domingo, 3 de abril de 2022

Eu, Daniel Furlan do Tinder

Desde 2012 sou usuário contumaz de aplicativos de relacionamento, quando ainda eram sites - uso interrompido por um breve período entre final de 2012 e meados de 2013. Entrei no primeiro deles por influência de uma amiga, que tinha arranjado um namorado (hoje marido) a 400 km de distância. De início eu tinha vergonha em admitir, até ter que assumir que minha timidez e minha cara de paisagem sempre dificultaram qualquer aproximação do nada, fosse com o fim que fosse, salvo para pedir informações de endereço - seja eu com relação à pessoa, seja a outra pessoa com relação a mim (lembrei disso hoje, ao ir no teatro com uma amiga, e ela ter conversado com cinco pessoas aleatórias. Eu, mesmo quando estou sozinho, não vou além do boa noite pra quem me atende).

Voltando aos aplicativos. O único interregno que tive foi por conta de uma namorada arranjada em um deles. Nos demais namoros, mantive as contas abertas, mesmo que muitas vezes não as utilizasse. Não, não se tratava de cafajestagem, nem achar que o relacionamento seria breve: é que eram relacionamentos não monogâmicos. Sobre isso, preciso confessar: em vinte anos de tentativas, de seis relacionamentos “não mono”, apenas dois foram efetivos - , sendo um deles o mais longo que já tive. A explicação que certa feita essa ex deu para não estourar de ciúmes como as imediatamente anteriores (e a seguinte) é que ela tinha reconhecido que a impressão de eu estar dando em cima de todo mundo o tempo todo era fruto do meu jeito de tiozão do pavê precoce, e que, ademais, ela já tinha sentido na pele que quando eu estou de fato interessado na pessoa eu ajo como se não tivesse interesse (isso ajuda a explicar muita coisa do meu fracasso específico com mulheres, para além da cara de paisagem e da timidez). 

Nesses tempos de conta em aplicativo com namorada, como não pretendia impressionar ninguém, tratei de fazer uma descrição jocosa e avisar do meu relacionamento. Era muito comum que as garotas com quem dava o "match" começassem a conversa perguntando se eu não seria o Daniel Furlan, humorista da TV Quase e do Choque de Cultura. Eu imaginava que era por conta da minha descrição - que foi o que de mais engraçado escrevi desde o Trezenhum. Humor sem graça (que, sem falsa modéstia, ainda acho muito bom! Até desacredito que era eu quem escrevia. Por sinal, ainda tenho alguns exemplares para venda) -, e se tratava apenas de uma forma de dizer que além de homônimo e de idade próxima, eu parecia engraçado, se utilizando de uma referência hipster na classe média descolada. 

Findo o último namoro, retomo com mais afinco os aplicativos e resolvo fazer uma apresentação mais séria. Nada mais de "Pensa num cara bonito, inteligente, companheiro, trabalhador, bem de vida, empático e simpático, bom de cama, alto, corpo em forma, bem humorado, alto-astral, compreensivo, excelente cozinheiro, com ótimo gosto musical, que sabe escolher vinho. Pensou? Agora mantenha o otimismo e o pensamento positivo aí, que eu aqui também vou estar torcendo pra que um cara assim seja o próximo perfil a aparecer!": agora eu digo a que venho, o que busco e o que não sou (para não ter cobranças depois de propaganda enganosa). 

Mas eis que dos poucos "matches" - ainda mais se comparado ao tempo em que eu namorava -, muitos seguem começando a conversa com a pergunta se eu não seria o Daniel Furlan. Dessa vez não entendo o porquê. Até uma delas revelar sua frustração quando respondi que não, eu não sou o Daniel Furlan (nem o famoso, nem o não famoso, por sinal, filho do meu professor da faculdade): contou que me achou parecido com o humorista, e deveras acreditou que eu fosse ele, pela aparência.

Fiquei também eu frustrado com a conversa com a guria: antes eu achava que estava até sendo engraçado e reconhecido por isso, mas o quê!, estavam apenas me confundindo (de novo) com alguém famoso. E com o Daniel Furlan, ainda por cima! Nem para ser com o Tom Cruise ou Brad Pitt (pelo tamanho da napa, que fosse). Talvez eu devesse tentar retomar o humor.


03 de abril de 2022 

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