Conversava com um grande amigo que trabalha na saúde pública e que já atendeu em posto de saúde da periferia, e acabamos entrando no famigerado tema do segundo turno: legalização do aborto. Ele me trouxe uma experiência sua interessantíssima, e que dá uma mostra do que pode acontecer no caso de legalização.
Uma moça, cerca de vinte anos, chegou ao posto de saúde onde trabalhava e falou que queria fazer um aborto. Coisa que pouca mulher faz, por toda a carga negativa do ato e pelo medo de ser presa ou processada. Ele não a repeliu, pelo contrário, a acolheu, e pediu que explicasse o porquê da sua decisão. Ela disse que seu parceiro iria achar que ela era uma oportunista, por engravidar quando estavam juntos há pouco tempo; que os seus pais não iriam aceitar que ela tivesse um filho sem que estivesse casada e, assim sendo, não via outra alternativa. Ninguém ainda sabia da sua gravidez e ela, ao invés de pedir a uma conhecida onde havia a clínica de aborto mais próxima, ou qual o método abortivo mais eficiente, resolvera ir direto ao posto de saúde – talvez com medo do que poderia ocorrer com ela, ou por desinformação.
Meu amigo pediu para que ela voltasse para casa e esperasse a poeira baixar, que pensasse um pouco mais, analisasse melhor a conjuntura. Explicou que ainda havia tempo para realizar o aborto, caso ela realmente quisesse, e se fosse essa sua vontade, não poderia fazer ali, mas ele daria as sugestões e indicações para que fosse o menos traumático e o mais seguro possível – dentro das possibilidades de um aborto ilegal para uma mulher da periferia.
Ela voltou algumas vezes ao posto para conversar, pesar os vários aspectos em manter ou interromper a gravidez, até o dia em que foi para comunicar sua decisão e agradecer meu amigo e a enfermeira que também a assistiu pela atenção e sugestões: conversara com o parceiro, com os pais, e resolveu que dava, sim, para levar em frente a gravidez.
Isso ilustra um pouco a “carnificina” que o novo arauto do conservadorismo reacionário brasileiro, José Serra, anunciou no caso de vitória da infanticida Dilma Roussef.
Legalizar o aborto não significa “chega deita expele”. Significa que a mulher poderá ir ao posto de saúde sem medo de dizer que pretende fazer um aborto, ser acolhida por profissionais capacitados – enfermeiro, assistente social, psicólogo, médico –, que com ela pesarão e se certificarão da sua decisão, para só então chegar às vias de fato: extrair um punhado de células que nada são, ou começar com a assistência e os exames pré-natal necessários.
Campinas, 11 de outubro de 2010.
Uma moça, cerca de vinte anos, chegou ao posto de saúde onde trabalhava e falou que queria fazer um aborto. Coisa que pouca mulher faz, por toda a carga negativa do ato e pelo medo de ser presa ou processada. Ele não a repeliu, pelo contrário, a acolheu, e pediu que explicasse o porquê da sua decisão. Ela disse que seu parceiro iria achar que ela era uma oportunista, por engravidar quando estavam juntos há pouco tempo; que os seus pais não iriam aceitar que ela tivesse um filho sem que estivesse casada e, assim sendo, não via outra alternativa. Ninguém ainda sabia da sua gravidez e ela, ao invés de pedir a uma conhecida onde havia a clínica de aborto mais próxima, ou qual o método abortivo mais eficiente, resolvera ir direto ao posto de saúde – talvez com medo do que poderia ocorrer com ela, ou por desinformação.
Meu amigo pediu para que ela voltasse para casa e esperasse a poeira baixar, que pensasse um pouco mais, analisasse melhor a conjuntura. Explicou que ainda havia tempo para realizar o aborto, caso ela realmente quisesse, e se fosse essa sua vontade, não poderia fazer ali, mas ele daria as sugestões e indicações para que fosse o menos traumático e o mais seguro possível – dentro das possibilidades de um aborto ilegal para uma mulher da periferia.
Ela voltou algumas vezes ao posto para conversar, pesar os vários aspectos em manter ou interromper a gravidez, até o dia em que foi para comunicar sua decisão e agradecer meu amigo e a enfermeira que também a assistiu pela atenção e sugestões: conversara com o parceiro, com os pais, e resolveu que dava, sim, para levar em frente a gravidez.
Isso ilustra um pouco a “carnificina” que o novo arauto do conservadorismo reacionário brasileiro, José Serra, anunciou no caso de vitória da infanticida Dilma Roussef.
Legalizar o aborto não significa “chega deita expele”. Significa que a mulher poderá ir ao posto de saúde sem medo de dizer que pretende fazer um aborto, ser acolhida por profissionais capacitados – enfermeiro, assistente social, psicólogo, médico –, que com ela pesarão e se certificarão da sua decisão, para só então chegar às vias de fato: extrair um punhado de células que nada são, ou começar com a assistência e os exames pré-natal necessários.
Campinas, 11 de outubro de 2010.
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