sexta-feira, 10 de julho de 2009

A burocratização da esfera política

Descobri esta semana que sou professor universitário. Fiquei curioso em saber se de universidade pública ou particular: isso, porém, não estava explicitado. Explico. Achei um texto meu, escrito pouco antes do início da greve deste ano, publicado em um blogue de alguém que desconheço. O dono do blogue resolveu esquecer de pôr o título, “Mediocridade e conservadorismo na universidade brasileira”, deixando apenas o subtítulo “O movimento estudantil”. Compreensível, visto o teor conservador de direita/reacionário do seu autor (que, ao que tudo indica, não entendeu o que eu quis dizer). Pelo menos citou o autor (por ser copyleft, deveria ter citado também que tirara da página do CMI).

O divertido foi que, vendo que o texto era escrito por alguém de dentro da universidade e com alguma experiência nesse ambiente, resolveu me taxar de professor universitário. Logo eu, que para Unicamp ainda sou aluninho de graduação. E não adiantou eu avisá-lo dos “equívocos”: meu texto segue sem o título, e eu sigo com mais títulos do que tenho – aqueles pressupostos aos professores universitários.

O ponto que chama a atenção nessa história é a necessidade de aval burocrático para que o que eu disse seja digno de consideração. Oito anos de graduação, participação no sindicalismo estudantil, em projetos de educação popular e outros não me autorizam a dizer nada, se eu não apresentar antes as credenciais. Que tais exigências burocráticas existam no âmbito do Estado é até justificável, visto que se trata de selecionar uma burocracia bem capacitada e adepta do burocratismo para garantir sua perpetuação. Preocupante é quando tal burocratização atinge toda a esfera política. Para ter direito à voz é preciso antes mostrar os papéis timbrados que dizem que você tem tal direito. Carteira de identidade não vale. Só com isso, quem ousa ter voz não passa de um defensor da ignorância. E a própria direita, sempre tão crítica da burocracia estatal, é a primeira a legitimar e estimular o papel do Estado na divisão social de saberes.

Os “especialistas” que toda reportagem na tv mostra que o digam.

Campinas, 10 de julho de 2009
Publicado em www.institutohypnos.org.br

sexta-feira, 3 de julho de 2009

A força faz a união

Do governo federal, redução (ainda que temporária) de impostos e uma linha de crédito de R$ 4 bi. Do estadual, mais uma linha de crédito de R$ 4 bi, e R$ 1,3 bi para a ampliação da marginal Tietê. Agora é a vez do governo municipal dar sua contribuição, com a proibição de circulação de ônibus fretados em parte da cidade de São Paulo. Se os três níveis de poder conseguissem agir tão sincronizadamente para a melhoria da educação, da saúde pública, da segurança, para o combate à corrupção, à miséria e estaríamos sem dúvida em um país muito melhor. Mas é o transporte individual que consegue unir forças dessa forma.
A democracia brasileira em breve poderá ir para além do “um homem, um voto”, instituirá o “um homem, um carro”. É quando todos terão a alforria do transporte público, livres para irem onde bem entenderem com seus potentes carros. A 5 km/h, se tanto, mais vagarosos que os resistentes pedestres que insistem em ter pernas e a ocupar calçadas com elas, impedindo a sua transformação em ruas, o que auxiliaria no fluxo de veículos.
A medida de proibir os fretados, diz o secretário de transporte, Alexandre Moraes, tirará de circulação 1300 ônibus, afetando 110 mil pessoas. Dessas, estima, 48 mil irão para o transporte público (com aumento de até 46% nos seus custos com transporte). Suponhamos que essa santa ingenuidade seja verdadeira, resta a dúvida: e as outras 62 mil pessoas? Adotarão bicicletas, skate, patinete? Ou porão 25 mil carros a mais nas ruas (e olha que estou dobrando a taxa de ocupação nesses carros)?
Para além do questionamento dos investimentos e da celeridade nas melhorias do transporte público, ainda mais na caótica São Paulo, outras questões devem ser levantadas: o papel do carro no imaginário nacional: ter carro é ter sucesso, pedestre é pobre e perdedor; e a centralidade da indústria automobilística na geração de empregos.
Enquanto não começarmos a mudar isso, seguiremos comprando carro para cada vez mais disputar corrida com pedestres. E ainda com o risco de perder.

Campinas, 03 de julho de 2009
Publicado em www.institutohypnos.org.br