domingo, 15 de novembro de 2009

A lei antifumo na berlinda

A lei antifumo do governador José Serra, do PSDB, que está virando moda em todo o território nacional, está em aporia: ou o governo prova que a lei é séria e deve ser cumprida para não ter que arcar com as penalidades, ou o governo mostra que a lei não passou de um evento midiático.

Se a lei é para valer, trata-se de uma lei estúpida, que traz mais malefícios do que benefícios. Diz ela que na primeira infração, o estabelecimento é multado em R$ 792, na segunda, R$ 1585, terceira reincidência é penalizado com 48 horas de interdição. Se insistir em desrespeitar a lei, o local é fechado por 30 dias. Muito justa e igualitária, ela não faz distinção alguma: vale para O Bar da Esquina como vale para o Shopping Cidade Jardim. Se O Bar da Esquina fechar por causa da lei – o que é possível já na primeira infração –, não há grandes dilemas (fora para o dono): seus assíduos freqüentadores migram para O Bar da Outra Esquina, e a vida segue normalmente. Agora, e se o Shopping Cidade Jardim for pego pela quarta vez pelos caça-bitucas, será interditado, como manda a lei?

Peguemos um caso mais concreto. Em uma das principais universidades do país, a PUC-SP, foram encontradas pela segunda vez bitucas onde não deveria haver. Na próxima vez que isso acontecer, começam as interdições. Se a lei for cumprida, quem ganha com isso? Nem o governador Serra, que seria execrado por um excesso de rigor absurdo.

Pode ser que eu erre, mas acredito que se a PUC for pega uma terceira ou quarta vez infringindo a lei, não vou chegar lá e dar com a cara na porta, onde um aviso anuncia que as aulas serão retomadas no Natal, quando for cumprida a penalidade. Não acontecendo isso, entrando eu normalmente para as aulas, como sempre acontece, vai ficar evidente que a lei antifumo é uma lei midiática, sem efeitos práticos de longo prazo, como foi o novo código de trânsito, há quase dez anos, ou a mal chamada lei seca. Ou, pior, veremos que se trata de uma lei que se aplica somente aos pequenos, como tantas outras leis justas que temos no país.


Campinas, 15 de novembro de 2009

Publicado em www.institutohypnos.org.br

sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Brasil menino

Eu já devia estar mais esperto: peça de teatro que não é só para entreter, não convém se fiar na primeira impressão, essa que sobe (ou desce, não sei) logo quando ela termina. Não que a primeira impressão não tenha sua validade, que não possa muitas vezes ser a formadora da opinião definitiva, mas sempre cabe matutar depois, repensar o texto e a interpretação e ver se não havia algo escondido.

Foi esse o caso da peça Brasil Menino, da Cia. Berro D’Água, de Campinas. Como a própria apresentação diz, a peça se propõe a uma reflexão bem humorada sobre a relação entre a brasilidade, a cultura popular e a cultura de massa e o apelo do exterior.

Os dois atores, Brisa Vieira e Guga Cacilhas, revezam uma série de papéis: idosos e crianças, passando por personagens adultos. E conseguem trazer bem a questão complexa da cultura popular e da cultura de massa popularesca, sem cair em simplismos. As crianças não são as porta-vozes da novidade, pelo contrário, suas brincadeiras ainda têm muito das brincadeiras simples de antigamente; assim como os antigos – como diz meu avô – não são os arautos do conservadorismo. No meio termo – que não fica tão no meio -, o adulto, a quem cabe ser o responsável por puxar o afoxé no carnaval. Esse mesmo adulto que tem seu rádio ligado quase o tempo todo em músicas bregas, de letra e musicalidade sofríveis.

Por um tempo parece que a cultura popular e a indústria cultural conseguem conviver bem. Isso até surgir uma francesa oferecendo ao personagem adulto (eu não lembro dos nomes, para variar) que a acompanhe à França. Diante de tal perspectiva, não há afoxé que resista. A avó ainda insiste para que ele desista de ir “pra outras Alemanhas” e puxe o afoxé, como era o combinado. Contudo, ao ser estendido o convite a ela também, abdica do afoxé pelo sucesso no exterior. O detalhe é que a cultura “popular” que eles vão apresentar na França é inspirada na que toca no rádio do adulto, nada a ver com o relegado afoxé.

Tentei pensar também a relação do texto com o título, algumas idéias pipocaram, mas nada que eu conseguisse amarrar a conteto. Uma certa inocência da cultura popular ou dos seus produtres, ao menos? De qualquer forma, essa foi minha leitura, passada a primeira impressão, de que a peça era meio bobinha (bobinho sou eu). Como peça que não serve para entreter tem várias leituras, acredito que haja outras bem mais interessantes. Para isso depende de assistir ao espetáculo e tirar suas próprias conclusões.

Ps: Página da peça: www.brasilmenino.blogspot.com


Campinas, 30 de outubro de 2009


Publicado em www.institutohypnos.org.br