segunda-feira, 3 de dezembro de 2001

Yes, nós somos brazileiros!

"Pobre do país em que nem os seus intelectuais pensam com a própria cabeça."
eu, na questão 9 da prova de PGE II

Imagine a seguinte cena: você chega para seus amigos e comenta, como quem não quer nada:
- Um professor meu, da faculdade, teve um artigo publicado na edição atual da revista científica "Journal of Psychological Science". Seus amigos farão um "Oh!" em coro uníssono e pedirão mais detalhes. Você, depois de tanta insistência, conta das maravilhas que é estudar numa universidade do padrão das de primeiro mundo, onde os professores publicam artigos, em inglês, inclusive.
Agora imagine a mesma cena, mas com uma pequena diferença: a revista não se chama "Journal of Psychological Science", e sim "Jornal da Ciência Psicológica". Pior, "Jornal Brasileiro da Ciência Psicológica". Brega, não? Isso é para você ver como os professores da "Filô" se preocupam com tudo antes de tomar qualquer atitude.
A folha noticiou há algumas semanas que professores da Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Ribeirão Preto lançarão ano que vem a primeira revista científica brasileira sobre psicologia editada totalmente em inglês. A edição ficará a cargo do professor Joseph Appeared of Bramble (aquele, que por ter fruência em ingrês, fala psicologia crínica).
É inquestionável que o inglês é hoje a língua hegemônica, e que uma revista editada em tal idioma terá muito mais abrangência e repercussão.
Porém, ao meu ver, a U$P, como detentora da fama de melhor universidade, deveria dar o exemplo de produção científica autônoma, não no sentido de independente de influências externa, que isso é muito difícil, além de não ser benéfico, mas no sentido de valorizar um pouco o país que representa, preservando, no caso, o idioma. Um artigo em português (já que falei em português, outra coisa que não está certo, somos 150 milhões de habitantes contra 15 de Portugal, e nós é que temos que falar português, ao invés deles falarem brasileiro?!) pode perder sua repercussão e abrangência, mas de forma alguma perderá sua qualidade. E, até onde eu sei, o principal de uma pesquisa científica é a qualidade. Se fosse o caso, a revista poderia ser editada em inglês e português. Agora, apenas em inglês vai acabar por ter abrangência no mundo, mas alijará de seus artigos seus alunos – sem falar nos contribuintes – que não sabem inglês. Pode-se argumentar que aluno de universidade tem que saber inglês. Tem não, é recomendado que saiba.
Claro, argumentar que a defesa da língua, da qualidade é mais importante que a repercussão da revista e dos artigos muito pouco ou nada vale neste antro de vaidades que é a U$P (agora fui uspiano!). Ninguém quer ficar mal falado ou (pior!) não ser falado.
Resumindo a ópera (que eu estou enrolando, enrolando, mas não dizendo nada): não acho que não se deva escrever em inglês, mas não deveria uma universidade brasileira, pública, ainda por cima, deixar de lado o português; uma revista nos dois idiomas agradaria a gregos e troianos (ou melhor, a gentleman e caipiras). Abandonar o português é o primeiro passo para deixar de lado os problemas especificamente brasileiros. E se uma universidade brasileira não se prestar a isso, quem fará?

Ribeirão Preto, 03 de dezembro de 2001

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