domingo, 6 de novembro de 2011

Vagabundos, baderneiros, maconheiros, irresponsáveis... incompetentes?

Richard Dawkins questiona algures o que não seria da física e da ciência se Newton tivesse se dedicado integralmente a ela, ao invés de ter perdido tempo com discussões estéreis, como as sobre religião. Não lembro se ele faz a mesma pergunta sobre Einstein, Heisenberg e outros físicos e cientistas da primeira metade do século XX. De qualquer forma, chuto uma resposta à sua pergunta: se Newton tivesse se abstido das atividades extra-científicas, assim como os grandes cientistas da primeira metade do século XX, em geral bastante engajados politicamente, teria sido tão medíocre quanto a grande maioria dos pesquisadores da atualidade.
A intelligentsia acadêmica brasileira (para ficar na parte tida por pensante da sociedade) não é nenhum Richard Dawkins, mas bem gostaria de sê-lo: ter panca de inteligente e intelectual, morar na Inglaterra, dando aula para ou tendo como colegas pessoas com boa formação, convivendo com gente “civilizada”, enfim (salvo eventuais hordas bárbaras, como a de agosto). Claro, não precisa ser ateu – apenas pró-ciência e anti-comunista.
Novo protesto na USP, e lá vemos novamente as mesmas manifestações dos bons cientistas da universidade e dos homens de bem de nação, criticando os baderneiros que não querem estudar e atrapalham o bom andamento da ciência tupiniquim.
Afinal, conforme ranqueamentos internacionais, da TopUniversities, para ser mais exato, a USP é a melhor universidade latino-americana, e a 169º do mundo. Não que eu ache que esses rankings sirvam para muita coisa, mas nossa intelligentsia certamente se guia por ela – publicações, prazos, congressos, papérs, bolsas, tudo é feito em função do que os gringos dizem que é bom.
É de se questionar, portanto, onde não estaria a USP, não tivesse todos os incômodos causados por esses alunos que fazem protestos, greves, ocupam prédios.
Bem... talvez estivesse fora do ranking das 200 melhores: dos nove cursos que aparecem entre os 200 melhores, nas diversas áreas, seis – filosofia, sociologia, história, lingüística, ciência política e geografia – são da FFLCH. E se esses alunos estavam fumando maconha e fazendo greve, é de se questionar, então, o que estavam fazendo os demais dos 198 programas de pós da USP. Assistindo tevê, lendo Folha e Veja?
Surpresa? Não deveria ser. A ciência pura pode até existir (não vou entrar nesta questão), mas o cientista puro, certamente não. Não por acaso, quando a Science publicou reportagem sobre a ciência no Brasil, quem ganhou destaque não foi a Fapesp e seus quase 800 milhões de reais – que não mereceu uma mísera linha –, e sim um cientista que faz bastante alarde político – ainda que questão de política científica, mas com uma visão bem menos tacanha de ciência que Brito Cruz, ou demais coronéis da ciência paulista –, Miguel Nicolelis.
Esta ocupação de prédios na USP poderia ser uma ótima oportunidade para esses pesquisadores fazerem uma auto-crítica (proposta ingênua, eu sei): ao invés de desqualificarem o outro, entrarem realmente no debate – não é obrigado a concordar com a atitude, contudo, é radicalmente diferente negar a política, exigindo logo a ordem e a autoridade –, e admitirem: pessoas, mesmo as diferentes, as chatas, as que usam vermelho, as que fedem, eventualmente podem ter mais assuntos e ser mais interessantes do que ratos e átomos.

Pato Branco, 06 de novembro de 2011.

sábado, 22 de outubro de 2011

Até o final!


Torcedor 1 – Olha, gol!
Torcedor 2 – Gol?
Torcedor 3 – Que gol bizarro!
Torcedor 2 – Gol mesmo?! Vamos comemorar!
(A torcida comemora com grande entusiasmo, apesar de ser 47 do segundo tempo).
Torcedor 1 – O cara da imprensa nem tá mais aqui.
Torcedor 2 – Sacanagem!
Torcedor 1 – Ah, o cara já se mandou...
Torcedor 3 – Mas a torcida ainda tá aqui!
Torcedor 2 – E como foi o gol?
Torcedor 1 – Você não viu?
Torcedor 2 – Não.
Torcedor 1 – Foi um gol feio, bate-rebate-entrou.
Torcedor 3 – Já pensou se o Paraná empata?
Torcedor 2 – Seria bonito.
Torcedor 1 – A Ponte tá vacilando muito.
Torcedor 2 (subindo na grade) – A gente podia provocar a torcida adversária.
Torcedor 3 – Como aquele ali? – e aponta para um torcedor ponte-pretano que acha uma brecha na lona que oculta uma torcida da outra, grita dois impropérios e pára.
Torcedor 1 – Desistiu.
Torcedor 2 (grita para a torcida adversária, que nessa hora pressiona pedindo o fim do jogo) – Tão com medo? Tão com com medo?
Torcedor 1 (apontando para um integrante da comissão técnica, na beira do gramado) – Olha aquele lá, o desespero.
Torcedor 2 – Chuta pra frente! Chuta pra frente! Antes que o jogo aca...be... acabou.
Torcedor 3 – Quase, ein?
Torcedor 1 – Deu um sufoco na Ponte nesse finalzinho.
Final: Ponte Preta 4 x 3 Paraná Clube.
E quando Vannucci, eu e Ricardo saímos do Moisés Lucarelli, toda a torcida do Paraná que resistiu até o final e pôde comemorar o terceiro gol da equipe deixou o estádio (detalhe: eu, que não vi o gol, era o único torcedor paranista). Enquanto nos afastávamos, combinávamos de aparecermos para um próximo jogo – mas na torcida animada.

Campinas, 22 de outubro de 2011.