Outlier
é como a estatística chama os casos em uma amostra que estão muito
fora do espectro das respostas padrões, e por isso são
desconsiderados. Reconheço que eu via como outliers
o que chamo de bons médicos, aqueles que além dos conhecimentos
técnicos exigidos, têm atenção e cuidado para com seus pacientes
– nada excessivo, apenas o necessário na relação entre duas
pessoas. Resistia – e ainda resisto – em taxar essa minha postura como preconceituosa, ainda que tampouco a julgue positiva: diria antes que
se trata de má vontade com a classe médica, fruto de interação
não apenas com médicos enquanto profissionais, mas com parentes que
seguiram a profissão, e de ter morado com estudantes de medicina, numa república que virou ponto de encontro de parte da turma –
para não falar do relato de amigos não-médicos que trabalham na
área da saúde.
Semana passada tive a oportunidade de pôr essa minha concepção à
prova, ao aceitar o convite para participar de uma mesa sobre
máscaras sociais, no evento Medicina, Cultura e Arte 2, organizado
pelos alunos da Faculdade de Medicina do ABC – convite que me
surpreendeu, tanto quanto o teor do evento.
Por
conta de alguns acasos, acabei ficando além, muito além da mesa que
participei, e do que havia planejado e esperava: como domingo
precisaria estar em São Paulo de novo, aceitei a sugestão e o
convite para dormir no Diretório Acadêmico, onde acampavam parte
dos participantes de outras cidades. Com isso pude ter um contato com
os alunos bem maior do que havia tido durante a tarde, alunos tanto
da FMABC, quanto de outras universidades, Unesp, Curitiba, Recife.
Como um deles mesmo admitiu, estudantes e médicos como os
participantes do MCA são minoria – porém minoria é diferente de
outlier! E, mais
animador: trata-se de um pessoal ciente que está numa posição de
poder perante a sociedade, e que está disposto a refletir sobre as
próprias práticas – disposição que me pareceu até maior do que
na grande maioria de quem é das ciências humanas, até porque
enquanto estes se julgam pensadores natos, e isso os desobrigaria da
auto-reflexão, aqueles sabem que estão tendo uma formação técnica
e se vêem forçados a ir além do que a faculdade oferece.
Voltei do ABC mais otimista: descobri que médicos e futuros médicos
com uma visão holística do paciente existem em maior número do que
eu imaginava, e estão se organizando – pelo que entendi, começam
a. Quem sabe em um futuro não tão distante, aliado a políticas
governamentais e iniciativas institucionais que já ocorrem, médico
de saúde da família, por exemplo, deixem de ser consideradas carreira para os médicos fracassados.
Campinas, 11 de outubro de 2011.
ps: o título fica por conta de muitos dos estudantes com quem conversei participarem do projeto "Sorrir é viver", que, pondo alunos transformados em palhaços (clowns), procura humanizar a formação médica e dar uma aliviada no carregado ambiente hospitalar. É inspirado nos Doutores da Alegria (que fizeram uma apresentação-palestra no primeiro dia do evento, por sinal) e na medicina de Patch Adams.
1 comentário:
Adorei o texto! Fico feliz pelo MCA 2 ter alcançado um de seus objetivos - que é justamente esse, de ampliar nossos horizontes e nos colocar em diferentes posições na sociedade, não adquirindo um único papel.
Mais uma vez agradeço a participação no MCA2. Espero te ver nos próximos!
Ass.: Natália Mattos
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