terça-feira, 24 de janeiro de 2012

PT, PSDB e direito humanos

Como não tinha laços afetivos com o PT, não tive problemas em aceitar que o partido não oferecia para o país uma alternativa de fato ao programa de modernização-conservadora posta em prática nos anos de tucanato no governo federal. Não precisei, portanto, fazer como muitos dos meus amigos, nutrir um ódio irracional ao PSDB para ter que justificar o voto no PT: não voto em nenhum dos dois, e em ninguém, diante do próprio arcabouço institucional que rege nossa política.

Por não ter aderido ao Fla-Flu PT-PSDB, sempre encarei ambos os partidos como primos – para não dizer irmãos (gêmeos?) –, que disputavam, via de regra, o mesmo eleitorado, o mesmo nicho, com pequenas nunces – importantes, mas não fundamentais. Ainda que PSDB caia para a direita, e PT, para a esquerda no espectro político; dentro dos partidos, a depender da corrente ou do cacique, o PT está à direita do PSDB. Para ficar apenas em um exemplo de como os partidos não possuem lá suas grandes diferenças: os programas de inclusão social postos em prática durante o governo Lula eram ações já defendidas por muitos adeptos do neoliberalismo, diante do desmonte do consenso de Washington: políticas compensatórias à massa de excluídos da bonança do capital financeiro, com o intuito de evitar eclosões sociais severas, que pusessem o status quo em risco.

Encarava como partidos próximos, mas preciso admitir, contudo, que desde a última eleição, quando Serra escancarou de vez a caixa de Pandora do pensamento mais reacionário do país, PT e PSDB começam a demarcar suas diferenças de modo mais significativo. Infelizmente, tais diferenças não se encontram no campo da economia, de programas para o país, ou mesmo em uma disputa para ver qual o mais moderno: tais diferenças têm se marcado no campo dos direitos humanos. A proposta de país é a mesma, a mesma modernização-conservadora, com alguma nuance mais desenvolvimentista aqui, mais liberal acolá, mas sempre se pautando num grande pacto com elites regionais de todas as nuances, no crescimento da produtividade e nas parcerias público-privadas – nova roupagem para as privatizações dos anos 1990.


Ainda que o PT não venha se mostrando um ferrenho defensor dos direitos humanos, na atuação da polícia e nos planos de segurança, fica evidente a diferença de tratamento para com as questões sociais, e isso não é de agora. Vale lembrar que durante os anos do governo FHC, como o governo não conseguiu cooptar o MST, o movimento passou a ser encarado como caso de polícia (mesmo de exército) – e isso foi posto em prática também por governadores aliados, como Jaime Lerner (então PFL), do Paraná, ou Antônio Britto (PMDB), do Rio Grande do Sul, com direito a assassinatos por parte da polícia.

As recentes ações da Polícia Militar paulista, uma polícia com boa reputação internacional no quesito desrespeito dos direitos humanos – vale lembrar que este anos comemoramos 20 anos do massacre do Carandiru que, dizem, matou 111 pessoas –, mostram uma vez mais a diferença entre os partidos: enquanto o PT tenta, pelas bordas, diminuir a força da PM via guardas-municipais (necessidade para aspirar a uma cadeira no conselho de segurança da ONU), o PSDB endurece a linha-dura, disposta a agradar parcela significativa da população que apóia o “atire antes, pergunte depois”, com base no precário silogismo “quem não deve não teme”.

Se na ação contra jovens de classe média, membros da elite intelectual-acadêmica do país (não necessariamente econômica, mas cientes de muitos dos seus direitos), Estado e polícia não tiveram peias em se utilizar de truculência, pode-se dizer que, diante do que ela está apta, para seus padrões, a PM paulista agiu quase que com delicadeza nos recentes grandes casos (norme$ ca$o$) em que esteve envolvida, desta vez contra miseráveis que parte da população gostaria de ver exterminada: o expurgo da Cracolândia, a limpeza de Pinheirinho. Melhor não tentar nem imaginar como ela não atua diariamente, em casos isolados, na periferia pobre, e melhor fingir acreditar que as rebeliões nas cadeias acabaram mesmo, e que isso se deu por convencimento na base do discurso-racional aos presos e ao PCC.


Campinas, 24 de janeiro de 2012.

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