Mostrar mensagens com a etiqueta Trezenhum. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Trezenhum. Mostrar todas as mensagens

quinta-feira, 6 de julho de 2023

Banheiro interditado [por Sérgio S., ex-Trezenhum. Humor sem graça.]

Começo com uma nota prévia e peço desculpas, mas nem tudo no mundo são perfumes, desodorante Brut e Leite de Rosas no mundo laboral.
No setor onde trabalho, o banheiro masculino, sem saída de ar externa - mas com uma ventoinha que liga junto com a luz, e não sei se tem outra função -, é composto oficialmente de duas cabines e duas pias. Digo oficialmente porque há sempre algum problema a assombrar o referido espaço no ambiente de trabalho.
Um dos problemas, já assumido como tradição da casa, é com uma das torneiras. Ninguém a usa - salvo quando a outra está pifada -, porque não se lava só as mãos nela, mas boa parte da calça e da camisa e, a depender da altura da pessoa, dá pra lavar o peito também, tamanha a força com que a água sai. Praticamente um trote aos novatos - ou a eventuais visitas ao setor que decidem ir ao banheiro.
O outro problema se dá sempre com a mesma cabine - justo a mais ampla e convidativa. Por muito tempo sua descarga quebrava reiteradamente. E lá íamos nós, dois dias sofrendo com os odores da retrete - talvez sofrendo até mais que o pessoal da faxina, porque esses, como não era com eles, não tinham o que fazer, e podiam se dedicar aos outros banheiros do local (por sinal, isto não é uma queixa ao trabalho da faxina, nem nessa nem em outra situação, no máximo critico a terceirizada, assim como quem contrata essa terceirizada, pelos salários vergonhosos pagos e pelo papel que nos disponibiliza - isso quando não fica duas semanas sem repôr a contento). Esse problema foi dado por resolvido quando nobre colega Carmen, que tem experiência com obras, arrancou a caixa de descarga e passamos a apertar direto no parafuso da instalação. Resolveu um problema, mas trouxe outro, menor: a maioria dos usuários do banheiro masculino, sem sensibilidade para apertar algo pontual como um parafuso, soca o dedo até onde pode, transformando a cabine numa grande poça d'água (limpa! O que suja, às vezes é a terra do sapato).

O problema atual, nessa mesma cabine, não sei bem qual é. De qualquer modo, agiram rápido e antes que acumulasse odores, puseram um aviso de banheiro interditado, escrito com giz de cera azul. Houve alguma discussão sobre esse detalhe lúdico do cartaz (ainda que no setor de Fernández, funcionário do topo, ele tenha tido que pintar mapas com lápis de cor, para economizar a tinta colorida da impressora), mas todos respeitaram. Ao cabo das conversas, sempre uma certa indignação: custava imprimir uma folha com um sinal de caveira, o aviso de interditado e em caso uso, risco de arma química? Instrutivo, direto, sem chances de achar que era piada.
Entretanto, o problema maior não foi esse, mas o detalhe reparado pelo nobre colega Goreti na cabine ao lado: marcas de garras na parede. Isso gerou novo debate, e desta feita mais acalorado - e mesmo com certa apreensão. Contando que estamos no décimo andar, não há janelas no banheiro e as marcas são próximas ao chão, excluímos a possibilidade de uma pomba gigante, do tamanho de uma curucaca. As curucacas, por não existirem em São Paulo, também foram excluídas - e junto excluímos aves grandes em geral. Gato foi outra opção levantada, mas como o bicho não foi até o alto da cabine - sem falar que ninguém nunca viu um gato dentro de todo o prédio -, descartamos a possibilidade. 
Todos com medo de assumir, mas a opção mais razoável que nos pareceu foi a de um rato, que teria subido pelo encanamento - talvez atraído pelo cheiro da outra cabine em um de seus outros problemas? - e tentado escalar a cabine. Pareceu bastante razoável e para evitar uma histeria coletiva, optamos por não comentar com as mulheres do setor - cuja anatomia não permite o uso da retrete em pé. Nobre colega Desembargador, entusiasta do Capirotinho, que adorava contar que recebia pra fazer cagadas, tem evitado essa pequena vingança contra a espoliação da mais-valia que sofre - e desconfio que tenha medo de ratos, porque tem escovado os dentes (fora do horário de almoço, claro, que como o nome diz, é para almoçar e não para fazer higiene bucal, como bem ensina o Capirotinho) com uma velocidade impressionante.
Estamos nessa situação há dois dias, e hoje o nobre colega Macedo trouxe a hipótese de alguém com "dificuldade de ir aos pés" ter feito aquelas marcas. Não sofro desse tipo de constipação, mas me pareceu meio exagerado alguém espernear e se debater com tamanha veemência na cabine apenas por certo congestionamento em seu tráfego intestinal. Desembargador, por seu turno, achou mais plausível que a história do rato. Daí, então, a necessidade desta crônica de utilidade privada: colega com prisão de ventre: coma mais fibras!

06 de julho de 2023


PS: Este é um texto ficcional, teoricamente de humor. Qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência. A imagem também é ilustrativa. 

sexta-feira, 12 de maio de 2023

Doutor Sabujinho, o tiozão galanteador [por Sérgio S., ex-Trezenhum. Humor Sem Graça]

Os ventos não andam favoráveis ao doutor Sabujinho. Esqueci de comentar em meu texto sobre o fatídico colega Rivarola que ele também é um espécime da família tradicional brasileira (ainda que tenha dito não ter votado no Abominável na última eleição, mas tenho dúvidas, uma vez que defendia entusiasticamente o Cara de Cratera para governador). Uma das suas famas mais famigeradas no setor (e já se espalhando alhures) é que se trata de um galanteador inveterado, que adora posar de cavalheiro da high society - mas no máximo lembra um personagem genérico d’Os Simpsons, alguns dos bêbados que fazem figuração no bar do Moe (falta só ser amarelo). 

Quando Goleador chegou ao setor, antes mesmo de ela ser apresentada a todos, doutor Sabujinho já se dispôs a ensiná-la o trabalho - ela teve a infelicidade de ter uma baia livre bem defronte à dele. E assim foi, por duas semanas: ele sentado juntinho a ela, praticamente no colo dela - ou no decote, dizem as más línguas. Colega Carnegie, que senta próximo, conta ter ouvido certa hora doutor Sabujinho dizer a ela que eles tinham tudo para formar uma dupla de sucesso na empresa, tipo Bebeto e Romário na seleção - num trocadilho óbvio (e infame) com o sobrenome da colega; e ele deve se achar o Romário, claro. 

Sorte dele o chefe não ter reparado direito: duas semanas para ensinar o trabalho é de uma ineficiência digna de uma conversa muito séria. Ainda mais porque Goleador tinha alguma experiência prévia - apesar de seu grande mérito é saber parecer uma digital influencer, mesmo que sua conta no Instagram tenha menos seguidores que a do Pato Rei. Experiência prévia que fez com que na terceira semana ela já notasse que tinha coisas a corrigir naquilo que Sabujinho lhe ensinara - e fazia. Claro que ela não comentou com o próprio, afinal, ele não apenas foi muito solícito com ela, como se mostra alguém querido por muitos colegas (não por mim, gostaria de reforçar, e também saliento que acho que é falsa essa amizade dos demais) e, principalmente, pelo chefe.

Pela proatividade de quando chegou, até suspeitamos que Goleador fosse disputar o posto de puxa-saco-mor, mas até agora não foi o caso - até agora! O que foi notável é que tão logo outra baia ficou disponível, Goleador foi ocupá-la. Segue perto do doutor Sabujinho, mas não tanto - e, mais importante, de costas para ele.

Doutor Sabujinho, ainda que não tenha desistido, sentiu os cortes da nova funcionária, e decidiu retomar seus galanteios para com Beviláqua, a secretária (que suspeitamos ser bisneta do jurista Clóvis, por conta do sobrenome), uma moça na flor da idade, bonita e reservada. A pobre colega foi o primeiro alvo do fatídico colega, tão logo ele foi contratado - e por onde já começou toda sua fama, até porque em sua primeira apresentação ele salientou que quem sustentou a casa na pandemia foi a esposa, que certamente ganha mais do que ele até hoje.

