sábado, 24 de dezembro de 2011

A Grande Imprensa e o pseudo-combate à corrupção no Brasil

Renato Janine Ribeiro comentou em seu artigo no jornal Valor, de segunda (“Apurar até depois do fim”); Vladmir Safatle, no seu espaço na Folha de São Paulo, terça (“O inimigo da moral”); Maria Inês Nassif, na sua coluna do dia 22, quinta, no portal de notícias Carta Maior (“2011, o ano em que a mídia demitiu ministros. 2012, o ano da Privataria.”). Os três criticam a parcialidade da Grande Imprensa diante da corrupção no Brasil, e como essa parcialidade, a despeito da impressão de combate à corrupção, não altera em absolutamente nada o panorama, simplesmente porque a corrupção por ela denunciada é um subterfúgio para fazer proselitismo partidário disfarçado.

Maria Inês Nassif, em artigo na revista Interesse Nacional número 11, de outubro de 2010, comentava o fato da chamada direita (PSDB-DEM), carente de base social, ter a Grande Imprensa – ou mídia tradicional, como ela prefere – como tal base, encabeçando os ataques ao governo Lula. Já no governo Dilma, diante do esfacelamento da oposição com o surgimento do PSD, à imprensa coube todo o papel de oposição ao PT: ela assume, então, claramente, ainda que de maneira não admitida, o papel de veículo partidário.

A tática utilizada no correr de todo o ano para tentar desestabilizar o governo Dilma, um governo que teoricamente começou fraco – pela primeira vez o presidente era mais fraco que seu partido, como a própria Nassif assinalara quando Dilma ainda era uma possibilidade de candidata –, tratou de utilizar o que Renato Janine Ribeiro chamou de “tática de artilharia”: mirar um ministro por vez para derrubá-lo. O efeito, contudo, foi contrário ao esperado: Dilma conseguiu passar a imagem de intransigente com os corruptos, além de ter conseguido se tornar credora dos partidos da base aliada – como assinalou Nassif. Isso até o ministro-alvo ser Fernando Pimental, o primeiro da cota de Dilma.

A princípio esse denuncismo parece benéfico, preocupado em combater a corrupção. A forma de agir, contudo, soltando denúncias a conta-gotas e sempre direcionado – exceção a Haddad, que sempre merece uma lembrança, por não ter sido pego em caso algum de corrupção e pôr medo na oposição de perder a principal cidade do país –, é o primeiro sinal de que o interesse é outro.

Como em política, no Brasil, o suspeito é culpado até que se prove o contrário, uma campanha orquestrada pelos grandes veículos de massa tem um poder considerável. Entretanto, uma vez derrubado o alvo, logo a Grande Imprensa se volta para o próximo da lista, como se o caso estivesse encerrado: não tem qualquer preocupação em seguir com a apuração e confirmar se as denúncias são, de fato, procedentes, para, em caso afirmativo, mostrar quais os caminhos da corrupção – obra do sistema e não de um pessoa individualmente –, ou, em caso negativo, em fazer um mea culpa pela reputação manchada.

Mas não é apenas de leviandade: como comentou Safatle, não há sequer simetria na apuração dos casos de corrupção: a Grande Imprensa é extremamente seletiva no que fala, no que cala, no quanto e quando fala. Ele lembra que o esquema do mensalão, que ficou grudado ao PT, teve início no governo PSDB.
 
O assunto do momento é o livro do jornalista Amaury Ribeiro Jr., A privataria tucana, que, conforme Nassif, faz “denúncia fundamentada e grave” sobre o processo de privatização durante o governo tucano – cujo projeto político, junto com a redução do Estado, típico do receituário neoliberal, era de criar uma burguesia moderna, “escolhida a dedo por uma elite iluminada, e tecida especialmente para redimir o país da velha oligarquia, mas em aliança com ela própria”. A tentativa de ignorar o livro, num primeiro momento, a campanha de desqualificação do autor, depois, mostram que não se trata de uma obra desprezível – sem contar que acabaram por fazer propaganda ao livro, já esgotado.

O risco de um CPI a partir daquilo que o livro constrange a Grande Imprensa a moderar no seu apetite contra o governo Dilma: afinal, seu grande aliado nas últimas cinco eleições presidenciais, o PSDB, está no alvo, afora o fato de nunca se sabe aonde termina uma CPI – nem nós sabemos até onde se estende o quarto poder.

A conclusão dos três colunistas é basicamente a mesma: para combater a corrupção estrutural do Brasil, não adianta fazer denúncias para derrubar ministros, ou encarar toda denúncia como disputa partidária: é preciso levar as investigações adiante, em busca do que esquema que move, e não das pessoas que se aproveitam dele – e fazê-lo sem coloração partidária necessária.


Pato Branco, 24 de dezembro de 2011.

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