Apesar
de dizer que não dou bola pra essas coisas, não resisto: vai
chegando a virada do calendário e eu começo a esboçar sonhos, a
fazer planos, estabelecer metas para o ano vindouro. Poderia ser
influência dos métodos científicos de governança pessoal, porém
creio que seja mesmo resquício de infância – ainda que quando
pecorrucho eu me contentasse com planos do tipo “o ano que vem vai
ser mais legal”, “fazer mais coisas que este ano”, no máximo,
“jogar mais videogame” ou “bater tal jogo”. A vida era
mais simples, também – eu ainda não tinha tido Kant.
O pior dos planos de ano novo é que estão sempre fadados ao
fracasso, eu sei. O que não sei é por que insisto.
Houve uma vez
que decidi ser pragmático, ao menos aparentemente: estabeleci que
minha meta de ano novo seria arrumar a casa e jogar fora tudo o que
não me servisse mais. Havia até esse evidente efeito renovador.
Linda idéia! A parte de arrumar a casa foi fácil. Difícil foi
estabelecer o que não me servia mais – vai que pudesse me servir
no futuro, como saber? Essa resolução de ano novo, tão singela,
que deveria me trazer a satisfação de ter concretizado todas minhas
metas, acabou sendo outra frustração. Para piorar, das poucas
coisas que joguei fora, uma delas – um tubo de cartão no qual veio
um calendário e que nunca tinha utilizado – me fez, deveras, falta
no correr do ano.
Nos últimos tempos meus planos têm sido um pouco mais
quantitativos. Chamo-os de metas Lula. Eles dão a impressão de que é só você querer que assim será. Falharam, e não porque eu não quis, eu sei, mas ao menos
sabe-se por que falhou – por quanto falhou, na verdade. Teve ano
que minha resolução foi engordar dez quilos. Musculação,
suplemento, refeições reforçadas. Depois de três meses e tinha
ganho míseros dois quilos. É um começo, e assim que deslanchar,
chego aos dez quilos pretendidos, me consolava, enquanto a balança não se mexia. Uma gripe em maio me
fez perder quatro. Passei o resto do ano penando para conseguir
recuperar apenas um dos quilos perdidos.
Em dois mil e doze tinha estabelecido escrever todos os dias –
pouco importa o que –, ler mais do que em dois mil e onze e comprar
tantos livros quanto no ano anterior. A meta de escrever todos os
dias, não sei bem, mas devo ter furado em dez dias, no máximo. Me
consolei que uma falha ou outra acontecia. E mais outra e mais outra
e mais outra, de forma que antes do fim de janeiro já tinha
desistido desse plano mirabolante. Ler mais, eu até teria lido, não
existisse a internet e o facebook – não culpo a Augusta ou
qualquer oriental por isso. Também poderia ter apelado para o
expediente de livros fininhos e com gravuras, porém achei que seria
deslealdade. Já comprar tantos livros quanto no ano anterior eu
consegui cumprir. Além de gastar dinheiro, pra que isso me serviu,
eu não sei. Mas cumpri!
Para dois mil e treze, fiz várias cogitações. Ora pensava em ser o
mais pragmático possível, ora pensava em arriscar metas
impossíveis. Um dos meus planos foi parar de fumar. Chegaria dia
primeiro para os meus pais (com quem passarei a virada), pouco depois
da hora derradeira, e anunciaria: a partir de hoje não ponho um
cigarro na boca! (Nem em outro lugar, caso algum leitor engraçadinho
resolva fazer qualquer piadinha cretina). Pronto, era passar o novo
ano como passei os últimos trinta, e teria cumprido meu plano.
Confesso: teria cumprido a resolução, mas ela em si me soou um
tanto frustrante – não sei, faltou um pouco de desafio.
Na linha dos que eu não conseguiria cumprir, pensei em me tornar um
Don Juan. Para quem transou oito vezes na vida – aí já incluída
a da semana passada –, seria um choque de gestão. Uma das coisas
que mais me animou nesse plano é que poderia, quem sabe, surgir a
inspiração para um novo romance: a história de um Don Juan
ciumento que, em meio a sua seqüência de mulheres, encontra sua cara metade –
uma “Dona Juana” ciumenta –, e passa a ter crises agudas de
ciúmes, até porque nota que sua parceira é mais eficiente que ele
na arte da conquista. Não surgisse esse romance e eu seguisse apenas
com as crônicas, ainda assim teria sempre algo sobre o que escrever
– mulheres –, e ao invés de passar um ano escrevendo sobre Ruth,
a balconista da farmácia, todo mês, poderia escrever sobre uma
mulher por semana. Seriam cinquenta e duas crônicas, quem sabe não
daria um best-seller, Cinquenta e dois tons de mulheres?
Desisti desse plano estapafúrdio: não, não daria um romance, nem
crônicas, nem best-seller.
Insisti, contudo, nessa coisa da escrita, e pedi ajuda a um amigo,
crupiê de jogos literários. Também me pus como meta, auxiliado
pela PUC, que este ano termino, finalmente!, o mestrado – até
porque serei jubilado se não o fizer. E decidi que aprenderia a
tocar duas músicas novas por mês – independente da dificuldade.
Com o peso, resolvi não mexer, deixarei que ele oscile por sua
conta, enquanto eu oscilo na insustentável leveza do ser.
E meus planos de ano novo começavam mal, antes mesmo de começar o
novo ano. Deixei para o último dia e não consegui montar minha
série na Osesp – não achei essa opção no site, e acabei não
fazendo a assinatura.
No fim, ao contemplar minha bela obra de engenharia pessoal, senti um
certo aperto: cumprir todas minhas metas não me fará uma pessoa
melhor (só em titulação), nem mais feliz. Não cumprir, em
compensação... Mas, como sou uma pessoa metódica (dizem), não
abro mão de ter meu futuro planejado. Aceito contribuições.
Pato Branco, 29 de dezembro de 2012.
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