segunda-feira, 20 de janeiro de 2003

O nariz de palhaço e a orelha de burro

Hoje fui visitar um médico. Não que se trate de uma visita que me agrada, mas de vez em quando é preciso. Como belo espécime da classe-média, disponho de plano de saúde privado, o que permite milagres, como o de marcar consultas para o dia seguinte.

Tinha eu agendado consulta para as quatro e meia da tarde. Adepto ao “me-faça-de-pato-que-eu-gosto”, cheguei às quatro e vinte e cinco. Como – já disse – sou usuário de plano de saúde, e não particular que paga em dinheiro, tenho direito a um brinde, na maioria das vezes que vou a um médico: um nariz de palhaço.

Como cheguei ao consultório trinta e cinco minutos adiantado, tive que achar um jeito de passar o tempo. Assim ganhei mais um brinde: um par de orelhas de burro! A tv estava ligada, prendendo a atenção de quase todos os que estavam na sala de espera. Na tela um filme da “sessão da tarde”: A Lagoa Azul: duas crianças que não sabem que se engravida, mas conhecem anatomia. Diante de tamanha idiotice (também, o que eu poderia esperar de um televisor?) fui em busca de uma revista. Revirando entre Caras e Contigos encontrei uma Veja, o que não melhorou muito. Na verdade melhorou muito pouco. Ainda mais que, se bobear, a Veja mais nova que você encontra em salas de espera é a que anuncia a URV. Surpreendentemente aquela era de novembro de 2002.

Folheei um pouco aquilo, até que me detive nos colunistas. Primeiro o ultra-conservador, mas que escreve várias coisas boas, Roberto Pompeu de Toledo. Falava da importância da instituição da ex-presidência, cujo ocupante serviria de ponto de referência da nação. Creio que ele só falava isso porque o ex-presidente em questão era o FHC, fosse o Lula o assunto seria abordado de outra forma. Falava também da importância do Lula escolher o Palácio da Alvorada e não a Granja do Torto como morada oficial: nós precisamos da nossa Casa Branca.

Se Pompeu não estava inspirado, o mesmo não posso dizer do Diogo Mainardi. Mais surpreendente que encontrar aquela Veja, foi ler uma coluna do Diogo Mainardi boa! Comentava da presunção italiana com os islâmicos, que vai da Divina Comédia, de afrescos de igrejas às declarações do Silvio Berlusconi e “pensadores” italianos; e do risco dos extremistas realizarem um ataque terrorista ao país em que ele residia.

Talvez eu só esteja querendo me defender, já que não são poucos os que dizem que meu jeito de escrever é semelhante ao do Mainardi. Mas essa crônica dele foi a primeira razoável que vi! Claro que ele não podia perder a dele: além de pitadas de preconceito contra a cultura islâmica; do início ao fim da crônica, o maior desastre de um ataque terrorista na Itália que ele encontrou foi o de ele ir pelos ares.

Moral da história: da próxima vez que eu for num médico, levo meu Cony em baixo do braço, ao menos aproveito o tempo com alguma coisa útil.


Pato Branco, 20 de janeiro de 2003

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