terça-feira, 20 de maio de 2003

Radicais e radicais

Os últimos capítulos da deprimente novela petista “Os Radicais” tem mostrado que radicais no partido não são apenas Babá, Luciana Genro e Heloísa Helena. Sem dúvida eles são radicais no sentido primeiro dado pelo dicionário Aurélio, ou seja, são radicais no sentido relativo à raiz, são radicais na medida em que defendem propostas muito semelhantes às defendidas pelo PT vinte anos atrás, propostas que estão na origem, na raiz do partido dos trabalhadores.

O episódio da semana passada mostrou que José Genoíno e a cúpula do PT são também radicais de marca maior, mas radicais no sentido de intransigentes. Imagino o que eles não diriam se, mesmo com 40% dos votos, José Serra assumisse a presidência, porque FHC iria renunciar se não fosse assim. Pois foi algo paralelo o que ocorreu semana passada: Tião Viana e José Genoíno ameaçaram renunciar – o primeiro a liderança do partido no senado, o segundo a presidência do partido – caso o abaixo-assinado apresentado por deputados e senadores do partido pedindo o diálogo e não a expulsão dos três radicais não fosse desconsiderado. Tivessem assinado tal abaixo-assinado apenas os três radicais, vá lá ele ser desconsiderado; mas foram 35 dos 90 deputados e oito dos 14 senadores, portanto 57% dos senadores do partido. A ceninha dos líderes do partido mostra o quão maduro está o PT, e o quão democrático eles são: “ou a coisa anda como eu quero ou eu não brinco mais”.

Caro Genoíno, quer dizer, então, que se a maioria da bancada do senado é contra senhor, eles é que devem mudar, não vossa majestade? Vai ver que isso explica o “novo” governo: a maioria da população votou por mudança, mas o PT resolveu continuar a velha fórmula econômica; a maioria da população votou pelo crescimento do emprego, da renda, o que significa estímulo à indústria, mas o PT optou por manter estímulo à especulação, o que significa juros altos, diminuição da produção industrial, aumento do desemprego, queda na renda...

Mudaram os termos: de neobobos para radicais; mas é muito bom saber que temos, a exemplo do governo anterior, um governo aberto ao diálogo e à discussão, cumpridor de promessas eleitorais e maduro o suficiente para discutir divergências.

Arrependimento mata?


Campinas, 20 de maio de 2003

segunda-feira, 12 de maio de 2003

Conta outra, Genoíno

Me assusta como o PT no poder tem conseguido fazer com que eu mude de opiniões. Trata-se de algo diretamente proporcional: quanto mais o PT muda de opinião sobre o modo de fazer política, mais eu mudo minha opinião sobre a política.
Não cheguei a esse extremo, mas começo a flertar com ele, e vejo que falta pouco para eu fazer coro com boa parte da população brasileira que (alienada) diz “político é tudo igual”. A começar que partido de direita e de esquerda são, no Brasil, pelo menos, a mesma coisa. Essa é a impressão que se dá ao ver o PT no governo.
A eleição do Lula para presidente – a exemplo da eleição da Marta em São Paulo – criou um enorme vazio na política nacional: falta-nos um partido opositor de princípios e coerente. PFL, PSDB e PP (ex-PPB) não possuem qualquer princípio e, conseqüentemente, qualquer coerência; são uma oposição muito porcariazinha. Já o PT mostrou que como governo em nada se difere do PFL, do PSDB ou de quem mais for. Ou melhor, se difere no que tange a um passado glorioso, de princípios e coerente.
Se os atos do novo governo já davam a impressão de que a diferença entre PT e PSDB, quando ocupantes do executivo, é nenhuma, a entrevista do presidente do PT, José Genoíno, famoso por seu malufismo desabrochado na última eleição (“Rota na rua”), compete palmo a palmo com as retóricas vazias e mentirosas de FHC.
Não me alongarei muito na análise da entrevista, me deterei em apenas dois trechos. Primeiro trecho: diz o famigerado presidente do partido, já no fim da entrevista: “Eu entrei no partido como um esquerdista. Mudei, mas sem mudar de lado. Eu estou preparado para ser vaiado, sou um homem de crenças”. Claro, claro. Ano passado, em uma reunião do Cemarx (Centro de Estudos Marxistas), da Unicamp, um professor, que realmente não havia mudado de lado e continuava fiel ao marxismo, comentou essa mudança do Genoíno: não entendo muito do assunto (pediria àqueles que compreendem-no melhor que explicassem), por isso não me alongo, mas o Genoíno deixou de seguir o velho Marx para seguir o jovem Marx; um paralelo da diferença do jovem para o velho Marx é a que existe entre o novo e o velho testamento, ou seja, nenhuma.
Segundo trecho: pergunta: “Mas o partido foi contra quando o ex-presidente FHC quis tributar os inativos”, Genoíno: “Nós até aceitávamos negociar a cobrança (...). O presidente Lula fez um acordo com os governadores (...). Para a gente ter moral de cobrar o apoio dos governadores, a bancada do PT tem que votar o que o Lula assinou”. Nesse ponto, Genoíno se esmera: ele deve imaginar que a entrevista é pro Bom Dia Brasil, e não para a Folha de São Paulo, que dias atrás mostrou um documento assinado pelo futuro presidente Lula em que ele dizia ser contra a taxação dos inativos, e que tal proposta era imoral. E já que o Genoíno preza tanto a moral, porque não cumprir a palavra do Lula, que durante a campanha falou que o Brasil precisava de mais política e menos contabilidade? Superávit primário, problema de caixa, pagar juros, isso é política? E contabilidade é o que?
É companheiro Genoíno, bem diz o povo: político é tudo igual. Que pena, até ano passado eu acreditava que não era bem assim... Que pena...

Daniel Dalmoro
Campinas, 12 de maio de 2003