segunda-feira, 1 de setembro de 2025

Banquete de proatividade [por Sérgio S., ex-Trezenhum. Humor Sem Graça.]

Puxa-saquismo de resultado. Começou a rolar um zumzum no setor de que doutora Sabujinha teria uma proposta de emprego melhor. Sempre disposta a fazer o que os chefes mandam, sem se incomodar com o que seja, nem de passar por cima dos colegas, além de ser uma doutora em sua área, sua possível saída levantou um sinal amarelo da chefia, sempre afeita a funcionários submissos e acríticos. A suspeita ganhou mais corpo com uma série de reuniões entre a chefia e ela. Por fim, ela segue na empresa - por enquanto. 

Fica, porém sem promoção. Diz a rádio peão que é por ter pouco tempo de casa - contudo os doutores sabujinhos que a antecederam conseguiram-na em igual tempo, ou seja, o problema de fato é ela ser mulher. Mas, para não sair de mãos abanando, ou melhor, para ficar de mãos abanando, no lugar da promoção ela ganhou uma reduflação: diminuíram as atividades e responsabilidades que ela tinha - que já eram parcas, por mais que se queixasse.

Claro, trabalhos não somem, alguém precisou ficar com a bucha. Ficou para Carnegie, que se recusou a aceitar, diante de tudo o que já tem para fazer. Sem ter como argumentar contra fatos, a chefe jogou para mim, que não tive como alegar nada e só me restou aceitar - frustrando meus planos enunciados em crônica anterior. Na disputa pelo mais vagal do setor, um a zero para a doutora Sabujinha. Fato curioso: como que esqueceram Macedo, que é quem sempre recebe as demandas sem dono, e as aceita, mesmo estando sobrecarregado?

Puxa-saquismo profissional. Tal qual o último doutor Sabujinho, doutora Sabujinha sabe que é importante fazer uma moral com os colegas - ao menos aqueles que ela ainda não enfiou uma faca nas costas.

Ela, que já era bem relacionada, desde que decidiu permanecer, passou a ser a pessoa mais simpática do setor - para grande amargor dos que já sentiram suas botas de alpinismo no lombo.

Aproveitou a deixa de um grupo para apostar na loto para, inspirada no nobre colega Goreti, organizar uma macarronada com galeto - e mostrar para a chefia proatividade e capacidade de liderar um grupo. Claro, nem todos foram convidados: aqueles que já a enfrentaram ficaram de fora - este escriba entre eles.

Dos que foram convidados, a maioria topou. A data: quinto dia útil do mês, dia em que os funcionários, alegres pelo salário que pingou na conta, saem para comer fora, como se não tivesse o mês todo pela frente.


Assim, foram para o refeitório munidos de três potes de macarrão - um de penne, um de fusilli e um de espaguete -, dois potes de molho - vermelho e branco - e quatro airfryers para o galeto. De modo que na hora de preparar o almoço coletivo eram seis micro-ondas (havia um sendo utilizado por um funcionário de outro setor) e quatro airfryers ligados simultaneamente no mesmo disjuntor. Claro, óbvio, o disjuntor caiu. Não sem antes queimar quatro dos oito micro-ondas e três airfryers.

As reações foram diversas. Alguns, que já caíram no papinho da colega, ficaram consternados por ela; os que tiveram seus eletrodomésticos queimados estão com raiva, e os demais, que não tinham nada a ver com a história, estão simplesmente revoltados - até porque a empresa já avisou que não irá comprar novos aparelhos tão cedo. Assim, as filas para esquentar a comida, que já eram grandes, aumentaram ainda mais, chegando a passar de meia hora!

E se o povo ficou emputecido com ela, por ferrar o horário de almoço, os chefes, que nunca almoçam no refeitório, devem ter achado o gesto genial. Para os colegas, ela estragou o almoço, para a chefia, serviu um banquete de proatividade.


01 de setembro de 2025

Este é um texto ficcional (a imagem também), teoricamente de humor. Não há nada para além do texto. Qualquer semelhança com a vida real é uma impressionante coincidência, ou fruto da sua mente viciada que quer pôr tudo em formas pré-definidas

segunda-feira, 11 de agosto de 2025

Homenagem (atrasada) ao dia dos pais [por Sérgio S., ex-Trezenhum. Humor Sem Graça.]


