O
PT fará bem se aprender com os erros do seu maior adversário
político, o PSDB, e não ceder às chantagens da senadora Marta
Suplicy, do PT de São Paulo. Em 2014 Marta deu mostras contundentes
de que não difere muito de seu futuro colega de senado, o tucano
José Serra.
Serra
sempre se vangloriou de ter sido voz dissonante no partido durante os
anos FHC, ao discordar da política econômica, ainda que não o
fizesse com excessiva ênfase. Até a disputa da presidência, em
2002, Serra parecia um político sério, independente de se concordar
ou não com suas propostas. A partir dessa data passou a ficar mais
evidente que seu grande projeto político era si próprio - o Brasil
é apenas um acidente. Para além do festival de se elege-renuncia,
escárnio que a população paulista e paulistana aceita de bom
grado, boicotou o próprio partido nas eleições de 2006 e 2008, se
ressentiu pela falta de apoio à imposição de seu nome em 2010 e,
pior, jogou no lixo os resquícios de esquerda do PSDB, teoricamente
ainda progressista nos costumes (apesar de reiteradas práticas
contrárias aos direitos humanos, como a chancela às execuções
extra-judiciais dada por Alckmin aos seus subordinados), dando ao
Partido da Social-Democracia Brasileira o verniz do mais tacanho
reacionarismo, desse que merece o apoio sem constrangimento de
Malafaias e afins. Em algum momento, após as eleições - não
recordo se 2002, 2004 ou 2006 -, aventou-se a hipótese de Serra
estar organizando um novo partido, de linha
nacional-desenvolvimentista. Outra hora, falavam da sua saída para
algum outro partido - PMDB ou PSD. Nada disso aconteceu, e ele ganhou
legenda para disputar prefeitura, presidência, senado, e sabe-se lá
para qual cargo em 2018: mostra de que sua chantagem funcionou.
Resultado para o PSDB de ter dado guarida ao projeto de poder de
Serra: não se reciclou, não criou nomes para disputas posteriores,
se enfraqueceu: a derrota de Aécio pode ser posta na conta serrista,
e a disputa pela prefeitura paulistana, daqui dois anos, será a
primeira chance, desde Alckmin, de surgir alguém, um poste tucano,
com vistas a eleições posteriores. O único nome novo que despontou
desse período Serra-Alckmin foi o ministro das cidades do governo
petista, Gilberto Kassab, ou seja, um nome bem errado aos interesses
do partido.
A
título de comparação: o PT de São Paulo, desde 1998, teve apenas
os Suplicy (Marta em 1998, 2000, 2004 (reeleição), 2008, 2010;
Eduardo em 2006 e 2014, ambas tentando a reeleição ao senado) e
Mercadante (2002, 2006, 2010) como nomes recorrentes em eleições
majoritárias - os outros foram Genoíno (2002), Haddad (2012) e
Padilha (2014). Enquanto isso, o PSDB teve Covas em 1998, Alckmin
(2000, 2002, 2008, 2010, 2014), Serra (2004, 2006, 2012, 2014), José
Aníbal (2002) e Aloysio Nunes (2010). Se levarmos em conta que Serra
disputou duas vezes a presidência e Alckmin, uma, percebe-se a
situação precária dos tucanos paulistas para o futuro breve - suas
maiores esperanças sustentam-se no eleitorado raivoso anti-PT, ou na
troca de cargos entre Serra e Alckmin.
Marta
Suplicy tem deixado explícito que seu projeto de poder é pessoal,
pouco se importando com o partido - diferentemente de Lula, que impôs
novatos e permitiu que o partido seguisse arejado de nomes e de
idéias, como é visível no caso de Haddad. Um primeiro caso de
semelhança com Serra, de que Marta não vê limites para buscar o
poder, foi a insinuação sobre a sexualidade de Kassab, na disputa
pela prefeitura, em 2008. Recentemente, o primeiro aviso de que o
partido pouco valia foi sua carta de demissão do Ministério da
Cultura, em que ela deu mais munição para a Grande Imprensa e os
especuladores pressionarem por nomes do seu agrado, ao criticar o
então ministro da economia - fogo amigo é ainda melhor para
fustigar um governo já escaldado. O segundo ato foi seu comentário
sobre seu substituto no MinC, Juca Ferreira, ou melhor, suas
acusações levianas, tão ao gosto da imprensa anti-petista, de que
"a população brasileira não faz ideia dos desmandos que este
senhor promoveu à frente da Cultura brasileira", e que segue
sem fazer idéia, depois de seu aviso que nada diz. Por ironia, todos
as pessoas ligadas à cultura que tenho em meu Fakebook e que se
manifestaram sobre o novo ministro saudaram a escolha - conforme
Marta, esse povo saberia o que ele representa.
Pela
nota sobre Ferreira, Marta parece ter percebido que, apesar da sua
base de apoio na capital, não conseguiria impôr seu projeto
egocêntrico. Digo isso por ela também ter criticado em sua nota
Padilha, candidato petista derrotado na disputa pelo Palácio dos
Bandeirantes, ano passado. Uma primeira questão se põe: a força de
Marta e seu grupo na cidade é realmente dela ou é do PT? Saberemos
se o PT não capitular às chantagens.
Há
quem veja nesse ato de Marta o "pedido" para ser expulsa do
partido e assumir o papel de mártir. Motivos ela dá de sobra. Vejo
também a tentativa de construir um discurso mais afinado com o
consevadorismo dos bairros centrais de São Paulo, no caso de ela
disputar a prefeitura por outra legenda: a defesa da estabilidade, a
acusação de desmandos e a insinuação de aparelhamento do Estado
compõem muito do discurso ouvido e repetido por esse estrato, sempre
macetado pela Grande Imprensa corporativa. Com isso, numa candidatura
por outro partido, em 2016, ela poderia disputar com o PT o voto das
periferias e com o nome anti-PT o eleitor moderado dos bairros
abastados. Para os primeiros, se apresentaria como petista histórica,
para os segundos, ela tem até uma capa da Veja a seu favor. Falta,
claro, combinar com os russos.
05 de janeiro de 2014
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