Esta semana tivemos a saída de uma colega, que vai para um emprego melhor. Podia ter resolvido isso com um e-mail, todos ficariam mais felizes com uma partida assim, mas ela fez questão de um almoço de despedida. Discutíamos onde poderíamos ir quando o chefe propôs um restaurante tradicional (e um pouco caro) aqui perto - onde, dizem, o PSDB foi fundado e por isso se dizia um partido com um pé no popular. Animamos: pelo tom, quem iria pagar a conta era o chefe. Pois foi depois de fazermos os pedidos que soubemos que não era o caso: ele avisou com solenidade que o bolo seria por conta dele. Era possível ler na cara de muitos colegas: “O bolo?! E essa facada que vou levar por um prato que nem faço muita questão?”. Ficou aquele climão na mesa, talvez ele tenha até sentido - ou não, mais provável. A certa altura, ele foi ao banheiro e algumas pessoas conversaram rapidamente sobre a conta. Sabujinho foi até Beviláqua e disse que pagava a conta dela - afinal, o salário dela é menor que o dele, ainda que a herança que presumimos deva ser bem maior. Ela simpaticamente (mais do que deveria) disse que não precisava.

Pois na hora em que a conta chegou e foi cada um pagar a sua, chegou a vez de Beviláqua e o garçom avisou que a parte dela - uma água mineral e um filé de frango grelhado com uma salada frugal, o mais fitnesse um dos mais baratos do cardápio - já havia sido paga pelo “senhor na ponta da mesa”. Ela olhou para Rivarola que fez um sinal como quem diz “relaxa, eu paguei e está tudo bem, não vai me fazer falta”. Por ser uma pessoa bastante discreta (eufemismo para tímida), não é possível afirmar que Beviláqua ficou puta, mas o “Eu disse para ele que não era para pagar minha conta” me dita entre os dentes fez com que eu desconfiasse que ela estivesse consideravelmente emputecida com mais essa cantada do “senhor na ponta da mesa”.

Após esse episódio, começou a circular certa piada maldosa pelos corredores com relação ao doutor Sabujinho. Não se sabe quem começou, mas o que se tem dito é que o fatídico colega Rivarola é um tiozão da Sukita que se acha o tio da lancha. Particularmente, eu achei essa descrição injusta com o tio da Suquita.


12 de maio de 2023

PS: Este é um texto ficcional, teoricamente de humor. Qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência. A imagem também é ilustrativa.

quinta-feira, 4 de maio de 2023

Fernández e a estagiária [por Sérgio S., ex-Trezenhum Humor Sem Graça]

Nossa pequena fábula de hoje se passa uns andares acima, no setor de Fernández, funcionário do topo. Apesar de ser algo que os chefes não vêem com bons olhos, fomos hoje almoçar em um grupo diverso e sem nenhum doutor Sabujinho. Inclusive fomos a um lugar que não aqueles três que sempre costumo ir, conforme dito em crônica anterior. Do mesmo setor de Fernández estava Calzonelli - um manancial de boas histórias (menos para ela) que espero um dia conseguir trazer para estas mal traçadas linhas.

Desta vez a historieta é singela, sobre uma estagiária que chegou há um mês ao setor deles.

Primeira surpresa foi ter uma estagiária. Nosso setor há tempos não sabe o que é isso: há muito só entra gente parruda, já feita, formada, pós-graduada, mestrada (inclusive em D&D, que mais parece nome de loja de construção, mas isso foge ao nosso escopo), nada de estagiário, de pessoas que teríamos que ensinar algo e a quem atribuir todo tipo de tarefa, de buscar cafezinho a pintar mapas com lápis de cor para economizar impressora (como ocorreu no setor do Fernández, por sinal).

Lembro do meu tempo de estagiário, eu ainda na graduação. Naquela época havia um quê de quixotesco em fazer estágio: o estudante de triste figura, magricelo e cheio de espinhas na cara, mil planos e muitos anos de frustrações pela frente, crente que naquele estágio teria o primeiro grande insight da sua vida, e esse insight o transformaria numa sumidade em algum assunto qualquer que o transformaria no expoente da geração e mudaria a humanidade. Como alguém bem inserido em meu tempo (e classe), originalidade nunca foi algo que me acometeu. E o pior: como boa parte de meus colegas da faculdade, esse foi justamente o período mais fértil que tivemos, e não deixou de ser meio certo esses anseios do momento: foi justamente nessa fase que me veio o grande insight que tive na vida, onde condensei toda minha capacidade de observação com poder de síntese para soltar uma frase lapidar - até mesmo admirável pela pouca idade que eu tinha. Sim, o grande momento da minha vida intelectual e laboral se deu no estágio (se se excluir questões de título e monetárias), e isso não me fez ir além de uma nulidade, incapaz de alterar sequer minha vida, que dirá a humanidade (não foi uma observação útil para a empresa, então não era para ter mudado ela de qualquer modo). Ainda hoje sempre relembro em almoços de domingo ou encontros com amigos que estejam sem assunto dessa minha grande ideia, até para ter uma certa admiração tardia - é comum elogiarem minha espirituosidade com tão pouca idade para elaborar uma frase dessas (ok, não era tão pouca, ainda mais se comparado ao Mozart, por exemplo), assim como o momento seguinte vem aquela expressão de pena, quando notam que já faz vinte anos que tive meu grande momento, e ele não vale mais que uma citação rápida numa mesa de bar ou de almoço de família.

Já hoje, o estagiário já chega com crossfit em dia, a skincare feita, dentes de porcelanato e botox preventivo, é muito mais focado no que (dizem) de fato importa, dá toda a impressão de que bebe ritalina desde a época da mamadeira: não perde tempo com besteiras como grandes ideias, está ali para crescer na carreira, contribuir com a empresa e ganhar dinheiro (quando sair dessa condição de estagiário, claro), comprar um carro da moda, um celular bom, se o dinheiro não der para um carro, um relógio ok, se o salário também não der para um celular, ao menos umas férias em algum pacote barato no exterior pago em 22 prestações. Enfim, para esta geração estágio é o primeiro passo para ficar rico no futuro, não é para mudar o mundo - ainda que o estagiário siga basicamente com a nobre função de atender ao telefone, buscar um café na máquina ou um pão de queijo na cantina para os não estagiários.

Voltemos ao caso da estagiária do setor do topo. Mal nos sentamos à mesa e Calzonelli, com sua exuberância para contar causos com cores vivas, tratou de entregar Fernández: disse que a estagiária estava a fim dele, se pavoneava todo dia para seu lado, sem pudores, e todo o setor já comentava sobre isso. Fernández ficou constrangido em ser entregue assim. Respondeu sem graça que ela só era simpática, não havia segundas intenções. Calzonelli insistiu: ela era só atenção e sorrisos e bons dias para ele - ele, que era só mais um qualquer no meio da hierarquia, sem qualquer cargo de chefia (no máximo um salário mais alto que o da Calzonelli, afinal, ele é homem e isso basta, segundo vários deputados) -, para todos os demais ela vivia de cara fechada, malemal cumprimentava. Nós, claro, animávamos com a história proto-picante e, diante da torcida a favor do affair, Calzonelli já organizava um plano para Fernández tentar algo com a estagiária no mesmo dia.

Foi quando o nobre colega do topo foi um pouco mais enfático na sua defesa de que não havia nada demais entre ele e a moça: “Eu acho que você exagera na minha relação com a Ruth”. Calzonelli o mirou com a expressão fechada, como se não entendesse algo: “Que Ruth?” “Ora, a estagiária”. “A estagiária chama Ruth desde quando?” “Desde quando entrou, oras!” “O nome dela não é Rita?” “Não.” “Mas todo mundo chama ela de Rita, desde quando ela entrou!” “Eu notei, estranhei, mas no crachá dela está Ruth, e eu chamo ela de Ruth”.

Nosso ânimo arrefeceu e tivemos que dar razão ao nobre colega Fernández, de que a simpatia de Ruth não deveria ter nada a ver com segundas intenções, só com o fato de ele ser o único a chamá-la pelo nome, mesmo.

04 de maio de 2023

PS: Este é um texto ficcional, teoricamente de humor. Qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência. A imagem também é ilustrativa.

quinta-feira, 13 de abril de 2023

O fatídico colega Rivarola, o Doutor Sabujinho do momento [por Sérgio S., ex-Trezenhum. Humor Sem Graça.]

Em minha última crônica, preciso confessar e me desculpar publicamente, fui injusto com Macedo, meu nobre colega. Havia dito que ele era o golden boy dos chefes. Nunca foi. Apesar de funcionário exemplar, compenetrado e produtivo, o funcionário do mês sempre ficou a cargo de algum puxa-saco - e isso Macedo passa a anos luz, mesmo quando um antigo chefe insinuou que ele se daria bem se fosse um “pouco mais flexível e imparcial".

