Finalmente me mudei, depois de dez anos no mesmo endereço – nove na mesma casa! Casa que nesse longo tempo foi ocupada por amigos, ex-amigos, ex-namoradas, marrecos, sabiás, lagartixas, ratos, gatos e por último, sapos. Ah, sim! E por pessoas desconhecidas, uma vez, que levaram duas caixas de bombom e um walkman antigo.
Depois de dez anos de Campinas, cidade que cheguei maldizendo, que no meio do caminho criei não digo simpatia, mas tolerância – depois de ler o livro A cidade – Os antros e os cantos, do historiador Amaral Lapa, que me permitiu imaginar muito do que Campinas poderia ter sido e não é –, saí dela falando mal – mas com retorno combinado já para o próximo final de semana. Deixei a periferia pacata e rica (e ilustrada?) de uma cidade provinciana para morar perto da principal avenida de uma das cidades mais cosmopolitas do mundo – uma mudança brusca, e que eu sentia como sendo mais do que necessária.
Enquanto empacotava meus apetrechos, desempacotava lembranças – involuntariamente. Lembranças que simplesmente brotavam, ou então que eram despertadas por algum objeto – como um cedê da banda Zwan, mofado, que jazia embaixo de um monte de revistas que nunca mexo. Esse rememorar já havia começado antes, quando fora levar a um amigo minha bicicleta, há anos encostada, talvez justo pelas recordações que ela pudesse trazer – lembranças amargas de amigos que tentaram se matar, ou que conseguiram.
Na última noite de Campinas, chamei os amigos para uma festa despedida. Alguns apareceram. Parece que foi só então que me dei conta do que acontecia: naquele instante, mais do que um futuro prenhe de novidades, eu largava um passado pejado de possibilidades, mas que eu não soubera aproveitar. Me senti como Francoy, ao relembrar dos beijos que não teve de Beatriz: esse passado prenhe de possibilidades desperdiçadas era “algo como perder um dia de sol simplesmente por não ter achado a chave que abria a porta de casa”, ensimesmado por conta de alguma crise existencial, ou, mais comum, por não ter aonde ir para poder aproveitar o dia – o programa campineiro, shopping, convenhamos, não serve para aproveitar o sol, ou a lua, quando muito a chuva.
Ao se irem todos e eu ficar sozinho naquela casa vazia (de futuro), abarrotada por caixas cheias de livros e sentimentos, bateu uma sensação de nostalgia, de melancolia. Não tinha mais internet para fingir acompanhado na minha solidão, e o futuro do pretérito ressoava alto, a ponto de fazer esmorecer o futuro simples.
Assim foi toda a sexta-feira.
Ao aportar em São Paulo, numa noite fria, sob uma garoa fina, senti-me em casa antes mesmo de chegar no apartamento.
São Paulo, 29 de janeiro de 2012.
1 comentário:
uau,
que tocante!
forte abraço
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