quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Da USP à Paulista

Um amigo meu, o Wlad – que é também meu editor, diga-se de passagem e sem propósito outro que disfarçadamente dizer que em breve lançarei um livro –, pediu pra dormir aqui em casa: tinha reunião de serviço e depois iria para uma festa na FAU-USP. Me chamou pra ir junto (à festa), o que aceitei sem muito titubear – até porque era recepção aos ingressantes, e eu poderia conferir in loco o que estava perdendo, por ter ido, como sempre, mal na prova de aptidão.

Não chegou a ser uma “festa estranha com gente esquisita”, como o Festival de Apartamento, ao qual eu fora – o Wlad também – no final de semana, em Campinas. Na verdade, estava uma festa universitária banal, com o diferencial de que tocava uma banda ruim e havia alguns cartazes, fora Rodas, fora PM, GREVE! A outra diferença, mais marcante, foi não trombar com ninguém conhecido lá – o Wlad ainda encontrou dois, que estavam trabalhando no bar. Uma sensação estranha, que a mim incomodava, e o Wlad tentava encarar com a receptividade dos velhos tempos. Tentava, mas não conseguiu. Nem duas horas depois de chegarmos, tomávamos o caminho de volta: que tal flanar pela Paulista e Augusta, convidou-me. Convite que aceitei de pronto.

Descemos na estação Consolação. Na plataforma de embarque, uma mulher na casa dos seus trinta e poucos, muito elegante – de uma elegância que lhe assentava muito bem – passou por nós. Não havíamos sequer saído da estação quando cruzamos com duas gurias bonitas. Na rua, mal adentramos a Augusta, um mendigo anunciava, Acabou o show, agora é hora d'eu ir catar lixo. No caminho, um rapaz, acompanhado de mais dois, nos abordou pedindo dinheiro pra pinga – não vou mentir que é pra comer. Demos, por conta até da inferioridade numérica – apesar do tom não ter sido ameaçador. Mal passaram por nós, dois PMs atravessaram a rua em direção a eles – e de outros dois que estavam na mesma calçada que nós. Fodeu, lá vem truculência, pensei. Os três seguiram seu caminho sem titubear e a polícia não os incomodou. Eu, em compensação, não tive como não deixar escapar um puta, que medo!, diante de uma metralhadora que um policial entregava a outro. Que ignorância, comentou meu companheiro de passeio, pouco depois. Uma breve pausa num bar, gol!, onde assistimos ao segundo tento do Palmeiras. Prosseguimos. Mais à frente questionei: as pessoas que faziam ponto ali, eram mulheres ou travestis. Dúvida compartilhada pelo Wlad.

No caminho de volta para a Paulista, uma prostituta nos avisou que a Augusta termina naquela esquina. Também nos contou que fazia direito e que queria ser promotora: nada é pro curto prazo, é preciso ser persistente. Mais pedintes – esses sozinhos –, pessoas se apertando nas áreas para fumantes dos barzinhos, três baianos – a acreditar no sotaque e na camisa de um deles – nos pararam para pedir informação, aqui ainda é a Augusta, uma garota que esperava o ônibus, e do outro lado da rua um rapaz munido de guitarra e amplificador tocava um pop-rock romântico qualquer – tenho a impressão de que não daria certo, a moça estava suficientemente irritada ao celular, e alguém pra atrapalhá-la era tudo o que ela não devia querer.

Na Paulista, um mendigo dormindo não com o cofrinho, mas com a bunda exposta. Sob o vão do MASP, dois carros da PM estacionados; próximo a eles, num canto, um homem vendia artesanatos. Se punha ao lado dos seus produtos, peito estufado, como orgulhoso da sua mercadoria. Questionei ao Wlad expunha, vendia a quem, se praticamente ninguém passava lá àquela hora. E não seria louco de vender drogas na cara da polícia, se acaso aquilo fosse só um disfarce – não parecia. No meio do caminho, o Wlad ainda encontrou um conhecido da cidade dele, que interrompeu sua manobra de skate para convidá-lo para uma festa do vinil em Socorro. Cola lá, leva as bolachas!

Passamos no mercado e voltamos para a Augusta – agora mais movimentada –, comer um pedaço de pizza. Diante da frieza da rede de fast-food, nos animamos mais com uma “pizza de padoca” de um bar. Um homem ainda não bêbado, mas já suficientemente chato, insistia que a cerveja estava quente: molha e põe no freezer, junto com aquela que você vai beber depois. Ali terminamos com poucas palavras a última conversa que vínhamos tendo, sobre questões existenciais e afetivo-existenciais.

No caminho de casa, na parte de auto-atendimento de uma agência do Itaú, três mendigos dormiam o sono dos justos (zelado pelo vigia do banco?). Na FAU, a festa era prometida até às cinco.


São Paulo, 09 de fevereiro de 2012.

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