Troca-se de chefia, mudam os colegas, contudo, desde que estou em meu atual emprego, sempre temos alguém no setor que é despudoradamente um Fagundes, personagem da Laerte - e a maioria dos chefes adora esse tipo de funcionário, ao menos num primeiro momento. Curiosamente, o perfil é sempre muito parecido: um doutor em sua área, fracassado conforme seus próprios parâmetros, disposto a compensar esse seu retumbante fracasso com elogios do chefe de turno, a quem serve de maneira constrangedora e sem preocupação se isso implica pisar nos colegas. Sempre me pergunto se esse tipo de pessoa acaba assim por falta de uma mãe para elogiar ou, no outro extremo, de uma mãe que tudo elogia e não conta que ele ser o filho perfeito para ela não implica em perfeição fora de casa - e que ele não precisa provar a perfeição que a mãe vê pra toda autoridade. Enfim, por conta desse perfil comum, esse colega acaba por ganhar a alcunha, ou melhor, o título honorífico de Doutor Sabujinho - e alguns comentários maldosos, digo, imparciais, para ficar no mesmo campo que o antigo chefe.

Que conste aqui, um medium scriptum para não ter que ficar no post scriptum: se acaso este texto aparentar que tenho algo contra os doutores Sabujinhos com quem já convivi em minha vida laboral, nunca foi além do trabalho e do pessoal; e ainda assim busquei manter o máximo de isonomia e imparcialidade com os fatos.

Claro, há pequenas nuances entre um Doutor Sabujinho e outro. O atual, o fatídico colega Rivarola (que não é nobre, que fique claro, e para ter direito a algum adjetivo, achei que fatídico ornava), tem em comum com os anteriores uma proatividade ostentatória, de quem pega todas as demandas para si - mas é esperto para logo em seguida despachar parte dessas tarefas para algum colega ingênuo de fato fazer por ele, que fica com a fama no final.

O Doutor Sabujinho anterior tinha como grande frustração não ser o professor de Harvard que ele se julgava merecedor. O atual, crente piedoso do empreendedorismo e do anarco-capitalismo-cristão (afinal, na Bíblia Jesus fala em “que atire a primeira pedra primeiro os clientes Prime e Personnalité com as mensalidades em dia”), foi injustiçado pelo mercado, digo, pelo Estado, que não permitiu que sua startup vingasse e ele se tornasse o Steve Jobs brasileiro. O mais próximo do sucesso como empreendedor digital que ele chegou foi ser motorista de aplicativo (e usuário do aplicativo de ajuda emergencial do governo), após abandonar a infrutífera busca de jobs na sua área, mesmo com doutorado. Umas horas penso que foi melhor para ele: como empreendedor de sucesso, não teria um chefe para puxar saco e não poderia desenvolver suas verdadeiras habilidades (que estão muito além de qualquer doutorado).

Como todo Doutor Sabujinho, Rivarola é um profundo conhecedor de... tudo. Na verdade, de tudo e mais um pouco. E ainda um pouco mais. Sem falar na sua área de doutoramento, onde o fatídico colega parece que não ganhou o Nobel somente porque perdeu a data de inscrição. Uma versão moderna do vizir da história de Nuredin Ali e Bedredin Hassan (“um homem prudente, sábio, penetrante, perito nas belas letras e em todas as ciências”). Da queda do nome do pai na psicanálise lacaniana à fabricação de microchips com cobres aniônicos (cuprate) de lantânio, hólmio e bário; de teoria econômica (todas as vertentes) aos grupos fuchsianos aritméticos; do factum da razão nos juízos a priori à influência das civilizações pré-axumita na arte contemporânea produzida pelos dissidentes neoístas pós festivais de apartamento em New York; dos verdadeiro desejos do verdadeiro deus ao manuscrito Voynich (que ele não deve ter ainda liberado a tradução ao grande público porque está em dúvida na tradução de alguns termos), Rivarola talvez só não saiba a cor da minha cueca do dia - talvez. Mas a do chefe, ele deve saber com certeza.

A grande diferença de Rivarola com relação ao Doutor Sabujinho anterior, é que este tinha um ar meio bobo que causava certa piedade (até nos depararmos com ele caguetando alguém para o chefe); já o atual tem mil ares: adora carregar nas expressões faciais e corporais - parece que fez o curso de atuação do Wolf Maya e aprendeu direitinho (poderia ter sido ator de Malhação, se fosse bonito). Ele tem sempre a expressão super expressiva para expressar o momento* de acordo com o que sente do chefe. Se é algo grave, ele incorpora a expressão fechada, o tom severo - parece um médico sério (são raros, mas existem) comunicando o estado terminal aos familiares -, mesmo que seja só um dado outlier que será excluído do relatório do mês; se é alegria o que o chefe espera, só falta dançar declamando poesias do Casimiro de Abreu (não confundir com o Casimiro Ferreira, por favor!
) pela sala. Não há piada do chefe que não mereça uma sonora gargalhada a ecoar pelos corredores, e não há nada sério dito pelo chefe que não lhe inspire o mais compenetrado olhar.

Novamente, me alongo na apresentação do colega e acabo sendo obrigado a deixar para uma próxima o episódio que queria contar.


13 de abril de 2023


* Reitero: não fui redundante, fui influenciado pelos grandes dramaturgos gregos, como Aristófanes. Inclusive em grego fica um simpático, veja: εκφραστική έκφραση εκφράζουν.


PS: Este é um texto ficcional, teoricamente de humor. Qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência. A imagem também é ilustrativa.



quarta-feira, 5 de abril de 2023

Má Influência [por Sérgio S., ex-Trezenhum Humor Sem Graça]

Quando somos crianças e adolescentes os pais sempre temem as temidas* más influências que nos cercam. Em geral, escolhe-se por má influência alguém próximo: um amigo, um vizinho, um primo, um colega - ainda que atualmente estejam ampliando esse círculo e incluindo professores, esses comunistas que querem receber salário, ao invés de trabalhar por amor -, o que me faz pensar que é muito mais a busca de um bode expiatório, de um judas para malhar, que de fato de uma má influência. 

Curiosamente, para os pais nunca a má influência é o seu próprio filho - no máximo ele está uma má influência temporária por influência de uma verdadeira má influência, cujos pais negam a condição de má influência verdadeira e vão atribuir a filho de outrem, e assim até chegar ao primeiro motor do mundo, se formos levar às últimas consequências (o que soa até razoável, se se pensar friamente).

Meus pais, claro, nunca acharam que eu fosse uma má influência. E não só eles: criança tímida, quieta, retraída, eu era tido como a boa influência por professores e pais de amigos, como se fosse positivo uma criança ser apática - e óbvio que nenhum deles desconfiava que quem dava as ideias das traquinagens inocentes feitas pelos amiguinhos e colegas, e que lhes custava sermões e castigos (e até mesmo a fama de má influências), fosse eu.

O que eu definitivamente não esperava era que depois de velho me transformaria em uma reconhecida má influência. E descubro que isso tem um agravante: com a idade que tenho, não há como atribuir apenas um estado momentâneo de má influência, cuja origem de fato seria de algum colega - até porque fazer esse tipo de ilação é de responsabilidade dos pais, e os meus já me conhecem o suficiente para não me defender em situações do tipo.

Quem me avisou desse meu novo estatuto foi Macedo, meu nobre colega, que tal qual uma criança com medo dos pais vetarem encontrar com um amiguinho tido por uma má influência, avisou que não contaria minha “aventura” para a senhora Maceda, sua companheira (sim, muitas aspas para essa aventura).

Tanto a senhora Maceda quanto Macedo, meu nobre colega, são duas pessoas muito organizadas e muito compenetradas no trabalho. Inclusive, Macedo, meu nobre colega, sempre foi visto como uma boa influência pelos chefes que já passaram pelo setor. Tentamos - eu e Meirelles, outra nobre colega cuja apresentação fica para uma outra crônica -, dissuadi-lo de todo esse rigor: explicamos que isto não é uma empresa japonesa e o método 5S estava um pouco démodé (mais, inclusive, que falar démodé); que trabalhar direito é uma coisa, mas quando se torna um golden boy para os chefes é sinal de que se está fazendo algo de muito errado. Ele se dizia tocado, mas não mudava - até apelarmos para as palavras do Capirotinho** e ele começar a entender como funciona a "desvida laboral" (ou seria antivida?).

