Não entendo patavinas de música, assim mesmo me arrisco a escrever sobre (se eu fosse só falar do que entendo, nunca falaria nada). Escrevo, então, como alguém que gosta e não como alguém que entende, correndo seríssimos riscos de não sair de rasteiros clichês senso-comum.
Se não for a minha favorita, a quinta sinfonia, de Gustav Mahler, é uma das, e admito que assistir à sua execução ao vivo pela Sinfônica de Campinas, dia 31 de agosto, sob a regência de Lígia Amadio, foi uma emoção.
Composta pouco depois do compositor ter problemas de saúde que quase o levaram à morte, a sinfonia traz o peso, a gravidade desse encontro que inexoravelmente faremos logo no tema com que abre o primeiro movimento: passa a impressão de uma chamada dos Hades. É uma abertura do nível da quinta sinfonia de Beethoven, ainda que não do mesmo poder de concisão.
A gravidade desse tema de Mahler, ao contrário do que se pode imaginar, não parece vir do encontro com a morte, mas do permanente conflito que, quando em vida, travamos contra ela - seja para sobrevivermos, seja para vivermos. Tanto que a sinfonia não adquire as cores pessimistas do réquiem de Mozart, por exemplo, nem a suave redenção do réquiem de Fauré. Afinal, apesar desse marcante tema inicial, de o primeiro movimento ser uma marcha fúnebre, de reiteradamente se ouvir o chamado do Hades nas duas primeiras partes, a música está tratando de vida, em todos os seus aspectos - inclusive do seu fim.
Daí que ela, apesar da gravidade que a perpassa do início ao fim, oscila momentos de luminosidade e momentos sombrios, de tristeza e de alegria, de calma de agitação de tormento. O quarto movimento, já na terceira parte da sinfonia, um adagietto, flutua doce como os melhores sonhos - os quais nem sempre são realizados. Já no quinto, o metal no início cria a expectativa de novo chamado do Hades, mas ele não vem, e o que temos é um movimento alegre e festivo, como a coroar essa existência que começa com o aviso de que o Hades nos espera. Ao término da sinfonia, é seu tema inicial que nos marca, é a trombeta chamando do Hades que cantarolamos na saída do teatro. Tal ressoar não nos traz o temor da morte, apenas nos lembra que essa travessia é parte da vida.
PS: A Sinfônica de Campinas apresentará a quinta sinfonia de Mahler dia 18 de outubro, na Sala São Paulo, às 11h.
PS2: Vi que tem para baixar a referida sinfonia em www.karadar.it
Campinas, 01 de setembro de 2009
Publicado em www.institutohypnos.org.br
Se não for a minha favorita, a quinta sinfonia, de Gustav Mahler, é uma das, e admito que assistir à sua execução ao vivo pela Sinfônica de Campinas, dia 31 de agosto, sob a regência de Lígia Amadio, foi uma emoção.
Composta pouco depois do compositor ter problemas de saúde que quase o levaram à morte, a sinfonia traz o peso, a gravidade desse encontro que inexoravelmente faremos logo no tema com que abre o primeiro movimento: passa a impressão de uma chamada dos Hades. É uma abertura do nível da quinta sinfonia de Beethoven, ainda que não do mesmo poder de concisão.
A gravidade desse tema de Mahler, ao contrário do que se pode imaginar, não parece vir do encontro com a morte, mas do permanente conflito que, quando em vida, travamos contra ela - seja para sobrevivermos, seja para vivermos. Tanto que a sinfonia não adquire as cores pessimistas do réquiem de Mozart, por exemplo, nem a suave redenção do réquiem de Fauré. Afinal, apesar desse marcante tema inicial, de o primeiro movimento ser uma marcha fúnebre, de reiteradamente se ouvir o chamado do Hades nas duas primeiras partes, a música está tratando de vida, em todos os seus aspectos - inclusive do seu fim.
Daí que ela, apesar da gravidade que a perpassa do início ao fim, oscila momentos de luminosidade e momentos sombrios, de tristeza e de alegria, de calma de agitação de tormento. O quarto movimento, já na terceira parte da sinfonia, um adagietto, flutua doce como os melhores sonhos - os quais nem sempre são realizados. Já no quinto, o metal no início cria a expectativa de novo chamado do Hades, mas ele não vem, e o que temos é um movimento alegre e festivo, como a coroar essa existência que começa com o aviso de que o Hades nos espera. Ao término da sinfonia, é seu tema inicial que nos marca, é a trombeta chamando do Hades que cantarolamos na saída do teatro. Tal ressoar não nos traz o temor da morte, apenas nos lembra que essa travessia é parte da vida.
PS: A Sinfônica de Campinas apresentará a quinta sinfonia de Mahler dia 18 de outubro, na Sala São Paulo, às 11h.
PS2: Vi que tem para baixar a referida sinfonia em www.karadar.it
Campinas, 01 de setembro de 2009
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