHC é um espetáculo deplorável, que só mostra o tamanho do ego de cada um, e o quanto falta um mínimo de auto-crítica para os dois.
FHC, que afundou o país no seu populismo cambial, na sua privataria (como diz Elio Gaspari), tinha mais é que ficar calado no seu canto, ainda mais se fosse para criticar o atual governo, que não faz absolutamente nada diferente do que ele fez.
Agora foi a vez de Lula chamar seu antecessores de covardes. Pode até ser que ele tenha razão, não entremos nessa questão, mas o fato é que Lula e sua tropa de choque não têm envergadura moral alguma para falar isso. Afinal, quem tem mostrado covardia além da conta é ele e seu governo. Covardia perante os mercados, perante o FMI, aumentando de livre e espontânea vontade o sofrimento do povo brasileiro para satisfazê-los, ignorando o povo que votou por mudança, por empregos.
Covardia perante a Monsanto e os ruralistas, contemplando um ato ilegal (o plantio de soja transgênica na safra passada), e afrontando novamente a constituição para esta safra.
Covardia perante o lobby das cervejarias, das empresas de publicidade e das emissoras de tv, permitindo que o dinheiro falasse mais alto que a saúde pública, ao não desautorizar a propaganda de uma droga.
Mas o governo Lula não é só covardia, ele também é, segundo ele próprio, coragem, mas poderíamos dizer que é prevalecido.
Com os aposentados, de quem o governo não teve medo, e cortou as aposentadorias.
Com os sem-terra, para quem a reforma agrária está praticamente parada. Com a população carente, com a diminuição da já minguada verba para a saúde.
Enfim, enquanto com os poderosos Lula mostrou-se serviente, com todos aqueles que não têm força suficiente para peitar o governo, Lula mostrou coragem, coragem que FHC também demonstrou. Mas covarde não deixa de ser uma bela definição dos presidentes do Brasil, Lula inclusive.

Campinas, 02 de novembro de 2003

sábado, 1 de novembro de 2003

Ajamos!

Há um provérbio chinês que diz que antes de sairmos para consertar o mundo devemos dar três voltas em torno da nossa casa. Não concordo inteiramente com esse dizer, acho que dá possibilidade a uma interpretação um tanto quanto comodista, algo como que só se deve agir depois de resolvidos os problemas mais próximos. Acho que devemos nos preocupar com os grandes problemas, todavia sem deixar de estarmos sempre atentos para nossos próprios erros. Se só agíssemos quando já estivéssemos perfeitos, quando todos nossos defeitos tivessem sido corrigidos, nunca agiríamos; afinal, não somos deuses para alcançar a perfeição. Inclusive é agindo para consertar o mundo que perceberemos muitos de nossos defeitos, desde, é claro, estejamos abertos a nos permitir uma constante auto-avaliação. Conversando com um amigo meu esta semana, ele criticava um terceiro amigo que estava usando uma camiseta do Greenpeace. Dizia ele que era hipocrisia usar uma camiseta dessas, bradando contra a caça às baleias e à destruição das florestas tropicais, quando os mananciais de Barão Geraldo (distrito de Campinas onde nós três moramos) estavam ameaçados pelo novo zoneamento do distrito. Concordo em parte com ele, acho realmente que deveríamos equilibrar nossa ação entre temas mais globais, locais e pessoais (será que esses meus dois amigos reciclam o lixo que usam?). Me parece hipocrisia, sim, agir em temas globais ou locais sem fazer do dia-a-dia uma permanente ação de defesa da ecologia (para ficar no caso citado). Mas enfim, agir em qualquer uma dessas esferas já é um grande passo, visto como são as pessoas
de hoje. Só para citar um exemplo, quinze dias atrás eu e minha namorada discutimos com uma guria na fila do bandejão, após esta expressar seu desejo de soltar um bomba no IFCH (Instituto de Filosofia e Ciências Humanas), apontado por ela como responsável pela greve contra a reforma da previdência, ocorrida em agosto, que fez com que ela perdesse parte das suas férias. Fosse ela uma exceção, tudo bem, mas não é.
E eu aqui discutindo se devemos agir local, global ou pessoalmente, quando a maioria das pessoas têm a visão de futuro equivalente à de um avestruz (a moça com que discutimos é incapaz de perceber que se o conceito da Unicamp cair, o diploma dela, conseqüentemente, irremediavelmente, passará a valer menos por conter o logo da universidade) - quem dirá que uma pessoa dessas vai ter visão de comunidade. Não deixa de ser um pouco desanimador. Mas é preciso agir. Na esfera pessoal, primeiro, expandindo para a esfera local e global depois.
E você, já separou o lixo, boicotou a Coca-Cola e cumprimentou com um sorriso a atendente do mercado hoje?

Campinas, 01 de novembro de 2003