Assumo que eu também tenho minha fama de organizado no trabalho: minha caixa de e-mail (corporativo) já arrancou suspiros de vários colegas, e meu SGBD para contatos do whatsapp chega a assustar pessoas desavisadas. Em suma: essa minha organização causa inveja (e preguiça) de meus colegas, inclusive do Macedo. E fiquei com a fama.

É quando chegou a hora de organizar minhas férias - esse momento em que, apesar de ser parte do trabalho, eu trato como se fosse pertencente a minha vida pessoal.

Estou eu cá, a uma semana de sair de férias e embarcar rumo ao exterior, quando comento com ele que preciso decidir o roteiro e comprar logo a passagem de volta, antes que aumente o valor. Ele me olha embasbacado: “você não viaja semana que vem?”. “Sim”. E explico que já tenho estresse demais no trabalho e me falta energia para arranjar esse estresse extra de planejar as férias em detalhes: sei quando saio, sei para onde vou (quer dizer, tenho algumas ideias de onde ir, talvez), preciso decidir quando volto. 

“Você vai sem planejar?”, ele quase se exaspera, larga os talheres para pegar o celular. Comento a definição do nobre colega Goreti, que achei muito oportuna: “é tudo planejado, mas com planejamento em tempo real”.

Do celular ele me mostra a tabela de férias que estão planejando (ele sai de férias quando eu voltar): uma linda planilha colorida, divididas quase que por horas, com tempos dos trajetos, pontos a serem visitados, o número das reservas dos vôos e hotéis. Agora é minha vez de me embasbacar: uma agência de viagens para classe média não tem nem 10% desse esmero - talvez uma empresa especializada em ricaços.

Se eu consigo entender o jeito dele, ele segue com dificuldades para entender o meu: “Você ao menos sabe que cidades vai visitar?”. “Planejamento em tempo real, Macedo! Nem ideia, por isso ainda não consegui decidir quando volto: se do sul eu for para o centro do país ou direto para o norte, duas semanas dão conta; se eu decidir passar por cidades das três regiões, seria bom ficar uma semana a mais”. “E as passagens?”. “Compro na hora que decidir”. “E que horas você vai decidir, se viaja semana que vem?”. “No momento oportuno”, respondo - e me foge usar o termo em grego clássico, καιρος, pra tentar dar um ar erudito (atenção, não confundam com o uso moderno do termo, com o qual a Maju despontou). Talvez esse verniz erudito tivesse feito ele repensar o que disse a seguir: “É... definitivamente é melhor eu não contar isso pra senhora Maceda”. O tom não deixou dúvidas: eu havia me transformado em uma má influência - e para além dos chefes. Ainda tentei consertar com uma tabela quase igual à deles, feito no final do horário de almoço, mas não fui convicente: sou oficialmente uma má influência, cujos companheiros e companheiras dos meus colegas fazem o lugar dos pais e me olham de soslaio, até mesmo duvidando que meu SGBD de whatsapp seja verdadeiro.



Reparem que minha tabela é muito mais colorida e bonita e prática



05 de abril de 2023


* Não estou sendo redundante, isto é influência (má, talvez) da língua de Sócrates (o filósofo, morto por ser uma má influência, ainda que o futebolista também tenha sido considerado como tal)

** Para isso usamos o Manifesto proletário.


PS: Este é um texto ficcional, teoricamente de humor. Qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência. A imagem também é ilustrativa.

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2023

Efeito borboleta de um e-mail corporativo enviado equivocadamente [por Sérgio S., ex-Trezenhum. Humor sem graça.]

A história começa de um modo simples e despretensioso: um funcionário mandou e-mail em que perguntava se havia vaga em outro setor. Tudo certo, não fosse um erro: ao invés de mandar para a pessoa responsável, o e-mail foi para todos os funcionários. Isso também não é novidade: ao menos uma vez por mês recebemos um e-mail que era para alguém bem específico - infelizmente, até hoje nunca chegou algo picante, digno de embalar o horário do café. Também não é novidade vários colegas responderem reclamando do equívoco, que isso está enchendo a caixa de e-mails deles (como se tivessem 10mb de espaço), pedindo pra sair da lista (o que só é possível mediante pedir as contas), criticando quem não sabe usar e-mail.

Desconheço o colega que queria transferência de setor, mas a novidade foram as respostas que surgiram e os seus desdobramentos. Primeira novidade: o setor respondeu de pronto, mas para todo mundo também, solicitando o currículo. A seguir, vieram os clássicos de estarem enchendo a caixa de e-mails (e são esses os que mais enchem as caixas de e-mail), de  querer sair da lista de todos os funcionários e xingamentos a quem não sabe usar e-mail em pleno 2023.

No meio do caminho, nova novidade: alguém foi mais específico, e naquele tom de educadamente puto, respondeu “Por gentileza, encaminhar o e-mail somente ao interessado”. Pessoal gostou e resolveu repetir a frase, enchendo ainda mais a caixa dele e de seus colegas que se incomodam com mensagens do tipo. Virou praticamente uma hashtag nos e-mails institucionais - inclusive foi nessa hora que o nobre colega Macedo me avisou dessa treta interna. Talvez o colega que queria transferência tenha feito isso - eu, ao menos, não recebi seu currículo -, mas a discussão ganhou corpo e outros colegas aproveitaram o ensejo para mandar o currículo de conhecidos - e eu acho que fizeram para provocar os que só reclamam. Mais que isso: alguém puto com os emputecidos que enchem a caixa de e-mails alheios reclamando que estão enchendo suas caixas de e-mail mandou um e-mail para todos criticando quem critica quem comete esse tipo de equívoco e gerando nova contenda, em outra discussão por e-mail, que enche a caixa de e-mail de todos.

Voltando à discussão inicial. O funcionário do setor de compras, pelo visto uma pessoa bastante estressada e desgradável, que já tinha mandado dois e-mails reclamando que estavam enchendo a caixa de e-mails dele, apareceu mais uma vez, agora dizendo que aquele era um e-mail corporativo e não pessoal, e se fosse por esse caminho, logo estariam anunciando venda de veículos - o que nunca tinha acontecido até então, apesar de todo mês ter e-mail desse tipo, com respostas reclamando e blábláblá, como eu já disse acima. 

Contudo, a ideia do colega do setor de compras parece que encontrou eco. Se não chegou ao ponto de anunciar carros, o povo começou a anunciar de brigadeiro gurmê a casa na praia para o carnaval. Virou praticamente uma feira do rolo virtual interna, para desespero dos mal humorados, que seguiram se queixando, agora em meio a ofertas de produtos variados. 

De minha parte, minha queixa até agora é não ter aparecido nada que me apetecesse, mas avisei o nobre colega Goreti, que revende óleos essenciais e produtos de babosa.


16 de fevereiro de 2023

PS: Este é um texto ficcional, teoricamente de humor. Qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência. A imagem também é ilustrativa.

segunda-feira, 23 de janeiro de 2023

Família [por Sérgio S., ex-Trezenhum. Humor sem graça.]


"Família, família
cachorro, gato, galinha
família, família
vive junto todo dia". 

Se a desocupada leitora, o desocupado leitor esperava neste texto uma crítica à família, com citações de Engels e Gaiarsa, sinto informar que não haverá nada disso. Se, pelo contrário, imaginava que encontraria alguma palavra cristã edificante sobre a família, como teria a pastora Flordelis ou vemos nos sonhos eróticos-perversos da pastora Damares (quer dizer, espero que sejam sonhos, porque metade de sua historieta perversa de sequestro de crianças ela é acusada de já ter praticado), você errou feio, muito feio. Se imagina que uma família é como uma empresa, digo, que uma empresa é como uma família, tenho dó da sua família e sofro de inveja reversa de onde você trabalha.

“Família” é como não raro usam para se referir a mim e ao nobre colega Macedo, quando saímos pelo centro da cidade, em nosso horário de almoço, conforme comentado alhures. 

Até então achava que fosse uma forma de o atendente tentar parecer simpático ao chamar duas ou mais pessoas que chegam a um estabelecimento comercial: na ânsia de não ser minimalista com um “o que vocês querem” ou “pois não”, ao invés de um formalóide “o que os clientes/os senhores desejam”, ou os “o que os irmãos precisam”, que daria um ar muito religioso (talvez na Conde de Sarzedas caia bem), “família” soaria uma tentativa menos clichê, ainda que aparentemente muito utilizada. 

