quinta-feira, 17 de julho de 2025

Salvador tem clima mais paulistano que São Paulo

 É praxe se queixar da ex-terra da garoa, hoje terra das tormentas, como tendo as quatro estações num único dia. Passei uma semana em Salvador e digo: SP é amadora em viradas climáticas.

Acostumado que a previsão do tempo só acerta prognósticos emitidos com uma hora de atraso, sequer conferi o que me esperava para a capital baiana. Fui com base na minha intuição, retirada das aulas de geografia, século passado, que me ensinaram que no clima tropical os verões são quentes e chuvosos, e os invernos, menos quentes e secos. Já havia comprovado isso in loco, ano passado, em São Luís, no Maranhão. 

Ou ao menos assim achava. Porque este ano pus em dúvida o que os professores Jader e Wilfred me ensinaram - ou teria eu dormido na aula? Não, nessa época eu ainda tinha peso na consciência de dormir em aula. Não é possível que Salvador seja desse clima tropical ensinado! Teria o Trópico de Capricórnio um pequeno desvio, de modo a incluir Salvador no clima subtropical? Serão as mudanças climáticas? Terá sido só coincidência, mesmo? São perguntas.

O que se passou é que foram sete dias de frio e chuva e vento. Claro, há que se relativizar o que é frio na Bahia. Nada como estava em São Paulo, mas os 21ºC eram pouco convidativos para sair de bermuda à noite.

Também foram sete dias de sol e calor ameno e vento, que pouco convidavam a uma praia - menos para Lia, que fez questão de entrar na água, mais por querer muito entrar no mar, do que por estar gostoso para isso naquela ventania que esfriava qualquer 26ºC.

Já antevejo que os defensores mais radicais de São Paulo vão argumentar que aqui ainda é pior: a regularidade soteropolitana, de todas as estações em todos os dias, ainda garante que todos os apetrechos carregados consigo serão de alguma utilidade, enquanto em Éssepê você carrega tudo isso sem ter a certeza de que vai mesmo precisar - essa certeza só surge quando você esquece o guarda-chuvas pois, é claro, vai chover na hora do fim de expediente.

Da minha parte, está posto: nesse ponto, não reclamo mais do clima de São Paulo.


17 de julho de 2025




quinta-feira, 26 de junho de 2025

Ladeira General Carneiro, 26 de junho de 2025

No alto da ladeira General Carneiro, um homem oferece suas chagas em troca de moedas. Em frente à base da polícia, Testemunhas de Jeová oferecem sua versão do fim do mundo. Sigo descendo, e o que se oferece são produtos populares de um lado e do outro, réplicas de roupas e tênis de marcas e uniformes de futebol com propaganda de bets. Na rua Doutor Bittencourt Rodrigues, uma fila começa a se formar. Seria para o sopão do meio-dia? Noto movimentação bastante incomum pouco depois da entrada de ônibus do Parque Dom Pedro. Diante dessa nova figura, o fundo se destaca. Reparo no viaduto Diário Popular: se tornou a casa para muitas pessoas - as barracas improvisadas com cobertores se enfileiram na área para pedestres. Talvez os expulsos da mal chamada cracolândia. No gramado da alça do viaduto, PM e GCM dão guarida ao rapa, que recolhe restos transformados em pertences. Um homem, ora com as mãos na cabeça, ora apontando para seu colchonete e cobertor, parece negociar com dois PMs que permitam continuar com seus bens. Pouco depois os recolhe e segue acelerado rumo à movimentação incomum, meia quadra adiante. São onze horas da manhã, o frio já se dispersou sob o sol. O rapa segue fazendo seu trabalho sob o olhar vigilantes da polícia da e da guarda. Muitas pessoas, diante do olhar indiferente da cidade, saem enroladas em seus cobertores cinzas, como que tentando ganhar a invisibilidade que a sociedade quer deles.


26 de junho de 2025