quarta-feira, 21 de agosto de 2024

Um trauma chamado restaurante por quilo do centro [por Sérgio S., ex-Trezenhum. Humor Sem Graça.]


Faz um bom tempo comentei que costumo ter minhas três opções de almoço, ainda que o centro tenha centenas de restaurantes, os mais variados - ao menos aparentemente. De lá para cá, pouca coisa mudou: sigo frequentando duas das três casas de pasto referidas dois anos atrás, tendo substituído a terceira. Sou uma pessoa de hábitos. Vez ou outra cedo às pressões de Macedo, meu nobre colega e companheiro de almoços, e vamos a algum lugar diferente - ou mesmo ao terceiro restaurante de antanho, só para confirmar que segue salgado (não falo do preço, que nesse sentido se aplica só à sobremesa do local).

Nessas variações, acontece de irmos a algum restaurante por quilo do centro. E até hoje,  tem sido sempre uma decepção. Mais que isso, já se transformou num trauma. Um trauma reiterado a cada padaria que serve almoço, a cada portinha de sobrado com uma escada para um grande salão, a cada restaurante e lanchonete apertada. 

Existem basicamente três tipos de restaurantes por quilo no centro.

O primeiro são uns que tem pela cidade toda, a mesma apresentação visual, o mesmo preço, a mesma comida salgada, muda só o nome e o endereço.

O segundo são os baratos: tem um bifê (ou buffet, como preferem os chiques) com poucas opções, saladas desmilinguindo de tão cozidas, arroz, feijão, macarrão e a maior variedade é de frituras.

Por fim, há os por quilos caros e que parecem bons, alguns até tentam parecer chiques: os pratos (aqui me refiro ao utensílio) são enormes, para perdemos a noção do quanto estamos pegamos, bifê amplo e sortido, tanto nas saladas quanto nos pratos quentes, e churrasco (bregamente chamado de grill) também com muita variedade. Dentre esses, tem os que - além do trauma - me deixam puto da vida, porque claramente roubam no peso (a partir dos 400 gramas preciso empurrar a comida, mas nesses como 600 e não me pesa, e não, não é a comida que é leve). Não que os outros sejam honestos (e já vou explicar o porquê), mas esses tem uma desonestidade explícita e que poderia ser enquadrada por uma fiscalização.

Enfim.

Em um dia comum, num desses pseudo-chiques, me sirvo de sushi, ceviche, salada de broto de bambu, de cenoura, de tomate, de pepino e de agrião (pulo as conservas, também fartas), no bifê quente, pego paella, salmão ao molho de maracujá, arroz branco, bobó de camarão, fraldinha ao molho madeira, nhoque, tutu de feijão; na churrasqueira, picanha ao alho, fraldinha e frango. E aí vem o passe de mágica que só esses restaurantes conseguem: praticamente tudo tem o mesmo gosto! O agrião não arde, a cenoura parece um chuchu, o tomate parece a cenoura, o pepino o tomate, e o chuchu, esse eu não peguei para saber se tem gosto de alguma coisa outra. O sushi e o ceviche, por seu turno, se não são de chuchu, eu realmente não sei do que seriam. Nos pratos quentes, alguma diferença no molho de maracujá - ruim -, porque peixe, frango, frutos do mar, carne bovina, tudo tem o mesmo gosto, um indefinido tempero que vale para tudo. Paella, bobó de camarão e molho madeira são a mesma coisa - e ruim! Esses restaurantes parecem bandas de formatura, que tocam de tudo, mas sempre do mesmo jeito, de modo que só quando você escuta a letra (e entende o que estão cantando, porque isso também não é sempre) que descobre se estão tocando Beatles, Nirvana, Beyoncé, Banda Calypso, Leandro e Leonardo, Raça Negra, Titãs, Vivaldi, Shostakovich ou funk pancadão. Aí está a desonestidade do lugar: o vasto bifê não é nada mais que uma versão ampliada e repaginada dos por quilo baratos; se fôssemos dividir por gosto, teríamos umas três saladas, duas conservas e seis pratos quentes (contando o churrasco), no máximo, e raramente seriam bons.

Ainda assim, de vez em quando eu cedo à minha esperança de achar uma casa de pasto  por quilo realmente boa e honesta e às pressões do Macedo, e vou a um desses restaurantes. Sou uma pessoa de hábitos - e reclamar é um deles.


21 de agosto de 2024


PS: Lembrei apenas depois: os restaurantes que querem parecer chique ainda põe azeite de oliva de marcas boas para temperar a salada, mas quando você usa é capaz de sentir o sabor dos oliveirais do Mato Grosso...


PS: Este é um texto ficcional, teoricamente de humor. Qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência. A imagem também é ilustrativa.


sexta-feira, 16 de agosto de 2024

Um colega imperial [por Sérgio S., ex-Trezenhum. Humor Sem Graça.]



Precisava de material de um outro setor e mandei um e-mail à pessoa responsável. Educadamente ela me respondeu que somente César Augusto estava autorizado a fazer tal pedido meu setor. Me veio o estranhamento: quem é César Augusto? É certo que não sou a pessoa mais sociável, mas não me lembrava de ninguém com esse nome. 

Dei uma passada de olhos pela sala. Seria um dos novos funcionários? Algum novo estagiário que eu não percebera? Algum colega que eu sempre esqueço o nome, por nos chamarmos pelo sobrenome (ainda que eu sempre saiba o nome de quem sei o sobrenome)? 

Não conseguindo lembrar de nenhum César Augusto, fui pela lógica: quem na sala parecia subir num pedestal quando era chamado? Pedestal não por metidez, mas pelo próprio nome, afinal, César Augusto é imponente demais para alguém com feições como a minha, por exemplo. Novamente, sem sucesso na minha segunda tentativa de adivinhar quem era o misterioso colega César Augusto. 

Envergonhado, pedi ajuda ao nobre colega Macedo. Ele ajudou, mas poderia ter sido mais direto, não ter respondido minha pergunta com outra pergunta (o Chaves já ensinava que só os idiotas fazem isso).

Macedo, sabe me dizer quem é o César Augusto?

Sabe aquele que senta na terceira baia?

O Nilo, claro que sei! Que tem ele? (só os idiotas respondem a uma pergunta com outra pergunta, eu sei).

Sabe o nome dele? Não digo o sobrenome.

Sei, sim. César.

Pois então, tem um Augusto entre o César e o Nilo. Na verdade um Augusto Trajano.

Olhei novamente para o Nilo. Uma boa pessoa, jeito de bonachão, baixinho, fala baixa também, tranquilo, almoçamos seguidamente eu ele e Macedo (havíamos almoçado juntos no dia anterior), parece o Júlio, do Cocoricó, não parece alguém com nome tão imperial, César Augusto Trajano Nilo da Silveira.

Acho que as pessoas deveriam poder mudar de nome quando adultas, para melhor se adequar ao seu estilo. Até isso acontecer, pedi para Macedo não comentar com Nilo minha gafe e torço para que ele não acompanhe meus textos.


16 de agosto de 2024