sexta-feira, 8 de agosto de 2025

O apagão dos dados públicos e as big techs

O neoliberalismo tinha como algumas de suas premissas o homo oeconomicus - indivíduos racionais que buscam egoisticamente a maximização de utilidades, baseados em expectativas racionais - e a perfeição do mercado - a tal “mão invisível”, que conduziria a uma alocação ótima dos recursos sociais. Disso deriva a ideia de estado mínimo, sem atuação em atividades econômicas, e com funções subsidiárias aos mercados, seja na regulação, com a garantia da propriedade privada, dos contratos, da estabilidade financeira, de evitar práticas concorrenciais desleais; seja na minoração das externalidades negativas das políticas macroeconômicas, via políticas focalizadas de mitigação da miséria; seja na produção de dados e indicativos, sobre os quais empresas e indivíduos podem melhor compreender a sociedade para atuar nos seus mercados - por exemplo, saber se o mercado de trabalho está aquecido ou não é importante para empresas na hora de negociar salários.

O ultraliberalimo, ainda que surgido dos escombros do neoliberalismo pós crise financeira de 2008, rompe com o mínimo de “civilidade” (com muitas aspas) que o neoliberalismo trazia. Saem políticas compensatórias focalizadas pelo “deixa cada um se foder do jeito que quiser”, verbalizada por Guedes; não há mais resguardo da concorrência ou regulação mínima: ao estado cabe, basicamente, a função de polícia patrimonial. É nesse contexto que o Estado tem tentado se desobrigar do levantamento de dados e produção de estatísticas e indicadores.

Durante o governo Bolsonaro, por duas vezes o censo foi adiado. Agora é a vez do governo Trump atacar Departamento de Estatísticas do Trabalho dos EUA (BLS), ao demitir sua diretora, Erika McEntarfer. O que se noticia é que quando os dados não são favoráveis, os governos de extrema-direita preferem atacar o mensageiro e destruir a mensagem. 

A recusa na produção (e divulgação) de estatísticas oficiais parece contraditório num primeiro momento: não apenas políticas públicas são prejudicadas, como a estabilidade financeira, econômica e a política monetária - afetando os mercados. A quem pode interessar o apagão dos dados públicos? 

Com a popularização da internet, o grande volume de dados gerados pelos usuários e processados pelas grandes empresas de tecnologia, o trabalho com grande volume estatístico pode deixar de ser requisitado ao estado por alguns agentes. Em um capitalismo oligopolista, sem qualquer regulação, em que dados pessoais são o novo petróleo, o desmonte de agências estatísticas oficiais atua como uma espécie de privatização dessa função do governo, deixando às grandes empresas de tecnologia um poder de controle sobre estado, sociedade e mercados ainda mais intenso - se com esses dados é possível fazer publicidade quase personalizada, qual seria a dificuldade em extrair conclusões de aspectos macroeconômicos?

Mais que a responsabilização por o que é dito em suas redes, o que as grandes empresas têm a perder é esse grande banco de dados que lhes dão uma vantagem comparativa muito grande em vários setores da economia - ainda mais com governos atuando a seu favor.


08 de agosto de 2025

sexta-feira, 1 de agosto de 2025

Macedo e seus colegas de almoço nas minhas férias [por Sérgio S., ex-Trezenhum. Humor Sem Graça]

Voltei das férias - que não chamo de merecidas porque férias não é merecimento, é direito, conquistado com sangue e suor, mendigado por patrões (como se lhes fosse um fardo ceder esse direito) e sempre insuficiente para o tanto que trabalhamos (menos para juízes). Pois bem, voltei de férias e, diferentemente de algumas das férias passadas, ninguém perguntou se eu estava doente e estivera de atestado nos últimos dois dias. Desta feita sequer notaram que eu me ausentara, salvo o pessoal da minha equipe - o que não significa que sentiram minha falta. E isso é uma boa notícia! Sinal que estou no caminho certo - a meta é passar tão despercebido que até o trabalho passe por mim, e me reste apenas o salário (com os devidos descontos tributários, pois não sou sonegador, me opondo frontalmente ao que dizia um certo ex-presidente que usa adornos no tornozelo).

Talvez quem tenha sentido um pouco minha falta foi Macedo, meu contumaz companheiro de almoço. Na minha ausência, ele variou os colegas com quem compartilhou esse momento - e a alta rotatividade mostra que não teve um que tocou seu coraçãozinho ou que suportou seu humor quase silencioso: tiradas mordazes em ASMR. Já comentei algures que ele é de falar pouco e bem baixo. Também já comentei algures que, pobre Macedo, aparentemente tão bom ouvinte por falar pouco e aparentemente ter uma paciência de Jó, ainda por cima é cercado por tagarelas por todos os lados de sua baia e um pouco além - sendo eu o menos parolema (habemus esperanto!) dessa lista, o que não quer dizer muita coisa.

Digo tudo isto porque foi Macedo quem me atualizou das novidades no tempo em que estive fora. Novidades que não traziam nada de novo. Salvo as do almoço, em que descobriu a face oculta de vários colegas.

Do Mello, fiquei sabendo que não oferece chocolate quando se vai almoçar com ele. Compreensível: se aceitou o convite, não precisa te convencer a escutá-lo. O chocolate é uma forma de atrair para seu lero-lero, não uma compensação por suportá-lo.

De Pacheco, a Doutora Sabujinha, nada de novo, segue a pessoa chata e aduladora de sempre (conclusão minha, a partir do que ele contou).

As novidades novidadeiras foram as da Goleador. 

A primeira foi toda uma mobilização no setor de quem estaria matando a suculenta que fica na entrada, mesmo depois do recado afixado junto a ela. Ninguém queria assumir o ato, até que a secretária bateu o martelo: era ela quem iria cuidar da planta, ninguém mais; ao que Goleador respondeu, aliviada:

Ai, que bom! Não aguentava ter mais essa responsabilidade para mim. Eu via a planta morrendo e estava tentando salvá-la. Era a única a regá-la!

Tentando salvar uma suculenta regando todos os dias... Proatividade nem sempre é algo tão positivo assim - e nem digo isso por ser uma pessoa propassiva.

Mas talvez o que mais me chamou a atenção foi quando Macedo contou que conheceu a versão silenciosa dela. Incrédulo, perguntei como aconteceu tal proeza, estaria ela deprimida, talvez por conta da planta?

Não, ela apenas não fala de boca cheia - e estávamos almoçando.


01 de agosto de 2025


Relembrando os velhos tempos de Trezenhum. Humor Sem Graça., este texto contou com contribuição do Ricardo (além, é claro, do Macedo; mas ele não é da época do TZN. HSG)


Este é um texto ficcional (a imagem também), teoricamente de humor. Não há nada para além do texto. Qualquer semelhança com a vida real é uma impressionante coincidência, ou fruto da sua mente viciada que quer pôr tudo em formas pré-definidas