Pois estávamos eu e o nobre colega Macedo na zona, em um dos estabelecimentos comerciais onde costumo comprar chimia. A atendente se aproximou com o já habitual “posso ajudar, família?”. Ao que respondi que não, apenas olhava, mas ela insistiu em ficar ao nosso lado - depois a gente migra para as compras online e não entendem o porquê. Avisou que a geleia de determinada marca estava em promoção. Agradeci e avisei que era diabético. Ela assinalou onde estavam as sem açúcar e para ali voltei meu foco. 

Não o nobre colega Macedo, cuja atenção foi sugada pela geleia de alho com pimenta tal qual o clássico Ferdinando, o touro, diante de uma borboleta. Dono de marmitas com misturebas um tanto esdrúxulas (sem entrar no mérito se ficam boas, apenas que são plenamente incomuns), ele soltou um introspectivo “olha!”, enquanto eu me indignava com a empresa tentando me enganar, cobrando cinquenta centavos a mais numa geleia 100% fruta, mas com metade do peso. A atendente, que seguia ao meu lado, me pressionando, interveio de pronto: “essa tem açúcar” (sim! A geleia de alho com pimenta é doce!). “Ele está vendo pra ele”, respondi, ao que ela soltou um “ahh” estranho. 

E foi esse “ahh” estranho que fez eu suspeitar que o “família” que sempre ouvíamos não era um vocativo comum a todos, mas só àquelas pessoas que atendentes crêem serem uma... família. Isso se confirmou naquela mesma tarde, após ter perguntado a outros colegas e ninguém ser “família” quando saíam juntos às compras na hora do almoço.

Olhei para Macedo, meu nobre colega, e comuniquei, desolado, a descoberta: “Macedo, acham que somos um casal”. 

Até aí, tudo bem - desde que a senhora Maceda não achasse também e quisesse tirar qualquer satisfação e partir pro braço comigo. O problema é que imagem de casal as pessoas devem ter de nós: dois caras meio parecidos, com barbixas parecidas, usando roupas sempre quase iguais: com certeza acham que temos também um chaveiro com o rosto do outro escrito love e cada um tem um pingente com metade de um coração (se não for uma tatuagem na ulna ou no carpo ou em região íntima!). O problema não é acharem que somos um casal, mas que somos um casal brega! “Brega, Macedo! Um casal muito brega!”. Anos de estudo em artes pra terminar assim: confundido com alguém brega! E não adianta no lugar de pingente ou tatuagem de meio coração ser qualquer outra meia-imagem, mais significativa: seguimos bregas!

Para ajudar meu drama aqui compartilhado, Macedo não aceitou que passássemos a usar o crachá ao sair, para ao menos acharem que estávamos quase com a mesma roupa por trabalho, não por um de nós ter perguntado, no início da manhã, “amor, vamos de camisa vermelha hoje?”


23 de janeiro de 2023


PS: Este é um texto ficcional. Qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência.

segunda-feira, 2 de janeiro de 2023

Não misture drogas: o caso da berinjonha [por Sérgio S., ex-Trezenhum. Humor sem graça]

É discurso do senso comum que não se mistura drogas. Vale para as legalizadas, vale mais ainda para as ilegais, que não possuem, por conta dessa política, qualquer controle de qualidade.

É comum um povo de classe média alta que esquece que está tomando Rivotril - ou algo mais moderno - exagerar no uísque ou no campari, e deixar aflorar tudo o que tem no recanto de sua alma em vídeos nas redes sociais - e depois precisa se explicar que não é racista, machista ou homofóbicos, tem até amigos gays e já teve uma funcionária preta. 

Mesmo gente não tão abastada sempre diz que misturar bebidas dá ruim: uns dizem que a ressaca pegou porque fez a mistura de destilado com fermentado, outros porque misturou vinho e cerveja, há aqueles que o problema foi misturar gin e cachaça - nenhum admite que a ressaca foi por excesso de álcool, e não vejo porque não acreditar nessa versão de mistura de alcoóis.

Este sábado recebo uma mensagem no meio da tarde, do nobre colega Goreti - cujo apelido não sei se se dá porque sua mãe, Goreti, era realmente tão legal a ponto de quererem homenageá-la com o apelido ao filho; ou se o filho que era chato e melhor lembrar que ao menos sua mãe era legal; o ponto é que ele já se apresenta com esse apelido, que vem de anos. Pois Goreti, que também é meu vizinho, me mandou um áudio avisando que havia misturado maconha com algo que não consegui entender, estava passando mal, e se eu poderia ir socorrê-lo - ou, na impossibilidade disso, de ir dar comida para o gato, na manhã seguinte, e ver o que fazer com o que restava dele. A porta estaria aberta, era só entrar e salvá-lo. 

Preocupado com o que ele havia misturado sem sequer esperar o ano novo, fui até sua casa. Quando entrei, encontrei-o jogado no sofá da sala, cabelo molhado do banho. Perguntei o que tinha usado, se queria que o levasse para o pronto socorro. “Não precisa. Vomitei. Estou melhor”, balbuciou pausadamente. Tremia e não parecia bem. O vômito me fez lembrar que na faculdade eu tinha um amigo que costumava fumar maconha logo depois de usar ayahuasca, para dar um gás no efeito; imaginei se não seria esse o caso de Goreti: havia conseguido um pouco do alucinógeno, misturado os dois, como fazia Xelim*, e tido uma bad trip sem ninguém para ajudar a segurar a barra. Insisti em saber o que havia usado, e de novo só entendi a maconha. “Maconha com o quê, ô, criatura?!”. Eu estava realmente preocupado. “Com berinjela”.

Berinjela? Fiquei um tempo tentando entender se havia entendido direito. Berinjela. Devia ser, ele havia sido claro dessa vez. Meus parcos conhecimentos dos apelidos para psicotrópicos me fizeram ficar na mesma: “O que é berinjela?”. “Berinjela”, insistiu ele, sem abrir os olhos. “É um doce, uma bala, é farinha, é ácido, é popper?”, insisti, ignorando que eu nunca sei o que é doce e o que é bala, e gastando todo meu conhecimento em nomes de drogas com farinha, ácido e popper. “Berinjela”. “Cadê a embalagem disso?”. “Que embalagem?”. “Que porra é berinjela? Acho melhor irmos para o hospital”. “Não precisa”. “Me diz o que você misturou com a maconha”. “Berinjela”. “Que raios é berinjela?!”, eu me exasperava. Ao que ele respondeu com um muito claro “Berinjela é berinjela, caralho!”. “Você diz a leguminosa?”. “Berinjela é fruta”. Não acreditei nessa de fruta, mas deixei pra buscar essa informação na internet só depois - e ele estava correto -, no momento eu fiquei tentando entender a mistura. 

“Você fez uma berinjonha e teve uma bad trip, isso?”. “Não! Na verdade eu comi uma lasanha de berinjela. Sabe aquela que levei e não comi, porque saí comer fora com vocês?”. Eu lembrava, inclusive porque ele não havia posto sua marmita na geladeira. “Aquela lasanha de quatro dias atrás?”. “Oito”, me corrigiu. 

Uma lasanha de berinjela de oito dias, sendo um deles fora da geladeira... “Por que não me disse que estava com uma intoxicação alimentar, ao invés de me assustar assim?”. “Porque eu não achei que fosse. Pensei que poderia ser algo que misturaram com a maconha, ou a combinação de maconha com berinjela. Sei lá, maconha é bastante gordura e dizem que berinjela emagrece, vai que a interação é perigosa. Eu estava tendo um aperto no peito, muito enjôo, uma bad trip que nunca tinha tido”. “O modo de preparo da berinjela você não levou em conta?”. “Ainda estava boa, não achei que fosse... até vomitar”.

Me tranquilizei, acreditei quando Goreti disse que estava bem e eu poderia voltar para casa. Fiz para ele um soro caseiro (nem sei se caberia nesse caso, mas fiz), e disse que me buscasse caso precisasse de algo - não precisou. E eu deixo aqui o aviso de caso alguém resolva fazer um berinjonha: que ouse por sua conta e risco de eventual bad trip.


02 de janeiro de 2023


* Sim, os antigos vão lembrar que Xelim esteve presente em notícias do Trezenhum. Humor sem graça. É o mesmo.


