segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Estimular as crianças


Dizem os livros de auto-ajuda pedagógica que é bom estimular as crianças desde cedo, para que se desenvolvam mais inteligentes. Uma pena que há mães que parecem seguir tudo o que dizem por aí, menos a parte boa dos estímulos.

O cartunista Angeli tem uma série que adoro: “duas coisas que eu odeio... e uma que eu adoro”. Numa das tirinhas, não lembro quais as duas que ele odeia, mas lembro a que ele adora: crianças hiperativas: no quadrinho, defronte a ele, uma criança alucinada, e ele pergunta: e chimpanzé, você sabe imitar? Lembrei dessa tirinha quando fiquei dez minutos dentro do ônibus, esperando dar a hora dele sair do terminal.

Uma menina, devia ter seus cinco anos (sou ruim pra chutar idade de criança), corria do fundo do carro pra frente e se pendurava na catraca, da frente pro fundo e pulava no banco, do fundo pra frente, da frente pro fundo... enquanto isso a mãe, mal-humorada e preguiçosamente, sentada num dos bancos da frente, mandava ela parar – no máximo, o que ela conseguiu foi que ela mudasse a rota: subia em um banco na frente, se pendurava na catraca, pulava em outro, no imediatamente atrás, subia na catraca...

Eu estava sentado no último banco, e a menininha, quando vinha para o fundo, pulava exatamente ao meu lado. Uma hora, tendo provocado algum barulho que não ouvi, ela parou, achando que havia quebrado algo. Interagi qualquer coisa com ela: está pesada, ein? Não, estou forte! UAAAH!!! E foi pra frente, onde mudou de rota, pulando um pouco pelos bancos daquela região, enquanto a mãe mandava ela sossegar. Foi nessa hora que lembrei da tira do Angeli e lamentei meu sempre lerdo raciocínio – principalmente quando na interação com outrem.

Ela, porém, resolveu voltar, e eu resolvi aproveitar a chance. Consegue se pendurar ali em cima? Perguntei, apontando para a barra de segurar. A mãe me olhou com cara feia nessa hora. Não, sou pequena. Me respondeu a guria. Tem que pular alto. Não dá, olha. E pulou – duas vezes –, demonstrando que não conseguia. Foi o suficiente, porém, para que ela, que já andava um tanto agitada, ficasse a mil, para irritação maior da mãe, que não deixou ela se sentar ao meu lado, quando o ônibus partiu, e teve, então, que aguentar ela pulando e a pentelhando durante boa parte da viagem – até o momento em que, finalmente, cansada de mandar que parasse, se dignou a se levantar, pegou ela no colo e a segurou à força.

Lamentei por ambos o fim da diversão, aquela mãe mal humorada, para quem o problema da filha saracotear no ônibus em movimento não era ela se machucar, mas ela estar enchendo o saco. De qualquer forma, descobri que Angeli tinha razão: pôr pilha em crianças já em estado de serelepice profunda é divertido – inclusive pra elas, que devem ter poucas oportunidades de um adulto dando corda. E a diversão ganha um gosto extra quando a mãe não gosta e em breve você vai descer, deixando que ela cuide da filha – que só queria brincar sem atrapalhar ninguém.

Campinas, 28 de novembro de 2011.

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