O
refluxo golpista desta semana, antes de comemoração inspira
atenção. Não que seja uma retirada planejada - parece antes que
foram realmente surpreendidos e tiveram que recuar momentaneamente -,
mas certamente algo planejam, pois a aposta que fizeram foi alta
demais e é difícil - se não impossível - voltar atrás.
Insisto
na minha tese de que a entrada de Lula no governo, ainda que passado
o momento ideal, foi um contra-golpe genial num golpe que já era
considerado como certo por tucanos e marinhos [http://j.mp/cG160316].
Noto pela cobertura da imprensa internacional: até a entrada de Lula
no governo, a narrativa estrangeira seguia muito próxima da linha da
Grande Imprensa brasileira, tratando a crise brasileira como uma
conjunção de crise econômica com crise política causada por um
escândalo de corrupção. Desde a semana passada a imprensa
internacional vem se descolando da narrativa golpista e buscado
entender melhor o que se passa. Ainda falam da crise financeira e da
Petrobrás - elas existem, a despeito de qual seja a causa -, porém
não tardam a notar que há um quarto poder extra-legal e
extra-constitucional no Brasil, que derrotado na vitória tida como
certa em 2014, decidiu fazer valer sua vontade, democraticamente
apresentada ao país em horário nobre. A desfaçatez é grande
demais, a ponto de muitas vezes virar piada: na linha sucessória de
uma presidenta chamada de corrupta apesar de não ter nenhuma
acusação contra si, notórios corruptos; na oposição, o partido
que criou as práticas perpetuadas pelo PT e seus satélites
extremistas e limpos como a água do rio Tietê depois de vinte anos
e mais de um bilhão de dólares em despoluição. Em tom de sarcasmo
ou de denúncia, ficou difícil justificar o golpe ao mundo
"civilizado", ou mesmo aos nossos vizinhos argentinos. No
plano interno, o PMDB segue discutindo o novo governo, como forma de
abastecer o noticiário de fofocas, e tucanos já até prepararam uma
festa de inauguração do Novo Governo em Portugal, num pretenso
congresso de direito. As ameaças de Temer e Cunha já não causam o
mesmo frisson de quinze dias atrás - Lula articula com os principais
caciques da sigla, e o silêncio destes tem sido suficiente para não
permitir sorrisos largos de Bonner e congêneres na cobertura da
crise política. Dilma, por seu turno, saiu finalmente para o
combate, e denuncia dia sim, outro também, o golpe em curso,
tentando acuar os golpistas. Entretanto, o principal trunfo no plano
interno do contra-golpe foi a força demonstrada nas manifestações
contra o golpe e pela democracia organizada pelo PT, dia 18: ali
ficou claro aos golpistas que haveria enfrentamento sério, e por
mais que eles queiram dizer que mobilizaram mais pessoas no domingo,
sentiram no moral o desmoronar da crença global de que eram
praticamente unânimes.
O
alerta de que vêm mais golpe baixo por me despertou uma mensagem no
Fakebook de Eduardo Kawamura, que desconheço quem é e o que faz:
"Spoiler:
O novo governo já está planejado. Ele até será defendido em
Portugal no final de março (aliás, com o nosso dinheiro). Há quem
tenha ficado feliz com os editoriais dos grandes jornais afirmando o
caráter 'perigoso' da atuação do Moro para o estado democrático
de direito. É apenas a terraplanagem do golpe. O governo Dilma cai,
a Lava Jato será duramente questionada pela imprensa, a Lava Jato
acaba... Ninguém contava, porém, que alguém iria divulgar a lista
da Odebrecht que inclui TODO o 'Novo governo'. A imprensa terá muito
trabalho para fazer a lista desaparecer da memória dos brasileiros
(ou não)."
Realmente
faz muito sentido: as manifestações de domingo, dia 13, seriam a
comprovação da vontade popular de fim do ciclo petista - e
praticamente do PT - e a volta dos homens direitos e probos e da
meritocracia (ganha mais quem pode mais). O juiz/justiceiro/jagunço
Moro já havia alcançado seu objetivo e era hora de fingir
distanciamento e denunciar exageros pouco antes do golpe, para quando
consumado, dar um fim a qualquer perigo a quem não fosse petista, e
atestar que não era de ocasião a crítica à Lava Jato. As ruas dia
18 contradisseram os donos da voz, Odebrecht denunciou mais do que a
Lava Jato queria saber (ainda não se sabe se as doações são
legais ou ilegais, vale ressaltar), o vazamento seletivo vazou
errado, Janot deu uma prensa em seus subordinados e Teori Zavascki
decidiu pôr um freio ao coronel Gilmar Mendes (eu ainda me pergunto
o que falta para tirar esse criminoso do STF e julgá-lo como ele
merece) e seu pupilo paranaense. O pior para os golpistas não é
isso: como disse, a aposta na queda de Dilma foi alta, e está
difícil dar o passo atrás: a manutenção da ordem democrática
pode significar não o fim do PT, mas o fim do PSDB (com possível
crescimento de uma extrema-direita puro sangue, como o PSC); o corte
de vez de verba federal para a imprensa que tentou derrubar Dilma (a
tentativa da presidenta, ao assumir, de fazer as pazes com essa
imprensa através de publicidade oficial merecia ser destacado ao fim
desse imbróglio todo), além do acirramento de cobranças pela
cassação da concessão pública da rede Globo.
PSDB,
coronel Mendes, Rede Globo e demais patrocinadores do golpe têm
muito a perder com a manutenção da democracia e não vão,
portanto, se entregar tão fácil. Não consigo imaginar os próximos
passos, gostaria de estar errado, mas penso que logo vem mais chumbo
grosso contra o PT, a esquerda e a democracia.
25
de março de 2016.
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