PS: Este é um texto ficcional, teoricamente de humor. Qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência. A imagem também é ilustrativa.

 

segunda-feira, 5 de dezembro de 2022

Macedo, meu nobre colega [por Sérgio S., da Equipe Trezenhum. Humor sem graça.]

Macedo, meu nobre colega, como comentei em outro texto, sempre me acompanha nos entretenimentos de hora do almoço - vulgo comer e dar um rolê, às vezes fazer compras. 

Antes de continuar, um parênteses. Para não ter toda vez escrever "Macedo, meu nobre colega", vou abreviar para "Macedo MNC", mas não seja preguiçoso ou preguiçosa ou ambos e siga lendo "Macedo, meu nobre colega". Fecha parênteses.

Foto de Macedo, meu nobre colega, em suas últimas    
férias (arquivo pessoal dele, vulgo Instagram)

Não apenas isso, os demais colegas - que são nobres, mas não se chamam Macedo - dizem que somos parecidos: ambos magros, filhos de bancários, barbicha parecendo um ninho feito por um pombo bêbado, as mãozinhas para trás na hora de caminhar, guarda-roupas com pouca variedade (quer dizer, eu acho que ele tem um guarda-roupa, mas pode ser que seja uma pessoa chique e tenha um closet), humor bastante peculiar e que dividem com poucas pessoas, e branquelos - ainda que ele tenha um tom fanta mais autêntico e eu esteja para um branquelo-amarelado encardido (ao menos minha mãe sempre critica minhas roupas brancas, que ela diz estarem encardidas por conta do tom de branco que possuem). Por causa dessas semelhanças entre nós, eu acabo ficando estatisticamente parecido com um colega que trabalha alguns andares acima, no que hoje chamam de Rooftop (lê-se rufitóp), mas no meu tempo era apenas último andar, a quem chamaremos aqui de Fernández, Funcionário do Topo (FDT), sendo que o topo aqui se refere ao topo do edifício, não da carreira. Isso porque, apesar de eu não parecer com Fernández FDT, ele e Macedo MNC se parecem, e como eu e Macedo MNC nos assemelhamos, sobra que termino por ser estatisticamente parecido com o nobre colega Fernández FDT, de alguns andares acima.

Novo parênteses (me desculpe tantas interrupções): acabei de notar que o MNC não é uma boa, por dois motivos. Primeiro: vai que alguém se refira a ele como "Macedo, teu nobre colega", e um "Macedo TNC" não seria merecido com o nobre colega. Segundo, pelo risco de que alguma hora apareça no trabalho alguma "Yara, Minha Colega Admirável", e uma abreviatura com as iniciais induza um certo playboy meia bomba que faz cosplay de "não sou pulítico, sou jestor" e que gosta de se fantasiar de Village People para ir na Little Seul a achar que estou falando dele e me meter um processo. Fiquemos, então, com Macedo M, apenas, mas insisto para que o prezado leitor, a prezada leitora não seja preguiçoso ou preguiçosa ou ambos, e siga lendo Macedo, Meu Nobre Colega. Fecha parênteses. Ou melhor, abre outro, rapidinho: até pus a música aqui, pra acompanhar, achei que ficou supimpa. Agora fecha. Ou abre de novo para o tema nomes: acabei de notar que Fernández FDT ficou perto também de uma abreviatura infeliz, e que falado em voz alta pode ser confundido com um sonoro FDP, que Fernández não merece. Vamos convencionar, então, de usar só uma letra, assim, Fernández, Funcionário do Topo, o Fernández FDT, será apenas Fernández F. Agora fecha de verdade.

Na verdade foram tantas interrupções que precisarei encerrar este texto sem narrar o que pretendia e que você que me lê esperava. Peço desculpas e paciência: creio que foi por um bom motivo: facilitar a compreensão e apresentar nosso herói, Macedo M (lembrou de ler "meu nome colega"?). Na verdade, o herói deveria ser eu, Sérgio S, mas trupiquei nesses parênteses e sem querer perdi até o protagonismo da crônica. Ou nem sei se foi tão sem querer, porque Macedo M (não esqueça do "Meu Nobre Colega"!), sempre eficiente e concentrado, costuma ganhar o protagonismo e os elogios dos chefes (e não reparar nas suas barras de gergelim da gaveta).


05 de dezembro de 2022

PS: Este é um texto ficcional, teoricamente de humor. Qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência. A imagem também é ilustrativa.

sexta-feira, 2 de dezembro de 2022

Das vantagens em se trabalhar no centro [por Sérgio S., da Equipe Trezenhum. Humor sem graça.]

Reconheço um ganho em qualidade de vida ao ter o trabalho transferido da Marginal Tietê para a região central. A começar pela proximidade de casa e a economia de R$ 4,40 diários, o que totaliza praticamente R$ 100,00 mensais - pois agora a mesma 1h20min que eu levava para ir a pé do trabalho para casa eu gasto para ir e voltar. Me dou por satisfeito com essa caminhada, e isso me permite a economia de outros R$ 150 de academia. 

Afora essas vantagens monetária (já que o salário segue o mesmo) e temporal, que no fundo, conforme Benjamin Franklin, é tudo dinheiro, é na hora do almoço que o local de trabalho faz toda a diferença.

Na Marginal, começava que tínhamos três opções de almoço nas cercanias - uma barata, uma média-cara e uma cara, nenhuma muito boa -, e para o restante do tempo de almoço, a opção mais interessante era ficar contemplando o rio Tietê devidamente retificado, frequentado por brilhantes animais metálicos, sob o sol escaldante de ésse pê - o que talvez inspirasse poemas parnasianos em Marinetti ou em Mishima (ainda que não veja Mishima escrevendo poemas parnasianos, a não ser, talvez, com as próprias vísceras). Como não sou futurista (nem passadista), nem poeta (mesmo calado), nem fiz o curso de Ikebana e Harakiri do Anti-Espaço Cultural Casa de Lego* na época da Universidade, esse tipo de bucolismo urbano não me comove tanto... 

Em compensação, pelo centro são muitas opções de casas de pasto nas cercanias do trabalho, com grande variedade de preços e tipos de comida. Seria difícil até de escolher, basicamente impossível de enjoar, se eu não me restrigisse às três de sempre - que sequer são as mais baratas ou as mais gostosas.

O melhor mesmo de trabalhar pelo centro fica por conta das opções do que fazer para completar o horário de almoço. Sempre acompanhado de Macedo, meu nobre colega, e às vezes algum (ou alguma) outro colega, não menos nobre, mas que não se chama Macedo, saímos para ver exposições, passear por lojas (a 25 é logo ali, e nós evitamos), ou mesmo só zanzar vendo a fauna citadina pedestre. 

Quando nos centramos nas compras, invariavelmente sabemos distribuir nossas necessidades desnecessárias ao longo do mês, para estarmos sempre necessitando de algo: um estimulante modo do salário frugal garantir que não caiamos no tédio nem no consumismo desenfreado. 

Um dia saímos para fazer uma pesquisa de preços; no outro, para pesquisar outros produtos, que podem ser mais interessantes, diante das limitações monetárias. É na sequência que decidimos ir às compras: uma chave de mandril num dia, um jogo de três cuecas no outro, um odorizador de guarda-roupas no terceiro, um copo retrátil no quarto. E assim vamos, eu e Macedo, meu nobre colega, como se fôssemos dois barões do café esbanjando dinheiro, ou como se fôssemos Estragon e Vladimir esperando Godot: "a gente sempre inventa alguma coisa para ter a impressão que a gente existe", no caso, a gente inventa algo pra comprar. 

Os dias mais interessantes (e perdulários) costumam ser os que vamos à zona, o que costuma acontecer três vezes por mês: duas para comprar ervas, castanhas, frutas secas, ervilhas com wasabi e coisas do tipo, outra para ver se há promoção de cerveja e comprar queijos. Sim, eu sei que a zona cerealista não é tão grande, e poderíamos fazer a compra dos queijos, cervejas, das ervas e das passas numa vez só, mas precisamos fazer o tempo render.

E se acaso não temos o que comprar - ou meu orçamento do mês já está comprometido -, Macedo, meu nobre colega, sempre tem suas barras de gergelim para repôr em sua gaveta. Felizmente, até hoje ele nunca atentou que elas terminam num ritmo um pouco desproporcional ao que ele costuma comer...