A homenagem aos pais chegou atrasada aqui na empresa. Bem que Macedo havia comentado de seu estranhamento diante da ausência de qualquer mensagem do RH sobre a data. Pelo visto, esqueceu mesmo. Para disfarçar, a chefe do RH apareceu em pessoa esta segunda-feira, depois do almoço, munida de um tocador de violão e duas funcionárias que carregavam bandejas com bombons e um bilhetinhos para os homens - e que traziam-nas com tanta solenidade e cuidado que mais pareciam duas vestais com instrumentos para uma cirurgia espiritual.

A homenagem poderia terminar por aí: um aluno de canto e violão se esforçando para não errar os acordes nem desafinar muito e um bombom com um recadinho clichê. Porém o que essa homenagem trouxe à baila foi o velho receio do passaralho. Vamos por partes.

Sim, o RH esqueceu de mandar um e-mail com um “Feliz dia dos pais” antes dos dias dos pais. Para compensar, fez o que fez. Pensamos que o chefe poderia ficar incomodado com esse gasto extra, mas quando soubemos que o cantor era outro sobrinho seu, entendemos que o esquecimento foi uma ótima ideia da chefe do RH (e os leitores do TZN. HSG. vão se lembrar que o mesmo expediente era utilizado pela chefe do Bandejão)

Antes de tocar, o moço - mais articulado que Basso, de curta passagem pelo setor - fez um breve discurso motivacional, concluído com “lembrem-se das coisas que fazem sentido, que fazem você se sentir vivo!”. Aplausos da equipe. Olhei para Goreti, ele tinha lágrimas nos olhos - eu imaginava o por quê. Depois, confirmou:

Passo oito horas por dia, quarenta e oito semanas por ano, preso neste trabalho de merda, sem sentido algum, achando Sísifo um sortudo porque ainda pode ver o horizonte quando a pedra rola morro abaixo! Isso pelo lucro do patrão! E ele me pede para lembrar das coisas que fazem sentido?!

Menos melodramático, não pude deixar de complementar o nobre colega:
A dor do chicote estalando no lombo também faz nos lembrarmos que estamos vivos.

Macedo complementou algo em ASMR que não consegui escutar e deixei passar, porque também estava preocupado com o passaralho.

Voltemos à homenagem.

Depois do discurso, a música. Fosse acordeón no lugar do violão e poderíamos nos sentir numa live do ex-presidente que trata os filhos por números, como se fossem presidiários (não que não devessem ser). Outro ponto positivo: não tocou Pais e Filhos, como temeu Macedo, e sim Anunciação, do Alceu Valença. Que sentido faz essa música com o dia dos pais? Fica a interrogação. Pensei depois: poderia ter tocado Pai, do Fábio Júnior. Seria dolorido ouvi-lo tentando imitar o galã (existe ex pra galã, ou uma vez galã, sempre galã?), mas ao menos faria sentido. Quer dizer, faria sentido com o dia dos pais, porque sentido pareceu fazer muito com o recado que vinha junto ao bombom:
“Ser pai é ter um cargo de responsabilidade que você ama e nunca será demitido”.

Seria uma indireta àqueles que não estão satisfeitos com o trabalho? Com quem a chefia acha que não se mostra à altura das suas responsabilidades? De que vai rolar, finalmente, o passaralho que nos ronda desde o fim do ano passado? 

Perturbados, escutávamos um desafinado “tu vens, tu vens, eu já escuto os teus sinais”, enquanto imaginávamos o que não trariam tais sinais.


11 de agosto de 2025


PS: Em outro departamento, a música variou, foi Pra dizer adeus, do Titãs. Mais um sinal...

Este é um texto ficcional (a imagem também), teoricamente de humor. Não há nada para além do texto. Qualquer semelhança com a vida real é uma impressionante coincidência, ou fruto da sua mente viciada que quer pôr tudo em formas pré-definidas