sexta-feira, 9 de março de 2007

A carga tributária é mesmo de 40%?

Diz-se por aí, como na página www.queromaisbrasil.com.br, por exemplo, que O Brasileiro, esse ente metafísico e fundador da brasilianidade, está cansado de pagar impostos. O mesmo é dito na imprensa, por Mirians Leitões ou comentaristas que só não são tão cretinos quanto por falta de capacidade: o Brasil tem uma carga tributária altíssima! 40% do PIB! Um horror! Se se necessita mostrar como é alta, comparam com a dos EUA ou Japão, ou de alguns países europeus desenvolvidos ou fortemente estimulados por dinheiro da UE para isso.
Sempre discordei de que a carga tributária brasileira fosse alta: dada as necessidades e a condição de um terço da população brasileira, a carga é razoável, ainda mais se compararmos com países como Suécia, Bélgica e Dinamarca. Na minha singela opinião de leigo que não tem preguiça de pensar (ao contrário da maioria, se não a totalidade, dos especialistas que falam para e pelo povo), os problemas dos impostos no Brasil são que a carga é mal distribuída, recaindo, proporcionalmente, nos mais pobres, e o dinheiro arrecadado mal aplicado, não somente por conta da corrupção, mas por ser mal direcionado mesmo, indo para projetos de utilidade duvidosa ou para pagar juros a especuladores, por exemplo.
Mas hoje me bateu uma dúvida: a carga tributária real do Brasil é mesmo de 40%, ou esse é só o número formal? Fui comprar uma prateleira e na hora de pagar, pedi nota fiscal, como geralmente faço. “Nota ou pode ser recibo?”, me perguntou a atendente, como geralmente fazem. Exigi nota, para espanto do dono da loja, que estava no telefone, ao fundo. Falou que daria nota, era obrigação dele. Mas comentou que não tinha, como consumidor, o hábito de pedir notas – achava que o tempo perdido não valia a pena –, e no negócio fazia o máximo que podia sem nota, para conseguir competir. Comentou que uma das empresas das quais comprava determinado produto tinha três tabelas de preço: sem nota, com nota no valor de 30% e com nota no valor de 50%. Falou mais, não sei se com a intenção de me comover e fazer com que desistisse da nota, ou se por surpresa mesmo – já que o bloco de notas sequer estava à mão, e ele, inteligentemente, desde o início não insinuou nada de “o bloco não está aqui hoje”, “com nota é mais caro”, ou outras falas do gênero que costumam ser utilizadas. De qualquer forma fiquei com a dúvida: uma grande empresa, como uma rede de supermercados, por exemplo, ainda que dê nota fiscal ao consumidor, paga todos os seus impostos, registra todas as suas transações, para poder reclamar que paga 40% de imposto? Não seria mais sensato exigir maior rigor na fiscalização, menor benevolência para com os fraudadores, de modo a fazer com que todos paguem o que lhe é “de direito”, e assim, a carga tributária poder ser menor, já que o valor arrecadado aumentaria?

Campinas, 09 de março de 2007

sexta-feira, 23 de fevereiro de 2007

Pensar educação (incompleto)

Com considerável atraso parece o Brasil ter descoberto que a educação tem utilidade além de uma perfumaria para damas de boa família e que educar é algo mais do que confinar pessoas em um recinto para lá passarem quatro horas em silêncio.
A educação entrou de vez na pauta do país: a imprensa começa a dar destaque seguidamente ao assunto, em formas de reportagens e editoriais; os tais “formadores de opinião” opinam e opinam sobre a importância da educação para a construção do futuro da nação do futuro e os políticos, ao menos no discurso eleitoral, fizeram da educação sua prioridade número um – que o digam os candidatos à presidência da República nas eleições de 2006. Finalmente a discussão sobre educação passa a fazer parte da discussão quotidiana e deixa de ser uma discussão específica de quem mexe com isso, ou seja, das faculdades de educação.
Mas esse súbito interesse pela educação não veio trazido pelo vento. Surgiu da iniciativa dos “gigantes do PIB” nacional, com o apoio da grande imprensa (escrita, ao menos), que depois de um ano de gestação lançou, em 6 de setembro de 2006, o movimento Todos pela educação, com metas a serem cobradas dos governos para 2022. Que a iniciativa tenha surgido tarde e nascido torta não a invalida e não justifica oposição a ela. As metas estipuladas são válidas e sem dúvida trarão grandes benefícios à todos – à população e à nação –, mas isso não significa que o conceito de educação e os pressupostos por trás dessa iniciativa não devam ser questionados. Ocorre que essa iniciativa já foi divulgada pronta, e destinada a propor ações e cobrar governos, e não a fomentar qualquer tipo de debate. A imprensa tem feito sua parte, ocultando iniciativas que tragam um questionamento mais profundo sobre educação, divulgando somente ações que homologuem o movimento.
O que se pretende aqui não é, de forma alguma, se opor ao Todos pela educação, mas complementá-lo naquilo que ele se apresenta falho: o debate, a discussão de idéias. Afinal, o conhecimento é construído, e essa construção se dá a partir do diálogo, do confronto de opiniões divergentes.
Todos pela educação, educação pública para todos. Mas o que é educação? É simplesmente o que se aprende do professor? É o que se aprende na escola? É o que se aprende na rua, com o pai, com a avó, com o irmão mais novo? Dentro da educação formal, o que deve ser ensinado? Como deve ser ensinado? E diante das metas que o movimento põe para 2022, quais os objetivos, quais os frutos que essa educação deve render?

Campinas, 23 de fevereiro de 2007