02 de dezembro de 2022


* Piada retomada da época do Trezenhum. Humor sem graça. Quem acompanhou na época e/ou leu o livro (ainda tem para vender), entendeu.


PS: Este é um texto ficcional, teoricamente de humor. Qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência. A imagem também é ilustrativa.

sexta-feira, 18 de novembro de 2022

Avaliação imparcial, fundamentada, desapaixonada e serena dos uniformes da copa [por Sérgio S., da Equipe Trezenhum. Humor sem graça.]

Tem gente que pode até achar que a parte mais legal é aquela em que 4 jogadores, 3 pessoas aleatórias e 15 marmanjos mimados preocupados em não desmanchar o penteado correm atrás da bola por uma hora (e catimbam outra meia hora), outros as discussões políticas e éticas em torno da copa (como se o futebol não fosse uma das grandes lavanderias do mundo), mas, convenhamos, a parte mais legal mesmo é ver os uniformes das seleções. Ou era. Se antes dava vontade de comprar várias das camisas - que, claro, eu não comprava, por causa do preço, ou melhor, do meu salário -, agora são poucas as interessantes e menos ainda as bonitas (reconheço, isso já vinha da copa anterior). 
São 13 seleções com Nike, 7 com Adidas, 6 com Puma; Hummel, Kappa, New Balance, One All Sports, Marathon e Merooj vestem uma cada. Essa divisão é importante, porque faz mais sentido avaliar as camisas a partir das marcas, já que seguem meio que um modelo.
Enfim, vamos a uma avaliação imparcial e fundamentada dos “mantos” que estarão sacolejando pelos verdejantes pastos de areia do fazendão de petróleo dos Al Thani, que a gente finge ser um país. 



Hummel
Dinamarca.
Poderia parecer inspirada na camisa do Paraná Clube de 2019, em vários tons de branco, inclusive no distintivo, apenas com detalhes vermelho e azul nas mangas, mas no caso do uniforme dinamarquês, parece que a ideia era mesmo esconder o distintivo. Para não ficar uma camisa lisa, inventaram uns detalhes em tons mais fortes da mesma cor na manga, que fez ficar mais feia. Nota: 1/5





Kappa
Tunísia.
Inspirada na couraça de Hannibal, encontrada no país em 1909, com um rosto na barriga e duas rodelas gigantes de limão na altura dos peitos - em tom sobre tom, claro -, os uniformes da Tunísia parecem embalagem de alguma bebida com 40% ou mais de teor alcoólico. Nota: 2/5




Marathon
Equador.
Os uniformes do país sulamericano até que estão simpáticos. Parecem tapetes de classe média dos anos 90 - principalmente o uniforme 2, na casa dos meus pais tinha um com a estampa igual (só que sem o distintivo). As escolhas das cores foram felizes - os uniformes mais bonitos da copa, disparado. Nota: 5/5





Adidas
Espanha.
Como é proibido camisa lisa, os uniformes Adidas sempre passam a impressão de chuvisco de televisor, tão típico até os anos 90. O uniforme 1 da Espanha, com essa faixa na lateral e abaixo, passa ainda mais a impressão de ser os limites do aparelho (mas podiam ter encaixado melhor. O uniforme 2 pelo visto foi inspirado nos calçadões da orla do Rio de Janeiro em versão de supermercado gourmet, visto numa tevê com chuvisco. Nota: 1/5





Japão.
Alegam que a inspiração seria o origami, mas até onde me consta, amassar um papel de qualquer jeito e depois desdobrá-lo não faz disso um origami. O que temos é mais uma camisa de chuvisco em televisor, mas neste caso resolveram caprichar: parecem chuviscos num monitor trincado. Bonita? Tanto quanto chuvisco em um monitor trincado. A reserva ainda está discreta, chuviscos nas mangas, mas não salva. Nota: 1/5




País de Gales.
Atenção, pais! Não deixem seus filhos assistir aos jogos do País de Gales, risco de ataques epilépticos! Além do chuvisco, resolveram trazer diretamente a impressão de alguém bêbado vendo a televisão só com chuvisco para o uniforme 1. Se olhar demais dá tontura. Linda como uma boa ressaca de bebida falsificada. Já o 2, como não pode uniforme liso, simples e bonito, e não quiseram repetir o chuvisco bêbado, meteram uma faixa na lateral das costas, parece que alguém se apoiou em duas barras com tinta fresca. Nota: 1/5




México.
Dizem que a fenda geológica tremendo seria alusão a um cocar da tradição de povos ameríndios que ocupavam o território antes de serem triturados pelos europeus. Na verdade, deve ser mesmo uma alusão à fenda geológica na costa oeste do país, já prenunciando os tremores de um terremoto - tudo visto de uma tevê com chuvisco. Já o uniforme 2, branco poluído com desenho sem preenchimento, parece um livro de colorir para adultos ou meus desenhos em camisetas (que meus pais achavam bonitos, ou ao menos diziam isso). Nota: 1,5/5




Bélgica.
O uniforme 1, apesar do chuvisco Adidas tem um vermelho num tom bonito, um vermelho sangue, bem no clima do país e suas atrocidades na África - o apelido “Red Devils” teria se inspirado aí? Nas mangas, chegando no sovaco, fogos bem ao gosto do final dos anos 90 (havia uma pintura parecida na primeira versão do jogo Nascar para PC). O uniforme 2 parece abadá para um carnaval ou para Woodstock fora de época, que desistiram no meio do caminho: ia todo colorido, acharam demais, ficaram só umas faixas - e a gente se pergunta o porquê dessas cores todas. Nota: 1,5/5.




Argentina.
Se o uniforme 1 está interessante, apesar do chuvisco Adidas, com uma pequena inovação de duas faixas finas nas costas que terminam na bandeira Argentina na nuca, o uniforme 2 não podia ficar bom - a Adidas faz questão de uniformes feios ou horrorosos em 2022. Dizem que é violeta, mas se disser que é um azul estranho também está certo. Na frente, reutilizaram um .bmp do início dos anos 90, feito no Windows 3.11, de chamas. Porém, como vermelho não ia ornar na camisa, fizeram um fogo azul (violeta), mesmo. Talvez dê pra dizer que seria em homenagem ao glaciar Perito Moreno. Nota 2,5/5






Alemanha.
Como a Alemanha não tem um uniforme oficial, dá para inventar a partir do nada, de um pano branco. Por ser o país sede da empresa, pelo visto a Adidas resolveu não avacalhar muito - ao menos no uniforme 1. Botaram uma faixa preta no pano branco e tá feito - com os chuviscos, claro! Ficou ok. O uniforme 2 sai o Flamengo, entra um tie-day rubro negro visto de um televisor com chuvisco e quebrado. Nota: 2/5






Nike
Holanda.
Sigo achando que foram proibidos uniformes lisos, daí a Nike apelar para o tie-dye. Dá para fazer coisa legal a partir disso? Dá. Mas não é o caso do uniforme da Holanda. O uniforme 1 é um laranja com amarelo sujo. Dizem que era pra lembrar leão, não lembra; mas cabe perguntar por que raios um leão é o símbolo da Holanda, se na Europa não tem leões... enfim. O uniforme 2 é mais normalzinho, azul e na frente, em preto, o detalhe de armação de tenda de praia/babador, nas costas a marca do cabide, duas marcas da Nike para esta copa. Nota: 1,5/2






Inglaterra.
A Nike resolveu não sacanear o país onde inventaram o futebol. A camisa, claro, não pode ser limpa, mas diante do que se tem visto, não ser feia já é muita coisa. O uniforme 1 tem detalhes azuis degradê nas mangas, muito, mas muito cafonas; o 2 é vermelho e sem graça. Destaque para o símbolo da empresa, que é o que mais se chama a atenção. Nota: 2/5






Estados Unidos.
O uniforme 1 usa o padrão Nike tenda de praia/babador, com duas faixas nas mangas. Não é bonita, mas depois das da Adidas, dá até um alívio. O uniforme 2 é um tie-dye tom sobre tom azul, a remeter ao globo terrestre desfeito - seria uma pertinente crítica às atitudes do país, mas acho que é só um tye-die feio mesmo. Nota: 2/5






Arábia Saudita.
Inspirado nos uniformes da concorrente, o uniforme 1, seria uma boa camisa pra turista na praia, se fosse colorida, mas é branca, o que deixa a impressão de alguém acometido do bicho geográfico, mesmo. O 2 remete à camuflagem de exércitos de regiões de florestas tropicais, tão abundantes em locais que não a Arábia Saudita. Talvez seja uma homenagem a algum desejo impossível do país. Nota: 1/5






Polônia.
O uniforme 1, branco, seria bonito, mas meteram temas aleatórios em tom sobre tom cafonas nas mangas. O 2, vermelho - finalmente! -, decidiram que podiam fazer algo limpo e bonito. Nota: 3/5






Brasil.
Na onda do remake de sucesso de Pantanal, a Nike resolveu lançar uma camisa de oncinha albina. Quer dizer, o comunicado oficial diz que aquilo é uma estampa animal, mas parece mesmo aqueles grafites de pedra que se faz em muros de residências como forma de tentar afugentar pixadores e grafiteiros. Essa oncinha albina com mais a gola e mangas com duas cores e o botão na gola dão um ar de camisa de confraternização de fim de ano de empresa média - e as versões falsificadas vendidas por aí salientam esse aspecto, além de mostrar que a empresa ainda tem muito o que melhorar. O uniforme 2, azul, tem o motivo oncinha salientado pelo degradê verde da manga. Parece roupa de piscina dos mais cafonas - e feias. Tão bonita quantos os dribles de Neymar na Receita Federal. Nota: 1/5.






