A ideia era falar sobre as férias, já que recém retornei das minhas merecidas e insuficientes. Contudo, por ser um assunto com muitos desdobramentos necessários, deixo para um futuro indefinido, e hoje me centro no retorno a esse espaço que me acolhe por oito horas todos os dias - também passando ao largo de toda a tristeza que é isso, apesar dos amigos que tenho no trabalho, que são boas pessoas, mas é muito mais divertido encontrá-los no bar, e boa parte dos colegas é muito mais agradável nem encontrá-los, sequer lembrar que existem.
Enfim, cheguei das férias um pouco atrasado, porque me parece justo a primeira semana ser para se reaclimatar aos horários e todo o sofrimento da labuta. Fui para minha baia, com aquela sensação de que valho um pouco menos que um boi - o que mostra minha condição privilegiada, estar próximo ao valor de um boi e não de um bife de acém -, olhei ao redor, em busca dos quatro rostos novos prometidos para a virada do ano. Identifiquei apenas os dois estagiários - até porque a aparência destoa bastante. O que me chamou a atenção, contudo, foi que um deles estava ocupando a mesa do Desembargador (que havia sido de férias imediatamente antes de mim). Pior: o dito cujo vinha com uma desenvoltura que eu gostaria ter aos meus vinte e poucos anos, e agia como se fosse funcionário há anos, inclusive me cumprimentando animadamente - que respondi com frieza, porque é da minha natureza ser desconfiado. Ele não tardou para vir até mim, e antes de se apresentar já anunciou:
Preciso te contar as novidades!
Olhei perplexo aquele rosto que destoava da voz:
Desembargador?!
Dizem por aí que a barba é a maquiagem do homem. Reparo em alguns de meus colegas: Macedo, Carnegie, Desembargador, doutor Sabujinho, Martão e eu mesmo, todos com as faces cobertas em parte ou totalmente por pelos faciais. Se é assim, estamos mal: mesmo “maquiados”, seguimos com uma aparência que até nossas mães não conseguem elogiar muito esfuziantemente, porque sabem que a realidade foi um pouco dura conosco - menos com o doutor Sabujinho, que além de feio é acabado, apesar de ser o mais jovem dessa lista, e a mãe dele só é capaz de elogiá-lo se for mitomaníaca, porque para tudo há limites.
Pois é, o jovem imberbe na verdade não era o novo estagiário, e sim o próprio Desembargador desembarbado.
Aproveitamos as férias em Punta Cana e noivamos! E mostrou a aliança.
Me mostrou a foto do noivo, e depois de me certificar que o homem da foto era seu companheiro há mais de um ano, que eu bem conheço, creio que entendi melhor a importância do ato: caso algum dia acontecesse de terem que tirar a barba sem avisar, eles precisam ser capazes de se identificar.
Cumprimentei-o pelo noivado, desejei felicidades ao simpático casal e já avisei das minhas restrições alimentares para o jantar. E decidi escrever este texto para discretamente sugerir que deixem a barba, fica melhor.
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