quarta-feira, 3 de dezembro de 2014

Praça San Martín

Caminho até o fim da calle Florida e acabo na praça San Martin. Abro o mapa, estudo que rota seguir: não tenho ponto de chegada. Um homem chega oferecendo ajuda, muito simpático. Diz que o senhor da estátua é Dom Pedro I. "O do Brasil", pergunto intrigado. Não, mas seria o equivalente argentino, ele explica. Ora pois, ou é ou não é. Ensina que para um lado é a Recoleta, para o outro, San Telmo, fala rapidamente de um ou dois pontos turísticos de cada lado. Não consigo me desvencilhar, explicar que não estou perdido, nem em dúvida do que visitar: apenas estudo um caminho qualquer a seguir, um caminho que tenha me chamado a atenção no mapa por seus cruzamentos, suas curvas, ou seus ângulos de noventa graus em cada esquina. Depois disso, me pede ajuda para não sei que instituição - está até com um jaleco verde com uma cruz vermelha e um crachá. Lembro da história do meu irmão em Berlin, lembro das histórias quotidianas dos pedintes da estação Tatuapé, que tiveram ontem a mesma tragédia de anteontem - a morte da filha, a internação da esposa -, contadas pela Misson (minha favorita, depois das muitas dos valorosos moradores de calçada (e antes que alguém enxergue, não há qualquer ironia aqui) era a ceguinha que enxergava). Resisto, ele insiste, cedo. Vasculho moedas, mas lembro que na Argentina moedas valem quase nada e dou uma nota de cinco - valor de uma viagem de metrô. Ele pede pelo menos uma de dez, recuso, explico que trouxe pouco dinheiro e troquei no oficial. Só faltou me chamar de burro por não ter trocado no "negro", mas me deixa em paz. Recordo de quando esperava Camila, a moreninha da balada, em 2012, no cinema na Augusta, e um pedinte me pediu uma ajuda; dei-lhe uma moeda que tinha no bolso, cinqüenta centavos, ele reclamou: pó, dá ao menos um real! Eu já estava p da vida aquele dia, e não fosse o encontro nos próximos minutos, teria pego a moeda de volta. Depois disso, nunca mais dei esmola, saio com meu "hoje não rola". Pedintes aqui, há vários, em geral com crianças juno, o que muito me entristece e preocupa - já comentei sobre isso em outra crônica. Ao meu lado se senta um senhor bem cinematográfico, garboso em seus cabelos brancos, sua begala, paletó e sapatos azul marinho, um lenço vermelho. Atrás de mim, um homem vomita novamente. Cansarei de escutar seus despejos gástricos dentro de outras duas ocorrências - o porre ontem foi grande. Dou um giro pela praça. As construções que a circundam se harmoniza, dialogam entre si, apesar de serem de épocas e estilos muito diferentes: é antagônico ao cada um por si e foda-se a cidade dos prédios em São Paulo - do Martinelli e do Copan aos últimos apartamentos de kitnetes lançados na República. Há o museu nacional de armas, mas desconfio que ficarei deprimido em visitá-lo, melhor caminhar a esmo. Buenos Aires tem suas altas torres, banais edifícios pós-modernos de vidro verde que dão um ar de não-lugar aos grandes centros urbanos. Em Palermo, alguns prédios de alto padrão - na avenida Libertador, mas também na Coronel Díaz - já recusam a convivência em seus térreos: recuos frontais ao invés de comércio - e porteiros para garantir a segurança. Eis, talvez, um dos pontos mais decadente que vi de Buenos Aires.

Buenos Aires - São Paulo, 03 de dezembro de 2014

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