França.
Uma camisa de escritório mal passada, assim pode ser descrito o uniforme 1 da França, com seu botão e seu azul sóbrio (que nem está tão feio, depois do que vimos com o Brasil). Já o uniforme 2 é difícil definir se é um pijama, ou um pijama que foi posto pra lavar com roupas coloridas e ficou manchado. Nota: 2,5/5






Portugal.
É proibido fazer duas camisas bonitas nesta copa, é? Os uniformes de Portugal tinham tudo pra ser dos mais bonitos, mas começa com a mania de carregar em elementos de baixo relevo - e essa impressão de roupa não passada. O uniforme 2, na faixa verde e vermelha que corta o peito deixa bem evidente, fica até parecendo baixo relevo de notas de real - com a vantagem (ou desvantagem?) de não precisar olhar contra a luz para enxergar. Além disso, o uniforme 2 vem com a marca do cabide nas costas e detalhes azuis sem sentido. Nota: 4,5/5





Canadá.
Pelo que leio, única seleção que não teve camisa especial para a copa. Quer dizer que os antigos eram bonitos? Não. Quer dizer que ninguém achava que os canadenses estariam no Catar. Estão. O uniforme 1, vermelho com um perfex da mesma cor nas mangas. O 2, branco, é tão simples que não tem graça alguma. Nota: 1,5/5




Croácia.
Jogos da Croácia devia vir com um aviso aos que sofrem TOC, de que não deveriam ligar o televisor. A representante da Purina decidiu fazer um quadriculado não simétrico no uniforme 1, para horror de quem tem TOC (ou acha que isso é culpa de seu signo, para fugir de assumir seus BOs e ir atrás de resolvê-los). Se até hoje nunca se acertou um uniforme da Croácia, não vai ser em 2022 que isso vai acontecer. O uniforme 2, azul e azul, o xadrez está no degradê brega que a Nike assumiu para esta copa, junto com o distintivo que lembra de algum autódromo, parece mais camisa de algum GP de motovelocidade que de seleção de futebol - dá pra sentir o cheiro de gasolina aditivada só de olhar pra ela. Nota: 1,5/5




Coréia do Sul.

O uniforme 1, vermelho com detalhes vermelhos (e feios) nas mangas, e a marca do cabide em uma cor escura (dizem que é preta) nas costas. O uniforme 2 não sei se é tie-dye, o que é. Sei que é uma camisa preta com cores pra todo lado, que tem tudo pra cair nas graças de um adolescente de 15 anos - mas também pode ser interessante para uma marca de tintas. Nota: 2,5/5




Catar.
Sabe aquelas tesouras de zigue zague que você adorava na pré-escola? Pois parece que usaram uma dessas nas mangas da camisa (eu sei, é uma alusão à bandeira da fazenda, digo, do país). O uniforme 2 parece aquela camisa já encardida, que a criança ainda foi jogar bola no barro, foi goleiro e tomou bolada de todo lado, voltou com ela toda manchada, e os pais não quiseram se esforçar pra limpar, porque não valia a pena. Nota: 2/5




Austrália.
Por que?! Por que?! Parece que a Nike resolveu concentrar o que fez de pior nos uniformes para a copa na camisa 1 da Austrália. É um tie-dye tom sobre tom, mas que parece que é só uma camisa manchada, que lembra motivos animais nas mangas, que lembra uma criança que acabou de sair de uma guerra de bexiga de areia colorida que gruda na roupa, com a marca do cabide nas costas. E eu gosto de camisas tie-dye, mas as bem feitas! O uniforme 2 é o padrão Nike pra copa, com a tenda de praia/babador na frente e a marca do cabide nas costas. Nota: 1/5




Puma
Uruguai.
O uniforme 1 poderia ser só básico e clássico da celeste. A Puma, contudo, resolveu fazer dela também o básico e clássico do funcionário de escritório de baixo escalão, faltou só ser gola polo e ter o bolso no lado esquerdo. Isso é em parte corrigido no uniforme 2. Neste, o espaço de “anuncie aqui” típico da Puma para esta copa tem o formato do bolso que falta no uniforme 1 - infelizmente não é um bolso de verdade: perdeu muito em não lançar essa inovação, do uniforme com bolso. Nota: 3/5.



Suíça.
Claramente a inspiração das camisas suíças foi a função “limpeza de cabeçote” das impressoras jato de tinta, depois de muito tempo sem serem utilizadas. Seja a 1, vermelha, seja a 2, branca. Esta, no seu espaço “anuncie aqui” lembra as plaquetas de corredores de maratona - e a bandeira do país dá um ar de socorrista, maratonista-socorrista. Nota: 2/5




Sérvia.
Então é Natal, e o que você fez? O uniforme 1 da Sérvia, com seus detalhes dourados, está bonito, e as estrelas num tom mais escuro de vermelho por todo o uniforme (porque não pode ter camisa limpa, lembra?) dá um ar de Natal - é possível ouvir a voz da Simone só de olhar para ela. Já no uniforme 2, o espaço “anuncie aqui” parece plaqueta de restaurante árabe da 25 de Março. Nota: 3,5/5




Marrocos.
Mais uma camisa limpa. Vermelha com uma faixa verde que corta no peito. Geralmente é um expediente usado por equipes que tem tantos patrocínios que fica difícil achar o distintivo e o número - essa faixa ajuda a se situar em meio à profusão de símbolos. Contudo, ao cortar a faixa verde que corta o peito para pôr seu símbolo, a empresa consegue dar mais destaque a si que ao próprio escudo da seleção marroquina: parece uma camisa genérica da Puma, e ali do lado tem uma medalha de condecoração, sabe-se lá do que. O uniforme 2 tem a plaquinha de “anuncie aqui” da Puma mais discreta, que mostra que esse modelo clichê de uniforme 2 da empresa até poderia ser ok. Nota: 3,5/5




Senegal.
Camisa bonita, com uma estampa chevron nas cores da bandeira - com destaque para a estrela. A número 2 poderia ser bonita, mas tem a plaquinha de “anuncie aqui” da Puma. Nota: 4/5




Gana.
O uniforme 1 é limpo e básico. O 2, vermelho, tem a famigerada plaquinha de “anuncie aqui” de mercado, mas nas cores invertidas (é vermelha com bordas amarelas) e motivo praia. Dá para ouvir o locutor do mercado anunciando que o patrão enlouqueceu e só hoje a promoção da alcatra. Nota: 3/5.





One All Sports
Camarões.
Uma camisa lisa, com motivo geométrico que dá a impressão de uma armadura ou de um colete sexy para gogo boy. Surpreende por não ter nenhuma textura em tom sobre tom, pode isso? Nota: 3,5/5




Merooj
Irã.
Como parece ser proibido camisa lisa, talvez por algum remake de Pantanal que esteja sendo feito no país, meteram uma estampa de guepardo nas mangas. Não podia não ficar brega. Nota: 1,5/5




New Balance
Costa Rica.
Ué, podia fazer os uniformes simples, limpos, clean, em que o principal é deixar claro a seleção, ou esqueceram de avisar a Costa Rica? Nota: 3/5





18 de novembro de 2022

Colaboraram: Amanda C.M., Marcelo H.G., Ricardo D.A.